Não é possível o aproveitamento de créditos de ICMS decorrentes das aquisições de bens destinados ao uso e consumo da empresa, pois sua efetivação depende de lei complementar. Essa foi a tese de repercussão geral aprovada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal em julgamento virtual encerrado nesta terça-feira (7/11).
No recurso extraordinário julgado pela corte, o governo de Santa Catarina contestou uma decisão do Tribunal de Justiça local (TJ-SC). O acórdão garantiu a uma empresa a manutenção e o aproveitamento dos créditos de ICMS originados com a entrada de bens de uso e consumo do estabelecimento, relacionados à produção de mercadorias a serem exportadas.
O governo catarinense argumentou que a Constituição prevê a isenção do imposto somente nas operações nas quais as mercadorias são destinadas para fora do país e nos serviços prestados a destinatários no exterior.
Prevaleceu o entendimento do ministro Gilmar Mendes. Ele foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Kassio Nunes Marques.
Os magistrados ressaltaram que a Constituição adotou a técnica do crédito físico, segundo a qual somente geram créditos as entradas de mercadorias destinadas a sair do estabelecimento.
A Emenda Constitucional 42/2003 afastou por completo a incidência do ICMS sobre as exportações, mas, de acordo com Gilmar, não substituiu o modelo de crédito físico pelo de crédito financeiro (a ideia de que todo e qualquer bem ou insumo usado na elaboração da mercadoria gera direito a crédito, mesmo se for consumido durante o processo produtivo).
“Nada indica que houve intenção de romper com a consagrada fórmula constitucional referente a apropriação de créditos em cadeias não cumulativas”, apontou o ministro. Ele explicou que a compensação do imposto exige a sua incidência na etapa anterior e na etapa seguinte. Assim, “se o bem é consumido no processo de produção da mercadoria, não haverá cumulatividade de incidências”, pois tal insumo não será tributado de novo.
Na visão de Gilmar, seria “incongruente com a realidade fática adotar o critério do crédito financeiro justamente quando a imunidade foi ampliada para abarcar produtos com menor patamar de transformação industrial e que, portanto, gerariam menor creditamento em cadeia”. Além disso, a alteração constitucional foi pautada na simplificação e na uniformização do regime tributário. Ou seja, seria contraditório adotar regimes de creditamento diferenciados.
O acórdão do TJ-SC adotou uma forma de aproveitamenteo de créditos “onde a Constituição silenciou”, já que essa “pormenorização” foi delegada à lei complementar, segundo Gilmar, que destacou que os créditos financeiros não podem ser subentendidos. Em outras palavras, nas exportações, não é possível usar uma “interpretação ampliativa” para incluir em uma regra de imunidade “fatos, situações ou objetos” não abrangidos pelo texto literal da Constituição.
Voto vencido
Os ministros Dias Toffoli, Luiz Edson Fachin, André Mendonça, Cármen Lúcia e a já aposentada Rosa Weber se manifestaram de maneira diferente. Eles votaram por validar o entendimento do TJ-SC e fixá-lo como tese de repercussão geral.
Toffoli, relator do caso, explicou que a EC 42/2003 previu imunidade de ICMS para as operações de exportação e garantiu a manutenção e o aproveitamento dos créditos relativos a operações anteriores à exportação. De acordo com ele, tais créditos não se limitam àqueles enquadrados no regime de crédito físico.
O magistrado apontou que o preço de exportação não é afetado apenas pelas mercadorias tributadas pelo imposto e integrantes da operação pela qual sairão. Tal valor também pode ser afetado pelos produtos destinados ao uso ou consumo do estabelecimento e relacionados ao processo de industrialização de mercadorias destinadas à exportação. Por isso, deve ser garantido o aproveitamento do ICMS relativo a tais aquisições.
“É bastante razoável compreender que os produtores-exportadores repassem para o preço final de exportação, segundo algum critério de rateio, ainda que implícito, o valor de aquisição de tais mercadorias (no que se inclui o ICMS que incidiu sobre elas) destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento”, assinalou ele.
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Revista Consultor Jurídico, 8 de novembro de 2023, 15h13