ARTIGO DA SEMANA – CENÁRIO SOMBRIO PARA 2024

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

O ano ainda não acabou, mas já é possível ver um futuro cinzento para 2024.

Propositadamente, os debates sobre a Reforma Tributária ficaram limitados à tributação do consumo com a criação dos IVAs nacionais (IBS e CBS), à criação do imposto do pecado (Imposto Seletivo Federal) e aos tímidos ajustes na tributação do patrimônio (IPVA sobre aeronaves/embarcações e ITD progressivo).

Paralelamente à PEC 45/2019, discute-se qual deve ser a alíquota média do IBS, visto que estados, DF e municípios não cogitam uma queda na arrecadação.

A incidência do IPVA sobre aeronaves/embarcações e a constitucionalização do ITD progressivo são propostas de nítido viés arrecadatório travestidas de medidas de justiça tributária.

Como se vê, a Reforma Tributária tem objetivo arrecadatório, deixando a simplificando do sistema, a desoneração das exportações e investimentos para segundo plano.

A tributação da renda está sendo tratada por normas infraconstitucionais e todas com o exclusivo propósito de se alcançar o déficit zero defendido pelo Ministro da Fazenda.

Daí foram apresentados projetos de lei com vistas à tributação de fundos de investimento, à restrição das deduções das subvenções decorrentes de incentivos fiscais estaduais, etc…

A missão déficit zero também teve como vítima o voto de qualidade nos julgamentos do CARF em favor dos contribuintes.  

Diversos estados e o DF já apresentaram projetos de lei propondo o aumento nas alíquotas do ICMS[1]. Outros já tiveram os PLs aprovados pelas Assembleias Legislativas[2]

Enfim, o cenário atual deixa cada vez mais claro que a preocupação da União, Estados, DF e municípios é exclusivamente arrecadatória e que teremos um 2024 com mais tributos a pagar…


[1] RN e RS, por exemplo.

[2] BA, CE, DF, MG, PB, PE, RO e TO.

Reforços no Carf podem ajudar União a arrecadar R$ 54 bi

Valor está previsto com a aplicação do voto de qualidade no conselho, que editou portaria para convocar 24 novos conselheiros

Um dos pontos centrais nos planos do Ministério da Fazenda para aumentar a arrecadação, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) planeja ter novas turmas para dar maior celeridade e reduzir o estoque de processos. Uma portaria foi publicada recentemente para preencher vagas em aberto e atender a demanda de julgamentos.

Além das novas turmas, permanece nos planos do Carf a intenção de realizar sessões extraordinárias em 2024, conforme antecipou o Valor em outubro. O objetivo é o mesmo: reduzir o estoque de processos e o tempo para se chegar ao fim dos julgamentos (temporalidade). As duas medidas devem ampliar o volume de trabalho do órgão para ajudar no objetivo do governo de arrecadar R$ 54,7 bilhões em 2024 com o retorno do voto de qualidade — o desempate por presidente da turma julgadora, representante do Fisco.

Publicada na semana passada, a Portaria no 1.361 define a distribuição de vagas que estavam em aberto no conselho, que pode ter até 180 integrantes nas chamadas “turmas baixas” — o equivalente a uma primeira instância no Carf. Depois que o caso é julgado nelas, se houver precedente em sentido contrário, é levado à Câmara Superior.

Faltavam ser indicados 24 conselheiros, metade pela Fazenda e a outra metade pelos contribuintes. Dos 12 conselheiros representan- tes dos contribuintes, seis vagas foram destinadas às centrais sindicais e seis às confederações.

Para tributaristas, chamou a atenção a participação das centrais sindicais e a intenção de preencher as vagas em um cenário em que o Ministério da Fazenda vem alardeando o estoque de R$ 1,137 trilhão, que aguarda julgamento no órgão, em pouco mais de 80 mil processos.

Segundo o Carf, o critério usado foi técnico: as vagas das centrais sindicais foram distribuídas com base na carga processual (horas estimadas de julgamento) dos contribuintes pessoas físicas, que gira em torno de 12% da carga processual total — ou seja, o tempo que os conselheiros levam para julgar processos de tributos cobrados de pessoas físicas e não de empresas. Também foi utilizado como critério o índice de representatividade sindical.

Já quanto às confederações, o conselho considerou a representatividade econômica e contribuição para a arrecadação federal.

Os conselheiros indicados pelas centrais sindicais irão para a 2a Seção de Julgamento, onde tramitam os processos relacionados a pessoas físicas (IRPF e contribuições previdenciárias).

Entre alguns conselheiros e advogados ouvidos pelo Valor circula o rumor de que o regimento interno poderá ser alterado para que as turmas julguem com seis e não oito integrantes. Hoje, a norma prevê 15 turmas ordinárias com oito conselheiros (120 conselheiros) e 15 turmas extraordinárias com quatro con- selheiros (60 conselheiros) — que julgam casos de menor valor. A Câmara Superior tem 24 conselheiros, o que leva a um total de 204 conselheiros, sendo metade indicada pela Fazenda e a outra metade pelos contribuintes.

Ainda de acordo com o Carf, a portaria não aumentou o número de conselheiros em relação ao que já está previsto no regimento interno. “A finalidade foi preencher essas vagas em aberto, dada a demanda de julgamento do Carf. Em relação ao número de 180 conselheiros, faltavam ser indicados 24, metade pela Fazenda e a outra metade pelos contribuintes”, informou o órgão.

Ao Valor, o presidente do Carf, Carlos Higino, negou que as novas turmas tenham objetivo de fazer o órgão arrecadar mais em 2024. “Existem estudos com o objetivo de conferir maior celeridade e dinamicidade para o Carf, o que facilitará o alcance da missão institucional do órgão (julgar processos com celeridade e imparcialidade) e redução da temporalidade e estoque. Não existe relação com bater a meta de arrecadação”, diz.

Porém, para o governo arrecadar os quase R$ 55 bilhões com o retorno do voto de qualidade, será necessário que o Carf realize sessões extraordinárias que aumentem em 50% a carga de trabalho distribuída a cada conselheiro. Sem isso, a previsão é que a receita caia para R$ 36,5 bilhões, o que dificultaria ainda mais a intenção da Fazenda de manter o déficit zero no ano que vem.

Higino confirmou ao Valor que permanece a intenção de realizar sessões extras em 2024, independentemente das novas turmas. “As duas questões são independentes. Ambas têm o mesmo propósito de reduzir o esto- que de processos e a temporalidade do julgamento no Carf.”

O Carf é a principal medida arrecadatória desenhada pela Fazenda para alcançar o déficit zero em 2024. Dos R$ 168,5 bilhões necessários, R$ 54,7 bilhões são esperados a partir dos julgamentos do conselho. Em sequência, vêm as transações com a PGFN e Receita federal, com expectativa de arrecadar R$ 42 bilhões, e a medida provisória sobre a tributação da subvenção de ICMS, com R$ 35 bilhões.

De acordo com o advogado e ex- conselheiro Caio Nader Quintella, há muitos anos se ensaia um novo regimento no Carf, e agora pode ser um primeiro passo para que se retome a ideia de ter turmas compostas por seis conselheiros, como era antes da deflagração da Operação Zelotes, em 2015, o que possibilitaria a criação de novas turmas. A portaria aumentou a participação das centrais sindicais, segundo Diego Diniz Ribeiro, advogado do Daniel e Diniz Advocacia Tributária. Para o advogado, eventual elevação no número de turmas julgadoras pode ser uma oportunidade para o órgão pensar em uma seção especializada em direito aduaneiro. Outra mudança recente visa a igualdade de gênero no conselho. A Portaria no 1.360, publicada no começo do mês, determina que o Carf deverá ser composto por, no mínimo, 40% de cada gênero nas vagas de conselheiros. Enquanto não for alcançada a proporção, o presidente do Carf poderá indicar que as listas sejam compostas exclusivamente pelo gênero cujo percentual não foi atingido.

Fonte: Valor Econômico – 08/11/2023

STJ julga dedução de PLR de diretor empregado do IRPJ

A 1a Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar ontem um tema considerado inédito. Os ministros analisam a possibilidade de dedução, do cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL, de valores de participação nos lucros e resultados (PLR) e gratificações de administradores e diretores que também são empregados — modalidade de contratação que não é muito comum.

Por enquanto, apenas a relatora do caso, a ministra Regina Helena Costa, proferiu voto, a favor do contribuinte. Para ela, esses valores distribuídos aos diretores e administradores devem ser considerados despesas e, portanto, podem ser deduzidos. Antes mesmo de seu voto, o ministro Gurgel de Faria pediu vista (REsp 1948478).

A tributação da PLR — tanto de celetistas como estatutários — é motivo de briga histórica entre Fisco e contribuintes. Em 2021, segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), havia mais de R$ 7 bilhões em discussão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e no Judiciário.

Em seu voto, a ministra Regina Helena Costa admitiu recurso do ING Bank, que vinha perdendo até então em todas as instâncias do Judiciário. O Tribunal Regional Federal da 3a Região (TRF-3), com sede em São Paulo, manteve sentença favorável aos autos de infração sofridos pela instituição financeira, entre os anos de 2006 e 2007.

No julgamento, um dos advogados que assessora o ING Bank, Alexandre Ponce de Almeida, do escritório Velloza Advogados, fez sustentação oral. Ele destacou que o parágrafo 1o do artigo 3o da Lei no 10.101, de 2000, que trata de PLR, afirma expressamente que, para efeito de apuração do lucro real, a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa operacional as participações atribuídas aos empregados nos lucros ou resultados, sem fazer qualquer distinção entre eles.

Almeida ainda citou um outro

julgamento, de relatoria da ministra Regina Helena Costa, que tratou de PLR de diretores estatutários. Nele, a ministra fez um paralelo em relação a casos de diretores empregados para abordar a possibilidade de dedução desses valores do cálculo do IRPJ e da CSLL (REsp 1897960).

A procuradora Marise Correa de Oliveira, representante da PGFN, também fez sustentação oral no julgamento. Alegou que o recurso não poderia ser admitido pelo STJ por envolver análise de provas. E que o TRF da 3ª Região, ao analisar o caso, concluiu que não seria possível a dedução dos valores, uma vez que os diretores exercem atividade de gestão, “que está muito mais próxima do empregador do que do empregado”.

Ela acrescentou que a função de diretor é diferente da de empregado, que tem assegurado pelo artigo 7o, inciso XI, da Constituição o pagamento de PLR, desvinculado da remuneração.

Por fim, Marise citou que o Regulamento do Imposto de Renda (RIR), de 1999, era vigente na época das autuações. De acordo com ela, a norma — Decreto no 3.000 — dizia expressamente, no artigo 303, que “não serão dedutíveis, como custos ou despesas operacionais, as gratificações ou participações no resultado, atribuídas aos dirigentes ou administradores da pessoa jurídica”. Ao contrário da situação de empregados, ressaltou, com previsão de dedução no artigo 359.

Logo em seguida, o ministro Gurgel de Faria já antecipou que pediria vista. A ministra Regina Helena Costa preferiu, então, citar trechos de seu voto. Destacou que fez um voto longo, em homenagem ao ineditismo do tema. “O tribunal de origem entendeu que, por serem diretores empregados, os valores não seriam dedutíveis e assim manteve autuações lavradas pela Receita de 2006 e 2007. É um caso bem peculiar, estamos falando de autuações”, disse a relatora.

A ministra passou por diversas leis, que desde 1946 tratam do assunto, até chegar na Lei no 10.101, de 2000, que não faz distinção entre os trabalhadores ao tratar da dedução, e no Regulamento do Imposto de Renda, de 1999, que impedia o abatimento de valores pagos a diretores.

Para a ministra Regina Helena Costa, contudo, não faria sentido existir uma lei prevendo essa dedução, uma vez que esses valores dispendidos pelas empresas para o pagamento de PLR devem ser considerados despesas, que têm possibilidade de abatimento prevista no IRPJ e na CSLL.

“A indedutibilidade de despesa é que precisaria de previsão legal”, disse. Ela acrescentou que o que está dentro dessa dedução não precisa ser dito, uma vez que todos os custos e despesas devem ser abatidos na sistemática do lucro real.

Em seu voto, ainda afirmou que o Carf não tem posição consolidada sobre o assunto, mas tem decisão recente, de 2020, da Câmara Superior, no mesmo sentido do seu voto. Por fim, esclareceu que a solução encontrada no processo não deve ser generalizada porque ela atende às particularidades desse caso. O julga- mento então foi suspenso com o pedido de vista.

Para o advogado Leandro Cabral, do Velloza Advogados, que também assessora o ING Bank, o voto da ministra Regina Helena “é irretocável”.

Segundo Cabral, ela entendeu que essa despesa com PLR e gratificação a empregados que ocupam cargo diretivo reduz o lucro da companhia e não há razão para se exigir fora da regra de dedução do IRPJ e da CSLL. “Haveria necessidade de lei caso se quisesse tratar como indedutível, mas não há. Ao contrário, esses pagamentos a empregados são dedutíveis”, diz. “Esse julgado é importante também para ajudar a uniformizar a jurisprudência do Carf, inclusive mediante súmula.”

Fonte: Valor Econômico, 18/10/2023

ARTIGO DA SEMANA – Novo tratamento da multa qualificada

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

A Lei nº 14.689/2023 trouxe importante alteração na chamada multa de ofício de qualificada.

A multa qualificada é aquela exigida em razões de condutas praticadas pelo contribuinte com nítido propósito fraudulento.

O inciso II, do art. 44, da Lei nº 9.430/96, estabelece que a qualificação da multa somente pode ocorrer nos casos de evidente intuito de fraude, definidos nos arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502/1964.

Em sua redação original, o art. 44, da Lei nº 9.430/96, previa a multa qualificada em 150% da exigência fiscal.

Pela nova redação conferida pelo art. 8º[1], da Lei nº 14.689/2023, a multa qualificada será de 100% (cem por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de contribuição objeto do lançamento de ofício e de 150% (cento e cinquenta por cento), nos casos em que verificada a reincidência do sujeito passivo.

A reincidência ocorrerá quando, no prazo de 2 (dois) anos, contado do ato de lançamento em que tiver sido imputada a ação ou omissão tipificada nos arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, ficar comprovado que o sujeito passivo incorreu novamente em qualquer uma dessas ações ou omissões.

Nunca é demais lembrar que a qualificação da multa de ofício não pode ser aplicada livremente pelo fisco, sobretudo porque é exigida mediante lançamento de ofício, ato administrativo de natureza vinculada, de acordo com o que prevê o art. 142, do Código Tributário Nacional. 

Os órgãos administrativos de função judicante sempre afirmaram que a imposição da multa qualificada exige cautelas.

Desde a época do Primeiro Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, já se decidia que para a imposição da multa de ofício qualificada é necessário que haja descrição e inconteste comprovação da ação ou omissão dolosa, na qual fique evidente o intuito de sonegação, fraude ou conluio (Acórdão 104-18653. Data da Sessão: 19/03/2002. Relator: Remis Almeida Estol).

O CARF também tem se posicionado de maneira vigilante sobre a matéria, igualmente decidindo pela necessidade de comprovação das condutas descritas nos arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502/1964:

IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA (IRPJ) Ano-calendário: 2004, 2005 INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. PRESUNÇÃO DE OMISSÃO DE RECEITAS. Basta ao fisco demonstrar a existência de depósitos bancários de origens não comprovadas para que se presuma, até prova em contrário, a cargo do contribuinte, a ocorrência de omissão de rendimentos, nos termos do artigo 42, da Lei nº 9.430/96. Trata-se de presunção legal do tipo juris tantum e, portanto, cabe ao fisco comprovar apenas o fato definido na lei como necessário e suficiente ao estabelecimento da presunção, para que fique evidenciada a omissão de rendimentos. APLICAÇÃO DE MULTA QUALIFICADA. AUSÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO DE CONDUTA DOLOSA. A autoridade fiscal não logrou êxito em comprovar que a contribuinte teria praticado quaisquer das condutas dolosas descritas nos artigos 71, 72 e 73 da Lei nº 4.502/64. Nos termos da Súmula CARF nº 14, o simples fato da existência de omissão de receitas não autoriza a aplicação de multa qualificada prevista no artigo 44, § 1º da Lei nº 9.430/96. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA DE PRÁTICA DOLOSA. Descaracterizada a ocorrência de dolo por parte do sujeito passivo, o prazo decadencial rege-se pela regra do § 4º do artigo 150 do CTN e não do artigo 173, I, do CTN. TRIBUTAÇÃO REFLEXA. CSLL. PIS. COFINS. Dada a íntima relação de causa e efeito, aplica-se aos lançamentos reflexos o decidido no principal. 

(CARF 19515004878201022 1201-004.785, Relator: Gisele Barra Bossa, Data de Julgamento: 14/04/2021, Data de Publicação: 11/05/2021)

PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL Ano-calendário: 2010, 2011, 2012 AUTO DE INFRAÇÃO. NULIDADE. INOCORRÊNCIA Não procedem as arguições de nulidade quando não se vislumbram nos autos quaisquer das hipóteses previstas no art. 59 do Decreto nº 70.235, de 1972. LIMITES DA LIDE. EXCLUSÃO DO SIMPLES NACIONAL. MATÉRIA FORA DO LITÍGIO No processo administrativo fiscal em questão não está em discussão a exclusão do sujeito passivo do SIMPLES, matéria decidida em outro processo. ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS /PASEP Ano-calendário: 2010, 2011, 2012 ARGUMENTOS DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO CONFISCO. SÚMULA Nº 2 DO CARF. O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária, em conformidade com a Súmula nº 2 do CARF. MULTA DE OFÍCIO QUALIFICADA. IMPROCEDÊNCIA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE FRAUDE OU SONEGAÇÃO. A qualificação da multa somente pode ocorrer quando a autoridade fiscal provar de modo inconteste, o dolo por parte da contribuinte, condição imposta pela lei. Não estando comprovado com elementos contundentes o intuito de fraude, deve ser afastada a aplicação da multa qualificada. REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS. SÚMULA CARF Nº 28.O CARF não é competente para se pronunciar sobre controvérsias referentes ao Processo Administrativo de Representação Fiscal para Fins Penais (Súmula CARF nº 28). CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL (COFINS) Ano-calendário: 2010, 2011, 2012 ARGUMENTOS DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO CONFISCO. SÚMULA Nº 2 DO CARF. O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária, em conformidade com a Súmula nº 2 do CARF. MULTA DE OFÍCIO QUALIFICADA. IMPROCEDÊNCIA. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE FRAUDE OU SONEGAÇÃO. A qualificação da multa somente pode ocorrer quando a autoridade fiscal provar de modo inconteste, o dolo por parte da contribuinte, condição imposta pela lei. Não estando comprovado com elementos contundentes o intuito de fraude, deve ser afastada a aplicação da multa qualificada. REPRESENTAÇÃO FISCAL PARA FINS PENAIS. SÚMULA CARF Nº 28. O CARF não é competente para se pronunciar sobre controvérsias referentes ao Processo Administrativo de Representação Fiscal para Fins Penais (Súmula CARF nº 28). 

(CARF 10665720970201550 3201-007.634, Relator: LEONARDO VINICIUS TOLEDO DE ANDRADE, Data de Julgamento: 15/12/2020, Data de Publicação: 15/01/2021)

Portanto, mesmo com a atual disciplina, é preciso ficar atento à imposição da multa qualificada.

Uma última observação: a multa qualificada de 150% será objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal porque o RE 736.090[2] já teve sua repercussão geral reconhecida e aguarda julgamento do mérito pelo Plenário. 


[1] Art. 8º O art. 44 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 44. ………………………………………………………………………

……………………………………………………………………………………………

§ 1º O percentual de multa de que trata o inciso I do caput deste artigo será majorado nos casos previstos nos arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, independentemente de outras penalidades administrativas ou criminais cabíveis, e passará a ser de:

……………………………………………………………………………………………

VI – 100% (cem por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de contribuição objeto do lançamento de ofício;

VII – 150% (cento e cinquenta por cento) sobre a totalidade ou a diferença de imposto ou de contribuição objeto do lançamento de ofício, nos casos em que verificada a reincidência do sujeito passivo.

§ 1º-A. Verifica-se a reincidência prevista no inciso VII do § 1º deste artigo quando, no prazo de 2 (dois) anos, contado do ato de lançamento em que tiver sido imputada a ação ou omissão tipificada nos arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964, ficar comprovado que o sujeito passivo incorreu novamente em qualquer uma dessas ações ou omissões.

§ 1º-B. (VETADO).

§ 1º-C. A qualificação da multa prevista no § 1º deste artigo não se aplica quando:

I – não restar configurada, individualizada e comprovada a conduta dolosa a que se referem os arts. 7172 e 73 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964;

II – houver sentença penal de absolvição com apreciação de mérito em processo do qual decorra imputação criminal do sujeito passivo; e

III – (VETADO).

§ 1º-D. (VETADO);

§ 2º  (VETADO).

……………………………………………………………………………………………

§ 6º (VETADO).

§ 7º (VETADO)

[2] Tema 863, relator Min. Dias Toffoli: Recurso extraordinário em que se discute, à luz do art. 150, IV, da Constituição Federal, a razoabilidade da aplicação da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio, no percentual de 150% sobre a totalidade ou diferença do imposto ou contribuição não paga, não recolhida, não declarada ou declarada de forma inexata (atual § 1º c/c o inciso I do caput do art. 44 da Lei 9.430/1996), tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório.

Contribuintes vão poder negociar débitos bilionários com a União

Fazenda Nacional abrirá a possibilidade de transação sobre PIS e Cofins

Guilherme Pimenta e Beatriz Olivon
De Brasília

O Ministério da Fazenda pretende abrir, até o fim deste ano, a possibilidade de negociação de débitos relacionados a duas teses bilionárias que atualmente estão em discussão na esfera administrativa ou no Judiciário. Trata-se da chamada transação tributária, que pode resultar em acordo entre contribuinte e União, com condições mais favoráveis de parcelamento, além de descontos na dívida.

A Fazenda Nacional estima que a transação relacionada a essas duas teses poderá beneficiar grandes contribuintes e reforçar o caixa da União em até R$ 12 bilhões em 2024 — o mecanismo da transação é uma das principais apostas do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para zerar o déficit no próximo ano. Contudo, ambas as teses são controversas: não se sabe se quem optar por seguir em frente com a discus- são contra a Fazenda vai ganhar ou perder o processo. Para aderir à transação, é preciso desistir do litígio.

“São temas muito controversos”, afirma Anelize Almeida, procuradora-geral da Fazenda Nacional, em entrevista exclusiva ao Valor.

As duas teses que serão abertas em breve pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) serão referentes ao PIS e à Cofins. De acordo com dados do Ministério da Fa- zenda, os valores das causas nos processos sobre as contribuições em andamento somam R$ 785,4 bilhões.

A Fazenda localizou 300 discussões diferentes sobre esses tributos e destacou 19 assuntos prioritários, dos quais vão sair as duas teses que poderão entrar na transação tributária. Entre eles está a discussão sobre a inclusão do PIS e da Cofins na própria base de cálculo. Há mais de 16 mil processos sobre o assunto em tramitação, que aguardam julgamento em repercussão geral no Su- premo Tribunal Federal (STF). A estimativa de impacto para os cofres do governo, em caso de perda nesses processos, é de R$ 65 bilhões.

Outra tese que pode ser colocada aos contribuintes para transação se refere à inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da Cofins, que envolve quase 14 mil processos. De acordo com o governo, se a Fazenda perder essa tese, o impacto fiscal poderá chegar a R$ 35,4 bilhões, segundo o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2024.

Há ainda um terceiro tema em análise que pode ser colocado para transação: a inclusão de crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins. Há 1,1 mil processos sobre o tema, com um impacto

fiscal estimado para a União de R$ 16,5 bilhões, de acordo com a LDO.

Um dos motivos que levam a Fazenda Nacional a abrir a transação para duas grandes teses é um dispositivo da nova lei do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), sancionada na quinta-feira (Lei no 14.689/2023). Ele possibilita a realização da transação com teses tributárias que envolvem processos bilionários ainda em discussão na esfera administrativa ou no Judiciário.

Até então, só era possível negociar com a Fazenda valores já inscritos na dívida ativa, após derrota do contribuinte nos tribunais ou no Carf.

Para fazer a seleção das possíveis teses a entrar na transação, a PGFN analisou as discussões no Carf para saber o que a Fazenda ganhou no conselho, se existe recurso em repetitivo ou repercussão geral da Fazenda ou do contribuinte, e como estava a discussão na segunda instância do Judiciário. “Essa transação de controvérsia, das grandes teses, parte de uma prognose indeterminada. Eu não sei se vou ganhar ou perder. Está tão controverso que é melhor ir para a transação, desistir de um processo e resolver o litígio”, diz Anelize.

A minuta do edital, que pode ser divulgada até o fim deste mês, será parecida com a da transação já aberta para outras teses (Participação nos Lucros e Resultados – PLR e ágio interno). Segundo a própria procuradora, porém, elas deram pouco apetite de adesão. Para ela, a nova regra deve ser mais estimulante.

A estimativa de recuperação com esse assunto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 é de R$ 12 bilhões. O valor se refere aos pagamentos, no primeiro ano, de até duas transações de teses. Esse montante é calculado com base no atual estoque de processos, estimando percentuais de descontos e de adesão.

O cálculo é conservador, segundo a procuradora. Anelize avalia que as condições especiais para pagamento, que envolvem parcelamento e descontos, têm potencial para impulsionar negociações. Ela lembra também que a PGFN receberá 100 novos procuradores em 2024, a partir de um concurso aberto, reforçando a equipe de recuperação de créditos. Por isso, para ela, o valor recupe- rado será superior à estimativa.

Anelize também aponta que a recuperação de créditos inscritos na dívida ativa da União, a partir de transações, deve ser maior do que o estimado para este ano. A PGFN aguardava obter R$ 30 bilhões até o fim deste ano, mas R$ 22 bilhões já entraram no caixa no primeiro semestre. Assim, segundo a procuradora, é esperado que o governo recupere cerca de R$ 42 bilhões até dezembro. Os R$ 12 bilhões adicionais diminuiriam a projeção de déficit no fim deste ano, que está em R$ 141,4 bilhões, segundo dado divulgado na sexta-feira.

Na avaliação do advogado tributarista Breno Vasconcelos, sócio do Mannrich e Vasconcelos e pesquisador do Insper, as novas condições para transações podem atrair as empresas para as negociações e “são fruto de aprendizado da PGFN em relação a casos passados”.

Por outro lado, Vasconcelos alerta: a seleção das teses será fundamental para que o contribuinte aceite negociar. “Assim como a PGFN faz uma avaliação de prognóstico de perda [com os processos], os contribuintes também o fazem”, comentou. “Encontrar o ponto de equilíbrio será determinante para tornar os editais mais atrativos”, completa. (Colaboraram Lu Aiko Otta e Jéssi- ca Sant’Ana)

Fonte Valor Econômico 23,24 e 25/09/2023

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