João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.
A inexistência de prescrição no curso dos processos administrativos fiscais constitui um dogma que precisa ser afastado.
Prazos prescricionais, como se sabe, existem como preservação da segurança jurídica, visto não ser razoável, sequer justo, que alguém fique infinitamente à mercê de seu credor.
No âmbito processual, também há sanções para aquele que, embora recorrendo ao Judiciário para buscar seu direito, não impulsiona o processo, quando deveria.
Consequentemente, o processo também não pode se eternizar e é justo que o credor perca seu direito por não promover os atos processuais em tempo certo e razoável, impulsionando a ação.
A prescrição intercorrente, ou seja aquela que ocorre dentro do processo, precisa existir, a fim de que se evite uma causa que não tenha fim.
Afinal de contas, o art. 5º, LXXVIII, da Constituição estabelece que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
Como se vê, há clara preocupação do legislador constituinte derivado em assegurar ao contribuinte o direito de uma rápida solução para os processos administrativos, daí resultando a necessidade das decisões administrativas, sejam em primeira instância, seja em grau de recurso, não acarretarem processos de tramitação morosa.
Com efeito, a expressão “razoável duração” traz em si forte carga de subjetividade e cuida de conceito indeterminado como, aliás, também acontece com a expressão “razoabilidade”, que possui diversas nuances e pode ser vista sob diversos sentidos.
É evidente que o atendimento à garantia de uma “razoável duração” do processo administrativo fiscal jamais poderá desobedecer os princípios do contraditório e da ampla defesa, da isonomia, da segurança jurídica de um julgamento justo e de todos outros postulados constitucionais aplicáveis aos processos administrativos e à relação jurídica tributária.
Também é certo que a razoável duração dos processos administrativos representa uma garantia dos contribuintes que deverá ser observada tanto pelo legislador, quanto pela Administração.
Assim, a lei deverá fixar prazo razoável para a conclusão dos processos administrativos fiscais em que são formalizadas as exigências de tributos.
E para que o processo não se torne ineficaz e excessivamente moroso, não há melhor solução do que definir a prescrição da pretensão arrecadatória como sanção pelo descumprimento do prazo de duração razoável do processo administrativo.
A previsão legal da prescrição intercorrente em processos administrativos não é uma novidade.
O art. 1º, §1º, da Lei nº 9.873/99, que estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta, dispõe que “Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso”.
No Estado do Rio de Janeiro, o art. 74, §1º, da Lei nº 5.427/2009, que Estabelece normas sobre Atos e Processos Administrativos no âmbito estadual dispõe no mesmo sentido.
A norma reguladora do processo administrativo fiscal federal também precisa consignar a prescrição intercorrente.
Em tempos de processos digitalizados, sessões de julgamento remotas e virtuais, súmulas vinculantes e todo um aparato administrativo à disposição do contencioso administrativo, nada justifica a tramitação de processos administrativo por longos anos.
O Projeto de Lei Complementar nº 125/2022 e o Projeto de Lei nº 2.483/2022, ambos decorrentes da Comissão de Juristas instituída pelo Ato Conjunto dos Presidentes do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal nº 1/2022, são ótimas oportunidades para que a prescrição intercorrente seja finalmente prevista no âmbito do processo administrativo fiscal da União.