João Luís de Souza Pereira – Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado da pós-graduação da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.
Mesmo após a definição da tese no Tema 520 pelo STF, ainda é preciso atenção no exame de autos de infração exigindo o ICMS em importações por conta e ordem de terceiros.
Liberados para exigir o ICMS nestas operações do adquirente da mercadoria, os Estado têm sido pouco cautelosos quando lavram autos de infração exigindo o imposto e acréscimos legais.
A situação mais comum é aquela em que o auditor fiscal admite que o adquirente realizou operações de importação por conta e ordem adotando como elementos de convicção as Declarações de Importação e as Notas Fiscais emitidas pelo importador para a entrega das mercadorias.
Mas o exame destes documentos não atesta a existência de importações por conta e ordem realizadas entre o adquirente e seu fornecedor (empresa importadora).
Com efeito, todas as operações ocorreram sob a disciplina da Instrução Normativa da SRF nº 225/2002.
Nos precisos termos do art. 2º, §2º, da Instrução Normativa RFB nº 1.861/2018[1], a existência de prévio contrato entre importador e adquirente é requisito essencial nas importações por conta e ordem, visto que o ato normativo dispõe que “O objeto principal da relação jurídica de que trata este artigo é a prestação do serviço de promoção do despacho aduaneiro de importação, realizada pelo importador por conta e ordem de terceiro a pedido do adquirente de mercadoria importada por sua conta e ordem, em razão de contrato previamente firmado”.
Também merece destaque o art. 5º, II, da Instrução Normativa RFB nº 1.861/2018[2], segundo o qual a apresentação de contrato firmado entre importador e adquirente no sistema informatizado de comércio exterior é conditio sine qua non para a caracterização de importação por conta e ordem.
Portanto, à luz da Instrução Normativa RFB nº 1.861/2018 conclui-se que: (a) o contrato de importação por conta e ordem deve anteceder as operações de importação e (b) o contrato de importação por conta e ordem deve ser apresentado à autoridade aduaneira, compondo o chamado dossiê da importação.
Consequentemente, é dever do fiscal autuante fazer a juntada do contrato de importação, que passará a fazer parte integrante do auto de infração exigindo o ICMS-Importação, a fim de restar caracterizada uma importação por conta e ordem nos termos previstos na IN-RFB 1861/2018.
Com efeito, a disciplina das importações por conta e ordem por ato da Secretaria da Receita Federal não é um mermo capricho, mas uma imposição legal que decorre do art. 80, I, da Medida Provisória 2.158-35/2001[3].
Desse modo, a inobservância de requisito da IN-RFB 1861/2018 importa em desrespeito à lei e descaracteriza a natureza da operação.
Também não se pode perder de vista que, nos termos do art. 11, §3º, da Lei nº 11.281/2006, a importação por encomenda é aquela realizada com recursos próprios da pessoa jurídica importadora.
No mesmo sentido, é o art. 2º, §1º, da IN-RFB 1861/2018: “Considera-se adquirente de mercadoria de procedência estrangeira importada por sua conta e ordem a pessoa, física ou jurídica, que realiza transação comercial de compra e venda da mercadoria no exterior, em seu nome e com recursos próprios, e contrata o importador por conta e ordem referido no caput para promover o despacho aduaneiro de importação”.
Daí a imprescindibilidade do contrato de importação por conta e ordem de que tratam os arts. 2º, §2º E 5º, I, da IN-RBF nº 1.861/2018, no qual estarão fixadas as obrigações das partes quanto à entrega dos recursos do adquirente à importadora, tais como o momento em que os recursos serão disponibilizados, as condições para a entrega do numerário, a responsabilidade pelo fechamento do câmbio da moeda nacional em estrangeira, eventuais garantias, etc…
Como se vê, a falta do contrato de importação por conta ordem não é um mero descumprimento de formalidade, mas evidencia a inobservância de uma imposição legal essencial para a determinação da real natureza de uma operação de comércio exterior.
Sendo o lançamento tributário um ato administrativo vinculado, a falta de requisito essencial de validade, diretamente relacionado à identificação do aspecto material do fato gerador, acarreta vício insanável que afasta a exigência fiscal.
[1] Art. 2º Considera-se operação de importação por conta e ordem de terceiro aquela em que a pessoa jurídica importadora é contratada para promover, em seu nome, o despacho aduaneiro de importação de mercadoria de procedência estrangeira adquirida no exterior por outra pessoa, física ou jurídica.
§ 1º Considera-se adquirente de mercadoria de procedência estrangeira importada por sua conta e ordem a pessoa, física ou jurídica, que realiza transação comercial de compra e venda da mercadoria no exterior, em seu nome e com recursos próprios, e contrata o importador por conta e ordem referido no caput para promover o despacho aduaneiro de importação.
§ 2º O objeto principal da relação jurídica de que trata este artigo é a prestação do serviço de promoção do despacho aduaneiro de importação, realizada pelo importador por conta e ordem de terceiro a pedido do adquirente de mercadoria importada por sua conta e ordem, em razão de contrato previamente firmado, que poderá compreender, ainda, outros serviços relacionados com a operação de importação, como a realização de cotação de preços, a intermediação comercial e o pagamento ao fornecedor estrangeiro.
[2] Art. 5º O importador por conta e ordem de terceiro e o importador por encomenda, ao registrar a DI, deverão:
I – indicar, em campo próprio da declaração, o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) ou no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do adquirente de mercadoria importada por sua conta e ordem ou do encomendante predeterminado, conforme o caso; e
II – anexar cópia do contrato previamente firmado com o adquirente de mercadoria importada por sua conta e ordem ou com o encomendante predeterminado, conforme o caso, por meio do módulo Anexação Eletrônica de Documentos no Pucomex.
[3] Art. 80. A Secretaria da Receita Federal poderá:
I – estabelecer requisitos e condições para a atuação de pessoa jurídica importadora ou exportadora por conta e ordem de terceiro;