ARTIGO DA SEMANA –  CBS NO REGIME AUTOMOTIVO

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

Através dos artigos 308 a 314[1], o PLP 68/2024 cuida especificamente da tributação da CBS sobre o regime automotivo.

Os dispositivos em apreço regulamentam o art. 19, da Emenda Constitucional nº 132/2023, que tem por objetivo alcançar empresas instaladas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, bem como os empreendimentos industriais instalados nas áreas de atuação da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM e Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE.

Estas pessoas jurídicas farão jus a um crédito presumido da CBS, concedido até 31/12/2032, em substituição aos créditos presumidos do IPI.

O crédito presumido tem por objetivo incentivar a produção de veículos equipados com motor elétrico ou híbrido. Também poderá contemplar as pessoas jurídicas com projetos relacionados à produção de veículos tracionados por motor de combustão, desde que inicie a produção de veículos elétricos ou híbridos até 1o de janeiro de 2028, cumprindo metas de investimento e produção.

O crédito presumido concedido às empresas do setor automotivo instaladas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste é concedido em percentuais regressivos ao longo tempo a incidir sobre o total das vendas no mercado interno de veículos elétricos ou híbridos.

A base de cálculo do crédito presumido é a receita de vendas no mercado interno, incluídos os tributos, mas excluídos os descontos incondicionais concedidos, vendas não tributadas integralmente pela CBS, canceladas e devolvidas.

Para as empresas instaladas nas áreas de atuação da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM e Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, o crédito presumido também será concedido em percentuais regressivos ao longo tempo a incidir sobre o total das vendas no mercado interno de veículos elétricos ou híbridos.

A exemplo das empresas localizadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a base de cálculo do crédito presumido para ss empresas da região da SUDAM também é a receita de vendas no mercado interno, incluídos os tributos, mas excluídos os descontos incondicionais concedidos, vendas não tributadas integralmente pela CBS, canceladas e devolvidas.

O crédito presumido apurado nos termos dos dispositivos poderá ser utilizado na compensação de débitos da CBS ou de outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil (RFB) e sua utilização fica restrita aos débitos do estabelecimento habilitado à fruição do incentivo, vedado o ressarcimento.

A fim de delimitar os débitos objeto da compensação/dedução ao estabelecimento incentivado, a lei prevê a edição de um Ato do Poder Executivo que estabelecerá um rateio entre os diversos tributos federais devidos pela pessoa jurídica.

A ideia de delimitar a fruição do crédito presumido ao estabelecimento incentivado não é ruim. Aliás, este é o objetivo do legislador constituinte derivado.

Há diferença marcante na utilização do crédito presumido, visto que a lei distinguiu a compensação com débitos da CBS, da compensação com os demais tributos administrados pela RFB.

Interessante notar que a compensação com débitos da CBS não tem restrições. A lei apenas afirma, no inciso I, que o crédito presumido poderá ser utilizado na compensação com débitos da CBS e ponto final.

Por outro lado, ao tratar da compensação com débitos dos demais tributos administrados pela RFB, a norma regulamentadora estabelece que deverão ser observadas as condições e limites vigentes para compensação na data da declaração.   

Consequentemente, a compensação do crédito presumido com débitos da CBS não está sujeita às limitações, por exemplo, do art. 74, §3º, da Lei nº 9.430/96.

As sanções pelo descumprimento das condições exigidas para a fruição do crédito presumido são o cancelamento ou suspensão da habilitação. 

É claro que estas sanções devem ser aplicadas mediante o devido processo administrativo, no qual deverá ser observado o contraditório e a ampla defesa.

Apesar da lei afirmar que “poderá” ser aplicada a pena de suspensão da habilitação, a leitura do dispositivo seguinte deixa claro que a suspensão é a pena para o contribuinte que não comprovar sua situação de regularidade fiscal, aplicando-se o cancelamento como sanção nas demais hipóteses de inabilitação. Regularizada a situação fiscal e obtendo a certidão do art. 205 ou 206 do CTN, fica restabelecida a habilitação.

O cancelamento é a sanção para o descumprimento das demais condições para a fruição do crédito presumido, estranhas à regularidade fiscal do contribuinte.

Como a apuração e utilização do crédito presumido não dependem de prévia manifestação da RFB, a fiscalização poderá ocorrer a posteriori.

A apuração do crédito presumido a devolver compete ao Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio no encerramento do processo de cancelamento da habilitação.

A lei deixa claro, portanto, que o cancelamento da habilitação ocorrerá ao final de um devido processo administrativo, assegurados, obviamente, o contraditório e a ampla defesa.

Este processo administrativo deverá ter início em até 5 (cinco) anos, contados da ciência do descumprimento dos requisitos e condições para a fruição, daí resultando o prazo para a prescrição da pretensão punitiva da União.

Proferida decisão final no processo administrativo, o contribuinte será intimado a devolver o valor devolvido, devidamente acrescido dos encargos moratórios aplicáveis aos tributos federais, até o último dia do mês subsequente ao cancelamento da habilitação.

Não sendo realizada a devolução do crédito presumido, terá início o prazo que a União promova a cobrança do valor devido, em até 5 (cinco) anos, contados a partir do primeiro dia do mês seguinte àquele em que o recolhimento deveria ter sido efetuado. 


[1] Art. 308. Até 31 de dezembro de 2032, farão jus a crédito presumido da CBS, nos termos desta Lei Complementar, os projetos habilitados à fruição dos benefícios estabelecidos pelo art. 11-C da Lei no 9.440, de 14 de março de 1997, e pelos arts. 1o a 4o da Lei no 9.826, de 23 de agosto de 1999, de pessoa jurídica fabricante ou montadora de veículos. 

§ 1o O crédito presumido de que trata o caput:

I – incentivará exclusivamente a produção de veículos equipados com motor elétrico que tenha capacidade de tracionar o veículo somente com energia elétrica, permitida a associação com motor de combustão interna que utilize biocombustíveis isolada ou simultaneamente com combustíveis derivados de petróleo; e 

II – será concedido exclusivamente a:

a) projetos aprovados até 31 de dezembro de 2024, de pessoas jurídicas que, em 20 de dezembro de 2023, estavam habilitadas à fruição dos benefícios estabelecidos pelo art. 11-C da Lei no 9.440, de 14 de março de 1997, e pelos arts. 1o a 4o da Lei no 9.826, de 23 de agosto de 1999; e 

b) novos projetos, aprovados até 31 de dezembro de 2025, que ampliem ou reiniciem a produção em planta industrial utilizada em projetos ativos ou inativos habilitados à fruição dos benefícios de que trata a alínea “a” deste inciso. 

§ 2o O beneficio de que trata este artigo será estendido a projetos de pessoas jurídicas de que trata a alínea “a” do inciso II do § 1o relacionados à produção de veículos tracionados por motor de combustão interna que utilizem biocombustíveis isolada ou cumulativamente com combustíveis derivados de petróleo, desde que a pessoa jurídica habilitada: 

I – inicie a produção de veículos de que trata o inciso I do § 1o até 1o de janeiro de 2028, no estabelecimento incentivado; e 

II – assuma, nos termos do ato concessório do benefício, compromissos relativos: 

a) ao volume mínimo de investimentos;

b) ao volume mínimo de produção;

c) ao cumprimento de processo produtivo básico; e 

d) à manutenção da produção por prazo mínimo, inclusive após o encerramento do benefício.

§ 3o O benefício de que trata o caput fica condicionado:
I – à realização de investimentos em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica na região, inclusive na área de engenharia automotiva, correspondentes a, no mínimo, 10% (dez por cento) do valor do crédito presumido apurado, nos termos regulamentados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços – MDIC; e 

II – à regularidade fiscal da pessoa jurídica quanto a tributos federais. 

§ 4o Ato do Poder Executivo definirá os requisitos e condições das exigências contidas no inciso II do § 2o e no inciso I do § 3o. 

§ 5o O cumprimento dos requisitos e condições de que tratam o inciso II do § 2o e o inciso I do § 3o será comprovado perante o MDIC. 

§ 6o O MDIC encaminhará à RFB, anualmente, os resultados das auditorias relativas ao cumprimento dos requisitos referidos no § 4o.

Art. 309. O crédito presumido de que trata o art. 308 não poderá ser usufruído cumulativamente com quaisquer outros benefícios fiscais federais da CBS destinados à beneficiária desse crédito presumido. 

Art. 310. Em relação aos projetos habilitados à fruição dos benefícios estabelecidos pelo art. 11-C da Lei no 9.440, de 14 de março de 1997, o crédito presumido de que trata o art. 308 será calculado mediante a aplicação dos seguintes percentuais sobre o valor das vendas no mercado interno, em cada mês, dos produtos constantes nos projetos de que trata o art. 308, fabricados ou montados nos estabelecimentos incentivados:

I – 11,60% (onze inteiros e sessenta centésimos por cento) até o 12o (décimo segundo) mês de fruição do benefício; 

II – 10% (dez inteiros por cento) do 13o (décimo terceiro) ao 48o (quadragésimo oitavo) mês de fruição do benefício; 

III – 8,70% (oito inteiros e setenta centésimos por cento) do 49o (quadragésimo nono) ao 60o (sexagésimo) mês de fruição do benefício; 

§ 1o No cálculo do crédito presumido de que trata o caput não serão incluídos os impostos e as contribuições incidentes sobre a operação de venda, e serão excluídos os descontos incondicionais concedidos. 

§ 2o O crédito presumido de que trata o caput somente se aplica às vendas no mercado interno efetuadas com a exigência integral da CBS, não incluídas: 

I – as vendas isentas, imunes, não alcançadas pela incidência da Contribuição, com alíquota zero, com redução de alíquotas ou de base de cálculo, ou com suspensão da contribuição; e 

II – as vendas canceladas e as devolvidas.

§ 3o Os percentuais de que tratam os incisos I a III do caput serão reduzidos à razão de 20% (vinte por cento) do percentual inicial ao ano, entre 2029 e 2032, até serem extintos a partir de 2033. 

Art. 311. Em relação aos projetos habilitados à fruição dos benefícios estabelecidos pelos arts. 1o a 4o da Lei no 9.826, de 23 de agosto de 1999, o crédito presumido de que trata o art. 308 corresponderá ao produto da multiplicação dos seguintes fatores: 

I – valor das vendas no mercado interno, em cada mês, dos produtos constantes nos projetos de que trata o art. 308, fabricados ou montados nos estabelecimentos incentivados; 

II – alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI vigentes em 31 de dezembro de 2025, conforme a Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – Tipi, inclusive Notas Complementares, referentes aos produtos classificados nas posições 8702 a 8704;

III – fator de eficiência, que será o resultado do cálculo de 1 (um inteiro) diminuído da alíquota referida no inciso II, para cada posição na Tipi; e 

IV – fator multiplicador, que será de:

a) 32,00% (trinta e dois por cento) nos anos de 2027 e 2028; 

b) 25,60% (vinte e cinco inteiros e sessenta centésimos por cento) no ano de 2029; 

c) 19,20% (dezenove inteiros e vinte centésimos por cento) no ano de 2030; 

d) 12,80% (doze inteiros e oitenta centésimos por cento) no ano de 2031; e 

e) 6,40 % (seis inteiros e quarenta centésimos por cento) no ano de 2032. 

Parágrafo único. Aplica-se a este artigo o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 310. 

Art. 312. Os créditos apurados em decorrência dos benefícios de que trata o art. 308 somente poderão ser utilizados para: 

I – compensação com débitos da CBS; e

II – compensação com débitos próprios relativos a tributos administrados pela RFB, observadas as condições e limites vigentes para compensação na data da declaração. 

§ 1o Os créditos de que trata este artigo:

I – não poderão ser transferidos a outro estabelecimento da pessoa jurídica; 

II – devem ser utilizados somente para dedução e compensação de débitos próprios do estabelecimento habilitado e localizado na região incentivada; e 

III – não podem ser objeto de ressarcimento.

§ 2o Consideram-se débitos próprios do estabelecimento habilitado e localizado na região incentivada a parcela dos débitos de impostos e contribuições federais da pessoa jurídica na forma de rateio estabelecida em Ato do Poder Executivo.

Art. 313. O descumprimento das condições exigidas para fruição do crédito presumido poderá acarretar as seguintes penalidades: 

I – cancelamento da habilitação com efeitos retroativos; ou 

II – suspensão da habilitação.

Parágrafo único. A suspensão da habilitação de que trata o inciso II do caput poderá ser aplicada na hipótese de verificação do não atendimento, pela pessoa jurídica habilitada, da condição de que trata o inciso II do § 3o do art. 308, ficando suspensa utilização do crédito presumido de que trata este Capítulo enquanto não forem sanados os motivos que deram causa à suspensão da habilitação. 

Art. 314. O cancelamento da habilitação poderá ser aplicado na hipótese de descumprimento dos requisitos e condições de que tratam o art. 308, ainda que ocorrido após o período de apropriação do crédito presumido. 

§ 1o O cancelamento da habilitação implicará a devolução de parcela do crédito presumido apurado no período e os seus acréscimos legais, a qual corresponderá ao produto da multiplicação dos seguintes fatores: 

I – total do crédito presumido apurado no período fixado no ato concessório; 

II – 100% (cem por cento) diminuído do produto da multiplicação dos seguintes valores percentuais: 

a) F1%: resultado da divisão do somatório de investimentos realizados pelo estabelecimento no período do crédito, pelo volume mínimo de investimentos no período do crédito fixado no ato concessório do benefício, de modo que F1% não poderá́ ser superior a 100,0% (cem por cento); 

b) F2%: resultado da divisão do somatório dos volumes de produção realizados pelo estabelecimento no período do crédito, pelo volume mínimo de produção no período do crédito fixado no ato concessório do benefício, de modo que F2% não poderá́ ser superior a 100,0% (cem por cento); e 

c) F3%: resultado da divisão do prazo de manutenção da produção no estabelecimento, inclusive após o encerramento do benefício, pelo prazo mínimo de produção fixado no ato concessório do benefício, incluído o período após o encerramento do benefício, de modo que F3% não poderá́ ser superior a 100,0% (cem por cento). 

§ 2o A parcela do crédito presumido a devolver de que trata o § 1o: 

I – será apurada pelo MDIC, no encerramento do processo de cancelamento da habilitação, que deverá ser iniciado em até 5 (cinco) anos contados da ciência do descumprimento dos requisitos e condições de que tratam o art. 308; 

II – sofrerá incidência de juros de mora na mesma forma calculada sobre os tributos federais, nos termos da lei, contados a partir do período de apuração em que ocorrer o fato que deu causa ao cancelamento da habilitação; e 

III – deverá ser recolhida até o último dia útil do mês seguinte ao cancelamento da habilitação. 

§ 3o O direito de a administração tributária cobrar a devolução da parcela do crédito presumido de que trata este 

artigo será de 5 (cinco) anos contados a partir do primeiro dia do mês seguinte àquele em que o recolhimento deveria ter sido efetuado, na forma do inciso III do § 2o. 

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