ARTIGO DA SEMANA – ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA (GERAL E NONAGESIMAL) E SUAS EXCEÇÕES

João Luís de Souza Pereira – Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado da Pós-graduação da FGV Direito-Rio. Professor convidado do IAG PUC-Rio.

Com a proximidade do encerramento de mais um exercício financeiro, é conveniente recordar o princípio constitucional da anterioridade tributária.

Entre as limitações ao poder de tributar estabelecidas na Constituição, figura de forma reluzente o famoso princípio da anterioridade da lei tributária (art. 150, III, “b” e “c”, da Constituição).

Antes de recordar do que se trata, vale a pena lembrar que o princípio da anterioridade da lei tributária está ligado à ideia de segurança jurídica na tributação ou, como afirmam os juristas, tem fundamentação no valor segurança (jurídica).

Se todos devemos contribuir para o financiamento do Estado através do pagamento de tributos, que este financiamento se realize de forma segura, vale dizer, dando ao contribuinte a  garantia de que será possível organizar a vida de modo a saber o quanto se deverá contribuir para o financiamento do Estado.

A anterioridade dá a necessária segurança aos contribuintes quanto aos tributos que lhe serão exigidos ou majorados. Desta forma, como regra, a lei tributária que institua ou majore um tributo não terá eficácia imediata, mas diferida para um momento posterior ao da sua publicação.

Todos os contribuintes, portanto, têm a segurança de que um tributo não será instituído ou majorado no dia seguinte ao da publicação da lei.

De acordo com artigo 150, III, “b” e “c”, da Constituição, lei que instituir ou majorar tributo só produzirá efeitos a partir do próximo exercício e, de acordo com a Emenda Constitucional n° 42/2003, também observado um período mínimo de noventa dias, sem prejuízo da “virada do exercício”.

Portanto, não basta que a lei instituidora ou majoradora do tributo seja publicada no exercício anterior. É preciso também que esta publicação ocorra no mínimo 90 (noventa) dias antes do encerramento do exercício.

A necessidade adicional dos 90 dias, acrescentado pela EC 42/2003, tem uma boa justificativa.

Olhando para o passado, observa-se que nem sempre a observância da “virada do exercício” era suficiente para conferir a necessária segurança aos contribuintes, evitando a surpresa no aumento ou na instituição de tributos. 

Já houve caso de tributo aumentado através de medida provisória publicada em 31 de dezembro e, portanto, apta a produzir efeitos já a partir do dia seguinte, conforme reconheceu o Supremo Tribunal Federal[1].

O Supremo Tribunal Federal passou designar a necessidade de observância da virada do exercício de anterioridade geral e a observância dos 90 dias de anterioridade nonagesimal.

O princípio da anterioridade (geral + nonagesimal) possui uma série de exceções.

Na Emenda Constitucional n° 32/2001 há regra específica no que diz respeito ao princípio da anterioridade aplicável às medidas provisórias. De acordo com a Constituição e com a interpretação dada pelo STF, os tributos podem ser instituídos ou aumentados por medidas provisórias – exceto os casos em que o tributo precisa ser instituído por lei complementar (artigo 154, I e 195, § 4°).

Mas a mesma Emenda Constitucional n° 32/2001 afirma que a medida provisória que implique instituição ou majoração de imposto somente produzirá efeitos no exercício seguinte se convertida em lei no ano anterior. As exceções a esta regra ficam por conta do Imposto de Importação, Imposto de Exportação, IPI, IOF e o Imposto Extraordinário de Guerra (art. 153, I, II, IV, V e art. 154, II, respectivamente).

Além disso, há determinados tributos que simplesmente não se sujeitam a nenhuma regra de anterioridade (geral nem nonagesimal). Ou seja, há tributos  cujas leis que venham a instituí-los ou majorá-los terão eficácia imediata. Pertencem a esse grupo: (a) o empréstimo compulsório do artigo 148, I; (b) o imposto de importação – artigo 153, I; (c) o imposto de exportação – artigo 153, II; (d) o IOF – artigo 153, V e (e)  o imposto extraordinário de guerra – artigo 154, II. 

Há tributos que não se sujeitam à anterioridade nonagesimal, mas devem observar a anterioridade geral: (a) o Imposto de Renda  – artigo 153, III e (b) o IPVA e o IPTU, ambos no que diz respeito à fixação das respectivas bases de cálculo.

Também há o oposto, ou seja, tributos que somente deve observar a anterioridade nonagesimal (noventena), mas não se sujeitam à anterioridade geral. Nesta categoria estão: (a) o IPI, (b) as contribuições de seguridade social  do artigo 195 da Constituição, (c) o ICMS-Combustíveis de que tratam o artigo 155, § 2°, XII, “h” e a Lei Complementar nº 912/2022 e (d) a contribuição de intervenção no domínio econômico sobre importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível, segundo o disposto no artigo 177, § 4°, I, “b”.

Especificamente em relação às contribuições de seguridade social (PIS, COFINS, Contribuição previdenciária), é preciso destacar que o artigo 195, § 6°, é mais amplo que o artigo 150, III, “c”, na medida em que determina que a anterioridade nonagesimal há de ser observada para os caso de instituição ou modificação destes tributos. É bem verdade que o Supremo Tribunal Federal já entendeu que a prorrogação do prazo de vigência de contribuição de seguridade social não é modificação e, portanto, não se sujeita à anterioridade nonagesimal[2]

Ainda no que se refere à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, uma súmula merece destaque. Trata-se da Súmula nº 669, afastando a necessidade de observância do princípio da anterioridade para os casos de alteração do prazo de recolhimento de tributos, já que para o STF esta modificação não importa em majoração. Confira-se: “Norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.”

Por falar nisso, o que se deve entender por aumento de tributo para efeito da observância da anterioridade?


[1] Recurso Extraordinário 250.521/SP: Imposto de Renda e Contribuição Social. Medida Provisória nº 812, de 31.12.94, convertida na Lei nº 8.981/85. Artigos 42 e 58. Princípios da anterioridade e da irretroatividade.  Medida provisória que foi publicada em 31.12.94, apesar de esse dia ser um sábado e o Diário Oficial ter sido posto à venda à noite. Não-ocorrência, portanto, de ofensa, quanto à alteração relativa ao imposto de renda, aos princípios da anterioridade e da irretroatividade. 

[2]Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 2.666: “Ocorrência de mera prorrogação da Lei nº 9.311/96, modificada pela Lei nº 9.539/97, não tendo aplicação ao caso o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição Federal. O princípio da anterioridade nonagesimal aplica-se somente aos casos de instituição ou modificação da contribuição social, e não ao caso de simples prorrogação da lei que a houver instituído ou modificado.”

ISENÇÃO DO IPI: PESSOA COM DEFICIÊNCIA PODE COMPRAR NOVO CARRO EM MENOS DE 3 ANOS, EM CASO DE PERDA TOTAL 

A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 reconheceu o direito de uma pessoa com deficiência à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de um novo automóvel, em prazo inferior a três anos, em caso de acidente com perda total de veículo adquirido anteriormente com o mesmo benefício fiscal. A decisão, unânime, negou provimento ao recurso da Fazenda Nacional contra sentença da 21ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, que havia assegurado o benefício ao autor da ação.

A Lei nº 8.989/95, que define as regras para isenção do IPI na aquisição de automóveis por pessoas com deficiência, estabelece que esse benefício só poderá ser utilizado uma vez, salvo se o veículo tiver sido adquirido há mais de três anos. No caso julgado, o proprietário pretendia efetuar uma nova aquisição, antes do final do prazo, para substituir o carro que havia sido alvo de acidente, com perda total.

O desembargador federal Leonardo Resende, relator do processo, votou no sentido de que a restrição temporal prevista na Lei nº 8.989/95 busca evitar possíveis abusos e desvios de finalidade do desconto fiscal, o que não se verifica nesse caso. No voto, ele ressalta que não se vislumbra qualquer intenção do autor da ação de usar o benefício de forma indevida ou indiscriminada, mas apenas para substituir o automóvel adquirido anteriormente, que foi perdido por circunstância alheia à sua vontade.

Citando precedente do próprio TRF5, a Sexta Turma destacou, ainda, que a Lei nº 8.989/95 tem o intuito de facilitar a locomoção das pessoas que possuem dificuldades em virtude de sua condição física, reduzindo as desigualdades e efetivando, assim, o princípio da dignidade da pessoa humana.

Processo nº 0004247-08.2022.4.05.8300

Por: Divisão de Comunicação Social do TRF5

ARTIGO DA SEMANA – Reforma Tributária de novo?

João Luís de Souza Pereira

Advogado. Mestre em Direito.

Professor convidado da Pós-graduação da FGV Direito Rio

Professor convidado do IAG/PUC-Rio

Artigo do Fernando Facury Scaff publicado nesta semana, defendendo tese acerca da intenção de tributação dos lucros e dividendos, trouxe o tema da Reforma Tributária novamente à tona. Reforma Tributária também tem sido assunto pautado pela imprensa no acompanhamento dos trabalhos da Equipe de Transição do novo governo federal. A senadora Simone Tebet e o Vice-presidente eleito igualmente abordaram a Reforma em suas entrevistas à jornalista Miriam Leitão neste semana.

Reforma Tributária é tema presente em toda fase de transição de governos. Governo sai, governo entra, e a Reforma Tributária toma conta do noticiário. Não é preciso muito esforço para lembrar que Lula, Dilma e Bolsonaro/Paulo Guedes abordaram o assunto na fase que antecedeu o início dos mandatos.

Já afirmamos aqui que é bastante improvável que o próximo governo aprove uma Reforma Tributária. Aliás, o mesmo clima de urgência na aprovação da Reforma esteve presente nos governos Lula, Dilma e Bolsonaro e nada aconteceu, além de propostas.

Muito cá entre nós, é mais fácil o Brasil devolver o 7 x 1 à Alemanha na  Copa do Qatar do que o governo eleito aprovar uma Reforma Tributária ao longo do próximo mandato.

De todo modo, uma coisa é certa: se a Reforma não for aprovada nos mágicos primeiros 100 dias, nada acontecerá nos 1.200 restantes.

A propósito, as Propostas de Reforma Tributária mais maduras que tramitam no Legislativo não farão as necessárias mudanças no Sistema Tributário Nacional. Ao contrário, as PECs 45/2019 e 110/2019, bem como PL 3887/2020,  mais parecem um puxadinho, uma meia sola – diriam os mais antigos, na exata medida em que não propõem uma solução definitiva para alterar o complexo Sistema Tributário Nacional.

Da Administração que se despede do poder pra cá, ainda não apareceu uma proposta de emenda constitucional corajosa o suficiente para dar um basta ao IPI, ICMS, ISS, PIS, COFINS e CIDE, transformando-os num só tributo, ainda que com alíquotas seletivas, mas verdadeira e amplamente não-cumulativo.

Também não se verifica uma proposta que, além de criar um IVA, também contemple a desoneração da folha de salários, acabe com as múltiplas incidências tributárias sobre as importações e garanta a livre desoneração das exportações, esta última sem mecanismos complexos e quase inacessíveis de ressarcimento.

Na verdade, mais importante do que discutir uma Reforma Tributária – que a experiência mostra que não será aprovada – é enfrentar o enorme desafio de aperfeiçoamento da tributação  através de leis ordinárias.

O próximo governo precisar debater com o Congresso sobre uma solução perene para tributação dos combustíveis, pondo fim ao contencioso judicial deflagrado recentemente sobre a matéria.

Executivo e Legislativo precisam conversar e produzir uma norma para incluir o devedor de créditos não constituídos e não inscritos em dívida ativa num programa de regularidade fiscal, com prazo certo e condições bem definidas.

Cabe ao novo governo e à norma legislatura definir um norma que bonifique o bom pagador de tributos, de preferência com eficácia nacional.

A nova Administração tem a obrigação de apresentar uma solução justa, equilibrada e eficaz para aumentar o nível de recuperação de créditos tributários inscritos em dívida ativa.

A ampla compensação tributária e a livre transferência de créditos decorrentes de indébitos tributários precisa deixar de ser um tabu.

O país precisa de um Código de Processo Tributário e os órgãos administrativos de função judicante devem ser prestigiados, com melhor remuneração de seus membros para afastar as nefastas influências negativas e espancar o fantasma da corrupção que volta e meia aparece no noticiário.

Só é cabível discutir Reforma Tributária após a superação dos desafios impostos pela legislação infraconstitucional.   

Se não for assim, melhor deixar o Sistema Tributário Nacional como está. Afinal, como sempre repetiam os saudosos e queridos Osiris Lopes Filho e Geraldo Ataliba, imposto bom é imposto velho.

Cidadania questiona fim da isenção fiscal de petróleo e derivados na Zona Franca de Manaus

Para o partido, a medida produzirá “efeitos devastadores” para a indústria do petróleo instalada na região.

O partido Cidadania ​Nacional ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7239, contra a exclusão da isenção do Imposto de Importação e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) nas operações com petróleo e derivados por empresas da Zona Franca de Manaus (AM). A ação foi distribuída ao ministro Luís Roberto Barroso.

A legenda alega que a medida, prevista na Lei 14.183/2021, viola o artigo 92-A do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que mantém a Zona Franca de Manaus até 2073. A seu ver, a legislação infraconstitucional pode apenas aumentar o nível dos incentivos, nunca os eliminar ou reduzir.

Para o Cidadania, a lei produzirá “efeitos devastadores” não só para a indústria do petróleo instalada na região, mas para a própria existência da área livre de comércio. Segundo o partido, a exclusão se opõe ao objetivo constitucional de redução das desigualdades regionais, considerando a relevância do regime fiscal da Zona Franca de Manaus para o desenvolvimento social e econômico da região e do país.

Veto derrubado

Em junho deste ano, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 893, o Plenário do STF restabeleceu a vigência do dispositivo questionado, pois o veto do presidente da República, Jair Bolsonaro, ao trecho do projeto de lei foi inconstitucional, por ter sido exercido após o prazo de 15 dias.

Rito

Diante da relevância da matéria, o relator adotou o rito previsto no artigo 12 da Lei das ADIs (Lei 9.868/1999), que autoriza o julgamento da ação diretamente no mérito, sem exame prévio do pedido de liminar, e solicitou informações à Presidência da República, ao Congresso Nacional e à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

RP/CR//CF

Fonte: Notícias do STF

Disponibilizada decisão monocrática do STF revogando liminar que suspendia os efeitos de Decreto no tocante à redução do IPI de produtos produzidos pelas indústrias da ZFM que possuem o Processo Produtivo Básico

16 de setembro de 2022 | ADI 7.153/DF | Supremo Tribunal Federal

O Ministro Alexandre de Moraes – Relator – determinou a suspensão da eficácia de decisão que suspendia os efeitos do Decreto 11.158/2022 no tocante à redução das alíquotas em relação aos produtos produzidos pelas indústrias da Zona Franca de Manaus (ZFM) que possuem o Processo Produtivo Básico, nos termos do art. 7º, § 8º, “b”, da Lei nº 8.387/1991, inclusive quanto aos insumos catalogados no código 2106.90.10 Ex 01 da TIPI. Segundo o Ministro, o referido Decreto foi significativamente alterado pelo Decreto nº 11.182/2022, que restabeleceu as alíquotas do IPI para 109 produtos fabricados na ZFM, o que, somados aos 61 produtos já listados no Decreto nº 11.158/2022, objetos da alteração, conforma um total de 170 produtos cujas alíquotas foram restabelecidas, o que representa, segundo informações apresentadas pela Advocacia-Geral da União, um índice superior a 97% de preservação de todo o faturamento instalado na ZFM. Assim, o Ministrou entendeu não estarem mais presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, razão pela qual entendeu pela revogação da medida cautelar anteriormente concedida, com efeitos ex nunc, para restaurar a eficácia do Decreto nº 11.158/2022, com a redação dada pelas alterações do Decreto nº 11.182/2022.

Fonte: Sacha Calvin Misabel Derzi – Consultores & Advogados

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