Iniciado julgamento no STF em que se discute a constitucionalidade de dispositivo da Lei de Execuções Fiscais que versa sobre a prescrição intercorrente tributária

10 de fevereiro de 2023 | RE 636.562/SC (RG) – Tema 390| Plenário do STF

O Ministro Roberto Barroso – Relator –, acompanhado pelo Ministro Alexandre de Moraes, propôs fixação da seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional o art. 40 da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais – LEF), tendo natureza processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de 5 (cinco) anos”. O Ministro entendeu que, a despeito de a introdução da prescrição intercorrente tributária ter sido feita por lei ordinária, não há vício de inconstitucionalidade na LEF, haja vista que o legislador ordinário se limitou a transpor o modelo estabelecido pelo art. 174 do CTN, adaptando-o às particularidades da prescrição verificada no curso de uma execução fiscal. O Ministro acrescentou, ainda, que o tratamento da prescrição intercorrente por meio de lei ordinária nacional atende ao comando do art. 22, I, da CF/1988, porquanto compete à União legislar sobre direito processual, competência que garante a uniformidade do tratamento da matéria em âmbito nacional e, por conseguinte, a preservação da isonomia entre os sujeitos passivos nas execuções fiscais em todo o País. O julgamento aguarda o voto dos demais Ministros.

Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados

DECISÃO: Ação anulatória de débito fiscal deve ser julgada pelo mesmo juízo onde já foi ajuizada a execução

Quando houver conexão entre duas ações e a ação anulatória de débito fiscal for ajuizada posteriormente à ação de execução fiscal, os processos devem ser reunidos para julgamento simultâneo. Com este fundamento, a 4ª Seção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF) decidiu que a 8ª Vara Federal de Execuções Fiscais da Seção Judiciária da Bahia (SJBA) é competente para julgar a ação anulatória de débito fiscal.

O processo havia sido distribuído para o Juízo Federal da 4ª Vara Cível Federal Cível da SJBA que declinou da competência para o Juízo da 8ª Vara. Esse último suscitou conflito negativo de competência, que é quando, conforme o art. 66 do Código de Processo Civil (CPC), dois ou mais juízes se declaram incompetentes para julgar um processo ou discordam quanto à reunião ou à separação de processos.

Relator do processo, o desembargador federal I´talo Fioravanti Sabo Mendes ressaltou que no caso concreto aplica-se a regra de conexão prevista no Código de Processo Civil (CPC): “à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico” e determina que “serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles”. A conexão ocorre quando duas ou mais ações possuem pedido ou causa de pedir em comum, no caso, o mesmo débito fiscal.

Evitar decisões conflitantes – O magistrado citou entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que “havendo conexão entre execução fiscal e ação anulatória de débito fiscal, impõe-se a reunião dos processos, de modo a evitar decisões conflitantes; espécie em que, ajuizada primeiro a execução fiscal, o respectivo juízo deve processar e julgar ambas as ações”.

Esse entendimento foi adotado pelo TRF1, que acrescentou: “A reunião de tais processos somente será possível se a execução for ajuizada antes da ação anulatória, vez que a modificação da competência por conexão somente é admissível nos casos em que a competência é relativa”, prosseguiu o magistrado, que é o que se verifica no presente caso.

O Colegiado, por unanimidade, declarou competente o Juízo Federal da 8ª Vara de Execução Fiscal da SJBA para processar e julgar a ação anulatória, nos termos do voto do relator.

Processo: 1013966-76.2022.4.01.0000

Assessoria de Comunicação Social

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

ARTIGO DA SEMANA – Enunciados da I Jornada de Direito Tributário do Conselho da Justiça Federal

Em outubro de 2022, foi realizada a I Jornada de Direito Tributário, por meio do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em parceria com o Superior Tribunal de Justiça e a Associação dos Juízes Federais do Brasil.

Por ocasião da conclusão dos trabalhos, foram aprovados 12 (doze) Enunciados agrupados em quatro temas previamente definidos: Sistema Tributário Nacional, Normas Gerais de Direito Tributário, Espécies Tributárias e Processo Tributário.

Os Enunciados não têm caráter vinculante, mas seguramente são balizadores das decisões proferidas pelos magistrados federais em matéria tributária, daí a importância de conhecê-los e estudá-los. 

SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL 

ENUNCIADO 1 – A ausência de finalidade lucrativa (art. 150, inciso VI, “c”, CF/1988), para fins de gozo da imunidade tributária das instituições de educação ou de assistência social, não se confunde com gratuidade ou com a proibição de auferir lucros, desde que haja a reversão dos seus resultados, rendas e patrimônio, à finalidade essencial, vedada a sua distribuição, a qualquer título. 

Justificativa: A ausência de finalidade lucrativa é exigência da CF/88, para que as instituições de educação e de assistência social sejam imunes aos impostos. Contudo, falta de finalidade lucrativa não implica em gratuidade e em que tais entidades não possam auferir resultados positivos. A necessidade de gratuidade, não é exigida pela Lei Maior; não se exige beneficência, apenas falta de finalidade lucrativa. Conforme Regina Helena Costa1, a imunidade pressupõe a capacidade econômica, pois despindo-se os fatos de conteúdo econômico, seriam os mesmos irrelevantes para o direito tributário, ou se estaria diante de mera não incidência. E segundo Roque Antonio Carrazza2, a gratuidade não é requisito para gozo da imunidade pois, se a gratuidade fosse conditio sine qua non ao desfrute da imunidade, praticamente estaria esvaziada em relação às escolas, a norma contida nesta alínea “c” Cf. RE 58.691/SP e 93.463/RJ. Quanto à possibilidade de auferimento de resultados positivos, a há proibição de se obter sobras, superávits, ou lucros em sentido amplo; o que a CF/88 exige é que esses resultados positivos não sejam distribuídos, devendo os mesmos serem aplicados no desenvolvimento de suas atividades.3 

[1] COSTA, Regina Helena. Aspectos da Imunidade Tributária. Tese (Doutorado em Direito) Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP. São Paulo, 2000. 

[2] CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros Editores, 31a ed., 2017, p. 929/930. 

[3] Cf. Carrazza, p. 914/916 e BARRETO, Aires F. C. Dir. Trib. Mun. Saraiva, 75-78.

ENUNCIADO 2 – O princípio da capacidade contributiva não está limitado aos impostos. 

Justificativa: O princípio da capacidade contributiva encontra fundamento imediato no princípio da isonomia, além de outros princípios constitucionais, como o direito de propriedade, o princípio da solidariedade, entre outros. Por isso, mesmo que não estivesse positivado na CF, o dever de observância desse princípio vincularia o legislador tanto no que se refere à delimitação da hipótese de incidência tributária, quanto no que se refere à eleição dos elementos de graduação do tributo. Sucede que o dispositivo constitucional que consagrou expressamente o princípio – art. 145, § 1, da CF – apresenta redação que dá ensejo a interpretações limitadoras do alcance da capacidade contributiva, em três aspectos fundamentais: (a) o dispositivo apenas faz alusão à capacidade contributiva em sentido relativo (graduação do tributo), deixando escapar a faceta objetiva do princípio (eleição, para a hipótese de incidência tributária, de materialidades que expressem relevância econômica); (b) a expressão “sempre que possível” dá a entender que se trata de uma faculdade do legislador; (c) a referência a impostos conduz à compreensão de que o princípio da capacidade contributiva não se aplica às demais espécies tributárias. Explicitar que a capacidade contributiva não decorre exclusivamente do art. 145, § 1o, da CF, parece importante para afastar tais compreensões equivocadas, além de refletir entendimento dominante na doutrina (cf., entre outros: P. B. Carvalho; A. P. Velloso; B.T. Grupenmaceher) e uma tendência interpretativa dos tribunais (cf.: STF, RE 406.955; RE 562.045). 

ENUNCIADO 3 – A arbitragem é meio legítimo de solução de conflitos entre Fisco e contribuintes, desde que venha a ser legalmente instituída. 

Justificativa: O enunciado objetiva assentar a possibilidade de instituição da arbitragem como meio para a solução de controvérsias em matéria tributária, afastando os óbices da indisponibilidade do crédito tributário e, igualmente, do interesse público. É sabido que, no que concerne à solução das contendas no âmbito do direito público, a impossibilidade do emprego do método arbitral já foi superada, seja pela jurisprudência (STF, AI 52181), seja por força de uma positivação legal genérica (art. 1o, §1o, da Lei n. 9.307/1996, com a redação da Lei n. 13.129/2015), relacionada a direitos disponíveis, além de inúmeros permissivos legais específicos. Especialmente quanto à indisponibilidade do crédito tributário, a qual constitui uma emanação da própria indisponibilidade do interesse público, é de se notar que traduz a impossibilidade de sua disposição ao alvedrio do administrador. Não há, por óbvio, impedimento a que tal ocorra se o administrador estiver assim autorizado pelo legislador, o qual se encontra habilitado, constitucionalmente, para tanto. Nesse sentido, apropriada a visão de Pedro Gonçalves (Administração Pública e arbitragem – especial, o princípio legal da irrecorribilidade de sentenças arbitrais. InEstudos em homenagem a António Barbosa de Melo. Coimbra: Almedina, 2013, p. 784. Org.: CORREIA, Fernando Alves; SILVA, João Calvão da; ANDRADE, José Carlos Vieira de Andrade; CANOTILHO, José Joaquim Gomes; COSTA, José Manuel m. Cardoso). O enunciado, portanto, expressa a mensagem de que compete ao legislador, flexibilizando a indicada indisponibilidade, autorizar a Administração Tributária a submeter os seus litígios à arbitragem. Não se enveredou – advirta-se – aqui pela discussão sobre qual a natureza da espécie normativa exigida para tal fim. 

NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO 

ENUNCIADO 4 – A responsabilidade tributária por sucessão empresarial prevista no art. 132 do Código Tributário Nacional (CTN) se aplica aos casos de cisão previstos no art. 229 da Lei n. 6.404/1976 (Lei das S.A). 

Justificativa: O art. 132 do CTN, que trata das hipóteses de responsabilidade tributária por sucessão empresarial, não fez menção explícita à cisão, pois esse conceito apenas foi normatizado pela Lei n. 6.404/1976 (Lei das S.A.), que entrou em vigor posteriormente ao CTN. No entanto, o entendimento pacífico da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é que esse dispositivo determina a responsabilidade tributária solidária entre as empresas cindendas e a sociedade que foi cindida, considerando essa operação como uma espécie de transformação (REsp n. 1.682.792/SP e REsp n. 852.972/PR). A Lei das S.A. estabelece que a cisão pode ser total ou parcial (art. 229) e, em regra, ela implicará a solidariedade pelas obrigações anteriores entre as sociedades que absorverem o patrimônio da companhia cindida e a sociedade original. Ocorrida a cisão parcial, é possível estipular as obrigações que serão transferidas às sociedades cindendas; na hipótese de oposição dos credores a essa estipulação, não haverá solidariedade entre as companhias, como prevê o art. 233, parágrafo único, da Lei n. 6.404/1976. Nesse sentido, a cisão é uma operação societária com alta discricionariedade por parte dos sócios em determinar qual patrimônio é vertido à cindenda e qual permanece com a cindida. Todavia, o art. 123 do CTN veda que convenção particular possa determinar a responsabilização tributária, considerando que eventuais estipulações previstas, conforme o parágrafo único do art. 233 da Lei n. 6.404/1976, não podem ser opostas ao Fisco, sob pena de violação dos princípios da indisponibilidade e da supremacia do interesse público. 

ENUNCIADO 5 – Informações e dados relativos a incentivos fiscais, concedidos a pessoas jurídicas ou por elas fruídos, devem ser fornecidos a qualquer interessado (transparência passiva), nos termos da Lei de Acesso à Informação, além de ser divulgados no Portal da Transparência do ente federado (transparência ativa). 

Justificativa: Segundo a Receita Federal do Brasil, os incentivos fiscais destinados a promover a equalização das rendas entre diferentes regiões ou a incentivar determinado setor da economia classificam-se como “gastos tributários”, isto é, constituem “gastos indiretos do governo realizados por intermédio do sistema tributário, visando a atender objetivos econômicos e sociais e constituem-se em uma exceção ao sistema tributário de referência, reduzindo a arrecadação potencial e, consequentemente, aumentando a disponibilidade econômica do contribuinte”. Assim, trata-se de verdadeira política pública, que se utiliza não do gasto direto, mas sim do indireto, por meio da renúncia de receitas públicas, para atingir objetivos econômicos e sociais, acepção que se aplica inteiramente aos incentivos fiscais de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Nesse contexto, devem ser públicas as informações sobre as pessoas jurídicas objeto dessa desoneração tributária, os valores a elas concedidos e por elas fruídos em determinado período, eventuais condições a que estejam sujeitas e outras informações pertinentes, porquanto, afinal, o Estado, em sentido amplo, é que está financiando essas pessoas jurídicas beneficiadas às custas dos demais membros da sociedade. Por isso, trata-se de informações e dados revestidos de inegável interesse público, que devem ser prestados pelas Administrações Tributárias (CRFB, art. 5o, inciso XXXIII), razão pela qual não deve ter lugar a alegação de sigilo fiscal nesse tocante (CTN, art. 198, caput); afinal, quem recebe incentivos do Poder Público deve estar sempre aberto aos mais amplos controles, inclusive social. 

ENUNCIADO 6 – A responsabilidade tributária dos terceiros elencados no rol do art. 134 do Código Tributário Nacional é subsidiária, sendo assegurado o benefício de ordem. 

Justificativa: Ainda que o caput do art. 134 do CTN preveja que “respondem solidariamente”, o instituto da solidariedade, pela definição do parágrafo único do art. 124 do próprio CTN, é incompatível com preceito de que tal responsabilidade se aplica na “impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte”, contido no mesmo dispositivo. Trata-se, portanto, de “flagrante ausência de tecnicidade legislativa” (STJ, 1a Seção, EREsp 446.955/SC, Rel. Min. Luiz Fux, julg. 9/4/2008). A Primeira Seção do STJ concluiu, na ementa do mesmo julgado, que é “cediço que o instituto da solidariedade não se coaduna com o benefício de ordem ou de excussão. Em verdade, o aludido preceito normativo cuida de responsabilidade subsidiária”. Renato Lopes Becho defende que “é possível sustentar o caráter subsidiário da responsabilidade de terceiros. Talvez o legislador, por equívoco, tenha estipulado uma aparente solidariedade apenas no intuito de manter o contribuinte no polo passivo da ação de cobrança do crédito tributário” (Desdobramentos das decisões sobre responsabilidade tributária de terceiros no STF. RDDT, n. 204, p. 45-57, set. 2012). Kiyoshi Harada tem o mesmo entendimento: “na verdade, o texto do dispositivo sob exame refere-se à responsabilidade subsidiária, pois a solidária não comporta benefício de ordem” (ITBI: doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2010, p. 159). 

ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS 

ENUNCIADO 7 – A empresa vendedora, cuja comprovada boa-fé evidencie a regularidade da operação interestadual realizada com o adquirente, não pode ser objetivamente responsabilizada pelo pagamento do diferencial de alíquota de ICMS em razão de a mercadoria não ter chegado ao destino final. 

Justificativa: Trata-se de entendimento firmado pela 1a Seção, no EREsp n. 1.657.359 (Rel. Min. Gurgel de Faria) em que se verificou a divergência entre acórdãos da 1a e da 2a Turma, no qual o Tribunal privilegiou a justiça material, uma vez que, há anos, inúmeros contribuintes têm sido autuados para pagamento de tributo cujo fato gerador não se perfectibilizou por dolo ou culpa de terceiros. O paradigma segue a linha adotada pelo STJ, a fim de proteger o contribuinte que age de boa-fé (por exemplo, Súmula n. 509: “É lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda”). 

ENUNCIADO 8 – No ICMS-ST progressivo, o contribuinte-substituído também tem legitimidade ativa ad causam para pleitear a declaração de inexistência da relação jurídica tributária. 

Justificativa: O enunciado proposto sistematiza o comando do art. 10 da Lei Complementar n. 87/1996, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça e o majoritário entendimento doutrinário sobre o tema. 

PROCESSO TRIBUTÁRIO 

ENUNCIADO 9 – É cabível negócio jurídico processual em litígios que tenham por objeto créditos tributários não inscritos em Dívida Ativa, quer no âmbito do processo administrativo fiscal, aplicando- se, por analogia, o art. 190 do CPC, quer no âmbito de processo judicial. 

Justificativa: O cabimento de negócio jurídico processual em matéria tributária é um fato consumado, reconhecido pela Procuradoria da Fazenda Nacional, conforme portarias que regulamentam o tema e casos concretos de acordos já celebrados, mas tais normativos não preveem este tipo de pacto em processos administrativos ou em processos judiciais, envolvendo débitos não inscritos em Dívida Ativa. Entretanto, o negócio jurídico processual não vincula órgãos, mas, sim, as pessoas jurídicas em lide, sendo que tanto a Procuradoria quanto a Receita Federal são órgãos da União, razão pela qual poder-se-ia afirmar a presença da titular dos direitos e obrigações processuais em tela. Ora, se tomado como premissa que o processo judicial tributário admite composição, nos termos do art. 190 do CPC, não há nada que justifique isso ser admissível para processos envolvendo débitos inscritos, mas não para os que envolvam os não-inscritos e, por consequência, também nada obsta que se aplique ao processo administrativo fiscal, tendo por fim maior celeridade e segurança jurídica. 

ENUNCIADO 10 – É possível a antecipação da garantia de futura Execução Fiscal por meio do ajuizamento de tutela de urgência antecedente, com base nos dispositivos gerais dos arts. 300 a 302 do CPC, sendo desnecessário o aditamento para formulação de pedido principal. 

Justificativa: Após a confirmação da existência do débito tributário no Processo Administrativo, cessa a suspensão da exigibilidade do crédito. É notória a demora na inscrição do referido débito em dívida ativa e no ajuizamento da Execução Fiscal. Assim, na vigência do CPC/1973 os contribuintes passaram a ajuizar Ações Cautelares Inominadas, com o único objetivo de – oferecendo apólice de seguro garantia, carta de fiança bancária ou bens à penhora – antecipar os efeitos que seriam obtidos com a aceitação de garantia em execução fiscal pendente de ajuizamento pelas Fazendas Públicas. Sendo assim, possível a expedição de Certidões Positivas com o efeito de negativas de Quitação de Tributos. Tal entendimento era respaldado pelo julgamento do repetitivo proferido nos autos do RESP n. 1.156.668/DF: “o contribuinte pode, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa”. Com o atual Código de Processo Civil as ações cautelares autônomas deixaram de existir e criou-se um grande problema, pois a antecipação de garantia, por vezes, é indeferida (vide a respeito TJSP; Apelação 1010617-47.2017.8.26.0053; Relator: Ferraz de Arruda; 13a Câmara de Direito Público). Outrossim, há situações nas quais se exige o aditamento, para a formulação de pedido principal, quando na verdade a existência ou não do débito tributário não será discutida nessa ação, mas sim nos autos da Execução Fiscal e/ou nos respectivos Embargos à Execução Fiscal. Assim, mostra-se de suma importância que se possibilite a antecipação da garantia nesses casos. 

ENUNCIADO 11 – A distribuição de ação de produção antecipada de provas não importa renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa. 

Justificativa: O parágrafo único do art. 38 da Lei Federal n. 6.830/1980 prevê que a distribuição de ação judicial (mandado de segurança, ação anulatória etc.), visando a desconstituição do crédito tributário, implica em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa. No entanto, a distribuição de ação de produção antecipada de provas não acarreta a renúncia prevista neste dispositivo. Após advento do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), a produção antecipada de provas deixou de ser mero procedimento cautelar e ganhou autonomia. Assim, considerando as três hipóteses previstas no art. 381 do CPC, poderá ser distribuída ação cujo objeto é simplesmente a produção de uma prova. A prova é produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, com a participação da parte adversa. Após produção da prova, o juízo responsável homologa a prova, mas sem realizar qualquer juízo de mérito. Como não há juízo de mérito na ação de produção antecipada de provas, é válido que o contribuinte distribua esta ação sem que isto acarrete renúncia da fase administrativa. A fase administrativa de um auto de infração pode levar anos para se encerrar. Então, em alguns casos, não é possível aguardar até a fase probatória de um processo de conhecimento para se produzir a prova necessária para defesa do contribuinte, sob pena de perecimento de documentos, circunstâncias, fatos, dentre outros. Por isso, na forma do inciso I, do art. 381, do CPC, é defeso ao contribuinte distribuir ação de produção antecipada de provas para produzir as provas necessárias antes de seu perecimento. E, por vezes, o contribuinte necessita produzir uma prova para sua defesa na própria fase administrativa. Pode-se necessitar de demarcar a área exata de um imóvel para defesa de autuação de ITR. Pode-se necessitar de uma perícia química de um produto para se defender de uma autuação de classificação fiscal. Pode-se necessitar de uma perícia contábil para análise dos demonstrativos para se defender de uma autuação de IRPJ. Assim, na forma dos incisos II e III, do art. 381, do CPC, é defeso ao contribuinte distribuir ação de produção antecipada de provas para produzir as provas necessárias para viabilizar a autocomposição (levando a própria autoridade administrativa a reconhecer o erro de eventual autuação) ou mesmo evitar o ajuizamento de futura ação judicial sobre o crédito tributário (considerando que a prova produzida antecipadamente pode levar o julgador administrativo a anular o auto de infração). Desta forma, mostra-se relevante a pacificação de que a distribuição desta ação não implicará na renúncia da fase administrativa. 

ENUNCIADO 12 – A exigência de garantia integral do crédito executado para o recebimento dos embargos à execução fiscal deve ser dispensada quando o embargante comprovar, de maneira suficiente, não possuir patrimônio para garantia do crédito. 

Justificativa: Os artigos 8o e 9a Lei de Execução Fiscal (LEF Lei n. 6.830/1980) informam que o executado tem o prazo de 5 dias para pagar ou garantir a execução. Garantida a execução, tem o prazo de 30 dias para oferecer embargos à execução, que não serão admitidos antes da garantia, conforme art. 16 da LEF. Os embargos à execução constituem a única possibilidade de defesa em execução fiscal, ressalvada a matéria de ordem pública. Assim, o executado que não possui patrimônio suficiente para garantir o débito, não exerce os direitos de acesso ao Judiciário, contraditório e ampla defesa, garantidos constitucionalmente (art. 5o, XXXV e LV). A Teoria do Estatuto do Patrimônio Mínimo, do Min. Luiz Edson Fachin, sustenta o resguardo de um patrimônio mínimo para preservar a dignidade da pessoa humana. Necessário mitigar a obrigatoriedade de garantia integral do crédito para o recebimento dos embargos à execução fiscal quando o devedor comprovar que não possui patrimônio para a garantia do crédito. O STJ já se posicionou: (…)resguarda a todos os cidadãos o direito de acesso ao Poder Judiciário, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5o, CF/1988), tendo esta Corte Superior, com base em tais princípios constitucionais, mitigado a obrigatoriedade de garantia integral do crédito executado para o recebimento dos embargos à execução fiscal (…) deve ser afastada a exigência da garantia do juízo para a oposição de embargos à execução fiscal, caso comprovado inequivocadamente que o devedor não possui patrimônio para garantia do crédito (REsp n. 1.487.772/SE, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe de 12/6/2019). 

A questão tributária em recuperação judicial: começa a ser trilhado o fim do impasse?

A reforma da Lei 11.101/2005 buscou em certa medida aclarar pontos específicos e superar divergências que na prática geravam o que parte da doutrina denomina “jurisprudência lotérica”, em que as partes passam a contar com um fator imponderável: dependendo de quem for o juiz da causa, seu destino poderá ser completamente diferente.

No tocante à questão tributária, embora mantida a redação do artigo 57 da Lei 11.101/2005, que prevê a comprovação da regularidade fiscal como requisito para a concessão da recuperação judicial e cuja aplicação era mitigada pelos tribunais pátrios, a Lei 14.112/2020 trouxe importantes alterações com relação ao prosseguimento das execuções fiscais (artigo 6º, §7º-B da Lei 11.101/2005), melhores condições de parcelamento e transação envolvendo débitos tributários (artigos 10-A, 10-B e 10-C da Lei 10.522/2002) e novas hipóteses de convolação em falência (artigo 73, V e VI da lei 11.101/2005).

Diante da mudança legislativa, que colocou à disposição das recuperandas novos incentivos ao equacionamento dos débitos tributários, parte da jurisprudência e da doutrina passou a entender que a orientação anterior no sentido de que o juízo recuperacional poderia dispensar a exigência da certidão negativa para a concessão da recuperação judicial estaria superada.

Neste sentido, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) passou a exigir prova da regularidade fiscal das recuperandas para a concessão da recuperação judicial, em especial nos casos em que a aprovação do plano de recuperação judicial ocorreu após a vigência da reforma da Lei 11.101/2005. Com a alteração do entendimento outrora sedimentado inclusive para os processos em andamento, concluiu-se que não há direito adquirido a regime jurídico decorrente de construção jurisprudencial, concedendo-se prazos que variam de 30 a 180 dias para a comprovação da regularidade fiscal, inclusive ex officio.

No entanto, a questão não se uniformizou na medida em que o próprio STJ, mesmo após a vigência da reforma, tem mantido o posicionamento até então vigente em decisões monocráticas, no sentido de manter a dispensa da providência do artigo 57 da Lei 11.101/2005, considerada incompatível com o princípio da preservação da empresa.

Em síntese, a partir daí, passamos a ter o TJ-SP, na maioria dos casos, exigindo prova da regularidade fiscal como requisito legal para a homologação do plano de recuperação judicial ou eventuais aditivos, e o STJ mantendo a mesma linha do entendimento anterior à reforma legislativa nas inúmeras decisões monocráticas recentemente proferidas sobre o tema.

Diante desse quadro, o TJ-SP, cumprindo seu papel fundamental de uniformização da jurisprudência (artigo 926 do CPC), aprovou em 24/11/2022 os seguintes enunciados:

Enunciado XIX: Após a vigência da Lei 14.112/2020, constitui requisito para a homologação do plano de recuperação judicial, ou de eventual aditivo, a prévia apresentação das certidões negativas de débitos tributários, facultada a concessão de prazo para cumprimento da exigência.

Enunciado XX: A exigência de apresentação das certidões negativas de débitos tributários é passível de exame de ofício, independentemente da parte recorrente.

O Enunciado XIX tem fundamental importância para a análise da questão e deve ser interpretado à luz da jurisprudência atual do TJ-SP. Com efeito, a partir da sua redação interpreta-se que a comprovação da regularidade fiscal é requisito para a homologação de planos de recuperação judiciais e eventuais aditivos, sendo que o TJ-SP estabeleceu como critério temporal a data da deliberação assemblear:

“Direito intertemporal. Não há direito adquirido a regime jurídico. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Requisitos para concessão de recuperação judicial que devem ser apurados tal como previstos, no ordenamento jurídico, à época da deliberação da assembleia geral de credores sobre o plano de recuperação judicial. Tempus regit actum. Art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal; art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Assim, não se pode invocar orientação jurisprudencial anterior à entrada em vigor da Lei 14.112/2020 caso a deliberação assemblear seja posterior, como ocorre na hipótese” (TJ-SP; Agravo de Instrumento 2067179-82.2021.8.26.0000; relator: des. Cesar Ciampolini; 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro Central Cível – 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais; data do julgamento: 20/10/2021; data de registro: 27/10/2021).

Além disso, o Enunciado XIX, à luz do entendimento acima colacionado, abrange expressamente as hipóteses de aditamento a planos de recuperação judicial, sendo este ponto essencial para a solução de possíveis controvérsias, pois em razão da pandemia de Covid-19 diversas empresas que já tinham seus planos homologados em data anterior à vigência da Lei 14.112/2020 (23/01/2021) e apresentaram novos aditivos passaram a sustentar a inaplicabilidade da nova lei para condicionar a nova homologação à prova da regularidade fiscal.

Desse modo, de acordo com a análise aqui exposta, todas as deliberações assembleares sobre planos de recuperação judicial ou eventuais aditivos ocorridas após a vigência da Lei 14.112/2020 seguem o princípio geral do tempus regit actum, devendo a sua homologação ser precedida da apresentação das certidões negativas de débitos tributários prevista no art. 57 da Lei 11.101/2005.

Já o Enunciado XX vai em linha com o entendimento já sedimentado pelo TJSP, no sentido de que compete ao Judiciário o exame de ofício a questão da legalidade do processo recuperacional e falimentar na medida em que se trata de questão de ordem pública e em conformidade com o artigo 933 do CPC devem ser conhecidas de ofício. Aliás, não é por outra razão que o enunciado deixa expresso que a essas situações aplica-se o efeito translativo dos recursos, o que significa dizer que a questão de deve ser conhecida pelo órgão julgador mesmo que o recurso tenha objeto distinto.

Evidente que a edição dos enunciados acima não implica o fim dos debates, por dois motivos.

O primeiro, é que o entendimento do TJ-SP, apesar de ter de ser respeitado por todos os órgãos julgadores do estado de São Paulo, salvo melhor juízo, não vincula, por óbvio, o STJ, o que significa dizer que a questão da comprovação da regularidade fiscal como requisito para a concessão da recuperação judicial e se pode a questão ser conhecida de ofício pelo órgão julgador fatalmente continuará sendo objeto de inúmeros recursos especiais até pronunciamento específico quanto à divergência.

O segundo, é que alguns pontos importantes ainda não foram objeto de uniformização e, portanto, não são tratados pelos enunciados. Destacamos, a nosso ver, os principais:

a) A despeito da mudança jurisprudencial no tocante à aplicação do art. 57 da Lei 11.101/2005, não há, ainda, definição quanto às consequências de eventual não apresentação das certidões negativas, se sobrestamento ou extinção do processo, revogação do stay period ou convolação da recuperação judicial em falência.

b) As novas regras relacionadas a parcelamento e transação tributários são direcionadas à Fazenda Nacional, com possibilidade de edição de leis semelhantes pelos demais entes da federação. Nesse sentido, a possibilidade de equacionamento das dívidas tributárias de empresas em recuperação judicial em âmbito estadual e municipal não é uniforme e, nesse cenário, o Judiciário deve se deparar também com a questão da exigibilidade ou dispensa das certidões negativas das demais Fazendas Públicas, consideradas as peculiaridades de cada caso.

c) É possível que existam débitos tributários em litígio sem garantia do juízo, o que, salvo melhor juízo, impossibilitaria a obtenção de certidão positiva com efeito negativo. Ao se deparar com situações de impossibilidade de obtenção das certidões negativas ou positivas com efeito negativo, deverá o Judiciário avaliar, de acordo com as circunstâncias concretas, qual a melhor solução a ser adotada.

Todos esses últimos pontos são essenciais, pois além do inequívoco objetivo do legislador de preservar a atividade empresarial e seus benefícios econômicos e sociais, os tribunais superiores já consolidaram o entendimento que a Fazenda Pública não pode criar óbices ao livre exercício da atividade econômica (artigo 170, CF) como meio coercitivo para cobrança de tributos (Súmulas 70, 3.323 e 547/STF e 127/STJ).

Apesar de todos os problemas que ainda serão enfrentados, não há dúvida de que toda solução começa com o primeiro passo e este foi dado pelo TJ-SP, provocando desta feita que o STJ também se pronuncie em breve sob a forma de enunciado ou por meio de julgamentos colegiados.

Oreste Nestor de Souza Laspro é advogado, administrador judicial. Professor de Direito Processual da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo).

Revista Consultor Jurídico, 9 de janeiro de 2023, 8h00

STJ fixa o que é proveito econômico para caso de exceção de pré-executividade

O valor do proveito econômico a ser usado como base de cálculo é o montante da dívida que foi executada pela Fazenda Pública dividido pelo número de executados. Tal fórmula deve ser aplicada para fins de definição de honorários de sucumbência em favor do advogado da parte vencedora em ação de exceção de pré-executividade.

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por um contribuinte, com o objetivo de aumentar os honorários que seus advogados teriam direito a receber.

O caso trata de exceção de pré-executividade, o instrumento que pode ser usado pelo contribuinte para informar ao Judiciário de que está sendo erroneamente cobrado judicialmente por uma dívida pela qual não é responsável.

As instâncias ordinárias analisaram o pedido e reconheceram que, de fato, o sócio não deveria constar no polo passivo da execução fiscal. Considerando modesto o trabalho dos advogados, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região fixou honorários de sucumbência pelo método da equidade.

Essa foi a motivação que levou a parte a recorrer ao STJ. O método da equidade está autorizado no parágrafo 8º do artigo 85 do Código de Processo Civil e se destina apenas aos processos em que o valor ou proveito econômico é considerado muito baixo.

Em março de 2022, a Corte Especial do STJ fixou tese no sentido de que essa regra não pode ser usada nas hipóteses em que o valor da causa for muito alto. Relator na 2ª Turma, o ministro Francisco Falcão aplicou esse enunciado para reformar o acórdão do TRF-3.

Assim, ficou certo que os honorários devem ser fixados com base no parágrafo 3º do artigo 85 do CPC, que trata de processos em que a Fazenda é derrotada. Ele prevê percentuais gradativos calculados sobre o valor da condenação ou do proveito econômico.

No caso da exceção de pré-executividade, o ministro Falcão definiu que o valor do proveito econômico é o mesmo da dívida executada, tendo em vista o dano potencial que seria causado caso a execução prosseguisse regularmente contra o sócio.

No entanto, entendeu que esse valor deve ser dividido pelo total de sócios executados, pois estariam todos obrigados a arcar solidariamente com a dívida.

“Assim, na hipótese de recebimento de honorários, o proveito econômico é o valor da dívida dividido pelo número de executados. Sobre a base apurada, devem incidir os percentuais das gradações do parágrafo 3º do artigo 85 do CPC/2015”, concluiu. A votação foi unânime.

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AREsp 2.231.216

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 4 de janeiro de 2023, 8h47

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