Relevância da questão federal discutida em matéria tributária no STJ

O Superior Tribunal de Justiça foi instituído pela Constituição de 1988, sendo instalado no dia 7 de abril de 1989.

O constituinte de 1988 transferiu para o STJ a missão de zelar pela integridade e pela uniformização da interpretação do direito federal infraconstitucional comum.

Um dos motivos da criação do Tribunal foi a denominada “Crise do Supremo”. Isso porque o STF tinha competência para julgar os recursos versando sobre matéria constitucional e infraconstitucional, fazendo com que chegassem àquela corte milhares de recursos. Segundo o ministro Athos Gusmão: “A criação do STJ atendeu aos reclamos”.

A classe jurídica em geral buscava de várias maneiras solucionar a crise, visto que a situação em que se encontrava a Suprema Corte era lastimável.

Visando solucionar a crise que se passava pelo Supremo Tribunal Federal, várias foram as tentativas de solução. Dentre elas a arguição de relevância e os óbices regimentais e jurisprudenciais. Já em 1963, o professor José Afonso da Silva sugeriu a criação de um “Tribunal Superior de Justiça”, que teria as mesmas funções dadas pelo constituinte, ao Superior Tribunal de Justiça.

Diante das frustradas tentativas de solucionar a crise do Supremo, foi criado o Superior Tribunal de Justiça, que passou a ter a competência para julgar os recursos referentes a matéria infraconstitucional, ficando o Supremo Tribunal Federal com a competência para julgar os recursos referentes a matéria constitucional.

O STJ passou a ser cúpula da Justiça comum.

O professor Bernardo Pimentel de Souza bem sintetiza a finalidade da criação do Superior Tribunal de Justiça:

“Para que a finalidade da criação do Superior Tribunal de Justiça fosse atingida, o legislador constituinte transferiu à novel corte boa parte da competência antes conferida ao Supremo Tribunal Federal. É o que se depreende do cotejo do artigo 105, inciso I, alíneas ‘a’, ‘d’ e ‘g’, inciso II, alíneas ‘a’ e ‘c’, e inciso III, alíneas ‘a’, ‘b’ e ‘c’ da Constituição vigente, com artigo 119, inciso I, alíneas ‘b’, ‘e’ e ‘f’, inciso II, alíneas ‘a’ e ‘c’, e inciso III, alíneas ‘a’, ‘c’ e ‘d’, da Carta de 1967, com a redação dada pela emenda nº 1, de 1969. Já do extinto Tribunal Federal de Recursos, o Superior Tribunal de Justiça herdou pequena parte da competência. É o que revela a comparação do artigo 105, inciso I, alíneas ‘a’, ‘b’, ‘c’ e ‘d’, da Constituição Federal de 1988, com artigo 122, inciso I, alíneas ‘b’, ‘c’ e ‘e’, da Carta de 1967, com a redação dada pela Emenda nº 1, de 1969. Não parece ser correto dizer que o Superior Tribunal de Justiça substituiu o Tribunal Federal de Recursos. Na verdade, tudo indica que a extinta corte deu lugar aos atuais tribunais regionais federais. É a conclusão que se tira do cotejo do artigo 108, inciso I, alíneas ‘a’, ‘c’ e ‘d’, e ‘e’, e o inciso II, da Constituição vigente, com o artigo 122, inciso I, alíneas ‘b’, ‘c’, ‘d’ e ‘e’, e inciso III, da Carta de 1967, com a redação dada pela emenda nº 1, de 1969.”

O professor José Afonso da Silva assim resumiu a competência do Superior Tribunal de Justiça:

“O que dá característica própria ao STJ são suas atribuições de controle da inteireza positiva, da autoridade e da uniformidade de interpretação da lei federal, consubstanciando-se aí jurisdição de tutela do princípio da incolumidade do Direito objetivo que constitui um valor jurídico — que resume certeza, garantia e ordem —, valor esse que impõe a necessidade de um órgão de cume e um instituto processual para a sua real efetivação no plano processual.”

Instituído o Superior Tribunal de Justiça, criou-se o recurso especial, que veio a ser o meio processual adequado para que se provocasse a então novel Corte para salvaguarda do direito federal infraconstitucional comum. Existindo um direito federal comum a todos, imprescindível um instrumento que garantisse sua autoridade e uniformidade.

O REsp está previsto na Constituição de 1988, mais precisamente em seu artigo 105, inciso III, alíneas “a”, “b” e “c”. É cabível contra acórdão proferido em única ou última instância, quando, ao solucionar questão de natureza legal federal, o tribunal regional ou local: a) contrariar ou negar vigência a dispositivo de lei federal ou tratado; b) considerar válida lei ou ato de governo local contestado em face de lei federal; c) atribuir a preceito de lei federal interpretação divergente da conferida por outro tribunal.

Agora veio a Emenda Constitucional 125/2002 que cria um novo requisito de admissibilidade ao recurso especial: a “relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso”.

Com isso, o STJ passará apenas a apreciar recursos cujo julgamento traga consequências para além do caso concreto, de forma similar ao filtro atualmente previsto para o STF, com a repercussão geral das questões constitucionais. Passa a ser obrigação do recorrente, portanto, demonstrar os motivos pelos quais a questão federal discutida em seu recurso é relevante.

No âmbito do direito tributário, a discussão merece preocupação e reflexão porque não se sabe, ainda, qual é o conceito de “relevância” da matéria.

O que seria mais relevante: a tese da exclusão de ICMS da BC do PIS Cofins ou a tese da base de cálculo do ITBI?

Aqui o novel filtro desperta preocupações pois não podemos esquecer que o recurso especial é o instrumento processual adequado para que se prevaleça a soberania e segurança da legislação infraconstitucional que supostamente venha a ser violada.

Como já salientado, existindo um direito federal infraconstitucional, sendo externado pelas leis federais, que são comuns a todos os cidadãos, imprescindível um instrumento capaz de resguardar a autoridade e uniformidade dessas leis federais.

E não podemos aceitar que temos “lei federal” relevante ou “lei federal irrelevante”.

A discussão a respeito do cumprimento das obrigações acessórias é tão ou mais relevante do que a discussão sobre a execução fiscal de uma dívida milionária.

A relevância em direito tributário não pode se limitar ao aspecto econômico da causa.

O STJ tem o dever de zelar pela autoridade e uniformidade da lei federal.

Se existe um Direito federal comum a todos os cidadãos, impõe se preservar a autoridade, uniformidade e aplicação desse Direito.

E o que não falta em nosso contencioso judicial tributário é a divergência de interpretações da nossa complexa legislação fiscal.

Breno de Paula é doutor e mestre em Direito (Uerj), advogado tributarista e professor de Direito Tributário da Universidade Federal de Rondônia.

Revista Consultor Jurídico, 1 de setembro de 2022, 16h04

CSRF afirma que não incide contribuição previdenciária sobre o valor pago a título de PLR, mesmo que o acordo ocorra no período de aferição das metas

23 de agosto de 2022 | PAF 15504.004615/2010-91 | 2ª Turma da CSRF

A Turma, por voto de qualidade, aplicando o disposto no art. 19-E da Lei nº 10.522/2002, acrescido pelo art. 28 da Lei nº 13.988/2020, entendeu que não incide a contribuição previdenciária sobre os pagamentos realizados a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) cuja convenção coletiva foi firmada no final do período de aferição. Nesse sentido, os Conselheiros consignaram que para a PLR seja considerada passível de exclusão da base de cálculo da contribuição previdenciária, não é necessário que a convenção seja realizada antes do período de aferição, bastando que aconteça antes do pagamento.

CSRF afirma que não incide contribuição previdenciária sobre bônus de contratação

24 de agosto de 2022 | PAF 16327.001665/2010-78 | 2ª Turma da CSRF

A Turma, por unanimidade, entendeu que não integram o conceito de salário de contribuição os valores pagos a título de bônus de contratação (hiring bonus). Nesse sentido, os Conselheiros consignaram não incidir contribuição previdenciária sobre hiring bonus uma vez que, independentemente da situação, a verba não teria natureza remuneratória.

Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores & Advogados

STJ afirma que não incide ICMS sobre a veiculação e divulgação de publicidade na internet

23 de agosto de 2022 | AREsp 1.598.445/SP | 1ª Turma do STJ

A Turma, por unanimidade, entendeu pela não incidência de ICMS sobre a veiculação e divulgação de publicidade na internet. Segundo os Ministros, o serviço de inserção de publicidade e veiculação de propaganda em sites da internet não se confunde com o serviço de comunicação tributável pelo ICMS, previsto no art. 60 da Lei nº 9.472/1997, na medida em que configura serviço de valor adicionado, nos termos do art. 61 do referido diploma legal. Outrossim, os Ministros rememoraram entendimento jurisprudencial firmado no STF, por ocasião do julgamento da ADI 6.034/RJ, em que restou asseverada a constitucionalidade do subitem “17.25” constante da lista anexa da LC nº 116/2003, incluído pela LC nº 157/2016, que prevê a incidência do ISSQN – afastando, por conseguinte, a incidência do ICMS – sobre a prestação de serviços de inserção de textos, desenhos, e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita).

Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores & Advogados

STJ nega penhora online antes da citação do devedor em execução fiscal

A Lei 6.830/1980, rotulada como Lei de Execuções Fiscais, em seu artigo 8º, estabelece que o devedor será citado para, no prazo de cinco dias, pagar a dívida ou garantir a execução, mediante a indicação de bens à penhora.

O advento do Código de Processo Civil de 2015 fez surgir interpretação do seu artigo 854 de que seria possível a penhora em dinheiro em depósito ou em aplicação financeira por via eletrônica “sem dar ciência prévia do ato ao executado”

Desde então, as Fazendas nacional, estaduais e municipais passaram a requerer, e a obter, decisões determinando a penhora em dinheiro por meio eletrônico antes da citação do devedor na ação de execução fiscal, sob a justificativa da aplicação subsidiária do CPC/2015. 

Por oportuno, em orientação jurisprudencial uníssona, as 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça consolidaram o entendimento de que o juiz não pode determinar o bloqueio de bens do devedor, por meio do Sisbajud (sistema de penhora online de ativos financeiros), antes da sua citação na ação de execução fiscal. Por ocasião do recebimento de ação de execução fiscal, alguns juízes determinavam, simultaneamente, a citação do devedor e o bloqueio de bens, a pedido da Fazenda Pública, o que fazia com que o bloqueio dos bens do devedor se efetivasse antes da sua citação. 

Na esteira da disciplina que já fora prevista no CPC/1973, o CPC de 2015 não permite que haja o bloqueio de bens do devedor antes da sua regular citação para responder a ação de execução, em harmonia com os postulados do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal. 

Em julgamento realizado em 2/8/2022, em recurso especial interposto pela Fazenda Nacional, a 2ª Turma do STJ, no REsp 1.664.465, relator ministro Herman Benjamin, decidiu pela impossibilidade de se proceder à constrição de bens do executado antes da sua citação, sendo reafirmada a orientação de que deve haver a citação do executado antes da determinação da penhora ou bloqueio de bens. 

A tese sustentada pela Fazenda Nacional era que o CPC/2015 permitiria que o juiz, a pedido do exequente, antes da citação do devedor, determinasse que instituições financeiras procedessem ao bloqueio de ativos financeiros para possibilitar a penhora de dinheiro. Entretanto, o fato de a legislação processual permitir que a penhora de dinheiro possa se operar por meio eletrônico não pode conduzir, por si só, ao entendimento de que tal constrição deva ser realizada antes da citação do devedor. 

A rigor, já havia diversos pronunciamentos da 1ª Turma do STJ (AgInt no REsp 1.588.608 e AgInt no REsp 1.485.018), no sentido de que apenas quando o executado fosse validamente citado, e não pagar nem nomear bens à penhora, é que poderia ter seus ativos financeiros bloqueados por meio do sistema online, não podendo ser realizado tal bloqueio a pretexto de buscar dar efetividade à execução. 

Com o referido julgamento, tem-se que a jurisprudência das 1ª e 2ª Turmas do STJ, que compõem a Seção de Direito Público, referenda o entendimento de que o CPC/2015 não alterou a natureza do bloqueio de dinheiro via sistema eletrônico, como sendo uma providência que consubstancia a penhora, a qual somente deve ser implementada após a citação do devedor, desde que não tenha efetuado o pagamento ou nomeação de bens à penhora. 

Deve ser feita a ressalva, entretanto, de que excepcionalmente a realização de bloqueio de bens do devedor antes da sua penhora pode ser efetivada a título de pedido de medida cautelar de arresto, cuja concessão pressupõe a demonstração dos requisitos próprios (fumus boni iuris e periculum in mora) das tutelas de urgência, ou na hipótese de o devedor não ser encontrado para ser citado (AgRg no AREsp 555.536). 

Assim, trata-se de importante orientação jurisprudencial a ser seguida pelos demais órgãos do Poder Judiciário, de sorte que, a pretexto de assegurar a efetividade da ação de execução, não nos afigura lícita a determinação judicial de bloqueio de bens do devedor antes da sua citação. Para que se determine o bloqueio de bens, há a necessidade de que o executado seja regularmente citado, e deixe de pagar ou nomear bens passíveis de penhora.

Gleydson K. L. Oliveira é mestre e doutor em Direito pela PUC-SP, professor da graduação e mestrado da UFRN e advogado.

Revista Consultor Jurídico, 27 de agosto de 2022, 17h08

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