Juíza aplica ‘tese do século’ para excluir Pis da própria base de cálculo

Tributos não são componentes do faturamento. Ao contrário, são devidos pelas pessoas jurídicas, configurando desembolso, portanto, destinados às entidades de direito público que detêm competência tributária para instituí-los e capacidade tributária ativa para suas respectivas cobranças.

Esse foi o entendimento da juíza Frana Elizabeth Mendes, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, para conceder liminar para que a Receita Federal exija o PIS/Cofins sobre sua própria base de cálculo. 

A magistrada adotou o entendimento firmado no julgamento da “tese do século” pelo Supremo Tribunal Federal e deferiu o pedido de uma empresa de construção naval que está em recuperação judicial. 

Com o julgamento em 2017 da “tese do século” que decidiu que o ICMS não pode incidir sobre a base de cálculo do PIS/Cofins (RE 574.706), contribuintes de todo o Brasil começaram a ajuizar “teses filhotes”, ou seja, que possuem a mesma argumentação jurídica da tese principal que trata do conceito de faturamento.

Uma delas, submetida à Repercussão Geral pelo STF sob o tema 1067 (RE 1.233.096) de relatoria do ministro Dias Toffoli e que aguarda julgamento desde 2019, trata da não incidência do PIS e da Cofins sobre as suas próprias bases de cálculo.

A Justiça Federal do Rio de Janeiro deferiu uma liminar em janeiro de 2023 para impedir que a Receita Federal exija dos contribuintes, empresas do ramo do mercado marítimo e naval, o PIS/Cofins sob as suas próprias bases.

Segundo a advogada Daniella Maria Alves Tedeschi, sócia do escritório DMAT Advogados, que representa a empresa, a decisão é de suma importância visto que a matéria se encontra submetida à Repercussão Geral pelo Tema 1067 no STF desde 2019.

“Isso faz com que muitos Magistrados acabem indeferindo liminares deste tipo posto que preferem aguardar o que será decidido pelo STF e por entenderem muitas vezes que a exigibilidade de tributos não caracterizaria periculum in mora aptos ao deferimento de liminares”. explica

A especialista explica que os processos de repercussão geral às vezes levam muitos anos para serem julgados, como o da Tese do Século, o que torna importante que os magistrados também estejam sensíveis ao deferimento de liminares destas matérias.

“De fato, há muito a ser comemorado, posto que os contribuintes poderão deixar de recolher o Pis/Cofins sobre suas bases mesmo a matéria estando pendente de julgamento pelo STF”, sustenta. 

Processo 5001358-37.2023.4.02.5101

Rafa Santos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 20 de janeiro de 2023, 11h46

Com base em norma de Mourão, empresas obtêm decisões para pagar menos PIS/Cofins

Com base no princípio da anterioridade nonagesimal, a Justiça vem autorizando empresas a pagarem alíquotas menores de PIS e Cofins instituídas por norma editada em 31 de dezembro, último dia do governo Jair Bolsonaro (PL), e revogada no início da gestão Lula (PT). Tributaristas avaliam que as decisões respeitam garantias dos contribuintes.

No apagar das luzes da gestão Bolsonaro, o então vice-presidente, Hamilton Mourão (Republicanos), no exercício da presidência, editou o Decreto 11.322/2022, que reduziu a alíquota do PIS/Pasep de 0,65% para 0,33% e a da Cofins de 4% para 2%, o que geraria impacto de aproximadamente R$ 5,8 bilhões nas contas públicas.

Um dos primeiros atos do novo governo foi tentar desarmar a bomba fiscal editando o Decreto 11.374/2023, que entrou em vigor um dia após o assinado por Mourão. 

Na ocasião, especialistas ouvidos pela ConJur apontaram a insegurança jurídica provocada pela medida e o risco de judicialização em torno do tema. E, como era de se esperar, o imbróglio chegou ao Poder Judiciário, com amplo saldo favorável ao contribuinte até o momento.

A decisão com maior impacto foi proferida pela juíza federal Regilena Emy Fukui Bolognesi, da 11ª Vara Cível Federal de São Paulo, e foi provocada por ação do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp). A liminar garante que todas as associadas recolham o PIS e a Cofins com alíquotas reduzidas  — de 2,33% no total — até o dia 2 de abril. Essa é a primeira ação coletiva que se tem notícia.

Em outra decisão, a juíza Diana Brunstein, da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo, entendeu que tanto o PIS como a Cofins são contribuições que se sujeitam ao princípio da anterioridade nonagesimal (artigos 150, III, “c”, e 195, parágrafo 6º, da Constituição). Tal postulado estabelece que a criação ou aumento de alíquota de tributo só pode ser cobrada após o prazo de noventa dias, contados da publicação da lei. O objetivo é propiciar ao contribuinte o conhecimento antecipado da situação mais gravosa a qual será submetido.

“Sendo assim, conclui-se que a elevação da carga tributária decorrente da majoração de alíquotas estabelecida pelo Decreto 11.374/2023, o qual teve aplicação imediata, ofende o princípio da anterioridade nonagesimal”, registrou ao aceitar mandado de segurança impetrado pela empresa de meios de pagamento Cielo.

O juiz federal substituto Evandro Ubiratan Paiva da Silveira, da 11ª Vara Federal de Porto Alegre, seguiu a mesma linha. O julgador sustentou que o Decreto 11.374/2023, ao restabelecer as alíquotas de PIS/Cofins anteriormente reduzidas, promoveu aumento de tributos com efeitos imediatos.

“Conforme já exposto pelo STF, nos autos da ADI 5.277, não há ilegalidade em tal disposição, no entanto, a observância do princípio da anterioridade, no caso nonagesimal, é imperativa”, afirmou ao aceitar mandado de segurança em favor da Ball Beverage Can South America, uma empresa do setor de metal manufaturado.  

Quem entendeu de modo diferente foi o juiz José Tarcísio Januário, da 1ª Vara Federal de Jundiaí (SP). Ao julgar pedido da Tubex Indústria e Comércio de Embalagens, ele entendeu que o princípio da anterioridade não deveria ser aplicado ao caso.

“A revogação de norma que diminui alíquota das contribuições não é considerada, pela jurisprudência do STF, como majoração e, assim, não se submete à anterioridade, uma vez que se trata de tributo já existente”, disse ao negar pedido de liminar da empresa. 

Defesa dos contribuintes
O presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Processo Tributário, Igor Mauler Santiago, sócio do Mauler Advogados, exalta o posicionamento do Poder Judiciário até o momento. “Ambos os decretos foram expedidos pelas autoridades competentes e na forma da lei. A aplicação da anterioridade nonagesimal é estrita, matemática, não comportando ponderação. As decisões são elogiáveis”. 

A tributarista Mariana Ferreira, do Murayama & Affonso Ferreira Advogados, entende que a vitória do Ciesp é resultado da inequívoca e justa aplicação dos princípios tributários, no presente caso, da anterioridade nonagesimal.

“E outro não poderia ser o resultado, já que a abrupta alteração ocorrida no recolhimento do PIS e da Cofins sobre as receitas financeiras levará os contribuintes a uma acirrada corrida ao Judiciário”, diz, avaliando que a tendência é o Judiciário seguir essas primeiras decisões.

O advogado Pedro Céglio, do GBA Advogados Associados, segue a mesma linha. “A Constituição Federal, prestigiando a segurança jurídica, adotou o princípio da anterioridade. De acordo com ele, o aumento de tributo não se opera imediatamente, mas deve-se aguardar o exercício financeiro seguinte (anterioridade geral) ou, ao menos, 90 dias (anterioridade nonagesimal) — contados da publicação da norma majoradora —, para que o tributo seja exigível com valor elevado, salvo exceções expressamente indicadas na Constituição Federal”. 

Embora o decreto revogado pelo governo Lula tenha tido vigência de apenas um dia, o princípio da anterioridade deve prevalecer. É o que acredita o advogado Matheus Bueno, sócio do Bueno Tax Lawyers. 

“Apesar de ter em tese vigido por apenas um dia, o desconto merece ser preservado, pois do contrário estar-se-ia criando nova regra com base numa suposta não surpresa do contribuinte. Seria, então, cabível a pergunta: se um dia não for suficiente, quantos seriam? O princípio da anterioridade impõe uma regra objetiva que não comporta flexibilidade, e essas decisões reconhecem isso, sempre em favor do sistema como um todo”, sustenta.

O tributarista Augusto Fauvel entende que o mesmo raciocínio deve ser aplicado ao decreto também assinado por Mourão que reduziu as alíquotas do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e que foi igualmente revogado pelo governo Lula.

“A redução de alíquota, portanto, já se encontra vigente ao ser revogada, o que, por força do artigo 150, III, ‘b’, da Constituição, vedaria aos entes federados a cobrança do tributo (AFRMM) no mesmo exercício financeiro em que foi publicada a lei que o aumentou, indiferentemente ao tempo em que esteve vigente e ao fato de a redução ter ou não produzido efeitos”, explica.

O advogado pondera que o imbróglio envolvendo os decretos revogados pelo novo governo lembra muito a polêmica em torno do Difal — diferencial de alíquotas do ICMS entre estados, que foi amplamente debatida por tributaristas desde o começo de 2022. 

A problemática gira em torno da possibilidade do Difal estar sujeito à anterioridade. O tema ainda está sendo debatido no STF. “É exatamente o mesmo raciocínio”, resume. 

Processo 5000834-23.2023.4.03.6100
Processo 5000915-69.2023.4.03.6100
Processo 5000422-72.2023.4.04.7100
Processo 5000027-16.2023.4.03.6128

Rafa Santos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 18 de janeiro de 2023, 20h11

ARTIGO DA SEMANA – Perspectivas Tributárias 2023

João Luís de Souza Pereira – Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito-Rio e do IAG/PUC-Rio

Feliz Ano Novo!

Terminado o recesso forense de fim de ano, há temas importantes que poderão entrar nas pautas de julgamentos dos Tribunais Superiores.

Destacamos alguns temas tributários em Recursos Repetitivos que foram afetados à Primeira Seção do STJ, bem como questões tributárias que tiveram a Repercussão Geral reconhecida no STF ao longo de 2022 e que poderão ser julgadas neste ano.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Tema Repetitivo 1125:

Possibilidade de exclusão do valor correspondente ao ICMS-ST da base de cálculo da Contribuição ao PIS e da COFINS devidas pelo contribuinte substituído.

Relator: Min. Gurgel de Faria

Recurso(s) Especial(is):  1.896.678 e 1.958.265

Tema Repetitivo 1164:

Definir se incide contribuição previdenciária patronal sobre o auxílio-alimentação pago em pecúnia.

Relator: Min. Gurgel de Faria

Recurso(s) Especial(is): 1.995.437 e 2.004.478

Tema Repetitivo 1170:

Definir se é cabível a incidência de contribuição previdenciária sobre os valores pagos a empregado a título de décimo terceiro salário proporcional referente ao aviso prévio indenizado.

Relator: Min. Paulo Sérgio Domingues

Recurso(s) Especial(is): 1.974.197, 2.000.020, 2.003.967 e 2.006.644

Tema Repetitivo 1174:

Possibilidade de excluir os valores relativos à contribuição previdenciária do empregado e trabalhador avulso e ao imposto de renda de pessoa física, retidos na fonte pelo empregador, da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e das contribuições destinadas a terceiros e ao SAT/RAT.

Relator: Min. Herman Benjamin

Recurso(s) Especial(is): 2.005.029, 2.005.087, 2.005.289 e 2.005.567

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Tema de Repercussão Geral 1195:

Trata-se de recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 2º, 24, I, 150, IV, e 155, II, da Constituição Federal, a possibilidade de o percentual de multas fiscais de caráter punitivo não qualificadas em razão de sonegação, fraude ou conluio ser fixado em montante superior ao valor do tributo devido, ante a proporcionalidade, a razoabilidade e o não-confisco em matéria tributária, bem como ser reduzido pelo Poder Judiciário.

Relator: Min. Nunes Marques

Recurso(s) Extraordinário(s): 1.335.293

Tema de Repercussão Geral 1198:

Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, IV, 5º, XIII, XXII, XXXV e LV, 146, III, a, 150, I, II, IV e V, 155, III, e 170, parágrafo único, da Constituição Federal, se a Lei 13.296/2008 do Estado de São Paulo, questionada na ADI 4.376, Rel. Min. Gilmar Mendes, pode submeter locadora de veículos ao recolhimento de IPVA relativo aos automóveis colocados para locação naquele Estado, mesmo que a empresa seja sediada em outro Estado da federação, onde realiza o registro de toda sua frota e recolhe referido tributo, bem como submeter seus clientes locatários como responsáveis solidários da obrigação tributária. Ademais, questiona-se a proporcionalidade e vedação ao confisco na seara tributária, pela imposição de multa tributária de 100% (cem por cento) após a inscrição do débito em dívida ativa.

Relator: Min. André Mendonça

Recurso(s) Extraordinário(s): 1.357.421 (com Agravo)

Tema de Repercussão Geral 1217:

Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 1º, 5º, XXII, 22, IV, 24, I, 30, II, III, e 146, III, b, da Constituição Federal, a aplicabilidade do entendimento firmado no Tema 1.062 (ARE 1.216.078-RG, Rel. Min. Dias Toffoli) aos casos em que lei municipal estabeleça índice de correção monetária e taxa de juros de mora incidentes sobre créditos tributários, sem limitação aos percentuais fixados pela União para os mesmos fins, atualmente a Taxa Selic.

Relatora: Min. Cármen Lúcia

Recurso(s) Extraordinário(s): 1.346.152

Tema de Repercussão Geral 1153:

Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 146, III, “a”, e 155, III, da Constituição Federal, se os estados-membros e o Distrito Federal podem, no âmbito de sua competência tributária, imputar ao credor fiduciário a responsabilidade tributária para o pagamento do IPVA, ante a ausência de lei de âmbito nacional com normas gerais sobre o referido tributo e, ainda, a qualidade de proprietário de veículo automotor, considerada relação jurídica entre particulares e a propriedade resolúvel conferida ao credor pelo direito privado.

Relator: Min. Luiz Fux

Recurso(s) Extraordinário(s): 1.355.870

Revogação de decreto que reduziu PIS e Cofins deve provocar enxurrada de ações

Um dos primeiros atos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em seu novo governo foi revogar o decreto que reduzia as alíquotas do PIS/Pasep e da Cofins sobre uma série de operações financeiras. E isso, na opinião de tributaristas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, criou um imbróglio capaz de gerar insegurança jurídica.

O decreto foi assinado no último dia 30 pelo presidente em exercício Hamilton Mourão, já que Jair Bolsonaro estava fora do país. De acordo com integrantes da equipe de transição, tratou-se de um “presente” inesperado deixado por um governo que vivia seus últimos momentos.

A medida assinada por Mourão baixou a alíquota do PIS/Pasep de 0,65% para 0,33% e a da Cofins de 4% para 2%, o que geraria impacto de aproximadamente R$ 5,8 bilhões nas contas públicas.

Lula também revogou o decreto que dava desconto de 50% nas alíquotas do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) a partir deste ano. A renúncia fiscal nesse caso seria de R$ 2,44 milhões em 2023, R$ 2,49 milhões em 2024 e R$ 2,42 milhões em 2025.

O tal imbróglio apontado pelos tributaristas é causado pelo princípio da anterioridade nonagesimal, que determina que qualquer alteração legal que crie ou aumente imposto só pode produzir efeitos 90 dias após sua publicação. Segundo os advogados, o princípio se aplica às revogações efetuadas por Lula. 

O tributarista Breno Dias de Paula classifica a situação como um típico e genuíno exemplo de insegurança jurídica.

“Tudo de que o Brasil não precisa na atual quadra são condutas estatais que prejudiquem o ambiente de negócios com mais insegurança jurídica. Certamente o assunto será judicializado para a aplicação do princípio da anterioridade”, comentou ele. 

O tributarista lembra que o artigo 150, III, alínea “c”, da Constituição Federal, que estabelece o princípio da anterioridade, é uma limitação ao poder de tributar e tem como objetivo proteger os contribuintes das anomalias fazendárias que costumam ser praticadas no início e no fim do exercício financeiro.

Na mesma linha, Carlos Augusto Daniel, sócio do escritório Daniel e Diniz Advocacia Tributária, explica que, apesar da grande proximidade entre os decretos, houve um período curto de vigência daquele que reduziu as alíquotas do PIS e da Cofins.

“Por mais que o decreto do novo governo tenha invocado o instituto da repristinação, isso não basta para descaracterizar o fato de que a medida representa um aumento, e não pode ser afastado o regime temporal estabelecido pela Constituição.”

Repristinação é o instituto jurídico que trata da validade de uma lei que é revogada por uma norma posterior. Segundo Daniel, um caminho possível para o novo governo seria questionar a constitucionalidade ou a legalidade do decreto revogado, buscando o reconhecimento da sua nulidade e a eliminação de seus efeitos, o que geraria a possibilidade de cobrança dos tributos nos próximos 90 dias.

Maria Carolina Sampaiohead da área tributária e sócia da banca GVM Advogados, por sua vez, comenta que a revogação de benefícios e isenções, assim como a alteração de aspectos dos tributos, sempre foi uma discussão presente em nossos tribunais. Ela lembra que o STF, até muito recentemente, entendia que a redução de uma isenção ou de um benefício não implicava majoração do tributo.

“Já em 2020, o Supremo entendeu por bem revisitar a matéria e decidiu que a redução de um benefício fiscal implica majoração do tributo, sujeita ao princípio da anterioridade constitucional.”

A tributarista pondera que a revogação do decreto de Mourão que reduziu PIS, Cofins e ARFMM não representa a anulação de um benefício fiscal propriamente dito, mas a extinção de uma norma que reduziu uma alíquota, tudo via decreto do Executivo.

“Essa previsão de alíquotas em decreto, por si, já é um ponto controverso. Todavia, o STF validou esse procedimento, especificamente para o PIS/Cofins, em 2020, no julgamento do RE 1.043.313 e da ADI 5.277.”

Sócio do escritório Martorelli Advogados, o tributarista João Amadeus dos Santos explica que, embora seja permitido no Direito brasileiro, o instituto da repristinação tem algumas limitações.

“O que é proibido é a repristinação tácita, isto é, que se presuma que a redação antiga voltou. Ou seja, tem de ser expresso na nova norma que a antiga redação voltou. É isso o que o artigo 2º, §3º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro determina. No caso, nós temos isso no Decreto nº 11.374, que revogou a redução do PIS/Pasep e da Cofins.”

Anterioridade necessária
No entendimento de todos os especialistas consultados pela ConJur, é necessário, sim, que seja respeitado o intervalo de 90 dias até que a revogação do decreto de Mourão produza efeitos.

Santos afirma que há uma complicação no caso do PIS/Cofins sobre receitas financeiras, pois é a Lei nº 10.865/2004, em seu artigo 27, §2º, que dá ao Executivo o poder de alterar as alíquotas mediante decreto. Esse dispositivo teve sua constitucionalidade questionada e, recentemente, o STF atestou sua legalidade.

“Na tese propriamente dita, fixada para fins de repercussão geral, não foi abordada a questão da anterioridade dos 90 dias (nonagesimal), porém, em várias manifestações dos ministros quando do julgamento ficou consignado que o aumento das alíquotas produzido via decreto deve, sim, obedecer à noventena”, diz ele.

Assim sendo, o contribuinte que entender ter sido violada sua garantia constitucional pelo novo governo pode ingressar com medida judicial. 

Eduardo Ramos, advogado especialista em Direito Tributário da Weiss Advocacia, resume bem a questão ao lembrar que o contribuinte, quando se depara com decretos que reduzem a carga tributária de algumas de suas receitas, espera que haja previsibilidade. “O que resta agora é a insegurança jurídica e a enxurrada de ações que o Judiciário deve receber nos próximos meses.”

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 5 de janeiro de 2023, 19h51

PIS e Cofins incidem nas importações de países do GATT para uso na Zona Franca

A incidência do PIS e da Cofins-importação nas aquisições feitas de países signatários do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras (GATT) para uso e consumo dentro da Zona Franca de Manaus é válida, de acordo com decisão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu parcial provimento a um recurso da Fazenda Nacional sobre o tema.

Com essa decisão, o colegiado reformou um acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) segundo o qual as importações de bens por empresas sediadas na Zona Franca não estariam sujeitas às contribuições sociais.

O caso teve origem em mandado de segurança impetrado por uma empresa de pequeno porte que, conforme os autos, fazia a compra de bens de países do GATT para revenda na Zona Franca. Para a empresa, a exigência do PIS e da Cofins-importação violava o regime jurídico da Zona Franca (Decreto-Lei 288/1967) e o regime que disciplina o GATT.

Relator do recurso da Fazenda, o ministro Francisco Falcão explicou que as receitas auferidas com a exportação de mercadorias ao exterior são isentas do PIS e da Cofins-faturamento, nos termos do artigo 14 da Medida Provisória 2.158/2001. No mesmo sentido, segundo ele, o STJ firmou entendimento de que, conforme o artigo 4º do Decreto-Lei 288/1967, a venda de mercadoria destinada à Zona Franca equivale à exportação de produto nacional para o exterior, de modo que sobre as receitas dessa operação também não incidem o PIS e a Cofins.

Por outro lado, destacou o ministro, o PIS e a Cofins-importação são contribuições instituídas pela Lei 10.864/2004, devidas pelo importador de produtos e serviços do exterior. Assim, para o relator, as duas contribuições são diferentes daquelas incidentes sobre o faturamento e, portanto, não é possível falar em equiparação para fins de isenção fiscal.

Falcão lembrou que o Decreto-Lei 288/1967 prevê a isenção ao imposto de importação e ao imposto sobre produtos industrializados incidentes na entrada de mercadorias estrangeiras na Zona Franca de Manaus.

“Nota-se que o Decreto-Lei 288/1967 é bastante claro com relação aos benefícios fiscais instituídos, os quais não abrangem a isenção às citadas contribuições na importação, que são devidas pelos importadores de mercadorias destinadas à Zona Franca de Manaus.”

Ainda segundo o ministro Falcão, o princípio do tratamento nacional previsto pelo artigo III do GATT estabelece tratamento igualitário aos produtos nacionais e importados, com o objetivo de evitar discriminações em virtude da imposição de impostos ou outros tributos internos sobre o produto importado.

“Em se tratando da incidência de PIS e Cofins-importação, situação distinta da tributação interna, não fica configurado o desrespeito ao princípio”, concluiu o ministro. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

REsp 2.020.209

Revista Consultor Jurídico, 29 de dezembro de 2022, 14h20

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