Distribuidora suspeita de fraude não deve ter acesso a sistema sobre ICMS

O artigo 45 da Lei de Processo Administrativo (Lei 9.784/1999) estabelece que em caso de risco iminente, a administração pública poderá motivadamente adotar providências para resguardar o interesse público sem a prévia manifestação do interessado.

Esse foi o entendimento da, 5ª Câmara do Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) para rejeitar mandado de segurança impetrado por uma empresa que queria retomar o acesso ao Sistema de Captação e Auditoria dos Anexos de Combustíveis (Scanc), em sua filial de Guarulhos, na região metropolitana da capital paulista. 

O Scanc é um sistema de informações relativas a operações comerciais de circulação de combustíveis derivados do petróleo que, entre outras coisas, apura e demonstra os valores do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a serem repassados às unidades federadas. 

No mandado de segurança, a empresa sustenta que a revogação do acesso ao Scanc foi nula por violar os deveres de motivação e transparência, tendo em vista que não houve procedimento prévio ou justificativa.

Ao analisar o pedido, o juiz substituto Eduardo Pratavieira, relator da matéria, apontou que bloqueio ocorreu por conta de uma investigação sobre irregularidades diversas cometidas pelo Grupo Copape em conjunto com a distribuidora Aster, que apontam valor superior a R$ 1,3 bi em ICMS não recolhido. 

“Sobre o assunto, restou demonstrado nos autos que a empresa Copape tinha débitos perante o fisco desde julho de 2020 e que solicitou parcelamento também no mês de maio do ano de 2021, tudo a corroborar com as informações prestadas pela autoridade coatora. Ademais, a investigação abrange a impetrante, e trata de suposto conluio em razão da parceria entre as empresas, que fazem parte do mesmo grupo econômico, daí porque não é plausível o argumento de que se trata de repreensão por ato de terceiro”, registrou o juiz. 

Por fim, o julgador conclui que o bloqueio ao sistema Scanc questionado pela empresa visa evitar a continuidade da conduta que está sendo investigada. 

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Processo 1034381-23.2021.8.26.0053

Revista Consultor Jurídico, 9 de junho de 2023, 18h19

ARTIGO DA SEMANA – Cuidado com a Reforma Tributária!

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

A divulgação do Relatório do Grupo de Trabalho Destinado a Analisar e Debater a PEC nº 45/2019 trouxe a tema da Reforma Tributária novamente à tona.

Reforma Tributária é o tema da moda e vem à tona em todo início de mandato.

Como mandatos se iniciam a cada dois anos, a Reforma Tributária está sempre presente no centro das discussões.

Alterar os tributos já discriminados na Constituição antes de se debater o tamanho do Estado não faz o menor sentido. A manutenção de um Estado grande (ou máximo) demanda muitos recursos. Um Estado mínimo não depende tanto do que se arrecada, além de receber uma boa injeção de recursos decorrentes de privatizações.

Também é de se estranhar a preocupação com uma Reforma Tributária ao passo que a legislação tributária infraconstitucional continua caótica.

A complexidade dos tributos brasileiros tem menos origem na Constituição do que na leis que os instituem e na extensa gama de normas infralegais que os regulamentam.

Aliás, os mesmos legisladores que se preocupam em reformar o Sistema Tributário Nacional não demonstram a mesma preocupação em simplificar as normas do PIS/COFINS e do IRPJ, por exemplo.

Igualmente não se pode esquecer a grande tendência do Congresso Nacional em piorar o que poderia simplificar a vida dos contribuintes ou tornar a tributação mais justa.

Antes de inventar IVA, IBS, Imposto Seletivo e cashbacks, os legisladores deveriam olhar para a extensão da não-cumulatividade dos tributos, de modo a garantir a ampla possibilidade de compensação de créditos decorrentes das operações anteriores.

Imaginar a disciplina ou a regulamentação da tributação sobre o valor adicionado por norma infraconstitucional chega a dar calafrios!

Nunca é demais lembrar que a não-cumulatividade do ICMS, nascida da Constituição e aprimorada pela Lei Kandir, vem sendo objeto de sucessivas normas infraconstitucionais que, ao longo do tempo, restringem as possibilidades de creditamento do imposto pago nas etapas anteriores.

Reflita: os mesmos legisladores que pretendem reformar o Sistema Tributário Nacional votaram a aprovaram as Leis Complementares  92/97, 99/99, 114/2002, 122/2006, 138/2010 e 171/2019 que fizeram com que a ampla não-cumulatividade do ICMS somente ocorra a partir de 01/01/2033.

O mesmo Congresso Nacional, que hoje se debruça sobre PECs para introduzir cashback na tributação do consumo, não demonstrou preocupação em provocar o Executivo e/ou aprovar leis que, ao longo dos anos, tenham corrigido a tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, perpetuando uma tributação injusta sobre expressiva camada da população de 2015 ao começo de 2023.

O mesmo Congresso Nacional que defende a Reforma Tributária promulgou diversas Emendas Constitucionais para introduzir novos tributos (CPMF, CIDE, PIS/COFINS-Importação…) e para “constitucionalizar” questões que o STF afirmou ou estava em vias de afirmar serem inconstitucionais (substituição tributária para frente, incidência do ICMS em qualquer importação…).

Portanto, tratando-se de Reforma Tributária, todo cuidado é pouco…

CNI apela ao STF contra norma que veta aproveitamento de créditos do ICMS

Apontando violação da não cumulatividade do tributo e desequilíbrio concorrencial, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) ajuizou no Supremo Tribunal Federal uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra duas normas do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) relativas ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Na ação, a entidade questiona as cláusulas 17ª do Convênio ICMS nº 199/2022 e 17ª do Convênio ICMS nº 15/2023, que vedam a apropriação de créditos de ICMS nas operações e prestações antecedentes às saídas de óleo diesel A, biodiesel (B100), gás liquefeito de petróleo (GLP) e gás liquefeito de gás natural (GLGN), e também da gasolina A e do etanol anidro combustível (EAC), obrigando o contribuinte a estornar eventuais créditos.

Os Convênios 199/2022 e 15/2023 foram editados pelo Confaz após a publicação da Lei Complementar nº 192/22, que instituiu tributação única do ICMS sobre o óleo diesel, biodiesel, GLP, GLGN, gasolina e o etanol anidro combustível.

A CNI alega que os trechos dos convênios são inconstitucionais, pois, ao vedarem o aproveitamento dos créditos, o ICMS passa a ser cumulativo.

“Ao prever a não cumulatividade do ICMS (art. 155, §2º, I), a Constituição Federal teve a clara intenção de atenuar e/ou equilibrar os efeitos da carga tributária sobre o preço final dos produtos comercializados”, argumenta a confederação. “Nessa medida, as normas impugnadas violam a não cumulatividade do ICMS na circulação de cada insumo utilizado na produção de combustível, pois fulminam todo o crédito acumulado nas diversas cadeias econômicas.”

Além disso, segundo a entidade, os trechos das normas favorecem tributariamente os combustíveis que são importados, que, por não apresentarem fases produtivas nacionais anteriores à comercialização, não teriam créditos cujo aproveitamento seria vedado. 

Dessa forma, prossegue a CNI, por tornarem o imposto cumulativo, as cláusulas atacadas acabam tendo efeito direto na “majoração do preço do combustível comercializado ao consumidor final, na medida em que onera toda a cadeia econômica dos produtos”, o que afronta a Constituição.

A confederação alega ainda que a vedação ao aproveitamento do crédito provoca desequilíbrio concorrencial tanto entre as empresas de maior porte, mais verticalizadas, quanto entre as menores.

“Nessas empresas de maior porte, o ICMS das etapas anteriores poderá ser mantido, ao menos em parte, em razão do uso em outras atividades tributadas pelo imposto, ou em função do valor agregado internamente”, observa a entidade. Diante disso, a CNI pede que o STF, inicialmente, conceda liminar para suspender os trechos dos convênios.

Revista Consultor Jurídico, 3 de junho de 2023, 11h49

ARTIGO DA SEMANA – Multas por dados omitidos ou informações incorretas: errar não é humano

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

Quando se aproximava o prazo para a entrega das Declarações de Ajuste Anual do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (DIRPF), a orientação dos especialistas era bastante clara e direta: entregue a declaração de qualquer jeito e, posteriormente, apresente uma declaração retificadora.

Esta orientação, amplamente divulgada em todas mídias, tinha um propósito igualmente claro: evitar a imposição da multa pelo atraso na entrega da declaração.

Se para evitar a multa pelo atraso, basta entregar a DIRPF de qualquer jeito, uma conclusão é inevitável: não há multa para a entrega de DIRPF com incorreções, tampouco pela apresentação de declaração retificadora.

Se isto é verdade para as pessoas físicas, o mesmo não se pode dizer para as pessoas jurídicas.

O art. 7º, IV, da Lei nº 10.426/2002, prevê penalidade para as pessoas jurídicas que apresentem declarações com omissões ou informações incorretas[1].

No Estado do Rio de Janeiro, o art. 62-B, II, da Lei nº 2.657/96[2], também prevê penalidades pela omissão ou informação de dado incorreto em documentos, formulários ou arquivos magnéticos, ainda que posteriormente retificados.

Analisando a questão estritamente sob o prisma da legislação federal, não se pode deixar de enxergar um tratamento desigual entre os contribuintes pessoas físicas e as empresas.

Esta desigualdade, ainda que se sustente o contrário, não encontra respaldo na Constituição. Pessoas físicas e jurídicas devem participar do financiamento do Estado através do pagamento de tributos e ambas estão sujeitas a erros nas declarações que prestam ao fisco federal.

Logo, estabelecer distinção entre pessoas físicas e jurídicas neste particular não é  um critério justo sob o ponto de vista da igualdade tributária.

Seja federal ou estadual, punir um erro que pode ser objeto de retificação igualmente não parece ser justo, sequer razoável.

Se a informação contida na declaração, arquivo, documento ou formulário pode ser retificada, não há motivo para, apenas por esta circunstância, penalizar o contribuinte.

Aliás, a simples constatação do erro pela autoridade tributária já é motivo suficiente para se concluir que a pretensão de se levar vantagem em razão do equívoco foi ineficaz.

Embora o art. 136, CTN, estabeleça que “Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”, já está passando da hora de conferir temperamentos à interpretação deste dispositivo.

Se houve omissão ou erro na prestação de informação, mas a obrigação principal foi cumprida corretamente, ainda que a destempo e com acréscimos moratórios, por que impor uma penalidade formal ao sujeito passivo?

Se houve omissão ou erro na prestação de informação, mas o fisco, recorrendo aos meios normais de fiscalização, identificou a ocorrência do fato gerador e exigiu o tributo devido com os acréscimos decorrentes do procedimento de ofício e no exercício regular da busca da verdade material, por que também exigir uma multa exclusivamente formal?

Perpetuando-se a histórica interpretação do art. 136, do CTN, estaremos condenados a ser contribuintes infalíveis, submetidos a uma inteligência artificial com parâmetros 100% precisos…

Muito melhor seria que a multa formal de que se trata somente fosse exigida nos casos de evidente intuito de fraude ou de claro embaraço à fiscalização. 


[1] Art. 7o O sujeito passivo que deixar de apresentar Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica – DIPJ, Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF, Declaração Simplificada da Pessoa Jurídica, Declaração de Imposto de Renda Retido na Fonte – DIRF e Demonstrativo de Apuração de Contribuições Sociais – Dacon, nos prazos fixados, ou que as apresentar com incorreções ou omissões, será intimado a apresentar declaração original, no caso de não-apresentação, ou a prestar esclarecimentos, nos demais casos, no prazo estipulado pela Secretaria da Receita Federal – SRF, e sujeitar-se-á às seguintes multas:                     

IV – de R$ 20,00 (vinte reais) para cada grupo de 10 (dez) informações incorretas ou omitidas.  

[2] Art. 62-B. O descumprimento de obrigações acessórias relativas à entrega de informações e declarações ensejará a aplicação das seguintes penalidades:
II – indicar informação ou dado incorreto ou omiti-lo em documento, formulário ou arquivo exigido pela legislação:
a) se a retificação for efetuada antes de ciência de intimação:
1) MULTA: equivalente em reais a 1.000 (mil) UFIR-RJ, observado o disposto no art. 70-A.
b) se a retificação for efetuada após a ciência de intimação:
1) MULTA: 0,25 % (vinte e cinco centésimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 1.500 (mil e quinhentas) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 10.000 (dez mil) UFIR-RJ, caso entregue dentro do prazo estabelecido na 1ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo;
2) MULTA: 0,5% (cinco décimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 2.000 (duas mil) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 15.000 (quinze mil) UFIR-RJ caso entregue dentro do prazo estabelecido na 2ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo, sem prejuízo da aplicação da penalidade prevista no inciso I do art. 65 pelo não-atendimento da 1ª intimação;
3) MULTA: 0,75% (setenta e cinco centésimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 2.500 (duas mil e quinhentas) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 20.000 (vinte mil) UFIR-RJ caso entregue dentro do prazo estabelecido na 3ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo, sem prejuízo da aplicação da penalidade prevista nos incisos I e II do art. 65 pelo não-atendimento da 1ª e da 2ª intimações;
c) caso não entregue a retificação dentro do prazo estabelecido na 3ª intimação que a exigiu:
1) MULTA: 1% (um por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais 3.000 (três mil) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 25.000 (vinte e cinco mil) UFIR-RJ, sem prejuízo da aplicação das penalidades previstas nos incisos I a III do art. 65 pelo não-atendimento das intimações e de outras medidas cabíveis;

Primeira Seção vai definir aplicação de regra de restituição de diferenças de ICMS-ST

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai definir, sob o rito dos recursos repetitivos, a aplicação da regra prevista no artigo 166 do Código Tributário Nacional (CTN) na hipótese de substituição tributária para frente.

A questão submetida a julgamento no Tema 1.191 é a seguinte: “Necessidade de observância, ou não, do que dispõe o artigo 166 do CTN nas situações em que se pleiteia a restituição/compensação de valores pagos a maior a título de ICMS no regime de substituição tributária para frente quando a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida”.

Foram selecionados como representativos da controvérsia os REsp 2.034.975, REsp 2.034.977 e REsp2.035.550, de relatoria do ministro Herman Benjamin.

O colegiado determinou a suspensão da tramitação dos recursos especiais e dos agravos em recursos especiais que discutem o tema no STJ e nos tribunais de segunda instância.

O relator destacou a multiplicidade de recursos sobre o assunto no STJ. Em seu voto, citou que, na base da jurisprudência do tribunal, é possível recuperar pelo menos 91 acórdãos e 1.026 decisões monocráticas sobre o assunto, evidenciando o caráter múltiplo da demanda.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica 

O Código de Processo Civil regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros. 

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. 

Leia o acórdão de afetação do REsp 2.034.975.

Fonte: Notícias do STJ

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