TNU decide que não incide IR sobre o Adicional Hora de Repouso e Alimentação

A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu, por maioria, negar provimento ao pedido de uniformização do tema que tratou da incidência tributária do Imposto de Renda (IR) sobre o Adicional Hora de Repouso e Alimentação (AHRA). A decisão foi tomada em sessão ordinária de julgamento.

O pedido de uniformização de interpretação de lei federal (Pedilef) foi interposto pela União contra acórdão da Turma Recursal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte que deu parcial provimento ao recurso da União para declarar a não incidência do IR sobre a verba trabalhista AHRA somente após o início de vigência da Lei nº 13.467/2017. 

Assim, a questão submetida a julgamento foi: “Definir se incide Imposto de Renda sobre o Adicional Hora de Repouso e Alimentação (AHRA) após o advento da Lei nº 13.467/2017 (reforma trabalhista)”.

Voto vencedor
Em seu voto, o juiz federal Francisco Glauber Pessoa Alves, relator do acórdão, relembrou que houve uma inovação legislativa na redação do §4º do artigo 71 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a qual prevê que a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.

O juiz federal também sustentou que o trabalho que se preste em detrimento ao direito ao descanso e saúde é, portanto, fora do que habitualmente se exige e não possui aspecto salarial, mas, sim, indenizatório puro. A regra é que o intervalo de descanso seja sempre observado. Quando não o for, observados os requisitos específicos, o pagamento deverá ser de cunho puramente indenizatório.

“Na seara trabalhista deixaram de existir dúvidas sobre a magnitude do direito constitucional à saúde expressado no direito ao intervalo intrajornada, a compensação pecuniária sob modalidade indenizatória e não mais remuneratória. Muito menos pode valer-se a norma tributária infraconstitucional de uma abrangência que aniquile direitos assentados sob base constitucional clara (arts. 7º, XXII, 194, caput, 197 e 200, II), à luz do sistema protetivo trabalhista com igual arcabouço constitucional, a partir da conformação normativa mais atual conferida pela reforma trabalhista”, apontou o magistrado.

Nesses termos, a Turma Nacional de Uniformização decidiu, por maioria, negar provimento ao pedido, nos termos do voto divergente do juiz federal Pessoa Alves. Ficaram vencidos o relator do processo, juiz federal Francisco de Assis Basilio de Moraes, e os juízes federais Júlio Guilherme Berezoski Shattschneider e Caio Moyses de Lima.

Por fim, a TNU fixou a seguinte tese: “Com o advento da Lei nº 13.467, de 13/7/2017, que deu nova redação ao §4º do art. 71 da CLT e estabeleceu expressamente a natureza indenizatória do pagamento operado pela supressão do intervalo intrajornada, habitualmente conhecido como Adicional Hora de Repouso e Alimentação (AHRA), em conformidade com a proteção constitucional à saúde do trabalhador (arts. 7º, XXII, 194, caput, 197 e 200, II, bem como art. 5º, § 2º, c/c arts. 4º e 5º da Convenção 155 da OIT, incorporada ao direito interno pelo Decreto nº 1.254/1994, hoje consolidada no Decreto nº 10.088/2019 e no art. 7º do Pacto Internacional Relativo aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, incorporado ao direito interno pelo Decreto nº 591/1992), não incide Imposto de Renda sobre a verba paga a tal título” — Tema 306. Com informações da assessoria de imprensa do Conselho da Justiça Federal.

Processo 0520381-15.2020.4.05.8400/RN

O lucro arbitrado na omissão de receitas e o problema da vagueza

Quanto fios de cabelo alguém precisa ter para ser considerado “calvo”? E quantos quilos, para ser considerado “gordo”? Ou quantos anos, para ser considerado “idoso”? Todos esses termos têm em comum a sua inevitável vagueza, marcada pela dificuldade de determinar a sua aplicação aos chamados “casos-limite”.

Como define Humberto Ávila, em recentíssimo estudo sobre o tema, “o que caracteriza a vagueza é a falta de demarcação dos limites de aplicação do significado ou a falta de precisão ou acurácia dessa aplicação” [1]. Essa indeterminação semântica afeta diretamente a aplicação das regras jurídicas, pois torna igualmente indeterminados os limites do alcance da hipótese de aplicação das regras, diante de casos-limites.

No texto de hoje, analisaremos um problema tão recorrente quanto inexplorado na jurisprudência tributária e que se conecta com a questão da vagueza: diante de uma hipótese de omissão de receitas, quando deve ser arbitrado o lucro? [2] Antes de avançarmos, é preciso esclarecermos um pouco mais como essas discussões se conectam.

Omitir receita nada mais é do que deixar de registrar em sua escrituração ganhos tributáveis no resultado do período, gerando uma redução indevida da base de cálculo dos tributos que se conectam com esses ganhos, como IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. A sua verificação pode se dar de duas formas: 1)comprovada, quando a fiscalização colige provas que evidenciam a diferença entre o montante de receitas declaradas e efetivamente ingressadas (p.ex. cotejo da escrituração com pagamentos recebidos por cartão de crédito ou registros de notas fiscais emitidas) ou 2) presumida, com base em previsões legais que estabelecem a presunção de omissão de receita, diante de certos indícios qualificados (p.ex. depósitos bancários de origem não comprovada e saldo credor na conta Caixa).

A conduta de omissão de receitas se conecta com a discussão do Lucro Arbitrado em razão da hipótese de arbitramento prevista no artigo 603, III, do RIR/2018, que determina que se arbitre o lucro quando “a escrituração a que o contribuinte estiver obrigado revelar evidentes indícios de fraudes ou contiver vícios, erros ou deficiências que a tornem imprestável para: i) identificar a efetiva movimentação financeira, inclusive bancária; ou ii) determinar o lucro real“.

A omissão de receitas, tanto presumida como comprovada, é, na melhor das hipóteses, indicativo de vícios, erros ou deficiências na escrituração, quando não se presta a demonstrar fraudes realizadas pelos contribuintes. Entretanto, não são quaisquer erros ou vícios que justificam o arbitramento, mas apenas aqueles que tornem imprestável a escrituração do contribuinte, para os fins estabelecidos em lei.

Ora, a partir de quantos vícios ou erros uma escrituração se torna imprestável? Ou pior, que tipos de vício a tornam imprestável? Lidar com a vagueza dessa qualificação é essencial para que se realize e controle o lançamento tributário, diante da obrigatoriedade do arbitramento, diante das hipóteses legais.

Explica-se: identificada a ocorrência de uma das hipóteses de arbitramento, não há qualquer margem de discricionariedade da fiscalização quanto a escolha de base de cálculo. Pelo contrário, o auditor-fiscal é obrigado realizar o arbitramento, uma vez verificado que se trata de uma hipótese legal para tanto, sob pena de nulidade, por vício material, do lançamento tributário realizado. O Carf tem inúmeros precedentes reconhecendo que “o artigo 47 da Lei nº 8.981, de 1995, ao usar a expressão de que o lucro será arbitrado, nos casos que especifica, não confere faculdade à autoridade fiscal, mas sim comando impositivo quanto à forma de tributação” [3]. Afirma-se, nessa linha, que o arbitramento “não se trata de uma faculdade, mas de efetiva imposição legal” [4] que deve ser observada no lançamento.

Inclusive, a vagueza na aplicação dessa hipótese de arbitramento afeta o crédito tributário em duas oportunidades: a primeira na realização do lançamento, e a segunda na sua revisão, pelos órgãos de contencioso administrativo. Essa constatação, apesar de trivial, é crucial para compreender a relevância dessa questão, pois basta haver uma discrepância de critério entre a administração tributária e o Carf na determinação do que seria “imprestável”, para que o auto de infração seja anulado.

A respeito da apuração do Lucro Arbitrado nas hipóteses de omissão de receita, não identificamos qualquer incompatibilidade da aplicação desse regime de apuração a partir tanto das omissões presumidas quanto das comprovadas. Perante o Direito, a receita apurada por meio da presunção legal é tão válida quanto aquela levantada por meio de provas diretas, e ambas são passíveis de contraprova do contribuinte. Dessa forma, uma vez fixada a receita bruta, ainda que com o cômputo das receitas omitidas, resta afastada peremptoriamente a possibilidade de se aplicar os parâmetros de cálculo do Lucro Arbitrado estabelecidos no artigo 608 do RIR/2018 [5]

Por outro lado, tampouco nos parece que o simples fato de haver receita omitida, por si só, permitiria inferir que a fiscalização deveria se socorrer necessariamente do Lucro Arbitrado. Para essa conclusão, deve-se passar à análise de um outro ponto: a existência ou efetivação do registro de custos e despesas relacionados à receita omitida e escriturada.

Se na escrituração contábil do contribuinte já se encontram registrados custos e despesas, em regra, não havendo nada que justifique a sua desconsideração, deve-se presumir que eles seriam efetivos, pois a omissão ocorre no registro da receita. Entretanto, o simples fato de haver gastos escriturados não significa que basta confrontá-los com a receita omitida e apurar as bases de cálculo. Aqui, a fiscalização deve verificar se os custos e despesas seriam razoavelmente correlacionáveis à essa receita objeto da omissão.

As situações mais comuns são as seguintes: 1) ausência total de escrituração de despesas/custos e receitas (omissão total de receitas e gastos); 2)escrituração de gastos correlacionados estritamente à receita declarada (omissão parcial de receitas e gastos[6]; e 3) escrituração de todos os gastos, e omissão de parte das receitas (omissão parcial das receitas).

Essa verificação da correlação entre receitas omitidas e gastos escriturados é mais factível de ser realizada nas hipóteses de omissão comprovada de receitas, pois é possível se ter uma dimensão real das operações realizadas, mas não declaradas, por meio de notas fiscais emitidas, operações com cartão, outros registros paralelos, controles de Estoque etc. Nesses casos, é possível a fiscalização verificar se os custos registrados (p.ex., de mercadorias vendidas) correspondem às receitas apuradas.

Caso a fiscalização verifique se tratar de uma omissão parcial apenas das receitas, não haveria óbice à apuração do Lucro Real. Entretanto, em se tratando das hipóteses de omissão total ou parcial de receitas e gastos, a fiscalização deveria, antes de partir para o arbitramento, intimar o contribuinte à regularização da sua escrituração, em prazo hábil, considerando a própria subsidiariedade desse método de apuração do lucro [7].

Intimado o contribuinte, duas situações podem ocorrer: 1) o contribuinte atende à fiscalização no prazo, retificando a sua escrituração, razão pela qual poderia ser apurado o Lucro Real; ou 2) ele não atende à fiscalização, autorizando-se ao arbitramento dos lucros, a partir da receita omitida, e desconsiderando a parcela de gastos escriturados.

Por outro lado, nas hipóteses de omissão por presunção de receitas, esse confronto com os gastos é mais problemático, pois o que há é a receita apurada a partir de elementos indiciários, que não permitem essa correlação direta com os gastos total ou parcialmente escriturados. Nesses casos, como dificilmente será possível concluir que a omissão se deu apenas nas receitas, parece-nos que a fiscalização deveria partir diretamente à intimação para correção da escrituração e, a depender do atendimento pelo contribuinte, apurar o Lucro Real ou Arbitrado.

Caso o contribuinte, após intimação para comprovar os seus gastos, não atender essa determinação e por isso sofrer o arbitramento do lucro, não pode posteriormente buscar na esfera administrativa comprovar exaustivamente esses elementos, buscando uma requalificação da base de cálculo para o Lucro Real — como estabelecido pela Súmula Carf nº 59 [8]. De outro giro, em atendendo a intimação, ou sendo a informação escriturada suficiente para a apuração do Lucro Real, não há qualquer óbice de administrativamente demonstrar novos custos e despesas não escriturados e verificados pela fiscalização, em um contexto de revisão da base de cálculo apurado pelo Fisco.

Além desse ângulo da correlação entre os gastos registrados e as receitas apuradas, usualmente utilizado para verificar a imprestabilidade da escrituração, há um segundo ângulo de análise baseado nas diferenças quantitativas entre as receitas declaradas e as omitidas.

Nas hipóteses de omissão parcial de receitas e gastos, e principalmente em razão da ausência de intimação da fiscalização para complementação dos registros contábeis e fiscais, costuma-se verificar o grau de discrepância entre a receita omitida e a declarada, para determinar se se trata de um caso de imprestabilidade da escrituração. 

Nesses casos, parece haver um casuísmo bastante elevado na determinação de qual grau de diferença seria suficiente a justificar que o lucro deveria ser arbitrado, sob pena de se impor uma margem de lucro irreal ao contribuinte. Vejamos alguns exemplos:

i) Ac. nº 1401-001.773 [9]: apurou-se que uma diferença de 65% entre a receita declarada e a receita omitida, seria uma margem de lucro impossível de ser alcançada, justificando o arbitramento;

ii) Ac. nº 9101-003.136 [10]: apurou-se que as receitas declaradas correspondiam a 3,2% das receitas omitidas; reconhecendo a necessidade do arbitramento;

iii) Ac. nº 1301-001.817 [11]: apurou-se que as receitas omitidas correspondiam a 65% das receitas declaradas, decidindo pela obrigatoriedade do Lucro Arbitrado;

iv) Ac. nº 1402-00.456 [12]: manteve-se o arbitramento do lucro pois a receita declarada correspondia a aproximadamente 10% da receita omitida, apurada a partir de depósitos bancários;

v) Ac. nº 1202-001.065 [13]: cancelou-se o lançamento com base no Lucro Real pois a receita omitida era 32% superior à receita declarada, evidenciado a imprestabilidade da escrituração;

vi) Ac. nº 1201-000.621 [14]: a receita omitida correspondia a 76% da receita declarada, justificando o arbitramento;

Recentemente, a CSRF, por meio do Ac. nº 9101-006.018[15], ao analisar a aplicação da presunção do artigo 42 da Lei nº 9.430/1996, aduziu que “a jurisprudência, em casos de absurda discrepância entre o que foi omitido e o que foi declarado/escriturado, vem flexibilizando a manutenção do regime pelo Lucro Real, considerando aplicável o arbitramento“.

Mais do que tentar estabelecer uma média “numérica”, um exame qualitativo dos casos permite inferir que na maioria deles, ao se apurar essa diferença quantitativa entre receita omitida e declarada, analisa-se se a adição da primeira à segunda não geraria margens de lucro irreais para as atividades das pessoas jurídicas fiscalizadas, até mesmo porque não se pode perder de vista que o tributo não é instrumento de sanção ao contribuinte que não mantém a regularidade de suas obrigações acessórias.

Considerando essa preocupação, o problema se torna como se chegar a uma margem de lucro parâmetro, para fins de cotejo com o caso concreto?

Há casos em que as margens são evidentemente irreais, onde não há o problema da vagueza em relação à imprestabilidade, pela “absurda discrepância”. Mas há situações em que essas margens entram em um campo de indeterminação prática que parece apontar para dois caminhos possíveis: 1) a utilização de provas apresentadas pela própria fiscalização ou pelo contribuinte, a respeito da margem de lucro média do setor; ou 2) adotar como parâmetro as margens presumidas pela própria legislação do imposto de renda, na apuração do Lucro Arbitrado, com fulcro no artigo 605 do RIR/2018.

Como se viu, a hipótese de arbitramento do lucro sob análise é, inescapavelmente, vaga. Não há como se determinar aprioristicamente o que seria uma escrituração imprestável, nos termos do artigo 605, III do RIR/2018. Isso não quer dizer que não se possa pensar em parâmetros para análise dos casos, ou mesmo de procedimentos no âmbito das fiscalizações, voltadas a contornar essa dificuldade de definição sem que se caia em um casuísmo jurisprudencial. 

A observância dos parâmetros propostos acima nos parece trazer uma maior operacionalidade prática à apuração dos tributos em hipóteses de omissão de receitas, com um ganho de segurança para os contribuintes e para a fiscalização.

*Retomando os trabalhos da Direto do Carf, todos os colunistas desejam um feliz 2023 aos nossos leitores, esperando que sigam acompanhando e consultando nossas considerações sobre a jurisprudência do Carf nesse ano vindouro.


[1] ÁVILA, Humberto. Teoria da Indeterminação no Direito. São Paulo: Malheiros, 2022, p.37-38.

[2] O tema foi explorado por mim e pelo colunista Fernando Brasil de Oliveira Pinto no artigo “O Lucro Arbitrado nas Hipóteses de Omissão de Receitas” (In: Marcelo Magalhães Peixoto; Alexandre Evaristo Pinto. (Org.). 100 anos do Imposto sobre a Renda no Brasil. 1ed.São Paulo: MP Editora, 2022, v. 1, p. 321-338). As reflexões trazidas aqui partem das considerações lá propostas para avançar na sistematização do tema.

[3] Ac. nº 1402-000.728, Rel. Moisés Giacomelli, j. 29/09/2011.

[4] Ac. nº 1201-004.787, rel. Efigênio de Freitas, j. 14/4/2021. No mesmo sentido, Ac. nº 1302-004.548, rel. Paulo Henrique Silva Figueiredo, j. 18/6/2020.

[5] Art. 608. O lucro arbitrado, quando não conhecida a receita bruta, será determinado por meio de procedimento de ofício, com a utilização de uma das seguintes alternativas de cálculo (…)

[6] Nesse caso, pode haver a escrituração de parte dos gastos relacionados à receita omitida.

[7] Nesse sentido, Ac. 1402-001.606, rel. Fernando Brasil de O. Pinto, j. 12/3/2014. No mesmo sentido, acórdãos nº 1302-002.915 e 9101-003.644.

[8] “A tributação do lucro na sistemática do lucro arbitrado não é invalidada pela apresentação, posterior ao lançamento, de livros e documentos imprescindíveis para a apuração do crédito tributário que, após regular intimação, deixaram de ser exibidos durante o procedimento fiscal”.

[9] Redator Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, j. 26/1/2017.

[10] Rel. Gerson Guerra, j. 03/11/2017.

[11] Rel. Wilson Fernandes Guimarães, j. 24/3/2015.

[12] Rel. Moisés Giacomelli, j. 25/2/2011.

[13] Rel. Orlando José Gonçalves Bueno, j. 7/11/2013.

[14] Rel. Guilherme Adolfo dos Santos Mendes, j. 24/11/2011.

[15] Rel. Luis Henrique Marotti Toselli, j. 28/3/2022.

Carlos Augusto Daniel Neto é sócio do escritório Daniel & Diniz Advocacia Tributária, em estágio pós-doutoral em Direito Tributário na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), doutor em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, ex-conselheiro titular da 1ª e 3ª Seções do Carf, pesquisador do NEF/FGV e do Nupem/IBDT e professor permanente do mestrado profissional do Cedes e de diversos cursos de pós-graduação.

Revista Consultor Jurídico, 11 de janeiro de 2023, 9h28

Ajuda de custo do home office não integra base de IR e contribuições ao INSS

Os valores pagos aos empregados como ajuda de custo pela prestação de serviços no regime de teletrabalho não devem ser incluídos na base de cálculo das contribuições previdenciárias, nem do imposto de renda de pessoa física (IRPF) dos funcionários, e podem ser deduzidos na apuração do imposto de renda de pessoa jurídica (IRPJ).

Esta é a interpretação manifestada pela Receita Federal em recente solução de consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que orienta fiscais do país.

A consulta foi feita por uma fabricante de refrigerantes e refrescos, que adotou o home officedurante a crise de Covid-19 e pretendia arcar com as despesas dos funcionários referentes à internet e ao consumo de energia elétrica durante o período de expediente.

O auditor-fiscal Amilson Melo Santos explicou que, conforme a Lei 8.212/1991, as contribuições previdenciárias incidem sobre valores destinados à retribuição do trabalho do empregado. Por outro lado, a ajuda de custo busca ressarcir despesas decorrentes do teletrabalho e deixa de ser paga caso o funcionário volte a trabalhar presencialmente.

Assim, Santos concluiu que tais valores representam ganhos eventuais, com caráter indenizatório, e consequentemente são excluídos da base de cálculo das contribuições previdenciárias. Porém, o auditor ressaltou a necessidade de se comprovar documentalmente que o montante é apenas uma indenização.

Com relação ao IRPF, Santos lembrou que a legislação determina sua incidência sobre o acréscimo patrimonial do contribuinte. No caso da ajuda de custo, ocorre, na verdade, a restituição do patrimônio. Mesmo assim, também é necessária a comprovação documental da natureza indenizatória dos valores.

Já no caso da determinação do lucro real para apuração do IRPJ, uma despesa é considerada dedutível quando é indispensável e usual à atividade exercida pela empresa.

O Fisco entendeu que a ajuda de custo pelo teletrabalho pode ser considerada operacional, pois tem relação com a atividade da empresa e com a manutenção da fonte produtora. Da mesma forma, é preciso comprovar, com documentos, “a necessidade, usualidade e normalidade das verbas”.

Clique aqui para ler a solução de consulta
SC 63/2022

Revista Consultor Jurídico, 29 de dezembro de 2022, 13h49

ARTIGO DA SEMANA – Retrospectiva Tributária/2022 – PARTE 1

João Luís de Souza Pereira – Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das Pós-graduações da FGV Direito Rio e do IAG PUC-Rio

Chegando ao fim de mais um exercício financeiro, é hora de conferir as principais decisões dos Tribunais Superiores em matéria tributária.

Embora 2022 tenha sido um ano impactado pelas eleições para a Presidência da República, Governos Estaduais, Câmara de Deputados, Assembleias Legislativas e 1/3 do Senado, várias questões importantes foram apreciadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.

Vamos recordá-las, mês a mês, dedicando esta primeira parte àquelas ocorridas no primeiro semestre.

JANEIRO

STJ – Primeira Turma decide que não incide ICMS sobre serviço de provimento de capacidade de satélite

Em julgamento realizado em janeiro, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ratificando orientação pacificada no Tema 427 dos Recursos Repetitivo, decidiu que não incide ICMS sobre o serviço de provimento de capacidade de satélite.

No julgamentos dos Recursos Especiais 1.473.550[1] e 1.474.142, a Primeira Turma do STJ decidiu que “Os satélites disponibilizados não passam de meios para que seja prestado o serviço de comunicação, sendo irrelevante para a subsunção tributária que se argumente no sentido que há retransmissão ou ampliação dos sinais enviados”, explicou o ministro.

Em resumo, o STJ decidiu que os satélites são meros meios disponibilizados para que outras empresas efetuem serviços de telecomunicação.

FEVEREIRO

 STF – Regra do CPC sobre efeito suspensivo se aplica a embargos em execução fiscal, decide STF

No julgamento virtual da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5165[2] proposta pelo Conselho Federal da OAB, o Plenário do STF concluiu que é constitucional a regra do art. 739-A do CPC/73  (art. 919, do CPC/2015) relativamente às execuções fiscais da dívida ativa tributária.

À luz da orientação do STF, portanto, não há inconstitucionalidade na norma que não adota como regra a atribuição de efeito suspensivo aos embargos às execuções fiscais. 

Segundo a ministra Cármen Lúcia, relatora, a nova sistemática está de acordo com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, na medida em que confere ao juiz a concessão do efeito suspensivo a partir de análise e decisão sobre a situação concreta.

A relatora também afirmou que “mesmo quando o juiz nega efeito suspensivo aos embargos à execução fiscal, não é possível à Fazenda Pública obter os bens penhorados ou levantar o valor do depósito em juízo antes do trânsito em julgado da sentença dos embargos, conforme previsão da Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/1980). Por esse motivo, não há ofensa ao devido processo legal, ao contraditório, à ampla defesa e ao direito de propriedade do executado”.

 STF declara a inconstitucionalidade de leis estaduais que regulamentam imposto sobre heranças e doações no exterior.

No julgamento das ADIs 6817, 6829, 6832 e 6837, de relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, ajuizadas contras leis dos Estados de Pernambuco, do Acre, do Espírito Santo e do Amapá; ADIs 6821 e 6824, de relatoria do ministro Alexandre de Moares, contra leis do Maranhão e de Rondônia; ADIs 6825, 6834 e 6835, relatadas pelo ministro Edson Fachin, contra leis do Rio Grande do Sul, do Ceará e da Bahia; ADIs 6822, 6827 e 6831, relatadas pelo ministro Roberto Barroso, contra leis da Paraíba, do Piauí e de Goiás; e ADIs 6836 e 6839, de relatoria da ministra Cármen Lúcia, ajuizadas contra leis do Amazonas e de Minas Gerais, o Plenário do STF reafirmou que o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e de Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), nas doações e heranças instituídas no exterior, não pode ser regulamentado pelos estados, em razão da ausência de lei complementar federal sobre a matéria. 

As decisões do STF no julgamento dessas 14 (catorze) ADIs estão em consonância com a posição do Tribunal no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 851108, com repercussão geral, com tese fixada no Tema 825[3]

Segundo o STF, os estados e o Distrito Federal não têm competência legislativa para instituir a cobrança do imposto quando o doador tiver domicílio ou residência no exterior ou se a pessoa falecida possuir bens, tiver sido residente ou domiciliada ou tiver seu inventário processado no exterior. Nos termos do artigo 155, parágrafo 1°, inciso III, da Constituição Federal, a competência para a instituição do ITCMD deve ser disciplinada por lei complementar federal.

As decisões nas ADIs sofreram modulação de efeitos, de modo que só terão a partir da data da publicação do acórdão do RE 851108 (20/4/2021), ressalvando-se as ações pendentes de conclusão, até a mesma data, em que se discuta a qual estado o contribuinte deveria efetuar o pagamento do ITCMD, considerando a ocorrência de bitributação, ou a validade da cobrança do imposto, se não pago anteriormente.

MARÇO

STF –  Taxas de administração de cartão de crédito/débito não podem ser excluídas da base de cálculo do PIS/COFINS

O Plenário do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.049.811, decidiu que as taxas pagas às administradoras de cartões de crédito e débito devem ser incluídas, pelas empresas vendedoras, na sua base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Como se trata de julgamento de matéria com repercussão geral reconhecida, foi fixada a tese sobre o assunto, resultando no Tema 1024[4]

Segundo o STF, as taxas administrativas que posteriormente serão repassadas às empresas de cartões de crédito devem ser tributadas na origem, por constituírem custo operacional a ser incluído na receita das empresas que receberam o pagamento por cartão.

 STF –  Entidades religiosas que prestam assistência social podem ter imunidade tributária

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que entidades religiosas podem se beneficiar da imunidade tributária conferida às instituições de assistência social, abrangendo, além de impostos sobre o seu patrimônio, renda e serviços, os tributos sobre a importação de bens a serem utilizados na consecução de seus objetivos estatutários.

No julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 630790, com repercussão geral reconhecida (Tema 336[5]), o Tribunal entendeu que a filantropia exercida com base em preceitos religiosos não desvirtua a natureza assistencial das entidades, para fins de direito à imunidade prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição Federal.

Segundo o Min. Luís Roberto Barroso, relator, “O alcance da imunidade é determinado pela destinação dos recursos auferidos pela entidade, e não pela origem ou natureza da renda”.

STJ – IRPJ e CSLL não incidem sobre valor decorrente de pagamento adiado de ICMS

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que é ilegal a cobrança do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) em relação aos ganhos obtidos por empresa beneficiada com pagamento adiado do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), concedido como incentivo fiscal[6].

Por unanimidade, o colegiado entendeu que o fisco, ao considerar esses ganhos como lucro, possibilita que a União retire, indiretamente, o incentivo fiscal concedido pelos estados, o que levaria ao esvaziamento ou à redução do benefício. 

O caso concreto versou sobre incentivo concedido pelo fisco de Santa Catarina, segundo o qual o pagamento diferido de parte do ICMS poderá ser realizado após 36 meses, acrescido de juros simples, mas sem correção monetária. 

De acordo a Secretaria da Receita Federal, esse valor equivaleria a lucro, base de cálculo de incidência do IRPJ e da CSLL. 

No STJ, a empresa sustentou que subvenção para investimento é toda vantagem fiscal concedida pelo poder público. 

A relatora do recurso, ministra Regina Helena Costa, lembrou que o STJ, ao julgar o EREsp 1.517.492, definiu que o crédito presumido de ICMS não pode ser incluído na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, independentemente de os créditos se enquadrarem em uma categoria específica de subvenção. Para a magistrada, a mesma tese se aplica ao pagamento diferido do ICMS.

Ainda segundo a relatora, “A base de cálculo do tributo haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência”. 

STJ – É possível compensar tributo pago indevidamente antes do mandado de segurança que admitiu a compensação

A Primeira Seção do STJ, no julgamento dos Embargos de Divergência nº 1.770.495, definiu a possibilidade de serem compensados os tributos pagos indevidamente antes da impetração do mandado de segurança que reconheceu o direito à compensação, desde que ainda não atingidos pela prescrição[7].

De acordo com o relator dos embargos de divergência, ministro Gurgel de Faria, o reconhecimento, no mandado de segurança, do direito à compensação de valores indevidamente recolhidos antes da impetração, e ainda não atingidos pela prescrição, não implica produção de efeito patrimonial pretérito – vedado pela Súmula 271 do STF –, “visto que não há quantificação dos créditos a compensar e, por conseguinte, provimento condenatório em desfavor da Fazenda Pública à devolução de determinado valor, o qual deverá ser calculado posteriormente pelo contribuinte e pelo fisco no âmbito administrativo, segundo o direito declarado judicialmente ao impetrante”.

STJ – Base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado

 ​No julgamento do Recurso Especial 1.937.821, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou teses importantes sobre o cálculo do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) nas operações de compra e venda, que passam a constituir o Tema 1.113[8].

Relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, afirmou que “No que tange à base de cálculo, a expressão ‘valor venal’ contida no artigo 38 do CTN deve ser entendida como o valor considerado em condições normais de mercado para as transmissões imobiliárias”.

Para o STJ, embora seja possível delimitar um valor médio dos imóveis no mercado, a avaliação de cada bem negociado pode sofrer oscilações positivas ou negativas, a depender de circunstâncias específicas. 

Afastando a utilização da base de cálculo do IPTU para o cálculo do imposto sobre a transmissão, o STJ decidiu que a base de cálculo do ITBI deve considerar o valor de mercado do imóvel individualmente determinado, afetado também por fatores como benfeitorias, estado de conservação e as necessidades do comprador e do vendedor, motivo pelo qual o lançamento desse imposto ocorre, como regra, por meio da declaração do contribuinte, ressalvado ao fisco o direito de revisar a quantia declarada, mediante procedimento administrativo que garanta o exercício do contraditório e da ampla defesa. 

ABRIL

STF – Autoridade fiscal pode anular atos praticados para dissimular tributo

Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a validade do art. 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN), introduzido artigo 1º da Lei Complementar 104/2001, que permite à autoridade fiscal desconsiderar atos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária. 

A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2446[9], na sessão virtual encerrada em 08/04/2022.

Segundo a relatora, ministra Cármen Lúcia, a desconsideração autorizada pelo dispositivo está limitada aos atos ou negócios jurídicos praticados com intenção de dissimulação ou ocultação de fato gerador que, além de estar previsto em lei, já tenha se materializado. Ou seja, o Fisco estará autorizado apenas a aplicar base de cálculo e alíquota a uma hipótese de incidência estabelecida em lei e que tenha se realizado.

Para a relatora, também não procede a alegação de que o art. 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN), retira incentivo ou estabelece proibição ao planejamento tributário das pessoas físicas ou jurídicas. Na sua avaliação, a norma não proíbe o contribuinte de buscar economia fiscal pelas vias legítimas, realizando suas atividades de forma menos onerosa, e, assim, deixar de pagar tributos quando não for configurado fato gerador cuja ocorrência tenha sido licitamente evitada.

A min. Cármen Lúcia também afirmou que a denominação “norma antielisão”, como a regra é conhecida, é inapropriada, pois o dispositivo trata de combate à evasão fiscal, instituto diverso. Na elisão fiscal, há diminuição lícita dos valores tributários devidos, pois o contribuinte evita a relação jurídica geradora da obrigação tributária, enquanto, na evasão fiscal, o contribuinte atua de forma a ocultar fato gerador para omitir-se ao pagamento da obrigação tributária devida.

Os ministros Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes divergiram da relatora, entendendo que, por ser uma medida extrema, a nulidade ou a desconsideração de atos e negócios jurídicos alegadamente simulados cabe ao Judiciário, e não à autoridade administrativa. 

MAIO

STJ – Repetitivo veda créditos de PIS/Pasep e Cofins sobre aquisição no regime monofásico

 A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.093), por maioria de votos,fixou cinco teses relativas ao creditamento de PIS/Pasep e Cofins no sistema monofásico e à legislação que disciplina o Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto). As teses são as seguintes:

1 – É vedada a constituição de créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins sobre o custo de aquisição (artigo 13 do Decreto-Lei 1.598/1977) de bens sujeitos à tributação monofásica (artigos 3º, inciso I, alínea “b”, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003).

2 – O benefício instituído no artigo 17 da Lei 11.033/2004 não se restringe às empresas que se encontram inseridas no regime específico de tributação denominado Reporto.

3 – O artigo 17 da Lei 11.033/2004 diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor; portanto, não permite a constituição de créditos da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins sobre o custo de aquisição (artigo 13 do Decreto-Lei 1.598/1977) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelo artigo 3º, inciso I, alínea “b”, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003.

4 – Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins não é incompatível com a técnica do creditamento, visto que se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa, que pode adquirir e revender conjuntamente bens sujeitos à não cumulatividade em incidência plurifásica, os quais podem lhe gerar créditos.

5 – O artigo 17 da Lei 11.033/2004 apenas autoriza que os créditos gerados na aquisição de bens sujeitos à não cumulatividade (incidência plurifásica) não sejam estornados (sejam mantidos) quando as respectivas vendas forem efetuadas com suspensão, isenção, alíquota zero ou não incidência da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, não autorizando a constituição de créditos sobre o custo de aquisição (artigo 13 do Decreto-Lei 1.598/1977) de bens sujeitos à tributação monofásica.

JUNHO

STF afasta incidência do IR sobre pensões alimentícias decorrentes do direito de família

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5422[10], afastou a incidência do Imposto de Renda (IR) sobre valores recebidos a título de alimentos ou de pensões alimentícias. 

De acordo com o Min. Dias Toffoli, relator, os alimentos ou pensão alimentícia oriundos do direito de família não são renda nem provento de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas simplesmente montantes retirados dos rendimentos recebidos pelo pagador (alimentante) para serem dados ao beneficiário. “O recebimento desses valores representa tão somente uma entrada de valores”, apontou.

Para o relator, o devedor dos alimentos ou da pensão alimentícia, ao receber a renda ou o provento (acréscimos patrimoniais) sujeitos ao IR, retira disso parcela para pagar a obrigação. Assim, a legislação questionada provoca a ocorrência de bitributação camuflada e sem justificação legítima, violando o texto constitucional.

Consequentemente, o Plenário deu interpretação conforme a Constituição Federal ao artigo 3º, parágrafo 1º, da Lei 7.713/1988, aos artigos 4º e 46 do Anexo do Decreto 9.580/2018 e aos artigos 3º, caput e parágrafos 1º e 4º, do Decreto-lei 1.301/1973, que preveem a incidência de IR nas obrigações alimentares.

Os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Nunes Marques ficaram parcialmente vencidos, entendendo que as pensões devem ser somadas aos valores do responsável legal, aplicando-se a tabela progressiva do IR para cada dependente, ressalvada a possibilidade de o alimentando declarar individualmente o Imposto de Renda.

STJ – Primeira Seção fixa teses para o bloqueio de ativos do executado pelo BacenJud em caso de parcelamento

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou orientações para o bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BacenJud, em caso de concessão de parcelamento do crédito tributário: 1) será levantado o bloqueio se a concessão for anterior à constrição; e 2) fica mantido o bloqueio se a concessão ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora on-line por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade.  

Segundo o relator do Tema 1.012[11], ministro Mauro Campbell Marques, a jurisprudência do STJ há muito já firmou entendimento no sentido de que o parcelamento de créditos tributários, na forma do artigo 151, VI, do Código Tributário Nacional (CTN), suspende a sua exigibilidade, acarretando, por consequência, a suspensão da execução fiscal. 

Todavia, o parcelamento não afasta a constrição de valores bloqueados anteriormente, “de modo que a suspensão da exigibilidade decorrente de parcelamento mantém a relação jurídica processual no estado em que ela se encontra, isto é, se inexiste penhora, a suspensão do feito obsta a realização posterior de medidas constritivas, ao menos enquanto o parcelamento estiver vigendo; de outro lado, as medidas de constrição já efetivadas deverão ser preservadas até a integral quitação ou a eventual rescisão do parcelamento”. 

Ainda de acordo com o relator, “Havendo ou não, conforme previsão legal, a necessidade de garantia do débito para fins de concessão de parcelamento fiscal, as leis federais que veiculam parcelamentos fiscais trazem em seu bojo, via de regra, a determinação de manutenção das garantias ou dos gravames prestados em execução fiscal ou medida cautelar fiscal, conforme o caso, na hipótese de concessão do parcelamento, ou seja, a adesão do contribuinte ao benefício fiscal não implica a liberação dos bens e direitos que tenham sido constituídos em garantia dos valores objeto do parcelamento”. 

STJ – Primeira Seção altera tese repetitiva para permitir inclusão do ICMS na base de cálculo da CPRB

​Considerando o que foi julgado pelo STF no Tema 1048 da Repercussão Geral, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) alterou a tese fixada no Tema 994[12] dos recursos repetitivos, que passou a vigorar com a seguinte redação: “é constitucional a inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB)”.


[1] PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AFASTAMENTO DA ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. ICMS. INCIDÊNCIA SOBRE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO. ICMS-COMUNICAÇÃO. SERVIÇO DE PRESTAÇÃO DE CAPACIDADE DE SATÉLITE. NÃO INCIDÊNCIA. FATO QUE ESCAPA DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. SERVIÇO SUPLEMENTAR À PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EXCEPCIONAL POSSIBILIDADE DE READEQUAÇÃO.

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5. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, “a incidência do ICMS, no que se refere à prestação dos serviços de comunicação, deve ser extraída da Constituição Federal e da LC 87/96, incidindo o tributo sobre os serviços de comunicação prestados de forma onerosa, através de qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza (art. 2º, III, da LC 87/96)” (REsp 1176753/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/11/2012, DJe 19/12/2012).

6. A Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 816.512/PI, julgado na sistemática do art. 543-C do CPC/1973, decidiu que o ICMS somente incide sobre o serviço de telecomunicação propriamente dito, e não sobre as atividades-meio e serviços suplementares.

7. O caso dos autos, em que se discute a incidência do ICMS-Comunicação sobre os serviços de provimento de capacidade de satélite, também segue a linha dos demais precedentes do Superior Tribunal de Justiça, no sentido da não tributação de serviços suplementares ou atividades-meio. Os satélites disponibilizados se constituem em meios para que seja prestado o serviço de comunicação, escapando à hipótese de incidência do imposto.

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(REsp n. 1.473.550/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 4/2/2022.)

[2] AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 739-A DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 E 919 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE EFEITO SUSPENSIVO AUTOMÁTICO. APLICABILIDADE DESSAS NORMAS À EXECUÇÃO FISCAL. AUSÊNCIA DE OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, AO CONTRADITÓRIO, À AMPLA DEFESA E AO DIREITO DE PROPRIEDADE E AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE, DA PROPORCIONALIDADE E DA ISONOMIA. AÇÃO DIRETA JULGADA IMPROCEDENTE.

[3] Tese: É vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional.

[4] Tese: É constitucional a inclusão dos valores retidos pelas administradoras de cartões na base de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS devidas por empresa que recebe pagamentos por meio de cartões de crédito e débito.

[5] Tese: As entidades religiosas podem se caracterizar como instituições de assistência social a fim de se beneficiarem da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da Constituição, que abrangerá não só os impostos sobre o seu patrimônio, renda e serviços, mas também os impostos sobre a importação de bens a serem utilizados na consecução de seus objetivos estatutários.

[6] PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. IRPJ. CSLL. BASE DE CÁLCULO. INCENTIVO FISCAL. REGIME ESPECIAL DE PAGAMENTO DO ICMS. PRODEC. PRETENSÃO DE CARACTERIZAÇÃO COMO RENDA OU LUCRO. PACTO FEDERATIVO. IMPOSSIBILIDADE.

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III – Configura ilegalidade exigir, das empresas submetidas ao regime especial de pagamento do Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense – PRODEC, a integração, à base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do montante obtido com o incentivo fiscal outorgado pelo Estado de Santa Catarina, qual seja, o “[…] pagamento diferido do ICMS, relativo a 60% sobre o incremento resultante pelo estabelecimento da empresa naquele Estado-membro, e que será adimplido no 36° mês, sem correção monetária, sendo devidos apenas juros simples anuais de 4% (quatro por cento) […]”.

IV – Ao considerar tal soma como lucro, o entendimento manifestado pelo Fisco (Ato Declaratório Interpretativo SRF n. 22/2003), sufraga, em última análise, a possibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou.

V – Tal orientação leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo, em especial porque fundamentado exclusivamente em ato infralegal.

VI – O modelo federativo abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada.

VII – Em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados.

VIII – A Constituição da República atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar.

IX – A concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo.

Embora represente renúncia a parcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar o atendimento a um plexo de interesses estratégicos para a unidade federativa, associados às prioridades e às necessidades locais coletivas.

X – A tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação.

XI – Não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com o princípio da subsidiariedade, que reveste e protege a autonomia dos entes federados.

XII – O abalo na credibilidade no programa estatal proposto pelo Estado-membro acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados, porquanto, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias.

XIII – A base de cálculo do tributo haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência.

XIV – A 1ª Seção deste Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o EREsp n. 1.443.771/RS, assentou que o crédito presumido de ICMS, a par de não se incorporar ao patrimônio da contribuinte, não constitui lucro, base imponível do IRPJ e da CSLL, sob o entendimento segundo o qual a concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo. Axiologia da ratio decidendi que afasta, igualmente, a pretensão de caracterização, como renda ou lucro, de montante outorgado, de igual forma, no contexto de incentivo fiscal relativo ao ICMS, o qual fora estabelecido, neste caso, no bojo do Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense – PRODEC.

XV – Recurso Especial provido.

(REsp n. 1.222.547/RS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 8/3/2022, DJe de 16/3/2022.)

[7] TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. NATUREZA DECLARATÓRIA. COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO. POSSIBILIDADE. SÚMULA 213 STJ.

1. Esta Corte de Justiça possui o entendimento de que “o mandado de segurança constitui instrumento adequado à declaração do direito à compensação do indébito recolhido em período anterior à impetração, observado o prazo prescricional de 5 (cinco) anos contados retroativamente a partir da data do ajuizamento da ação mandamental” (AgInt no REsp n. 1.778.268/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 2/4/2019).

2. Tal entendimento foi mais uma vez reafirmado por ocasião da apreciação dos embargos de divergência no EREsp n. 1.770.495/RS, reconhecendo que a declaração do direito à compensação tributária permite o aproveitamento de valores referentes a indébitos recolhidos nos cinco anos anteriores à data da impetração.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp n. 1.898.418/CE, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 15/2/2022, DJe de 25/2/2022.)

[8] Tese firmada: a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação; 

b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN); 

c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

[9] EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR N. 104/2001. INCLUSÃO DO PARÁGRAFO ÚNICO AO ART. 116 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL: NORMA GERAL ANTIELISIVA. ALEGAÇÕES DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, DA LEGALIDADE ESTRITA EM DIREITO TRIBUTÁRIO E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NÃO CONFIGURADAS. AÇÃO DIRETA JULGADA IMPROCEDENTE.

(ADI 2446, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 11/04/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-079  DIVULG 26-04-2022  PUBLIC 27-04-2022)

[10] EMENTA Ação direta de inconstitucionalidade. Legitimidade ativa. Presença. Afastamento de questões preliminares. Conhecimento parcial da ação. Direito tributário e direito de família. Imposto de renda. Incidência sobre valores percebidos a título de alimentos ou de pensão alimentícia. Inconstitucionalidade. Ausência de acréscimo patrimonial. Igualdade de gênero. Mínimo existencial. 1. Consiste o IBDFAM em associação homogênea, só podendo a ele se associarem pessoas físicas ou jurídicas, profissionais, estudantes, órgãos ou entidades que tenham conexão com o direito de família. Está presente, portanto, a pertinência temática, em razão da correlação entre seus objetivos institucionais e o objeto da ação direta de inconstitucionalidade. 2. Afastamento de outras questões preliminares, em razão da presença de procuração com poderes específicos; da desnecessidade de se impugnar dispositivo que não integre o complexo normativo questionado e da possibilidade de se declarar, por arrastamento, a inconstitucionalidade de disposições regulamentares e de outras disposições legais que possuam os mesmos vícios das normas citadas na petição inicial, tendo com elas inequívoca ligação. 3. A inconstitucionalidade suscitada está limitada à incidência do imposto de renda sobre os valores percebidos a título de alimentos ou de pensões alimentícias oriundos do direito de família. Ação da qual se conhece parcialmente, de modo a se entender que os pedidos formulados alcançam os dispositivos questionados apenas nas partes que tratam da aludida tributação. 4. A materialidade do imposto de renda está conectada com a existência de acréscimo patrimonial, aspecto presente nas ideias de renda e de proventos de qualquer natureza. 5. Alimentos ou pensão alimentícia oriundos do direito de família não se configuram como renda nem proventos de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas montante retirado dos acréscimos patrimoniais recebidos pelo alimentante para ser dado ao alimentado. A percepção desses valores pelo alimentado não representa riqueza nova, estando fora, portanto, da hipótese de incidência do imposto. 6. Na esteira do voto-vista do Ministro Roberto Barroso, “[n]a maioria dos casos, após a dissolução do vínculo conjugal, a guarda dos filhos menores é concedida à mãe. A incidência do imposto de renda sobre pensão alimentícia acaba por afrontar a igualdade de gênero, visto que penaliza ainda mais as mulheres. Além de criar, assistir e educar os filhos, elas ainda devem arcar com ônus tributários dos valores recebidos a título de alimentos, os quais foram fixados justamente para atender às necessidades básicas da criança ou do adolescente”. 7. Consoante o voto-vista do Ministro Alexandre de Moraes, a tributação não pode obstar o exercício de direitos fundamentais, de modo que “os valores recebidos a título de pensão alimentícia decorrente das obrigações familiares de seu provedor não podem integrar a renda tributável do alimentando, sob pena de violar-se a garantia ao mínimo existencial”. 8. Vencidos parcialmente os Ministro Gilmar Mendes, Edson Fachin e Nunes Marques, que sustentavam que as pensões alimentícias decorrentes do direito de família deveriam ser somadas aos valores de seu responsável legal aplicando-se a tabela progressiva do imposto de renda para cada dependente, ressalvando a possibilidade de o alimentando realizar isoladamente a declaração de imposto de renda. 9. Ação direta da qual se conhece em parte, relativamente à qual ela é julgada procedente, de modo a dar ao art. 3º, § 1º, da Lei nº 7.713/88, ao arts. 4º e 46 do Anexo do Decreto nº 9.580/18 e aos arts. 3º, caput e § 1º; e 4º do Decreto-lei nº 1.301/73 interpretação conforme à Constituição Federal para se afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias.

(ADI 5422, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 06/06/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-166  DIVULG 22-08-2022  PUBLIC 23-08-2022)

[11] Tese firmada: O bloqueio de ativos financeiros do executado via sistema BACENJUD, em caso de concessão de parcelamento fiscal, seguirá a seguinte orientação: (i) será levantado o bloqueio se a concessão é anterior à constrição; e (ii) fica mantido o bloqueio se a concessão ocorre em momento posterior à constrição, ressalvada, nessa hipótese, a possibilidade excepcional de substituição da penhora online por fiança bancária ou seguro garantia, diante das peculiaridades do caso concreto, mediante comprovação irrefutável, a cargo do executado, da necessidade de aplicação do princípio da menor onerosidade.

[12] Tese firmada: É constitucional a inclusão do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta – CPRB.

ARTIGO DA SEMANA – IRPF e Preservação do Mínimo Existencial 

João Luís de Souza Pereira – Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV-Direito Rio e do IAG/PUC-Rio

Após indicar o futuro Ministro da Fazenda e ser diplomado pelo TSE, Luís Inácio Lula da Silva criticou a dedução das despesas médicas na determinação da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).

Segundo o presidente eleito, o fato da população de baixa renda não realizar esta despesa – e consequentemente não ter como abatê-la – acaba por gerar uma situação de injustiça, na medida em que, em sua opinião, o pobre é quem paga o tratamento médico da classe média.

O raciocínio do presidente eleito, obviamente, não leva em consideração o que se deve entender por tributação justa, sob a perspectiva daqueles que pagam o IRPF.

Constitui absoluto consenso entre os pensadores do Direito Tributário, aqui rendendo todas as homenagens ao saudoso Ricardo Lobo Torres, que a tributação não pode comprometer recursos necessários à subsistência do indivíduo, daí decorrendo a teoria da preservação do mínimo existencial.

A preservação do mínimo existencial, a propósito, ganhou importante capítulo em 2022, na medida em que deixou o plano doutrinário e ficou expressamente reconhecida pela jurisprudência.

Em importante julgamento de junho/2022, o Supremo Tribunal Federal, na apreciação da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5422 (ADI 5422)[1], adotou a preservação do mínimo existencial como um dos fundamentos para afastar a incidência do IRPF sobre os rendimentos recebidos a título de pensão alimentícia.

Consequentemente, se o Estado não fornece assistência de saúde de qualidade a todos, é justo que o gasto com tratamentos médicos e hospitalares seja deduzido dos rendimentos brutos a fim de ser determinada a base de cálculo do IRPF.

Aliás, a discussão não deve ser sobre a redução ou eliminação da dedutibilidade das despesas médicas, mas sua ampliação para também contemplar os gastos com medicamentos.

Pelo mesmo motivo, deve ser abandonado o limite para a dedução das despesas com instrução.

A busca por uma justa tributação da renda, na esteira do que restou decidido na ADI 5422, deve considerar como base de cálculo apenas aquilo que excede o mínimo existencial. 

Nesta ordem de ideias, cabe discutir se a justa a incidência do imposto sobre rendimentos que são utilizados na habitação do indivíduo e sua família, tais como aluguéis e juros das prestações de imóvel próprio.

Atenção, parlamentares eleitos, vejam o desafio que têm pela frente…


[1] Ação direta de inconstitucionalidade. Legitimidade ativa. Presença. Afastamento de questões preliminares. Conhecimento parcial da ação. Direito tributário e direito de família. Imposto de renda. Incidência sobre valores percebidos a título de alimentos ou de pensão alimentícia. Inconstitucionalidade. Ausência de acréscimo patrimonial. Igualdade de gênero. Mínimo existencial. 

1. Consiste o IBDFAM em associação homogênea, só podendo a ele se associarem pessoas físicas ou jurídicas, profissionais, estudantes, órgãos ou entidades que tenham conexão com o direito de família. Está presente, portanto, a pertinência temática, em razão da correlação entre seus objetivos institucionais e o objeto da ação direta de inconstitucionalidade. 

2. Afastamento de outras questões preliminares, em razão da presença de procuração com poderes específicos; da desnecessidade de se impugnar dispositivo que não integre o complexo normativo questionado e da possibilidade de se declarar, por arrastamento, a inconstitucionalidade de disposições regulamentares e de outras disposições legais que possuam os mesmos vícios das normas citadas na petição inicial, tendo com elas inequívoca ligação. 

3. A inconstitucionalidade suscitada está limitada à incidência do imposto de renda sobre os valores percebidos a título de alimentos ou de pensões alimentícias oriundos do direito de família. Ação da qual se conhece parcialmente, de modo a se entender que os pedidos formulados alcançam os dispositivos questionados apenas nas partes que tratam da aludida tributação. 

4. A materialidade do imposto de renda está conectada com a existência de acréscimo patrimonial, aspecto presente nas ideias de renda e de proventos de qualquer natureza. 

5. Alimentos ou pensão alimentícia oriundos do direito de família não se configuram como renda nem proventos de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas montante retirado dos acréscimos patrimoniais recebidos pelo alimentante para ser dado ao alimentado. A percepção desses valores pelo alimentado não representa riqueza nova, estando fora, portanto, da hipótese de incidência do imposto. 

6. Na esteira do voto-vista do Ministro Roberto Barroso, “[n]a maioria dos casos, após a dissolução do vínculo conjugal, a guarda dos filhos menores é concedida à mãe. A incidência do imposto de renda sobre pensão alimentícia acaba por afrontar a igualdade de gênero, visto que penaliza ainda mais as mulheres. Além de criar, assistir e educar os filhos, elas ainda devem arcar com ônus tributários dos valores recebidos a título de alimentos, os quais foram fixados justamente para atender às necessidades básicas da criança ou do adolescente”. 

7. Consoante o voto-vista do Ministro Alexandre de Moraes, a tributação não pode obstar o exercício de direitos fundamentais, de modo que “os valores recebidos a título de pensão alimentícia decorrente das obrigações familiares de seu provedor não podem integrar a renda tributável do alimentando, sob pena de violar-se a garantia ao mínimo existencial”. 

8. Vencidos parcialmente os Ministro Gilmar Mendes, Edson Fachin e Nunes Marques, que sustentavam que as pensões alimentícias decorrentes do direito de família deveriam ser somadas aos valores de seu responsável legal aplicando-se a tabela progressiva do imposto de renda para cada dependente, ressalvando a possibilidade de o alimentando realizar isoladamente a declaração de imposto de renda. 

9. Ação direta da qual se conhece em parte, relativamente à qual ela é julgada procedente, de modo a dar ao art. 3º, § 1º, da Lei nº 7.713/88, ao arts. 4º e 46 do Anexo do Decreto nº 9.580/18 e aos arts. 3º, caput e § 1º; e 4º do Decreto-lei nº 1.301/73 interpretação conforme à Constituição Federal para se afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias.

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