A REFORMA TRIBUTÁRIA QUE NÃO VEM

O início do período de campanha eleitoral para a Presidência da República reacende a discussão sobre a Reforma Tributária. O tema é tratado em todos os programas de governo, defendido por todos os candidatos e aprovado por todas as equipes envolvidas na campanha.

Mas é evidente que nenhuma Reforma Tributária, com R e T maiúsculos, será aprovada nos próximos quatro anos, como não foi nos últimos 34 anos.

De 05/10/1988 para cá, a Constituição sofreu alterações pontuais. Criou-se um imposto provisório aqui, uma contribuição provisória acolá, ambos sobre a movimentação financeira, claro… A substituição tributária foi constitucionalizada, espancando qualquer dúvida sobre a possibilidade de tributação sobre operações ainda não realizadas. A competência tributária da União em matéria de contribuições foi ampliada, de modo que hoje até sobre as importações há contribuição específica, para além do II, IPI, ICMS e ISS que já incidiam sobre a entrada de produtos e serviços importados. Os Estados também foram beneficiados por Emendas Constitucionais, ou alguém se esqueceu da ampliação do ICMS nas importações e da constitucionalização dos Fundos de Combate à Pobreza? Municípios e o Distrito Federal não ficaram de fora do elastecimento da competência tributária, bastando lembrar das contribuições de iluminação pública criadas por Emenda Constitucional.

A Reforma Tributária que realmente importa para o desenvolvimento econômico e para a racionalização do que é totalmente irracional ainda não foi promulgada nos últimos 34 anos!

Emendas vão, emendas vêm, mas ainda convivemos com a múltipla incidência de tributos sobre o faturamento das empresas. A cada ano que passa, perde-se a oportunidade de acabar com a tributação sobre a folha de pagamentos. Entra ano e sai ano, e a Constituição continua prevendo várias incidências tributárias sobre as importações, como se vivêssemos num país autossuficiente e num mundo sem globalização.

Se não há Reforma no âmbito constitucional, a esperança está naquilo que pode ser reformado através de leis ordinárias e/ou complementares.

Diante disso, tomara que o novo Congresso demonstre preocupação com o caótico conceito de insumos na apuração do PIS/COFINS, finalmente estabeleça o imediato creditamento do ICMS sobre a aquisição de bens de uso e consumo, determine uma base de cálculo justa no imposto de renda devido pelas pessoas físicas, autorize a ampla utilização/transferência de todo saldo credor do ICMS, acabe com as restrições à compensação tributária, enfim, faça a sua parte, deputado e senador!

Fica o desabafo… 

Como funciona a tributação monofásica de PIS/Cofins para empresas do Simples

O regime monofásico de PIS/Cofins, instituído pela Lei nº 10.485 de 3 de julho de 2002, consiste em uma sistemática semelhante à substituição tributária, em que a lei elege, entre os participantes da cadeia produtiva de um produto, aquele que será o responsável pelo recolhimento dos tributos. Nessa sistemática, diferente do que ocorre no regime comum de PIS/Cofins, essas contribuições terão incidência concentrada em uma das etapas de circulação do produto, com encerramento de tributação, uma vez que no regime monofásico as alíquotas praticadas são maiores, para que nas etapas subsequentes o produto passe a circular com alíquota zero.

Em outras palavras, o PIS/Cofins monofásico incide uma única vez na cadeia de circulação do produto até chegar no consumidor final, e o nascimento do fato gerador é unicamente na origem, ou seja, na saída do produto da fábrica, sendo o responsável pelo recolhimento do tributo o industrial, e no caso de produto importado, o importador. Isso significa que aqueles que ocupam as etapas subsequentes, como os atacadistas e varejistas, estão desobrigados de pagar PIS/Cofins sobre a receita dos produtos com incidência monofásica dessas contribuições.

Essa forma de tributação monofásica de PIS/Cofins, se aplica à alguns produtos farmacêuticos e de higiene pessoal, produtos cosméticos e de toucador, bebidas frias e autopeças, que podem ser identificados nos Anexos I e II, da Lei citada acima, que lista os NCM — Nomenclatura Comum do Mercosul dos produtos classificados como monofásicos. A criação dessa sistemática tem como finalidade facilitar a arrecadação e a fiscalização, tendo em vista que, há um número bem maior de atacadistas e varejistas do que de importadores e industriais para serem fiscalizados. Além disso, a tributação concentrada na origem abastece o caixa público de forma antecipada, porém, prejudica o fluxo de caixa das empresas sujeitas a esse regime.

Não obstante, apesar da própria Lei 10.485 de 2002, reduzir a zero as alíquotas de PIS/Cofins relativamente à receita bruta auferida por comerciantes atacadistas e varejistas, as empresas optantes pelo Simples Nacional, fatalmente acabam pagando novamente essas contribuições, seja por não fazerem a segregação das receitas, seja por não realizarem a correta classificação tributária dos produtos que revendem.

Ademais, o desconhecimento gera uma certa confusão acerca do Simples Nacional, que por possibilitar, dentre outras vantagens, a emissão de apenas uma guia para pagamento, muitos acreditam tratar-se de um único tributo, quando na verdade trata-se de um regime compartilhado de arrecadação, cobrança e fiscalização, abrangendo todos os entes federados (União, estados e municípios), bem como todos os tributos (IRPJ, CSLL, PIS, Cofins, ICMS, ISS e CPP).

Veja que, há o pagamento de apenas uma guia, mas o valor do Simples Nacional é distribuído proporcionalmente entre os entes federados de acordo com o percentual de cada um dos tributos de suas respectivas competências, incluindo PIS/Cofins que são tributos federais de competência da União. Desse modo, se os tributos já foram recolhidos por antecipação tributária com encerramento de tributação, o contribuinte deve segregar as receitas decorrentes de operações sujeitas à tributação concentrada em uma única etapa, conforme estabelecido na Lei nº 123 de 14 de dezembro de 2006.

Ocorre que, essa segregação não é algo automático e demanda uma série de ajustes, a começar pela atualização do NCM de cada produto, do cadastro da empresa, e o acompanhamento das alterações legislativas, o que nem sempre é uma tarefa fácil, em função da complexidade da legislação fiscal e de suas constantes alterações.  Assim, essas empresas ficam demasiadamente prejudicadas, uma vez que o pagamento duplicado de PIS/Cofins, além de aumentar a carga tributária, se reflete no preço final do produto, tornando-o menos competitivo. 

A despeito dessa situação, a Instrução Normativa RFB nº 2055, de 06 de dezembro de 2021, regulamenta que o crédito relativo a tributos administrados pela Receita Federal é passível de reembolso e será restituído ou compensado acrescido de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulados mensalmente. Nesse sentido, as empresas que estão pagando PIS/Cofins a maior em decorrência da monofase, podem fazer pedido administrativo de restituição dos valores pagos a título de tributos indevidos.

O pedido administrativo de restituição é feito no portal do e-Cac, e deve ser efetivado após a retificação da declaração, com a devida segregação das receitas, mas é importante atentar para o apontamento correto das receitas com incidência monofásica de PIS/Cofins. Após a efetivação do pedido administrativo, o prazo médio para a restituição dos créditos de PIS/Cofins é de 60 dias, sendo possível pedir o reembolso dos últimos cinco anos, que é o prazo legal de prescrição do crédito tributário.

Salienta-se que, caso a empresa tenha débitos fiscais, a Receita Federal irá propor a compensação de ofício, ou seja, um ajuste de contas entre o crédito e o débito, sendo o eventual crédito remanescente restituído. A compensação de ofício poderá ser impugnada, mas nesse caso o crédito do contribuinte fica retido até que o débito existente seja integralmente quitado.


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Daniele Barcelos de Albuquerque é advogada, especialista em Direito Fiscal e MBA em Planejamento Tributário Estratégico pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RJ).

Fonte: Conjur – 15/08/2022

EXCLUSÃO DO PIS/COFINS DE SUAS PRÓPRIAS BASES DE CÁLCULO

Com o julgamento da Tese do Século (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, RE 574.706, Tema 69 de Repercussão Geral), abriu-se a possibilidade de novo questionamento envolvendo as bases de cálculo do PIS/COFINS.

Trata-se da possibilidade das contribuições para o PIS e a COFINS serem excluídas das próprias bases de cálculo.

Esta discussão envolve a indevida e inconstitucional definição da base de cálculo das contribuições para o PIS e da COFINS a partir da redação dada pela Lei nº 12.973/2014 às Leis nº 10.637/2002, 10.833/2003 e ao Decreto-Lei nº 1.598/77.

O art. 12, §5º, do Decreto-Lei nº 1.598/77,  alterado pela Lei nº 12.973/2014, passou a dispor que “Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes…”.

Como o PIS/COFINS incide sobre a receita bruta, as contribuições passam a integrar as próprias bases de cálculo.

O problema é que, através da Lei nº 12.973/2014, o legislador ordinário está elastecendo, de forma não autorizada pela Constituição, o conceito de receita definido pelo legislador constituinte.

Se a Constituição fixou a competência da União para instituir contribuições de seguridade social sobre a receita ou faturamento das empresas (art. 195, I, “b”), os tributos exigidos com fundamento nesta competência não podem incidir sobre os ingressos ou entradas no caixa que não são destinados ao contribuinte, mas repassados à União, aos Estados e/ou aos Municípios.

Isto, aliás, foi o que ficou decidido pelo STF no julgamento da Tese do Século.

Embora a tese da exclusão do PIS/COFINS de suas próprias bases de cálculo já esteja em discussão no STF (RE 1.233.096, Tema 1.067 da Repercussão Geral), nunca é demais lembrar: no julgamento da Tese do Século, só puderam obter o aproveitamento integral do que foi pago indevidamente os contribuintes que, à época do julgamento, já mantinham discussão idêntica em juízo.

Por isso é que as empresas não podem perder tempo e devem ingressar em juízo para discutir a exclusão do PIS/COFINS de suas próprias bases de cálculo.

Fica o alerta…

Por que não liberar a compensação tributária?

Durante um longo período, os contribuintes que tinham efetuado pagamento de tributos a maior ou indevidamente somente poderiam obter o ressarcimento através de pedidos administrativos ou judiciais de restituição. 

Surgindo como uma alternativa viável a estas situações desconfortáveis, a Lei nº 8.383/91 (e suas alterações) regulamentou inicialmente o instituto da compensação tributária, previsto nos artigos 156, II, 170 e 170-A, do CTN. Posteriormente, a Lei nº 9.129/95 deu nova redação ao artigo 89, da Lei nº 8.212/91, disciplinando a compensação das contribuições previdenciárias. Finalmente, o artigo 74, da Lei nº 9.430/96 (e suas alterações) instituiu uma nova modalidade de compensação, restrita aos tributos administrados pela então Secretaria da Receita Federal. 

A compensação tributária, à evidência, somente será cabível quando o sujeito for ao mesmo tempo credor e devedor da Fazenda Pública e se justifica pelo fato de não ser razoável que aquele que se encontre nessa situação pague o que deve e pleiteie a restituição do que pagou indevidamente ou a maior. Por isso, não há nada mais razoável do que a lei prever um encontro de contas entre os sujeitos da relação jurídica tributária neste caso.

Ao longo do tempo, sucessivas leis vêm restringindo a compensação tributária, mediante alterações ao art. 74, da Lei nº 9.430/96, embora não exista motivo razoável que justifique qualquer limitação ao direito de compensar.

Ainda hoje não é possível utilizar o saldo a restituir do IRPF apurado na Declaração de Ajuste Anual numa compensação tributária. A lei ainda veda a compensação tributária para abater débitos de tributos devidos no registro de uma Declaração de Importação. Também há vedação à utilização de compensação quando o débito de tributo federal já tiver sido encaminhado à Procuradoria da Fazenda Nacional para inscrição em dívida ativa. Isso sem contar a impossibilidade de ser utilizado o crédito recebido de terceiro numa compensação tributária.

Embora a Lei nº 14.375/2022, na alteração que introduziu à Lei nº 13.988/2020 (transação tributária), autorize o uso de precatórios ou de direito creditório com sentença de valor transitada em julgado para amortização de dívida tributária principal, multa e juros – o que não deixa de ser uma compensação tributária – a portaria PGFN nº 6.757/2022 restringe significativamente esta possibilidade. 

Se uma determinada pessoa física contribuiu para o incremento do caixa da União, antecipando imposto de renda em valor superior àquele apurado na Declaração de Ajuste Anual, nada mais justo do que permitir que este contribuinte possa transferir livremente este crédito a quem quer que seja.

Se uma pessoa jurídica, por erro, ignorância, ilegalidade ou qualquer outro motivo, pagou tributos federais além do devido, nada justifica restringir a livre cessão e/ou utilização deste crédito, sob pena da União reter indevidamente o que não lhe pertence. 

Considerando que a compensação tributária é matéria sob reserva de lei em sentido formal, pense no assunto quando escolher seu candidato para a próxima legislatura.

Fica a dica…

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