PROMESSAS TRIBUTÁRIAS DE CAMPANHA

Ainda de olho nas campanhas eleitorais, observamos dois temas tributários que ganharam repercussão nesta semana: a criação de um imposto sobre grandes fortunas e a correção da tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas.

Para mitigar a situação dos que vivem sob extrema pobreza, Ciro Gomes propõe a criação de um benefício previdenciário constitucional que irá englobar o Auxílio Brasil, a aposentadoria rural e o Benefício de Prestação Continuada (BPC). Para financiar o tal benefício previdenciário constitucional, Ciro Gomes conta com as atuais fontes de custeio, mas também propõe uma receita extra originária do Imposto Sobre Grandes Fortunas (IGF).

Sem entrar no mérito dos valores que podem ser arrecadados com o IGF, não podemos deixar de apontar um óbice constitucional gravíssimo à proposta de Ciro Gomes: tratando-se de um imposto, o total arrecadado a título de IGF não poderá ter uma destinação específica.

O legislador constituinte, fiel à natureza não vinculada dos impostos – esta importante espécie tributária – fixou, no art. 167, IV, o famoso princípio da não afetação da receita de impostos. Este princípio segue uma lógica bem arraigada no Código Tributário Nacional: como os impostos não têm como fato gerador uma atividade estatal, muito pelo contrário, o produto de sua arrecadação não pode financiar uma despesa específica.

Portanto, Ciro Gomes, busque outra fonte de receita para o seu  benefício previdenciário constitucional, desde que não seja uma CPMF, por favor!

As campanhas de Lula, Bolsonaro e do próprio Ciro Gomes estão divulgando a necessidade de correção da tabela do imposto de renda devido pelas pessoas físicas (IRPF).

O que muda são os limites de isenção e as novas faixas de tributação que propõem.  

A preocupação em corrigir a Tabela do IRPF é legítima, mas como defendemos há anos, não é melhor solução para o problema.

Corrigir a Tabela não soluciona o mais importante problema do IRPF no Brasil: a exata fixação da base de cálculo do imposto.

Diversamente de outros países, o IRPF brasileiro incide sobre rendimentos que são utilizados pelo cidadão para sua subsistência e que representam gastos realizados pelas pessoas físicas para arcar com despesas que são dever do Estado.

A dedução de despesas médicas somente na Declaração faz com que o contribuinte acabe por antecipar durante o ano mais imposto do que deveria pagar. Além disso, por mais que sejam dedutíveis na DIPF os gastos com a mensalidade do plano de saúde e outras despesas médicas, a pesada conta dos remédios pagos na farmácia não pode ser abatida, como se o profissional de saúde tivesse o dom de resolver todos os problemas sem a prescrição de medicamentos.

A dedução das despesas com instrução somente na Declaração também perpetua injustiça, isto sem contar o limite na dedução desta despesa que precisa ser abolido.

Também há casos em que a legislação brasileira não admite em hipótese alguma a dedução. Basta lembrar que, no Brasil, as despesas necessárias à habitação – aluguéis ou prestações da casa própria – não podem ser deduzidas no cálculo do IRPF, seja a cada mês, seja na DIPF. 

Estas são apenas algumas situações que fazem com que o IRPF incida sobre rendimentos que são utilizados em despesas necessárias à existência digna do ser humano, o chamado mínimo existencial.

Há um novo Congresso Nacional em formação. Fica o alerta…

Filtros de conteúdo para o processo administrativo tributário

Como no judicial, também o processo administrativo sofre com o paradoxo da ampla acessibilidade versus o volume daí resultante — e, por derivação, a ampliação do tempo para sua solução.

Há, por certo, oscilações — a ideia de inafastabilidade, no plano judicial, é sabidamente mais intensa que em nível administrativo; há recortes (temporais, por exemplo) que fazem o acesso à jurisdição administrativa mais estreito etc.

A lógica, em sua essência é a mesma, porém: historicamente, operamos com a dominante interpretação (por momentânea conveniência, para alguns; por convicção intransponível, para outros) de que é desejo constitucional que a jurisdição, quer a administrativa, quer a convencionalmente exercida pelo Judiciário, seja amplamente acessí(á)vel, aspecto que selaria uma das faces do Estado de Direito, sobretudo no pós-ditadura [revalidamos, com essa breve observação, nossa particular convicção de que o percurso histórico, marcadamente o que foi vivido pelos grandes autores que fizeram as bases do Direito Público brasileiro, diz muito sobre a interpretação que carregamos sobre certos institutos, mesmo que não conheçamos ou que não tenhamos vivido a passagem de uma para outra dessas frações da história jurídica nacional (antecedente e posterior à Constituição de 1988)].

Podemos (ou melhor, devemos) reconhecer, no entanto, que o processo de amadurecimento democrático a que nos submetemos, passados mais de trinta anos, talvez já seja suficiente para nos colocar numa posição menos “absolutista” quanto ao “tamanho” que seguiremos dando à ideia de inafastabilidade de jurisdição — uma reflexão que nos agita a todos no ambiente tributário judicial e que deve ser transposta, da mesma forma, para o administrativo.

Mas não queremos falar, aqui, de acessibilidade no plano formal, senão material, de conteúdo, numa perspectiva que poderia colaborar para a minimização do problema de estoque processual e de tempo de duração, por conseguinte.

Em tempos como os atuais, em que tanto falamos — às vezes, inapropriadamente — de “precedente”, sabemos que certos temas podem e devem ser desde logo tomados como jurisdicionalmente acertados.

Sem entrar no debate (para nós estéril) sobre se essa premissa vale para o intercâmbio de “precedentes” do Judiciário para o plano do processo administrativo [mas já admitindo que, se o que nos faceia é decisão de caráter vinculante (premissa, pensamos, para a manutenção da unidade do sistema), existiria, sim, essa intercambialidade], é preciso inferir: há um campo da experiência jurisdicional que, na medida de sua evolução, vai tornando certos temas alheios a debate (o tema em si, frisemos, não as particularidades fáticas do caso), daí sobrevindo uma espécie de camada apta a reter a formação de processos “novos” sobre bases temáticas “velhas”.

Essa espécie de raciocínio — plenamente viável com as peças normativas de que dispomos hoje — constituiria um tipo de juízo de delibação prévio, com caráter conteudístico e não meramente formal, podendo significar um bom caminho na solução do problema a que antes nos referíamos — do volume de processos e do derivado alongamento em seu tempo de duração.

Essa providência foi inicialmente pensada, em nível judicial, já há tempos, especificamente em 2006, com a introdução do artigo 285-A no Código de Processo Civil então vigente (o de 1973) [1]. Se não foi escandalosamente aplicado em ambiente tributário, dada a formatação não tão interessante das hipóteses ali vertidas, o fato é que esse passo histórico não pode ser esquecido: não é nova a preocupação de nosso sistema processual com o estabelecimento de um filtro preliminar de natureza conteudística-material.

Plantada naquela ocasião, a ideia avançou várias casas no “jogo” da operatividade prática com o Código de 2015, diploma que a reescreveu de modo a assentar, agora sim, hipóteses muito bem delineadas. O fez em seu artigo 332, disposição cuja leitura vale muito à pena refazer:

“Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar:

I – enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;

II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

IV – enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.

§ 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição.

§ 2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 241.

§ 3º Interposta a apelação, o juiz poderá retratar-se em 5 (cinco) dias.

§ 4º Se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com a citação do réu, e, se não houver retratação, determinará a citação do réu para apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias.”

Pensando em nível pragmático, é nosso particular interesse realçar o tanto que esse dispositivo pode funcionar, sobretudo quando lidos com atenção os incisos de seu caput, como importante filtro processual — não por aspectos formais, insistamos, mas pela eventual inconsistência do mérito articulado, uma decorrência que há de (ou deveria) ser vista como natural, para sistemas que prestigiam a força de determinados atos decisórios (caso em que o Brasil se coloca).

No âmbito federal, o assunto já gravitava sobre nossas cabeças antes mesmo da introdução do artigo 285-A no Código de Processo Civil de 1973, em razão da Lei nº 10.522/2002, cujo artigo 19, em sua redação original, autoriza(va) a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional a deixar de interpor recurso ou a desistir do interposto, desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão “recorrenda” versasse sobre matérias que, por exemplo, estivessem pacificadas no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça.

O dispositivo em questão ganhou (e segue ganhando) renovada redação, mas sempre mantida a mesma lógica — válida tanto para a atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, como para a da Receita, sobretudo no que se refere à constituição do crédito tributário —, a saber, de que os “precedentes” impactam (ou podem impactar) positivamente, como filtros de mérito, retendo a formação de novas lides tributárias (aí incluídas, realcemos, as administrativas), assim como o desenvolvimento das que já se instauraram.

Em termos práticos, sem prejuízo do que se contém na Lei nº 10.522/2002, a operação de que falamos poderia ser perfeitamente desenvolvida pelos julgadores administrativos em geral (não só no plano federal) à conta do artigo 332 do Código de Processo Civil de 1973, dada a aplicabilidade preconizada pelo artigo 15 do mesmo codex [2], vale dizer, proposta “demanda” administrativa fundada em tese vencida por decisão tal qual as descritas nos incisos do dispositivo, seria possível o julgamento liminar de mérito do caso, medida que, a um só tempo, (1) tenderia a colocar as jurisdições de que falamos (a judicial e a administrativa) em desejável harmonia, (2) romperia o uso do processo administrativo apenas para fins de adiamento, (3) sem imprimir, a par dessas “vantagens”, um rompimento com o devido processo legal, dado o encaminhamento preconizado nos parágrafos 4° e 5°, preceitos que, além de garantirem a óbvia recorribilidade da decisão (que no caso de um órgão colegiado seria preferencialmente emitida, porque liminar, pelo relator), ainda asseguram o anômalo emprego pelo mesmo julgador, do juízo de retratação — a ser naturalmente utilizado quando constatado que o julgamento liminar se deu fora da pressuposta adequação do caso presente com caso “precedente”.


[1] Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.

§ 1º Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.

§ 2º Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

[2] Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.

Fonte: Conjur – 21/08/2022

Publicado acórdão do STJ afirmando que o proprietário de imóvel gravado com usufruto é contribuinte do IPTU


15 de agosto de 2022 | AREsp 1.566.893/SP | 1ª Turma do STJ
A Turma, por unanimidade, entendeu que, no caso de imóvel gravado com usufruto, tanto o proprietário, que remanesce com o domínio indireto, quanto o usufrutuário, que exerce a posse direta e detém o domínio útil, são contribuintes do IPTU, podendo a lei municipal disciplinar a sujeição passiva de qualquer um deles ou, ainda, de ambos. À luz do entendimento jurisprudencial fixado no Tema 122/STJ – segundo qual o art. 34 do CTN elenca como contribuintes do IPTU tanto o proprietário quanto o detentor de domínio útil e o possuidor da coisa, este desde que tenha animus domini, cabendo à lei local de regência eleger sobre quem irá recair a sujeição passiva do imposto no âmbito daquela municipalidade –, os Ministros cassaram o acórdão recorrido, com a determinação de retorno dos autos ao Tribunal de origem, para que, em novo julgamento da apelação, seja verificada a sujeição passiva à luz da lei municipal. Por fim, os Ministros destacaram que a definição de contribuinte é matéria reservada à lei complementar (art. 146, III, “a”, da CF/1988) e, por isso, o art. 1.403, II, do CC/2002 não pode ser considerado como norma excludente de sujeição passiva para fins tributários.

Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados.

INICIADO JULGAMENTO NO STF EM QUE SE DISCUTE A POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DE ALÍQUOTA DO ICMS MAIS ELEVADA SOBRE ENERGIA ELÉTRICA E SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO EM COMPARAÇÃO À ALÍQUOTA GERAL DO TRIBUTO

19 de agosto de 2022 | ADI 7.111/PA, ADI 7.113/TO, ADI 7.116/MG, ADI 7.119/RO e ADI 7.122/GO | Plenário do STF
O Ministro Edson Fachin – Relator – entendeu não ser possível a fixação de alíquota de ICMS mais elevada sobre energia elétrica e serviços de comunicação em comparação à alíquota geral do tributo. Segundo o Ministro, incide, no caso, a regra da essencialidade em conjunto com a seletividade, não havendo espaço para que o legislador opte por apenas uma delas, conforme art. 155, § 2º, III, da CF/1988 e entendimento firmado pela Corte no RE 714.139/SC, reafirmado na ADI 7.117/SC e na ADI 7.123/DF. Por fim, no tocante à modulação dos efeitos da decisão, o Ministro adotou os parâmetros fixados no RE 714.139/SC (RG) – Tema 745 para produção de efeitos a partir do exercício financeiro de 2024. O julgamento aguarda o voto dos demais Ministros.
Fonte: SACHA CALMON – MISABEL DERZI Consultores e Advogados

TJ-SP anula lei de isenção tributária em troca de adoção de animais abandonados

A concessão de qualquer isenção só pode se dar mediante lei específica, sendo vedado ao Poder Legislativo conferir ao chefe do Executivo a prerrogativa extraordinária de dispor, normativamente, sobre tais categorias temáticas.

Assim entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao anular uma lei de Registro, de iniciativa parlamentar, que autorizava a prefeitura a conceder isenção de tributos municipais, como IPTU e ISS, a pessoas físicas ou jurídicas que adotassem animais.

Ao propor a ADI, a Prefeitura de Registro alegou afronta aos princípios da separação dos poderes, da legalidade tributária estrita, da razoabilidade, proporcionalidade e igualdade, além de atentar contra a autonomia financeira do município. Por unanimidade, o colegiado julgou a ação procedente.

Conforme o relator, desembargador Décio Notarangeli, trata-se de lei específica que define o beneficiário e os requisitos para a concessão e manutenção da isenção de tributos. Ficaria, porém, a critério do Executivo a definição de quantos e quais tributos seriam objeto da isenção e a extensão da renúncia fiscal, o que deveria ser feito por decreto em até 60 dias.

“Está claro, pois, que a referida lei padece de inconstitucionalidade pela abdicação, pelo Poder Legislativo, de sua competência institucional em favor do Poder Executivo, o que atenta contra a separação de poderes e a reserva legal estrita em matéria tributária”, explicou o magistrado, destacando que a isenção tributária não poderia ser concedida por meio de decreto do prefeito.

Para Notarangeli, sem a completa definição dos elementos da isenção fiscal, não seria possível nem afirmar se o benefício era, ou não, desproporcional: “Como é fácil de perceber, um desconto de 3% no IPTU, costumeiramente concedido como estímulo para a quitação do tributo à vista em uma única parcela, não se equipara a isenção de 75% ao contribuinte adotante”.

O relator também afirmou que a lei impôs diretrizes ao Poder Executivo e a seus órgãos, como o centro de controle de zoonoses e os canis públicos, em ofensa à competência de auto-organização administrativa do município. Além disso, ele disse que a norma não foi antecedida de estimativa de impacto orçamentário e financeiro, como determina o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

“Não consta que o projeto de renúncia fiscal tenha sido acompanhado de estimativa de impacto orçamentário, apesar de a questão ter sido suscitada antes da votação que derrubou o veto integral do prefeito. Nada obstante louvável a iniciativa parlamentar de incentivar a adoção responsável de animais abandonados, a Lei 2.000/2021, do município de Registro, padece de vício insanável de inconstitucionalidade”, concluiu.

Clique aqui para ler o acórdão
2275813-83.2021.8.26.0000

Fonte: Conjur – 23/08/2022

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