Mantida a sentença que condenou um empresário por deixar de repassar contribuições à Previdência Social

O Ministério Público Federal (MPF) recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) da sentença que condenou um empresário a três anos, dez meses e dez dias de reclusão em regime aberto e ao pagamento de multa em razão do acusado deixar de repassar à Previdência Social as contribuições recolhidas dos colaboradores de sua empresa de engenharia e por omitir o tributo na guia de recolhimento. O órgão pediu o aumento da pena imposta e a condenação do denunciado pelo crime de falsificação de documento público.

De acordo com os autos, o réu, um dos sócios e gestor, falsificou documento público ao omitir em Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informação à Previdência Social (GFIP), entre janeiro 2007 e março de 2007 e de março de 2009 a novembro 2009, as remunerações pagas a segurados empregados, além de descontar do salário de seus empregados as contribuições devidas à Seguridade Social, deixando, no entanto, de repassá-las ao erário.

Omissão de informação – Segundo explicou o relator do caso, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, o empresário foi condenado porque “reduziu a base de cálculo da cota patronal de contribuição previdenciária e, ainda, descontou do salário de seus empregados as contribuições devidas à Seguridade Social, sem repassá-las”.

Para o magistrado, isso já constitui crime pelo simples fato de “deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes no prazo e forma legal ou convencional”.

Além disso, Saulo Casali destacou que “não há que se falar em condenação pelo crime do art. 297, § 4º, do Código Penal (falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro), pois, como bem entendeu o juízo, na hipótese dos autos, ‘a ausência da relação da remuneração dos segurados nas GFIPs possuía como único fim ludibriar o agente arrecadador’”.

Com o entendimento de que a prática do crime de omissão de informação em documento previdenciário tinha como único objetivo eximir-se das arrecadações previdenciárias, a Quarta Turma manteve a sentença considerando que a pena estabelecida era razoável e suficiente para a reprovação e prevenção do crime.

Processo: 0001222-88.2017.4.01.3800

RF/CB

Assessoria de Comunicação Social

Tribunal Regional Federal da 1ª Região

2ª Turma encerra ação penal contra empresários investigados por sonegação em empresas de ração

Para a maioria do colegiado, não foi encerrado o processo administrativo-fiscal, necessário para a tipificação do delito fiscal.

Por maioria de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou o trancamento da ação penal contra os empresários Carlos Luiz Lobo e Cassiana Amorim Lobo Haddad, acusados de organização criminosa, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. A decisão se fundamentou na Súmula Vinculante 24 do STF, segundo a qual o crime contra a ordem tributária não se configura antes do lançamento definitivo do tributo.

A decisão, tomada nesta terça-feira (22) no Habeas Corpus (HC 180567), confirma liminar concedida pelo ministro Gilmar Mendes (relator) que havia revogado a prisão preventiva dos sócios, por considerar ilegal o decreto prisional, e determinado a suspensão do processo em relação a eles.

Caso

Os empresários, sócios da Lupus Desenvolvimento de Alimentos Ltda., são réus no âmbito da Operação Petscan, que investigou possíveis fraudes tributárias no ramo de produção e comercialização de rações em cidades mineiras. A operação foi deflagrada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) em dezembro de 2016.

De acordo com o MP, a conduta consistiria na venda de mercadoria sem a correta descrição do produto nem informação precisa sobre o real valor da operação, a fim de anular ou diminuir tributo, e, em decorrência, a prática do crime de falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santa Luzia (MG) decretou a prisão preventiva dos dois, com o objetivo de obstar a reiteração do crime e a ameaça à ordem econômica.

A defesa pediu a revogação da prisão no Tribunal de Justiça de Minas Gerais e, posteriormente, no Superior Tribunal de Justiça, mas ambos foram negados. No STF, alegou que os requisitos da medida não estavam preenchidos e que não havia prova da materialidade do crime de sonegação fiscal.

Em novembro de 2020, no início do julgamento de mérito, o relator votou pela confirmação da liminar e pela concessão do habeas corpus, e foi acompanhado pelo ministro Nunes Marques. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Edson Fachin.

Sonegação fiscal

Na sessão de hoje, prevaleceu o entendimento do relator de que os fatos narrados pela Polícia Civil e pelo MP-MG, utilizados como fundamento para o decreto prisional de sonegação fiscal, não se enquadram no tipo penal apontado na decisão – o inciso V do artigo 1º da Lei 8.137/1990 (negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação).

Na avaliação do ministro, o preenchimento incorreto da documentação fiscal era apenas o meio utilizado para o crime material de sonegação. Nesse caso, o esgotamento das vias administrativas é condição para a caracterização do crime tributário e deve preceder a ação penal, já que o lançamento definitivo do crédito tributário, por meio do encerramento do processo administrativo fiscal, é pressuposto inafastável da persecução penal. Esse entendimento está consolidado na Súmula Vinculante 24 do STF.

Em relação à lavagem de dinheiro, o ministro explicou que esse crime não se sustenta, porque o fato antecedente (crime fiscal) ainda não ocorreu.

Ação penal precipitada

Ao acompanhar o relator, o ministro Ricardo Lewandowski ressaltou que, no caso dos autos, não houve a constituição definitiva do crédito tributário na esfera administrativa em nenhum dos cinco autos de infração que deram origem às investigações. “Ninguém pode ser incriminado por delito de natureza fiscal ou tributária sem o exaurimento das vias administrativas”, afirmou. “Assim, ante a inexistência do crédito tributário, foi precipitada a instauração da persecução penal e, ainda mais, a prisão preventiva”.

Ficaram vencidos os ministros André Mendonça, que votou pela concessão do pedido de ofício apenas para afastar as prisões preventivas, e o ministro Edson Fachin, que não concedeu a ordem de habeas corpus.

SP/CR//CF

STJ mantém denúncia por crime-meio antes de crédito tributário definitivo

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acatou a argumentação do Ministério Público do Paraná para transformar em rés pessoas investigadas pela prática de crime tributário, apesar de esse delito ainda não poder ser tipificado.

O caso trata de esquema criado para reduzir tributação junto ao Fisco do Paraná, pela aquisição simulada de grãos de café com produtores de outros estados, em compras intermediadas por agências corretoras com sede em Londrina (PR) e Maringá (PR).

Esse crime tributário só pode ser tipificado quando o respectivo crédito tributário de ICMS for lançado de maneira definitiva, conforme prevê a Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal. O procedimento administrativo fiscal ainda não foi concluído.

No entanto, o MP paranaense denunciou os 70 investigados por todas as outras condutas usadas para, em tese, praticar esse crime tributário: organização criminosa, associação criminosa e falsidade ideológica.

Tratam-se de crimes autônomos, com tipificação independente e que, segundo a 6ª Turma do STJ, podem render persecução penal sem ofender a Súmula 24. Bastou ao MP excluir da denúncia a principal conduta apurada: suprimir ou reduzir tributo, crime previsto no artigo 1º da Lei 8.137/1990.

Relator de um recurso em Habeas Corpus ajuizado para obter o trancamento das investigações pelo crime tributário, o ministro Sebastião Reis Júnior foi informado pela defesa do oferecimento da denúncia e enxergou flagrante ilegalidade.

Para ele, em razão da sucessão de condutas tipificáveis, deve-se imputar aos suspeitos o crime-fim, considerando-se as demais absorvidas. Ou seja, se o contexto geral é do crime de reduzir tributos, a falsidade ideológica e a organização criminosa usadas nesse intuito seriam condutas-meio.

“Trata-se de tentativa de contornar o óbice da Súmula Vinculante 24/STF, visto que, a se permitir a persecução penal pelo delito-meio, corre-se o risco de permitir dupla imputação pelo mesmo fato, já que na manifestação ministerial há menção a posterior oferecimento da denúncia pelos crimes tributários ou persecução penal pelos crimes materiais da Lei 8.137/1990, sem que o resultado ainda tenha sido produzido”, afirmou.

Abriu a divergência vencedora o ministro Rogerio Schietti, para quem a estratégia do MP é legal. O crime de associação criminosa, por exemplo, é formal e se consuma com a formação da quadrilha no intuito de cometer a conduta tributária ilícita, o que não depende do término do procedimento administrativo fiscal.

O mesmo vale para falsidade ideológica, conduta que permitiu a prática do crime tributário, mas que também serviu para dar sustentação a empresas de fachada e para escamotear a origem e o destino de mercadorias transacionadas.

“Não havendo a imputação de crime previsto no artigo 1º da Lei 8.137/1990, não há, por conseguinte, malferimento à Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal”, concordou o ministro Antonio Saldanha Palheiro, em voto-vista para aderir à divergência. Formaram a maioria a ministra Laurita Vaz e o desembargador convocado Olindo Menezes.

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RHC 151.007

Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 4 de novembro de 2022, 8h49

Deixar de recolher ICMS em meses aleatórios não é crime, diz STJ

A conduta de deixar de recolher ICMS aos cofres públicos em meses aleatórios não pode ser considerada crime. A tipificação da conduta depende da demonstração de persistência pelo réu e do dolo específico, representado pela vontade de se apropriar dos valores retidos.

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem de ofício em Habeas Corpus para absolver um administrador de uma fabricante de maquinaria, que foi condenado a 1 ano e  2 meses de reclusão por deixar de recolher ICMS.

O imposto incide sobre a movimentação de mercadorias em geral e deve ser pago ao Fisco estadual. O acusado deixou de cumprir a obrigação em Santa Catarina, nos meses de março, maio, julho, outubro e dezembro de 2012 e dezembro de 2013, o que representou desfalque de R$ 250 mil aos cofres públicos.

Relator no STJ, o ministro Sebastião Reis Júnior observou que a conduta do acusado não pode ser tipificada como crime tributário porque o Supremo Tribunal Federal, em 2019, entendeu que a criminalização do não pagamento do ICMS depende da existência de contumácia e dolo.

Contumácia é a insistência e a teimosia no desrespeito à lei. Já o dolo é a específica a vontade de se apropriar dos valores retidos por meio da omissão ou alteração da dívida. Ele não existe, portanto, se o réu declara tais valores junto aos órgãos de administração fiscal.

“No caso dos autos, o não pagamento do tributo por seis meses aleatórios não é circunstância suficiente para demonstrar a contumácia nem o dolo de apropriação. Ou seja, não se identifica, em tais condutas, haver sido a sonegação fiscal o recurso usado pelo empresário para financiar a continuidade da atividade em benefício próprio, em detrimento da arrecadação tributária”, concluiu o ministro Sebastião.

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HC 569.856

Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 2 de novembro de 2022, 8h47

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