Segunda Turma devolve à primeira instância execução fiscal de R$ 6 bilhões contra a Kia Motors

Por verificar hipótese de supressão de instância, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria de votos, reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) e devolveu ao juízo de primeiro grau uma execução ajuizada pela Fazenda Nacional contra a Asia Motors do Brasil e, posteriormente, redirecionada para a sua sucessora, a Kia Motors Corporation. O valor atualizado da execução é de aproximadamente R$ 6 bilhões.

Para o colegiado, após tomar ciência do redirecionamento da execução, a Kia Motors não poderia ter interposto agravo de instrumento diretamente para o TRF1 sem, antes, oferecer exceção de pré-executividade ou embargos do devedor em primeira instância, nos termos do artigo 16 da Lei de Execução Fiscal

O débito fiscal apontado pela Fazenda se originou de programa governamental de incentivo à expansão da indústria automobilística nos anos 1990. Em troca de benefícios como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), as empresas que aderissem ao programa assumiriam o compromisso de investir no setor. 

Como contrapartida aos incentivos tributários, a Asia Motors se comprometeu a instalar uma fábrica em Camaçari (BA), porém, de acordo com o processo, esse investimento nunca foi feito, embora o grupo tenha importado mais de 20 mil unidades de veículos com redução de alíquota. 

Para a Fazenda, grupo Kia usou a Asia Motors para descumprir compromissos no Brasil

No curso da execução, o juízo deferiu pedido de inclusão da Kia Motors nos autos, sob o argumento, trazido pela Fazenda Nacional, de que teria havido dissolução irregular da Asia Motors no país. Para o fisco, a Kia se utilizou da empresa integrante do grupo para se eximir de responsabilidades e compromissos assumidos com o Brasil. 

Contra a decisão de primeiro grau, a Kia interpôs agravo de instrumento no TRF1, o qual acolheu o recurso para indeferir o redirecionamento da execução. Entre outros fundamentos, o tribunal entendeu que não houve prova documental de dissolução irregular da Asia.

Ainda segundo o TRF1, não houve supressão de instância no caso, tendo em vista que, conforme previsto pelo Código de Processo Civil (CPC) de 1973, é cabível agravo de instrumento contra a decisão interlocutória que decidiu sobre o polo passivo da execução. 

Discussão não é sobre natureza do redirecionamento, mas sobre supressão de instância

De acordo com o ministro Herman Benjamin – autor do voto acompanhado pela maioria da Segunda Turma –, não há dúvida de que a decisão que analisa o pedido de redirecionamento de execução tem natureza de decisão interlocutória, e, como tal, no regime do CPC/1973, é atacável por agravo de instrumento. 

“A questão posta em debate é se é lícito, à luz do princípio do devido processo legal, ‘saltar’ um grau de jurisdição e contornar o princípio do juiz natural para submeter diretamente ao tribunal de origem as razões de reforma de uma decisão”, ponderou o ministro. 

Para Herman Benjamin, ao se dar por citada nos autos e – sem oferecer exceção de pré-executividade (se não fosse necessária a produção de provas) ou embargos à execução fiscal (se fosse o caso de produzir provas) – recorrer diretamente ao TRF1, a Kia Motors, intencionalmente, deixou de submeter ao juízo de primeiro grau as razões de seu questionamento sobre a decisão.  

Em seu voto, o ministro considerou não ser possível “banalizar a hierarquia judicial”, permitindo à parte “pular” instâncias para submeter as suas manifestações diretamente ao juízo de segundo grau. 

“A rejeição dessa tese implica abertura de precedente perigosíssimo, viabilizando tumulto insuperável na tramitação de recursos nas cortes de origem. Por analogia, em ação de conhecimento pelo rito ordinário, a parte demandada poderia se insurgir contra a ordem de citação por meio de agravo de instrumento, para defender diretamente no sodalício local suposta ilegitimidade passiva ou até mesmo a improcedência do pedido (por prescrição), sem jamais ter deduzido suas razões no juízo de primeiro grau”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso da Fazenda.

Leia o acórdão no REsp 1.428.953.

Fonte: Notícias do STJ

Supremo anula decisão do TRF-3 sobre tributação do terço de férias

Por entender que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) afrontou decisão do Supremo Tribunal Federal, a ministra Cármen Lúcia, do STF, anulou uma sentença sobre tributação do terço de férias e reafirmou a suspensão dos processos sobre a matéria.

Na reclamação, o autor lembrou que, no mês passado, o ministro André Mendonça, nos autos do RE 1.072.485, proferiu decisãodecretando a suspensão, em todo o território nacional, dos feitos judiciais que versem sobre a questão presente no Tema 985, que discute se é legítima a incidência de contribuição social sobre o valor do terço constitucional de férias.

O reclamante sustentou que, após a publicação da decisão, o TRF-3 se posicionou no processo de origem, e em outros pendentes de análise, de forma contrária ao entendimento do STF, violando, portanto, a sua competência. 

Ao analisar o caso, a ministra deu razão aos argumentos do autor. “Pelo exposto, julgo procedente a presente reclamação, para cassar a decisão reclamada e determinar o sobrestamento do Processo n. 5002452-76.2018.4.03.6100 até o julgamento dos embargos de declaração no Recurso Extraordinário n. 1.072.485, Tema 985, pelo Supremo Tribunal Federal”, resumiu ela.

O autor da ação teve sua causa patrocinada pelo advogado Reginaldo Bueno, sócio da área tributária do escritório CMT. O causídico entende que “a decisão da reclamação preserva o contribuinte justamente naquilo que foi o motivador da decisão do ministro Mendonça: evitar resultados anti-isonômicos, ajustando uma equivocada decisão do TRF3”. 

Rcl 60.871

Revista Consultor Jurídico, 21 de julho de 2023, 21h59

Primeira Seção define em repetitivo que regra da irretratabilidade da CPRB não se aplica à administração

Em julgamento sob o rito dos repetitivos (Tema 1.184), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que “1) a regra da irretratabilidade da opção pela Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB), prevista no parágrafo 13 do artigo 9º da Lei 12.546/2011, destina-se apenas ao beneficiário do regime, e não à administração; 2) a revogação da escolha de tributação da contribuição previdenciária pelo sistema da CPRB, trazida pela Lei 13.670/2018, não feriu direitos do contribuinte, tendo em vista que foi respeitada a anterioridade nonagesimal”.

Segundo o relator, ministro Herman Benjamin, a contribuição previdenciária das empresas – estabelecida pelo artigo 22, I, da Lei 8.212/1991 – incidia originalmente sobre a folha de salários. Essa previsão, explicou, foi modificada pela Medida Provisória 540/11, convertida na Lei 12.546/2011, que substituiu a base de cálculo do recolhimento pela receita bruta (CPRB), ao passo que, com a edição da Lei 13.161/2015, tais regimes passaram a coexistir, sendo facultado àqueles que contribuem a escolha do regime de tributação sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta.

“Verifica-se que a CPRB é contribuição substitutiva, facultativa, em benefício do contribuinte, instituída como medida de política fiscal para incentivar a atividade econômica, cuja renúncia fiscal é expressiva, da ordem de R$ 83 bilhões de reais no período de 2012 a julho de 2017. Contudo, não há direito adquirido à desoneração fiscal, a qual se constitui, no presente caso, como uma liberalidade”, disse.

Regra da irretratabilidade da CPRB respeitou anterioridade nonagesimal

Para o ministro, o mesmo raciocínio deve ser aplicado à desoneração por lei ordinária. Herman Benjamin esclareceu que a desoneração prevista na Lei 12.546/2011 não era condicional nem por prazo certo, sendo que a sua revogação poderia ser feita a qualquer tempo, respeitando-se a anterioridade nonagesimal –  o que ocorreu, pois a Lei 13.670/2018 foi publicada em 30 de maio de 2018 e seus efeitos apenas começaram a ser produzidos em setembro de 2018.

Na sua avaliação, não prospera a alegação de que a irretratabilidade da opção pelo regime da CPRB também se aplicaria à administração. “Isso porque seria aceitar que o legislador ordinário pudesse estabelecer limites à competência legislativa futura do próprio legislador ordinário, o que não encontra respaldo no ordenamento jurídico, seja na Constituição Federal, seja nas leis ordinárias”, afirmou.

O relator ressaltou que a alteração promovida pela Lei 13.670/2018 não caracteriza violação à segurança jurídica, mas sim a exclusão de uma das opções de regime de tributação que a lei disponibilizava aos que contribuem.

“A regra da irretratabilidade da opção pela CPRB disposta no parágrafo 13 do artigo 9º da Lei 12.546/2011 destina-se apenas ao beneficiário do regime, não à administração, e tampouco fere direitos do contribuinte, pois foi respeitada a anterioridade nonagesimal”, concluiu.

Leia o acórdão no REsp 1.901.638.

Fonte: Notícias do STJ

TJ-RJ anula dispositivos do Código de Defesa do Contribuinte de Volta Redonda

O Poder Legislativo pode apresentar projeto de lei que trate de matéria tributária, mas não pode interferir na organização da administração pública, nem aumentar gastos sem indicar fonte de custeio.

Com esse entendimento, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro declarou a inconstitucionalidade dos artigos 3º, XI e XIV; 12 a 20; 28, parágrafo único; 31; 47 ao 52; 60 a 61; 63; 69; 70, VII e parágrafo 4º; 79; e 94 e 95 do Código de Defesa do Contribuinte de Volta Redonda (Lei municipal 5.478/2018).

Os dispositivos criaram obrigações ao Fisco local, impuseram limites à sua atividade e estabeleceram novos direitos para os contribuintes. Também instituíram o Conselho Municipal de Contribuintes, com componentes não integrantes do quadro funcional da cidade.

A Prefeitura de Volta Redonda contestou a norma, argumentando que apenas o Executivo pode dispor sobre a organização e funcionamento da administração pública e o regime jurídico dos servidores. Em defesa da lei, a Câmara Municipal de Volta Redonda alegou que o Legislativo pode propor lei tributária.

A relatora do caso, desembargadora Inês da Trindade Chaves de Melo, sustentou que a grande maioria dos dispositivos da lei não cuida de matéria tributária, mas de criação de órgão no âmbito do Poder Executivo; matérias especificas à organização e estrutura da administração; condutas materiais para atividade fiscalizatória tributária; e servidores da Fazenda municipal. E tais matérias são de iniciativa privativa do prefeito, segundo ela.

“De forma genérica, ao criar órgão no âmbito da estrutura do Poder Executivo, estabelecer obrigações específicas para órgãos e servidores da administração pública do município nos dispositivos impugnados, verifica-se verdadeira violação à competências exclusivas do chefe do Poder Executivo”, avaliou a magistrada.

A desembargadora mencionou que a norma violou o entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 917 de repercussão geral: “Não usurpa competência privativa do chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos (artigo 61, parágrafo 1º, II, ‘a’, ‘c’ e ‘e’, da Constituição Federal)”.

Segundo a relatora, a criação de direitos dos contribuintes que repercutem diretamente no exercício da administração tributária municipal, com a produção de atos materiais, sem a respectiva fonte de custeio, também é inconstitucional.

Igualmente violam a Carta Magna, conforme a magistrada, uma série de deveres que repercutem diretamente na organização e no funcionamento dos órgãos ligados à Secretaria municipal de Fazenda.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0035163-75.2019.8.19.0000

ARTIGO DA SEMANA – Por que o fisco não pode ir ao Judiciário após decisão do CARF?

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

O Ministro da Fazenda concedeu longa entrevista à jornalista Miriam Leitão, veiculada no canal Globonews na última quarta-feira.

O voto de qualidade de CARF, objeto do Projeto de Lei nº 2384/2023, foi um dos temas abordados na entrevista.

Segundo o Ministro, o restabelecimento do voto de qualidade em favor do fisco é fundamental para restabelecer o equilíbrio, já que só os contribuintes podem recorrer ao Judiciário após decisão desfavorável no CARF.

Ainda de acordo com o Ministro, esta posição é defendida até mesmo pela OCDE.

O Ministro também informou que o PL 2384 prevê a possibilidade de, havendo desempate em favor do fisco, o contribuinte poder realizar o pagamento do principal, sem multa e/ou juros, já que se trata de matéria controvertida.

O discurso do Ministro contém uma inverdade e nos remete à uma antiga discussão.

O déficit de veracidade na resposta do Ministro está na previsão de pagamento do tributo discutido sem acréscimo de multa e juros.

O PL 2384/2023 simplesmente não contém nenhum dispositivo neste sentido.

Os artigos 2º e 3º[1], do PL 2384/2023 apenas dispõem que a Receita Federal poderá disponibilizar métodos preventivos para a autorregularização de obrigações tributárias e que neste casos, dependendo da classificação do contribuinte numa espécie de ranking de conformidade, poderão ser afastadas as penalidades.

Logo, não se trata de afastamento de penalidades e juros, pura e simplesmente, nos casos de exigências fiscais controvertidas e decididas com placar apertado.

A antiga discussão que vem à tona com o discurso do Ministro diz respeito à vedação de acesso do fisco ao Judiciário após decisão final do CARF favorável ao contribuinte.

Dizer que só o contribuinte pode ir ao Judiciário após decisão desfavorável do CARF é reduzir uma discussão complexa ao tamanho de uma azeitona.

Também não é apropriado, sob o ponto de vista de privilégios, comparar fisco e contribuintes.

O fisco, todos sabemos, está numa situação privilegiada porque o crédito tributário goza de garantias e privilégios.

Aliás, como deixa claro o artigo 183, do Código Tributário Nacional, a enumeração das garantias do crédito tributário não se resumem àquelas relacionadas na Lei Geral Tributária. Há diversos outros meios previstos em lei que preservam o crédito da fazenda pública e conferem maior certeza ao recebimento dos valores devidos ao fisco. Portanto, as disposições sobre os privilégios do crédito tributário, a teor do art. 183 do CTN, têm caráter meramente exemplificativo uma vez que podem ser ampliadas por leis específicas.

Fundamentadas no princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, as prerrogativas especiais da Fazenda dirigem-se à proteção do crédito público com vistas à satisfação das necessidades coletivas.

Somente a Fazenda Pública pode unilateralmente produzir um título – a Certidão de Dívida Ativa – que será cobrado judicialmente mediante processo de execução. Nenhum credor privado goza desta prerrogativa.

Com total apoio do Judiciário, este título executivo gerado unilateralmente pela Fazenda Pública pode, inclusive, ser objeto de protesto extrajudicial, abalando, não raro, o bom nome comercial de pessoas físicas e jurídicas, bem como causando embaraços ou até mesmo inviabilizando o acesso ao crédito.

Por aí se vê que a comparação entre fisco e contribuinte do ponto de vista dos privilégios não é uma boa medida.

Mas também é preciso indagar o porquê de não ser possível ao fisco recorrer ao Poder Judiciário ao final de processo administrativo no CARF com decisão desfavorável a seu interesse.

Este é uma tema de grande importância, tendo em vista a possibilidade de introdução de um ambiente de insegurança jurídica entre os indivíduos, na exata medida em que nunca se chegará a uma decisão final no âmbito do processo administrativo, comprometendo a plena eficácia do artigo 156, IX, do Código Tributário Nacional, que afirma ser modalidade de extinção do crédito tributário “a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória”.

Esta é uma discussão antiga, que em agosto fará 19 (dezenove) anos. Através do Parecer PGFN/CRJ/N° 1.987/2004[2] e da Portaria do Procurador Geral da Fazenda Nacional n° 820/2004[3] a PGFN afirmou ser possível a reforma judicial por iniciativa da Fazenda Nacional das decisões proferidas pelos então  Conselhos de Contribuintes do Ministério da Fazenda e promoveu a regulamentação das hipóteses em que esta discussão seria cabível.

Diversamente do que concluiu a PGFN, os pensadores do Direito Tributário alinham pelo menos três grandes obstáculos ao ingresso da Fazenda Pública em juízo para reformar decisão que tenha apreciado recursos administrativo fiscal e decidido pelo cancelamento da exigência fiscal.

O primeiro motivo registrado pela doutrinária contrário à ideia de revisão judicial das decisões proferidas em apreciação de recursos administrativos fiscais é a violação ao princípio da segurança jurídica. Segundo esta corrente do pensamento doutrinário, a possibilidade de ingresso da Fazenda em juízo acabaria por instalar o caos, já que nunca os contribuintes teriam a necessária certeza e segurança da imutabilidade das decisões finais em processos administrativos (IVES GANDRA DA SILVA MARTINS[4] – Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Centro de Extensão Universitária e Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 78).

O segundo fundamento jurídico relevante apontado pela doutrina afeta diretamente a premissa básica adotada pela Procuradoria da Fazenda Nacional no Parecer PGFN/CRT/N° 1.087/2004, qual seja, o princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário. De acordo com o pensamento doutrinário predominante, o direito de acesso à jurisdição foi conferido pelo legislador constituinte ao cidadão, mas não ao Poder Público. Trata-se, pois, de uma garantia do cidadão (HUGO DE BRITO MACHADO[5] – Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Centro de Extensão Universitária e Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 155).

Uma terceira corrente doutrinária defende que é impossível o acesso da Fazenda Pública à jurisdição no caso em apreço, tendo em vista falecer à Administração interesse processual para reverter em juízo decisão proferida por ela mesma (SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO[6] – Processo Administrativo Tributário. São Paulo: Centro de Extensão Universitária e Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 190). 

Também não se pode perder de vista que o Superior Tribunal de Justiça permite o acesso da Fazenda Pública em juízo para obter a revisão de decisão administrativa eivada de nulidade, num verdadeiro exercício de controle judicial da legalidade do ato administrativo, desde que exista prévia disposição legal, obviamente (MS 8.810-DF, DJ 06/10/2003)[7].

Portanto, a impossibilidade de acesso da Fazenda Pública após decisão desfavorável do CARF é tema de grande profundidade que não se resume ao inconformismo do Ministro, da PGFN ou da Diretora do Centro de Política Tributária da OCDE.


[1] Art. 2o A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda poderá́: 

I – disponibilizar métodos preventivos para a autorregularização de obrigações principais ou acessórias relativas a tributos por ela administrados; e 

II – estabelecer programas de conformidade para prevenir conflitos e assegurar o diálogo e a compreensão de divergências acerca da aplicação da legislação tributária. 

§ 1o Nas hipóteses de que trata o caput, a comunicação ao sujeito passivo, para fins de resolução de divergências ou inconsistências, realizada previamente à intimação, não configura início de procedimento fiscal. 

§ 2o A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda disciplinará o disposto neste artigo. 

Art. 3o A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda estabelecerá classificação de contribuintes, de acordo com o grau de conformidade tributária e aduaneira, com base nos seguintes critérios: 

I – regularidade cadastral; 

II – regularidade no recolhimento dos tributos devidos; 

III – aderência entre escriturações ou declarações e os atos praticados pelo contribuinte; 

IV – exatidão das informações prestadas nas declarações e escriturações; e 

V – outros definidos pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda. 

§ 1o A classificação do contribuinte poderá́ ser utilizada como critério para sua inclusão em programas de conformidade. 

§ 2o No âmbito dos programas de conformidade, a administração tributária adotará as seguintes medidas, graduadas de acordo com a classificação do contribuinte, com vistas à autorregularização dos créditos tributários antes do lançamento: 

I – procedimento de orientação tributária e aduaneira prévia; 

II – deixar de aplicar eventual penalidade administrativa; 

III – prioridade de análise em processos administrativos, inclusive quanto a pedidos de restituição ou ressarcimento de direitos creditórios; e 

IV – atendimento preferencial na prestação de serviços presenciais ou 

virtuais. 

§ 3o A medida prevista no inciso II do § 2o será́ graduada e condicionada em função de: 

I – apresentação voluntária, antes do início do procedimento fiscal, de atos ou negócios jurídicos relevantes para fins tributários para o qual não haja posicionamento prévio da administração tributária; ou 

II – atendimento tempestivo a requisições de informações realizadas pela autoridade administrativa. 

§ 4o A Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda disciplinará o disposto neste artigo, inclusive no que se refere à divulgação da classificação dos contribuintes. 

[2] Publicado no Diário Oficial da União – Seção I, de 23/8/2004.

[3] Publicada no Diário Oficial da União – Seção I, de 29/10/2004.

[4] “Parece-me que até por força do ‘princípio-fundamento’ da Constituição, que é o da ‘segurança jurídica’, tal pretensão é inaceitável, visto que se instauraria em relação ao contribuinte que discutiu com sucesso administrativo, mas sem direito à sucumbência, a insegurança absoluta, pois todo o processo em que a Fazenda desempenhou essencialmente os papéis de ‘parte e juiz’, poderia ser reaberto, a qualquer momento, reiniciando-se discussão interminável”.

[5] “O Direito é instrumento de limitação do poder. Sua finalidade essencial consiste em proteger contra quem não tem, aquele que não tem, ou tem menos poder. Por isto mesmo o Estado, o maior centro de poder institucional do planeta, não pode invocar a seu favor as garantias que a ordem jurídica institui para proteger o cidadão, entre as quais se destaca o direito à jurisdição.

As garantias constitucionais são destinadas ao cidadão, e não ao próprio Estado, salvo, é claro, aquelas expressa e explicitamente destinadas, que funcionam como instrumento de preservação da ordem institucional”.

[6] “ninguém pode ir a juízo contra ato próprio, por falta de interesse de agir. De outra parte, a decisão administrativa definitiva, contra a Fazenda Pública, certa ou errada, constitucional ou não, extingue a obrigação tributária.

[7] “o Estado brasileiro submeteu-se a um procedimento destinado à identificação das obrigações e dos respectivos responsáveis. Esse procedimento, cuja instância máxima era o Ministro da Fazenda, hoje se exaure na Câmara Superior de Recursos Fiscais.

O Senhor Ministro deu curso ao apelo, invocando seu poder de controle sobre os conselhos de contribuintes. Ora, a necessidade de controlar pressupõe algo descontrolado. Na hipótese, haveria necessidade de controle, se o conselho de contribuintes houvesse atuado fora do âmbito de sua competência ou sem observar os pressupostos recursais. Nessas circunstâncias, a decisão do conselho seria nula. Bem por isso, o Ministro poderia intervir, para obviar a nulidade.

Na lide objeto deste processo, não se alega que o conselho ultrapassou o âmbito de sua competência ou desconheceu os pressupostos processuais. Simplesmente, afirma-se que o colegiado errou na aplicação da lei”.

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