STF volta a julgar ICMS sobre transferência de mercadorias

Tema está na pauta dos tribunais superiores há mais de 30 anos

O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou ao julgamento que afastou a incidência do ICMS nas transferências interestaduais de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma empresa. Mesmo com a modulação da decisão, a questão, segundo os contribuintes, não ficou completamente definida. Empresas acabaram autuadas por não pagamento do imposto.

O tema está na pauta dos tribunais superiores há mais de 30 anos. O primeiro precedente qualificado sobre o tema é de 1996: a Súmula nº 166 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O texto diz que “não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”.

Em 2021, o Supremo julgou o assunto com repercussão geral, no Tema 1099. Foi decidido que a cobrança era inconstitucional, mas a decisão foi modulada para só ter eficácia para o exercício financeiro de 2024, exceto para os processos administrativos e judiciais pendentes de julgamento “até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito da ADC 49”, que foi dia 29 de abril de 2021.

O problema é que alguns Estados começaram a lavrar autos de infração para os exercícios financeiros entre a data de publicação da ata e o início da vigência da decisão – ou seja, de maio de 2021 até dezembro de 2023. Porém, para tributaristas, não faz sentido cobrar um imposto que foi declarado inconstitucional em razão da modulação de efeitos.

Os contribuintes já tinham tentado restringir a cobrança em embargos de declaração na ADC 49. Mas eles foram rejeitados duas vezes porque tinham sido apresentados por amici curiae (interessados no processo, e não as partes). Agora, a questão voltou à Corte na forma de recurso extraordinário, e já há maioria no Plenário para reconhecer que ela tem repercussão geral e para reafirmar a modulação nos termos em que foi formulada em 2023 (RE 1490708).

Segundo Monique Salgado, Head of Legal da Roit, empresa que usa inteligência artificial para soluções tributárias, e advogada da causa que chegou ao Supremo, os desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tiveram posicionamento pró-contribuinte, mas a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) recorreu para tentar chancelar a cobrança retroativa.

“Se o Estado puder cobrar esse ICMS, vai virar uma caça às bruxas contra os contribuintes. A modulação de efeitos serve para garantir a segurança jurídica, e não para dar carta branca para os Estados cobrarem um imposto que foi considerado inconstitucional”, diz.

Apesar de o entendimento do TJSP no caso ser pró-contribuinte, outros tribunais têm dado razão ao Fisco. Em março de 2024, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou o pedido de uma empresa para não pagar o imposto porque o processo “não se enquadra na exceção estabelecida [na modulação], considerando que impetrado apenas em 30 de março de 2023″ (processo nº 5055283- 55.2023.8.21.0001). O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) também deu razão ao

Fisco quanto à data de validade do precedente do Supremo, e reformou a sentença favorável que o contribuinte tinha conseguido na primeira instância (processo nº 1.0000.24.155972-3/001).Até o fechamento da edição, havia sete votos pela manutenção do entendimento atual. Ainda há a possibilidade de algum ministro pedir destaque e levar o julgamento para o plenário físico. Se prevalecer o entendimento atual, ficará mantida a situação que abriu a brecha para a cobrança do imposto pelos Estados, segundo Bruno Teixeira, sócio tributarista de TozziniFreire Advogados.

No voto condutor do julgamento, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso apontou que a “desconsideração da modulação, além de violar a autoridade das decisões do STF em jurisdição constitucional, contraria a segurança jurídica e o equilíbrio fiscal que justificaram a modulação”.

Para os representantes dos contribuintes, no entanto, o imposto não pode ser exigido. “Eu até diria que, no julgamento da ADC 49, ficou muito claro que não poderia cobrar. Inclusive, em seu voto, o ministro Nunes Marques fez a ressalva explícita de que eventual modulação não autorizava a Fazenda a autuar os contribuintes”, diz Teixeira.

A situação dos contribuintes é duplamente negativa, aponta o especialista: por um lado, não pode reivindicar o tributo que eventualmente tenha sido pago antes da declaração de inconstitucionalidade e, por outro, está sujeito à cobrança retroativa dos tributos em relação a exercícios financeiros passados.

Leonardo Roesler especialista em direito tributário do RCA Advogados, aponta que as empresas que não judicializaram a questão estão sendo obrigadas a pagar um imposto declarado inconstitucional. “A solução justa deveria ser permitir que as empresas compensem o imposto pago indevidamente.”

A manutenção da tese fragiliza as empresas que escolheram não judicializar uma questão que já parecia pacificada no Judiciário há muitos anos, afirma Mariana Ferreira, coordenadora tributária no Murayama Affonso Ferreira e Mota Advogados.

“Esse julgamento evidencia que a segurança jurídica na esfera tributária é muito frágil, o que leva à infeliz necessidade de os contribuintes precisarem judicializar causas pelas quais, em regra, eles não precisariam brigar”, diz a advogada. “Estamos falando de três anos de recolhimento, é um impacto muito significativo no caixa das empresas.”

Procurada pelo Valor, a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (PGR-SP) não se manifestou.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2025/01/28/stf-volta-a-julgar-icms-sobre-transferencia-de-mercadorias.ghtml

ALERJ APROVA SECURITIZAÇÃO DA DÍVIDA ATIVA FLUMINENSE

O Governo do Estado poderá realizar a securitização da dívida ativa fluminense, ou seja, dos valores que o contribuinte não pagou dentro do prazo ao Executivo. A medida permite a cessão onerosa desses créditos tributários e não tributários a pessoas jurídicas de direito privado ou a fundos de investimento regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A determinação consta no Projeto de Lei 3.980/24, de autoria do deputado Luiz Paulo (PSD), que a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou, nesta terça-feira (17/12), em discussão única. A medida segue para o governador Cláudio Castro, que tem até 15 dias úteis para sancioná-la ou vetá-la.

O objetivo é a conversão de créditos que só seriam recebidos pelo Governo do Estado no futuro em receitas atuais, o que pode vir a proporcionar alívio imediato e necessário às finanças públicas, sem comprometer o equilíbrio fiscal a médio e longo prazo.

Autor da norma, o deputado Luiz Paulo explicou que a securitização da dívida ativa é uma prática financeira consolidada em diversas partes do mundo, onde se revelou uma solução eficiente para governos que enfrentam dificuldades fiscais. O parlamentar citou países europeus que implementaram a medida, como Espanha, Itália e Portugal.

“Ao seguir os exemplos internacionais bem-sucedidos e adaptar essa prática à realidade local, o Estado dará um passo importante em direção à recuperação financeira e à melhoria dos serviços públicos, beneficiando diretamente toda a população fluminense”, ressaltou o decano da Alerj.

A medida complementa a Lei 287/79, que instituiu o Código de Administração Financeira e Contabilidade Pública do Estado do Rio. A iniciativa encontra amparo na Lei Complementar Federal 208/24, que permite os processos de securitização condicionados à aprovação de leis regionais para cada caso.

Transparência e controle

O texto ainda estabelece uma série de medidas para garantir a lisura do processo de securitização. A Procuradoria Geral do Estado (PGE/RJ) e a Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz) serão os órgãos responsáveis pela implementação e pelo supervisionamento do procedimento. Estas instituições deverão observar o potencial de recuperação e o menor risco de inadimplência para selecionar as dívidas ativas a serem securitizadas.

Todos os processos deverão ser conduzidos de forma transparente, com relatórios periódicos semestrais publicados para o público e órgãos de controle. O projeto ainda prevê a realização de auditorias periódicas nos processos de securitização.

Fonte: Notícias da ALERJ

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