ARTIGO DA SEMANA –  Exigência de ISS via informações de administradoras de cartões de crédito/débito

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

A Secretaria Municipal de Fazenda do Rio de Janeiro está enviando correspondência a contribuintes do ISS informando que firmou convênio com Estado para ter acesso às informações fornecidas pelas administradoras de cartão de crédito/débito, bem como à escrituração fiscal digital EFD ICMS/IPI das empresas prestadoras de serviços.

Na mesma correspondência, o município informa que é possível identificar divergências entre o que foi declarado pelo contribuinte, o informado pelas administradoras de cartões de crédito/débito e as notas fiscais de serviços (Nota Carioca).

Daí, o município sugere que sejam regularizadas eventuais divergências apuradas através do cruzamento de informações, sob pena da exigência da diferença do ISS apurado, acrescido de multa de ofício de até 250%.

Também se informa que a não regularização do débito ensejará comunicação ao Ministério Público para apuração de infração penal (crime contra a ordem tributária – Lei nº 8.137/90).

A correspondência enviada pelo Município, verdadeira ameaça de uma devassa fiscal, revela diversas situações que merecem atenção.

Correspondência não é intimação

Antes de mais nada, é preciso deixar claro que a forma utilizada pelo município para fazer a abordagem – mera correspondência – não constitui uma intimação.

Consequentemente, o contribuinte que, inserindo-se na hipótese, desejar realizar as retificações e pagar a diferença de ISS estará realizando uma denúncia espontânea, já que não está sob ação fiscal.

Na denúncia espontânea o tributo devido pode ser pago em atraso, devidamente atualizado, com acréscimo de juros de mora, porém sem a penalidade (multa)

Convênio Estado – Município

A realização de convênios para a troca de informações entre os entes da federação é algo totalmente possível, previsto na lei e constitui importante ferramenta à disposição do fisco em sua missão de verificar a ocorrência de fatos geradores da obrigação tributária (art. 199, do CTN).

Nada obsta, portanto, a celebração do convênio para o compartilhamento de informações entre o Estado do Rio de Janeiro e o Município.

Evidentemente, aquele que receber a informação sobre a situação econômica ou financeira do contribuinte não poderá divulga-la, devendo preserva o devido sigilo (art. 198, do CTN).

Quebra de sigilo bancário

Ao obter informações sobre os pagamentos realizados aos contribuintes do IS pelas administradoras de cartões de crédito/débito, o Município do Rio de Janeiro passa a promover a quebra do sigilo bancário dos contribuintes sem prévia ordem judicial.

A quebra do sigilo bancário é regulada por lei federal, a Lei Complementar nº 105/2001, que foi objeto de profundo questionamento junto ao Poder Judiciário.

A parte que interessa são os artigos 5º e 6º, da LC 105/2001, que , cuidam de situações distintas e têm destinatários diferentes.

Art. 5oO Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços.

Com efeito, os arts. 5º e 6º, da Lei Complementar nº 105/2001

O art. 5º trata da possibilidade de serem transferidas ao fisco as informações sobre operações financeiras dos contribuintes, cabendo ao Poder Executivo fixar a periodicidade e os limites de valor.    

Mas o artigo 5º, da LC 105/2001, segundo a expressão literal do dispositivo, é voltado exclusivamente à União, jamais podendo ser utilizado pelos Estados ou Municípios.

Já o art. 6º, da LC 105/2001, tem aplicação aos demais entes da federação, e autoriza a fiscalização “a examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente”.

Tanto o artigo 5º quanto o artigo 6º foram objeto de profunda discussão judicial por se entender que o acesso do fisco, sem prévia ordem judicial, aos dados bancários do contribuinte caracterizaria violação à intimidade e ao sigilo de dados, ambos garantias fundamentais do contribuinte previstas no art. 5º, X e XII, da Constituição.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 2859, declarou a constitucionalidade dos artigos 5º e 6º, da LC 105/2001. 

Embora o Supremo Tribunal Federal tenha decidido pela constitucionalidade da Lei Complementar nº 105/2001, é preciso destacar que o Tribunal fez aguda ressalva quanto à aplicação do art. 6º, da LC 105/2001, pelos Estados e Municípios.

De acordo com o Supremo Tribunal Federal (ADIN 2859, DJ 21/10/2016), os Estados e Municípios “somente poderão obter as informações de que trata o art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001 quando a matéria estiver devidamente regulamentada, de maneira análoga ao Decreto federal nº 3.724/2001, de modo a resguardar as garantias processuais do contribuinte, na forma preconizada pela Lei nº 9.784/99, e o sigilo dos seus dados bancários”.

Mas o que significa a regulamentação da matéria de maneira análoga ao Decreto federal nº 3.724/2001? 

Responde o próprio Supremo Tribunal Federal:

“… a regulamentação da matéria no âmbito estadual e municipal deverá, obrigatoriamente, conter as seguintes garantias: 

i) pertinência temática entre as informações bancárias requeridas na forma do art. 6º da LC no 105/01 e o tributo objeto de cobrança no processo administrativo instaurado; 

ii) prévia notificação do contribuinte quanto à instauração do processo (leia-se, o contribuinte deverá ser notificado da existência do processo administrativo previamente à requisição das informações sobre sua movimentação financeira) e relativamente a todos os demais atos; 

iii) submissão do pedido de acesso a um superior hierárquico do agente fiscal requerente; 

iv) existência de sistemas eletrônicos de segurança que sejam certificados e com registro de acesso, de modo que torne possível identificar as pessoas que tiverem acesso aos dados sigilosos, inclusive para efeito de responsabilização na hipótese de abusos; 

v) estabelecimento de mecanismos efetivos de apuração e correção de desvios; 

vi) amplo acesso do contribuinte aos autos, garantindo-lhe a extração de cópias de quaisquer documentos e decisões, de maneira a permitir que possa exercer a todo tempo o controle jurisdicional dos atos da administração, segundo atualmente dispõe a Lei 9.784/1999.”

O Estado do Rio de Janeiro adotou as providências determinadas pelo STF, porém somente em 15/01/2020 , data da publicação do Decreto nº 46.902/2020

Pesquisando a legislação tributária municipal do Rio de Janeiro, não se identifica norma que cumpra o papel do Decreto (federal) nº 3.724/2001.

Logo, à míngua de devida regulamentação por lei municipal, observando aquilo que restou definido pelo Supremo Tribunal Federal, é impossível a quebra do sigilo bancário do contribuinte por ato do Poder Executivo do Município do Rio de Janeiro.

Mais ainda: todas as informações obtidas pelo município do Rio de Janeiro por tal meio são imprestáveis, da mesma forma que não se aproveita o fruto decorrente de uma árvore podre ou envenenada.

Havendo a cobrança de ISS pelo Rio de Janeiro com base nas informações obtidas pelas administradoras de cartões de crédito/débito, caberá ao contribuinte recorrer ao Poder Judiciário apontando a inconstitucionalidade da exigência fiscal face aos arts. 5º e 6º, da Lei Complementar nº 105/2001, na interpretação dada pelo STF no julgamento da ADI 2859, imediatamente ou após o desfecho de um processo administrativo fiscal.

Multa de 250%

A multa de ofício de 250% anunciada pelo município é exagerada, mesmo que se considere sua incidência exclusivamente aos casos de fraude, simulação ou sonegação.

O STF tem precedente pela inconstitucionalidade de multa de 300% prevista em lei federal (ADI 1075) e da multa de 250% prevista no ADCT da Constituição do Estado do Rio de Janeiro (ADI 551).

Nesta ordem de ideias, mesmo que o contribuinte se conforme com a exigência do ISS com base nas informações obtidas pelas administradoras de cartões de crédito/débito, a anunciada imposição de multa de 250% mercê ser impugnada, seja na via administrativa, seja perante o Poder Judiciário.

Comunicação ao Ministério Público

A advertência anunciada pelo município sobre a possível comunicação dos fatos ao Ministério Público não deve ser motivo de preocupação.

Inicialmente, é preciso lembrar que os crimes contra a ordem tributária pressupõem a existência de tributo devido. Isto quer dizer que a comunicação ao MP somente poderá ocorrer após a constituição do crédito tributário, vale dizer, a lavratura de um auto de infração.

Não há hipótese do município, pela simples identificação de eventual diferença no recolhimento do ISS representar ao MP para que seja apurada a materialidade de um crime que não existe, tendo em vista que não há tributo exigido e muito menos devido.

Mesmo após a lavratura do auto de infração, a apuração da responsabilidade penal somente terá seguimento após decisão administrativa final e definitiva contrária ao contribuinte no curso de um processo administrativo fiscal com garantia do contraditório e da ampla defesa.

Por tal motivo, recomenda-se que eventual auto de infração seja impugnado no prazo legal.

Pacheco atende pedido do governo e adia projetos que mexem em regras tributárias

Após o pedido do governo, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, adiou a votação de dois projetos que buscam equilibrar as relações entre pagadores de tributos e o Fisco. Ambos estavam na pauta da sessão desta quarta-feira (19). Segundo Pacheco, os projetos — PLP 125/2022, que institui o Código de Defesa do Contribuinte, e o PLP 124/2022, que muda as regras de atuação do Fisco — retornarão à pauta oportunamente.

O presidente do Senado informou que quer ouvir os líderes, em reunião agendada para esta quinta-feira (20), sobre a nova data de votação das propostas. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), disse que os temas são complexos e pediu mais tempo para a análise do texto. O relator das propostas,  senador Efraim Filho (União-PB), reconheceu que, principalmente para o Código de Defesa do Contribuinte, há uma série de sugestões de emendas no Plenário, mas reforçou que os temas estão maduros: 

— Esses temas tramitaram por mais de seis meses em comissão especial. Foram cinco audiências públicas, com a participação de entidades, com a participação do segmento interessado, com juristas [e especialistas]. São temas que tiveram sua análise esgotada dentro dessa comissão especial — informou Efraim.

O PLP 125/2022 premia o bom pagador enquanto pune o chamado “devedor contumaz”, como empresários que usam a inadimplência como estratégia de negócio. O texto traz normas gerais sobre os direitos, garantias e deveres dos cidadãos na relação com a Receita Federal e com os demais órgãos da administração tributária de todos os entes federativos. O objetivo central é coibir abusos por parte do Fisco.

Uma das principais novidades do PLP 124/2022 é a imposição de limite para as multas de 75% do tributo devido. O texto também uniformiza o processo administrativo fiscal trazendo regras gerais sobre a cobrança e o pagamento de tributos tanto para a União quanto para estados e municípios, além de estimular o uso da mediação e arbitragem como instrumento de prevenção de conflitos.

Fonte: Agência Senado

Primeira Seção discute se seguro-garantia impede protesto do título e inscrição do débito tributário no Cadin

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou os Recursos Especiais 2.098.943 e 2.098.945, de relatoria do ministro Afrânio Vilela, para julgamento pelo rito dos repetitivos.

A controvérsia foi cadastrada na base de dados do STJ como Tema 1.263 e está assim descrita: “definir se a oferta de seguro-garantia tem o efeito de obstar o encaminhamento do título a protesto e a inscrição do débito tributário no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin)”.

O relator enfatizou que “a tese a ser adotada contribuirá para oferecer maior segurança e transparência na solução da questão pelas instâncias de origem e pelos órgãos fracionários desta corte”.

O ministro destacou que a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas, ao concluir pela necessidade de submissão do assunto à sistemática dos repetitivos, apontou o relevante impacto nos processos em trâmite no país e nos procedimentos executivos adotados pelos estados e municípios para cobrança das dívidas tributárias.

A Primeira Seção determinou a suspensão de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria, nos quais tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial, na segunda instância ou no STJ.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Leia o acórdão de afetação do REsp 2.098.943.

Fonte: Notícias do STJ

Contribuição previdenciária sobre terço de férias será cobrada a partir de decisão sobre o tema

Plenário decidiu que a publicação da ata do julgamento do recurso sobre a matéria marca o início da cobrança.

Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a contribuição previdenciária das empresas será cobrada sobre o terço constitucional de férias a partir de 15/9/2020, data da publicação da ata do julgamento do mérito do Recurso Extraordinário (RE) 1072485. As contribuições já pagas e não questionadas judicialmente até a mesma data não serão devolvidas pela União.

Tramitação

Em agosto de 2020, o Plenário julgou legítima a incidência. Em dezembro de 2023, o ministro André Mendonça determinou a suspensão nacional de todos os processos judiciais e administrativos fiscais que discutissem o tema, até que o STF decidisse a modulação dos efeitos da decisão.

Mudança de entendimento

No julgamento desta quarta-feira, prevaleceu o entendimento do presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso. Em seu voto, proferido anteriormente no Plenário Virtual, ele lembrou que, em 2014, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) havia decidido que a contribuição previdenciária patronal não incidiria no adicional de férias. Além disso, diversos precedentes do STF avaliaram que a discussão seria de natureza infraconstitucional.

Segundo o ministro, com o reconhecimento da repercussão geral e o julgamento de mérito do RE, houve uma alteração no entendimento dominante nas duas Cortes. Assim, em respeito à segurança jurídica e ao sistema integrado de precedentes, é necessário modular os efeitos do julgamento.

Seguiram esse entendimento as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber (aposentada) e os ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Edson Fachin e Nunes Marques.

Fonte: Notícias do STF

STF fará audiência pública sobre isenção tributária a agrotóxicos

Ministro Edson Fachin, relator da ação, submeteu a proposta ao colegiado, que aprovou a medida.

O Supremo Tribunal Federal (STF) fará uma audiência pública para debater a isenção tributária a agrotóxicos. O pedido foi feito na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5553 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e aprovada pelo relator, ministro Edson Fachin, e pelo plenário da Corte. A data será marcada posteriormente.

Na ação, o PSOL questiona cláusulas do Convênio 100/1997 do Confaz que reduz em 60% a base de cálculo do ICMS dos agrotóxicos e autoriza os Estados a concederem isenção total do imposto nesses produtos.

Manifestações

Durante a sessão plenária de hoje (13), foram ouvidas as manifestações das partes do processo e de terceiros interessados.

A advogada Geovana Patrício, que falou pelo PSOL, apontou riscos à saúde e ao meio ambiente atrelados a agrotóxicos, reafirmando que a isenção tributária contribui para o uso desses produtos.

Por outro lado, o advogado Rodrigo de Oliveira, que falou pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), afirmou que o fim do benefício tributário nos agrotóxicos seria arcado pelo consumidor, que veria o preço dos produtos aumentarem para suprir os gastos a mais da produção.

Audiência pública

Ao fim das sustentações, o ministro Edson Fachin propôs ao Tribunal a realização de uma audiência pública sobre o tema. Como o julgamento havia sido iniciado no plenário virtual, o relator entendeu que era melhor uma deliberação colegiada sobre o pedido antes de autorizá-lo. O Plenário acolheu a sugestão.

PN/CR//CF

Fonte: Notícias do STF

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