Carf: Advogado que atua como árbitro será tributado na pessoa física

Colegiado considerou que a atividade de arbitragem não é privativa de advogados e pode ser exercida por qualquer pessoa capaz.

A 2ª turma da câmara Superior do Carf decidiu que advogados que atuam como árbitros devem tributar seus honorários como pessoa física. Por maioria, o colegiado concluiu que, ao exercer essa atividade, o advogado age em seu próprio nome, e não em nome da sociedade, impossibilitando a tributação dos honorários na pessoa jurídica.
Entenda
O processo teve início para esclarecer como os valores recebidos como honorários pela atuação como árbitro em câmaras de mediação e arbitragem nos anos de 2010, 2011 e 2012 deveriam ser tributados. A Receita Federal argumentou que, de acordo com a lei de arbitragem (lei 9.307/96), o serviço é prestado por pessoa física em seu próprio nome, o que impede a tributação desses honorários como receita de pessoa jurídica.
Em resposta, o contribuinte defendeu que prestadores de serviços de caráter personalíssimo podem ser tributados como pessoa jurídica, citando o provimento 196/20 da OAB. Este provimento estabelece que a atuação de advogados como conciliadores, mediadores, árbitros ou pareceristas não desconfigura a atividade advocatícia, permitindo que a remuneração seja recebida tanto como pessoa física quanto por sociedades de advogados.

O relator do caso, conselheiro Mauricio Nogueira Righetti, destacou que, embora um advogado possa ser contratado por sua especialização, renome e sucesso nas causas, não há impedimento para que ele utilize a pessoa jurídica da qual é sócio para fins de aplicação da legislação tributária. No entanto, no caso específico da atividade de arbitragem, a lei exige que o serviço seja prestado pela pessoa natural, invalidando a possibilidade de considerar a pessoa jurídica para fins tributários.
Em seguida, ressaltou que, no caso específico, ficou comprovado que os rendimentos foram recebidos pelo exercício da atividade de arbitragem. Dessa forma, ele considerou inadequado, do ponto de vista tributário, reconhecer esses valores como receitas de um escritório de advocacia em vez de quem realmente prestou os serviços.
O conselheiro também mencionou que, embora a OAB tenha pronunciamentos que associam a arbitragem à advocacia, permitindo que os rendimentos sejam contabilizados pela sociedade de advogados, a atividade de arbitragem não é exclusiva de advogados e pode ser exercida por qualquer pessoa capaz.
Por fim, o relator enfatizou que essa circunstância não deve conferir aos advogados um tratamento diferente das demais pessoas que precisam tributar esses rendimentos como pessoa física.
“A circunstância de a atividade ser desempenhada por advogado, quando em verdade poderia sê-lo por qualquer pessoa natural, não pode conferir àquele, tratamento não isonômico em relação às demais pessoas que se veem compelidas a tributar esses rendimentos na pessoa física, pela circunstância de eventualmente não se organizarem em classe legalmente regulada.”
O colegiado, por maioria, acompanhou o entendimento do relator, determinando que advogados que atuem como árbitros devem tributar seus rendimentos como pessoa física.
Processo: 12448.730776/2014-91
Leia a decisão.

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/412483/carf-advogado-que-atua-como-arbitro-sera-tributado-na-pessoa-fisica

Primeira Turma equipara boi vivo a carcaça para cálculo do crédito presumido de PIS e Cofins

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a compra de gado vivo para abate e transformação em carcaça não retira do frigorífico o direito de receber o crédito presumido da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins na alíquota de 60%, nos termos do artigo 8º, parágrafo 3º, inciso I, da Lei 10.924/2004

O entendimento foi definido pelo colegiado ao analisar controvérsia sobre a aplicação de alíquota de 35% ou de 60% nas hipóteses de direito ao crédito presumido por parte das empresas produtoras de mercadorias de origem animal. Os produtos são classificados com base na Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), que possui capítulos distintos para animais vivos (capítulo 1) e carnes e miudezas comestíveis (capítulo 2). 

Segundo a turma – sob relatoria do ministro Benedito Gonçalves, que aderiu a voto da ministra Regina Helena Costa –, seria contraditório outorgar, por um lado, o desconto de crédito no patamar de 60% nas hipóteses em que o frigorífico compra o boi morto e, por outro lado, estabelecer alíquota de 35% quando o matadouro adquire o boi vivo apenas com a finalidade de abatê-lo. 

O frigorífico autor da ação – ajuizada contra a União – alegou que atua no ramo de industrialização de carne para alimentação humana e, por isso, teria direito ao crédito presumido de ressarcimento de PIS e Cofins relativamente às carcaças e meias carcaças que compra de pessoas físicas e cooperativas, nos termos do artigo 8º, inciso I, da Lei 10.925/2004. 

A empresa afirmou que compra animais vivos para abate, enquadrando-se o insumo na previsão legal de ressarcimento de 60% do valor da contribuição ao PIS e da Cofins. 

Ainda de acordo com a empresa, ela chegou a ter reconhecido o ressarcimento nesse patamar, mas, posteriormente, houve mudança de entendimento administrativo e a autoridade fiscal passou a considerar que as suas compras não se enquadrariam no capítulo 2 da Nomenclatura Comum do Mercosul (carcaça e meia carcaça), mas sim no capítulo 1 da NCM (animais vivos), o que lhe conferiria direito a ressarcimento dos tributos à alíquota de 35%, conforme previsto no artigo 8º, inciso III, da Lei 10.925/2004.

TRF3 entendeu que transformação em carcaça não afasta natureza do produto comprado

Em primeiro grau, o juízo julgou a ação improcedente por entender que a autora compra animais vivos – cujo creditamento de PIS e Cofins seria de 35% –, e não carcaça – para a qual o creditamento previsto é de 60%. Segundo o juízo, a alegação de que a compra do animal vivo é feita apenas com a finalidade de transformá-lo em carcaça não modifica a natureza da mercadoria adquirida. 

A sentença foi mantida pelo TRF3, segundo o qual a autora da ação estaria buscando prevenir a defesa de futura relação jurídica, o que seria vedado no âmbito da ação declaratória. Ainda de acordo com o TRF3, a empresa, ao gerir atividades de um matadouro-frigorífico, pode adquirir tanto animais vivos quanto carcaças, os quais estão sujeitos por lei a creditamentos diferentes.

Para o TRF3, não se aplicaria ao caso o parágrafo 10º do artigo 8ª da Lei 10.925/2004 – dispositivo trazido pela Lei 12.865/2013 e que equiparou o direito ao crédito na alíquota de 60% a todos os insumos utilizados nos produtos descritos no inciso I do parágrafo 1º do mesmo artigo –, porque a ação foi proposta antes da alteração legislativa. 

CARF editou súmula prevendo aplicação de alíquota de 60%

No entendimento da Primeira Turma do STJ, o dimensionamento do crédito presumido não é tão expressivo quanto o valor numérico poderia indicar. Por exemplo, se a contribuição a título de Cofins for de 7,6%, a aplicação da alíquota de 60% resultaria em uma redução de contribuição para 4,56%. Segundo o colegiado, a intepretação do Fisco em relação ao enquadramento da alíquota de 35% para compra de boi vivo estava baseada em diretriz da Receita Federal já revogada (Instrução Normativa 660/2006). 

Por outro lado, a Primeira Turma tem precedente no sentido de que o contribuinte produtor de mercadoria de origem animal pode deduzir crédito presumido sobre os bens adquiridos de pessoa física ou de cooperativa, e não em razão dos alimentos que produz (REsp 1.440.268). 

No acórdão, os ministros lembraram que, segundo a Súmula 157 do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), no âmbito da produção agroindustrial, sobretudo no caso dos frigoríficos, o crédito presumido previsto pelo artigo 8º da Lei 10.925/2004 é de 60%, não de 35%. 

CTN prevê aplicação retroativa de lei interpretativa

O acórdão da Primeira Turma destacou também que, conforme decidido no REsp 1.515.500, a aplicação retroativa da legislação tributária tem seus limites no artigo 106 do Código Tributário Nacional (CTN), o qual prevê a possibilidade de aplicação retroativa quando se tratar de lei expressamente interpretativa ou benéfica ao contribuinte, nos casos sem julgamento definitivo. 

Nesse contexto – prosseguiu –, houve patente violação ao artigo 8º, parágrafo 3º, inciso I, da Lei 10.925/2004, porque o frigorífico – pessoa jurídica que produz mercadorias classificadas no capítulo 2 da NCM, ou seja, carnes e miudezas comestíveis – demonstrou ter direito ao crédito presumido de 60%, calculado sobre o valor do boi vivo adquirido de pessoa física ou de cooperativa. 

“A alíquota diversa para os casos em comento apenas estimularia a opção pela aquisição de boi morto, estímulo esse que refugiria do escopo da legislação de regência, a qual busca suprir a ausência de creditamento normal na aquisição de pessoa física e estimular a atividade rural e a produção de alimentos”, afirmou o acórdão.

Para o colegiado, se o texto do artigo 8º, parágrafo 3º, da Lei 10.925/2004 gerou “certa imprecisão” ao afirmar que o crédito presumido seria calculado sobre as compras de produtos de origem animal classificados nos capítulos 2 a 4 da NCM – sem esclarecer se a expressão “produtos de origem animal” teria relação com os insumos adquiridos por pessoa jurídica ou com os produtos produzidos por ela –, “é indubitável que, após o advento do aludido parágrafo 10, regramento aplicável à espécie em razão da norma plasmada no artigo 106, inciso I, do Código Tributário Nacional, tal imprecisão foi extirpada”.

A Primeira Turma determinou o retorno dos autos ao TRF3 para que reanalise a apelação, aplicando para a compra de boi vivo utilizado como insumo na produção de outros itens a alíquota de crédito presumido de 60%.

Leia o acórdão no AREsp 1.320.972.

Fonte: Notícias do STJ

Carf aprova 14 novas súmulas; veja os enunciados

Objetivo é uniformizar decisões, reduzir litígios e reforçar segurança jurídica.

Em uma decisão que visa fortalecer a segurança jurídica e reduzir os litígios tributários, o Carf – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais aprovou, na última semana, quatorze novas súmulas. A iniciativa visa promover a uniformização das decisões no âmbito do Conselho, evitando interpretações divergentes e consolidando uma aplicação mais coerente e previsível da legislação tributária.

Veja os enunciados:

1ª turma da Câmara Superior:
É possível a utilização, para formação de saldo negativo de IRPJ, das retenções na fonte correspondentes às receitas financeiras cuja tributação tenha sido diferida por se encontrar a pessoa jurídica em fase pré-operacional.
É defeso à autoridade julgadora alterar o regime de apuração adotado no lançamento do IRPJ e da CSLL, de lucro real para lucro arbitrado, quando configurada hipótese legal de arbitramento do lucro.
Os tributos discutidos judicialmente, cuja exigibilidade estiver suspensa nos termos do art. 151 do CTN, são indedutíveis para efeito de determinar a base de cálculo da CSLL.
2ª turma da Câmara Superior:
Para fins de incidência de contribuições previdenciárias, os escreventes e auxiliares de cartórios filiam-se ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ainda que tenham sido admitidos antes de 21/11/1994.
Os valores pagos aos diretores não empregados a título de participação nos lucros ou nos resultados estão sujeitos à incidência de contribuições previdenciárias.
No caso de multas por descumprimento de obrigação principal, bem como de obrigação acessória pela falta de declaração em GFIP, referentes a fatos geradores anteriores à vigência da MP 449/08, a retroatividade benigna deve ser aferida da seguinte forma:
(i) em relação à obrigação principal, os valores lançados sob amparo da antiga redação do art. 35 da lei 8.212/91 deverão ser comparados com o que seria devido nos termos da nova redação dada ao mesmo art. 35 pela MP 449/08, sendo a multa limitada a 20%; e (ii) em relação à multa por descumprimento de obrigação acessória, os valores lançados nos termos do art. 32, IV, §§ 4º e 5º, da lei 8.212/91, de forma isolada ou não, deverão ser comparados com o que seria devido nos termos do que dispõe o art. 32-A da mesma lei 8.212/91.
Os valores recebidos a título de diferenças ocorridas na conversão da remuneração de Cruzeiro Real para a Unidade Real de Valor – URV são de natureza salarial, razão pela qual estão sujeitos à incidência de IRPF nos termos do art. 43 do CTN.
Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função.
A isenção do art. 4º, “d”, do decreto-lei 1.510/76 se aplica a alienações ocorridas após a sua revogação pela lei 7.713/88, desde que já completados cinco anos sem mudança de titularidade das ações na vigência do decreto-lei 1.510/76.
Incabível a manutenção do arbitramento com base no SIPT, quando o VTN é apurado sem levar em conta a aptidão agrícola do imóvel. Rejeitado o valor arbitrado, e tendo o contribuinte reconhecido um VTN maior do que o declarado na DITR, deve-se adotar tal valor.
São isentos do imposto de renda os rendimentos do trabalho recebidos por técnicos a serviço das Nações Unidas, de seus programas ou de suas Agências Especializadas expressamente enumeradas no Decreto nº 59.308/1966, abrangidos por acordo de assistência técnica que atribua os benefícios fiscais decorrentes da Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, promulgada pelo decreto 27.784/50, contratados no Brasil por período pré-fixado ou por empreitada, para atuar como consultores.
3ª turma da Câmara Superior:
É permitido o aproveitamento de créditos sobre as despesas com serviços de fretes na aquisição de insumos não onerados pela Contribuição para o PIS/Pasep e pela Cofins não cumulativas, desde que tais serviços, registrados de forma autônoma em relação aos insumos adquiridos, tenham sido efetivamente tributados pelas referidas contribuições.
Os gastos com insumos da fase agrícola, denominados de “insumos do insumo”, permitem o direito ao crédito relativo à Contribuição para o PIS/Pasep e à Cofins não cumulativas.
Para fins do disposto no art. 3º, IV, da lei 10.637/02 e no art. 3º, IV, da lei 10.833/03, os dispêndios com locação de veículos de transporte de carga ou de passageiros não geram créditos de Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins não cumulativas.
Rito simplificado
O presidente do Carf, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, destacou que o procedimento simplificado de propositura e aprovação das súmulas, previsto no art. 124 do Novo Regimento Interno do Carf e regulamentado pela portaria 414, de 12 de março de 2024, representa um avanço significativo.
“O novo rito para a aprovação não apenas simplifica e acelera o processo administrativo tributário, no âmbito do Carf, como também garante que os direitos dos cidadãos continuem protegidos de forma uniforme e justa, como sempre fez o Carf.”
Semírames Oliveira, vice-presidente do Carf, ressaltou que a aprovação de súmulas contribui para a eficiência e segurança jurídica de todo o processo administrativo tributário Federal. A vice-presidente destacou ainda que as súmulas aprovadas passam a vincular automaticamente as Delegacias Regionais de Julgamento da Receita Federal do Brasil, e representam um passo importante para reduzir os litígios e trazer mais celeridade ao processo.
Para Fernando Brasil de Oliveira Pinto, presidente da 1ª seção de Julgamento, a implementação dessas novas súmulas é um passo significativo na busca por um sistema tributário mais ágil e justo, refletindo o compromisso contínuo do órgão em aperfeiçoar o processo administrativo tributário.

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/409912/carf-aprova-14-novas-sumulas-veja-os-enunciados

STF definirá se lucro no exterior pode ser tributado no Brasil

Ministros analisam recurso da Fazenda Nacional contra decisão do Superior Tribunal de Justiça favorável à siderúrgica Vale

O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá definir se tratados firmados entre o Brasil e outros países devem afastar a tributação da matriz nacional sobre ganhos de empresas coligadas e controladas no exterior. Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) divergem sobre essa possibilidade, o que tem levado companhias a recorrer ao Judiciário.

A questão é tão relevante que foi objeto do primeiro edital da nova fase de transação — negociação de pagamento de débitos com a Fazenda Nacional — aberto no fim de 2023 para “teses tributárias”. Na época, a Fazenda apontou cerca de 200 processos em tramitação sobre o tema — 150 na esfera administrativa e 50 na judicial —, que somavam ao redor de R$ 69 bilhões.

O STF começou a analisar a aplicação de tratados contra a incidência de IR e CSLL referente a lucro auferido no exterior no mês de maio. Mas um pedido de vista, após o voto do relator, ministro André Mendonça, favorável aos contribuintes, suspendeu o julgamento. O prazo para um processo voltar à pauta do Supremo depois de um pedido de vista é de 90 dias.

No mesmo mês de maio, no STJ, a ministra Regina Helena Costa, por meio de decisão monocrática, aceitou que tratados afastem a tributação no Brasil, enquanto a 1a Turma da Câmara Superior do Carf manteve a autuação fiscal em outro caso semelhante. Segundo advogados, a divergência acaba por incentivar a judicialização.

O processo que está sendo julgado pelo Supremo é um recurso da

Fazenda contra uma decisão do STJ, do ano de 2014 (RE 870214). Na ocasião, a 1a Turma havia decidido que não incide IR e CSLL sobre o lucro de controladas situadas em países com os quais o Brasil firmou tratados para evitar a bitributação sobre a renda. No caso, unidades, da companhia siderúrgica Vale, eram localizadas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo.

O STJ considerou, naquele caso, que deve prevalecer o artigo 7o dos tratados que seguem o modelo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O dispositivo estabelece que esses lucros só podem ser tributados no país de origem. Assim, essas empresas não se submeteriam a tributação no Brasil, como determinava o artigo 74 da Medida Provisória (MP) no 2.158, de 2001.

No voto, Regina Helena Costa afirmou que a Corte adota entendimento segundo o qual, no caso de empresa controlada, dotada de personalidade jurídica própria e distinta da controladora, nos termos dos Tratados Internacionais, os lucros auferidos são lucros próprios e assim tributados somente no país do seu domicílio (REsp 1325709).

“A sistemática adotada pela legislação fiscal nacional de adicioná-los ao lucro da empresa controladora brasileira fere os Pactos Internacionais Tributários e infringe o princípio da boa-fé na relações exteriores, a que o Direito Internacional não confere abono”, afirma no voto, citando o precedente da 1a Turma do STJ, do ano de 2014.

Já no Carf, a 1a Turma da Câmara Superior manteve autuação semelhante (16561.720158/2013-15) em julgamento realizado em 20 de maio. No caso, o auto de infração foi recebido pela Andrade Gutierrez Engenharia referente a lucros auferidos no exterior por controladas na Argélia, Peru, Espanha e Portugal.

No STF, o relator, ministro André Mendonça, afirma no voto que, uma vez que os tratados foram pactuados, não se admite o descumprimento de maneira unilateral pelo Brasil nem seu uso abusivo pelas empresas.

Ainda segundo o ministro, a decisão no caso concreto depende da aplicação específica de normas infraconstitucionais, mas, se admitida a discussão constitucional, se afastarem os efeitos do artigo 7o desses tratados, além do inadimplemento unilateral do pacto, será frustrada a confiança dos contribuintes que estruturaram suas operações tendo em vista a legislação e a interpretação no momento em que decidiram a estrutura de suas operações.

No voto, Mendonça afirma que o Brasil atrai investimentos ao pactuar acordos. Diz ainda que eventual redução na arrecadação da tributação sobre matrizes nacionais compensa-se com o influxo de multinacionais estrangeiras que se instalam no país. Faltam dez votos.

A advogada Priscila Faricelli, sócia do Demarest Advogados, destaca um julgado do STF, citado em decisões do Carf favoráveis ao Fisco, fazendo uma diferenciação entre ele e a discussão atual. Diz que a ADI no 2588 discute a tributação quando a empresa lá fora está em um paraíso fiscal. Mas aponta que a composição do STF mudou muito desde esse julgamento e que o processo da Vale, julgado pelo STJ, fala de países com os quais o Brasil tem tratado e não são paraísos fiscais.

Já o advogado Raphael Lavez, sócio do Lavez Coutinho Advogados, diz que o Carf é consistente em manter o entendimento favorável à Fazenda por meio do voto de qualidade (desempate). No caso analisado em maio, diz que o relator havia citado a jurisprudência do STJ, mas ficou vencido.

De acordo com Lavez, existem tratados que expressamente permitem a tributação nacional, mas o Carf tem esse entendimento, atualmente, para qualquer tratado. “Falta, na jurisprudência do Carf, reconhecer especificidades dos tratados em si”, afirmou o advogado.

Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma que o Carf segue as premissas do entendimento firmado pelo STF em precedentes como a ADI no 2588. Segundo o órgão, restou definido que os lucros obtidos por meio de controladas e coligadas no exterior estão disponíveis, jurídica e economicamente, para a empresa residente no Brasil. “A renda pertence à empresa residente no Brasil, e não às empresas sediadas no exterior”, diz.

Ainda segundo o órgão, existe vedação nos tratados para que um país tribute a renda de uma empresa situada no outro país signatário do tratado. Sobre os precedentes do STJ, a PGFN esclarece que apenas os julgados na forma de recursos repetitivos produzirão efeito vinculante para o Carf, o que ainda não aconteceu. A PGFN ainda atua perante o STJ para fazer prevalecer a tese de que a tributação recai sobre os lucros disponíveis para a empresa residente no Brasil.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/06/16/stf-definira-se-lucro-no-exterior-pode-ser-tributado-no-brasil.ghtml

Carf bate recorde e reduz em R$ 110 bi estoque de processos

Apesar do valor alcançado em abril, há ainda um total de cerca de R$ 1 trilhão em discussão no tribunal administrativo

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) vem conseguindo reduzir o estoque de processos, encerrando casos de maior valor e alcançando volumes recordes de julgamentos: em abril, foram cerca de R$ 110 bilhões em processos analisados, a melhor marca desde dezembro de 2019. O órgão recursal é a principal aposta do Ministério da Fazenda para elevar a arrecadação e atingir a meta de déficit zero este ano.

O número de abril ainda será consolidado oficialmente, mas foi antecipado ao Valor pelo presidente do Carf, Carlos Higino. Em março, o tribunal administrativo já havia alcançado um volume recorde de julgamentos. A queda no estoque foi de R$ 70 bilhões, a maior desde a pandemia.

O estoque, porém, ainda soma cerca de R$ 1 trilhão, distribuídos em aproximadamente 80 mil processos tributários. De acordo com Higino, esse valor continua alto porque, enquanto há processos saindo do Carf, outros estão entrando a partir de recursos contra condenações proferidas pelas Delegacias Regionais de Julgamento (DRJs).

A meta de julgamentos para 2024 segue em R$ 870 bilhões, para gerar uma arrecadação de R$ 55,6 bilhões, montante mantido no relatório de receitas e despesas do governo apresentado na última semana – além

dos casos em que sai vitorioso, o contribuinte, quando perde, ainda pode recorrer ao Poder Judiciário. O Carf não faz o controle de quantos encerram a disputa na esfera administrativa ou dão sequência ao litígio.

No segundo semestre, a ideia é acelerar os julgamentos. O Conselho pretende lançar um sistema de inteligência artificial para ajudar os conselheiros a elaborarem as minutas dos votos. O sistema vai se chamar “Iara” e está sendo desenvolvido em parceria com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). “Quando estiver rodando, teremos como aumentar a produtividade dos conselheiros”, disse Higino.

Além disso, o presidente espera uma mudança no fluxo de julgamentos com a aprovação de súmulas. Desde a edição da Lei no 14.689, de 2023, as súmulas do Carf passaram a ser de observância obrigatória pelos auditores fiscais, o que significa que as Delegacias Regionais de Julgamento também precisam seguir os entendimentos do Conselho – antes não eram obrigados, então podiam julgar de forma diferente, o que dava margem para recursos ao Carf apenas para aplicação da jurisprudência.

“Precisamos ter uniformidade e que as decisões do Conselho consigam ser observadas desde o lançamento na Receita Federal”, afirmou Higino.

Vários fatores contribuíram para as quedas recordes do estoque, de acordo com o presidente. Os principais são: julgamentos de casos de alto valor, o que não foi possível durante a pandemia de covid-19, o retorno do voto de qualidade (o desempate pelo voto duplo do presidente da turma julgadora, representante da Fazenda) e a regulamentação do bônus dos auditores – até o pagamento ser regulamentado, sessões foram paralisadas por falta de quórum. Ainda foram criadas novas turmas de julgamento e o número de conselheiros aumentou.

Higino destacou ainda que “algumas decisões do Carf incentivaram transações e acordos no âmbito da PGFN [Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional]”. Ele citou como exemplo o recém-aberto edital sobre contratos de afretamento, uma discussão bilionária que o setor de óleo e gás vem perdendo no Carf.

Em 2023, ainda ocorriam pedidos para retirada de pauta de grandes processos, o que tem se normalizado, segundo o presidente. “Em 2024 e talvez 2025, devemos ter uma redução muito forte do valor [do estoque]. O montante de R$ 1 trilhão é inaceitável”, disse. Além do valor do estoque, o presidente também projeta uma redução no número de processos na sequência, nos próximos dois anos.

“Estamos caminhando para ver o Carf dobrar o recorde de valores julgados em um único ano, que atualmente é de R$ 430 bilhões”, afirmou Jorge Mussa, do Pinheiro Neto Advogados.

Em 2015, lembrou o tributarista, o Tribunal de Contas da União (TCU) estimou que seriam necessários 77 anos para julgar todo o acervo de processos no Conselho e, desde então, foram implementadas diversas mudanças, como os lotes de repetitivos e o aumento do número de turmas julgadoras com o mesmo número total de conselheiros.

No ritmo atual, acrescentou, o Carf levaria apenas 10 anos para julgar todos os processos. “Mas poderá diminuir pela metade o valor em estoque ainda neste ano, se consolidando como um exemplo de sucesso em gestão processual.”

A advogada Ana Paula Lui, sócia do Mattos Filho, destacou que o Carf ainda vem fazendo alguns ajustes para aumentar o volume de julgamentos, como a criação de novas turmas – mesmo que para isso desfalque, ainda que temporariamente, turmas existentes. Para a advogada, o mês de maio foi de ajuste de turmas e até distribuição de processos. “Isso pode ter dado uma truncada no andamento que vinha bem e corrido, com muitos julgamentos”, afirmou.

A tributarista espera que o ritmo continue acelerado no segundo semestre. “Até pelo volume de processos pautados, vemos que eles estão levando a sério aumentar o número de julgamentos e zerar o estoque”, disse. O Carf tem, inclusive, acrescentou, realizado algumas sessões de julgamento durante as segundas e sextas-feiras – as sessões eram sempre de terça a quinta.

A advogada afirmou que ainda não é possível observar se o Carf está mais ou menos favorável aos posicionamentos da Receita Federal. Mas disse ter percebido mudanças em decorrência da retomada do voto de qualidade. “Está bem parecido com o que o Conselho já era, inclusive com a volta de alguns antigos conselheiros.”

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/05/27/carf-bate-recorde-e-reduz-em-r-110-bi-estoque-de-processos.ghtml

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