Em recente e inédita decisão exarada em 16/8/2022 pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, houve o provimento, por maioria, de Recurso Especial interposto por empresa, autorizando ao contribuinte a dedução da base de cálculo do IRPJ (Imposto sobre a renda das pessoas jurídicas) dos pagamentos feitos aos administradores e conselheiros, independentemente de serem mensais e fixos.
O entendimento dos tribunais regionais sobre a matéria não vinha sendo julgado de maneira favorável aos contribuintes, pois levavam em consideração o artigo 31 da Instrução Normativa nº 93/1997 da Receita Federal, que só permite deduções quando os pagamentos são mensais e fixos [1].
Não obstante a previsão literal contida na referida norma infralegal, o voto vencedor da relatora, ministra Regina Helena Costa, destacou precedentes da própria Corte Especial no sentido de que não pode haver a cobrança de Imposto de Renda com base apenas em norma infralegal, como ocorre no caso com a previsão do artigo 31 da Instrução Normativa nº 93/1997 da Receita.
Ademais, a relatora também destacou que são dedutíveis da base de cálculo do IR todas as despesas e custos operacionais das empresas que recolhem pelo lucro real, e que os pagamentos a administradores e conselheiros, mesmo que feitos de maneira eventual, também de enquadram como despesas e custos da pessoa jurídica, e não sua renda, somente sendo possível o óbice a tais deduções se houvesse a previsão da restrição em lei federal e não em ato infralegal da Receita Federal.
Parece-nos acertada a conclusão da ministra relatora, acompanhada pela maioria da 1ª Turma do STJ, nessa decisão do REsp 1.746.268, posto que, de fato, a previsão do artigo 31 da Instrução Normativa nº 93/1997 da Receita permite indiretamente tributação pelo IR algo que não é caracterizado como renda, mas, sim, despesa das empresas.
O fato jurídico tributário “pagamentos feitos aos administradores e conselheiros da empresa de maneira mensal e fixa ou não” não se subsume à hipótese de incidência prevista na norma jurídica que institui o imposto de renda da pessoa jurídica, o que afasta o fenômeno da incidência tributária para tais pagamentos feitos pelas empresas a seus administradores e conselheiros, mesmo aqueles que não sejam mensais e fixos.
De fato, o que o artigo 31 da Instrução Normativa nº 93/1997 da Receita Federal faz, ao só permitir as deduções mensais e fixas da base de cálculo do IRPJ, é inserir elemento estranho à hipótese de incidência do IRPJ, possibilitando a cobrança de imposto de renda sobre verdadeiros custos e despesas necessários da empresa.
Contudo, embora a votação no REsp 1.746.268 tenha sido apertada a favor do contribuinte (3 votos a 2), o precedente abre campo animador e menos arriscado às empresas do lucro real que queiram discutir a tese no Judiciário, o que possibilita a recuperação dos valores indevidamente recolhidos nos últimos cinco anos por meio de restituição ou compensação e, também, a ordem judicial para suspender os recolhimentos futuros.
Em conclusão, a viabilidade da discussão da tese no caso de empresas que queiram recuperar os valores indevidamente recolhidos por meio de compensação administrativa, bem como a ordem para suspender tais deduções no futuro, é a via do mandado de segurança, onde não há sequer o risco de sucumbência, opção essa mais atrativa às empresas do lucro real com perfil mais conservador.
Caso a empresa não pretenda a recuperação do passado por meio de compensação administrativa com outros tributos administrados na Receita Federal, mas, sim, por meio da devolutiva do valor na própria ação, recomenda-se o uso da ação declaratória cumulada com repetição de indébito. Porém, nesse caso, se a empresa perder o processo, pode ser condenada a pagar sucumbência que, no geral, é de 10% do valor atualizado da causa a favor da Fazenda Pública.
Num ou noutro caso, fato é que a tese tornou-se muito mais atrativa e viável com essa inédita decisão do STJ a favor dos contribuintes, o que, sem sombra de dúvidas, causará uma profusão de ações das empresas do lucro real no Judiciário para tentativa de recuperar esses créditos.
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[1] Instrução normativa SRF nº 93, de 24 de dezembro de 1997.
Artigo 31. São dedutíveis na determinação do lucro real, sem qualquer limitação, as retiradas dos sócios, diretores ou administradores, titular de empresa individual e conselheiros fiscais e consultivos, desde que escriturados em custos ou despesas operacionais e correspondam a remuneração mensal e fixa por prestação de serviços.
Rafael Purcinelli é advogado da área tributária da Roncato Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 24 de setembro de 2022, 9h04