STF definirá se lucro no exterior pode ser tributado no Brasil

Ministros analisam recurso da Fazenda Nacional contra decisão do Superior Tribunal de Justiça favorável à siderúrgica Vale

O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá definir se tratados firmados entre o Brasil e outros países devem afastar a tributação da matriz nacional sobre ganhos de empresas coligadas e controladas no exterior. Atualmente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) divergem sobre essa possibilidade, o que tem levado companhias a recorrer ao Judiciário.

A questão é tão relevante que foi objeto do primeiro edital da nova fase de transação — negociação de pagamento de débitos com a Fazenda Nacional — aberto no fim de 2023 para “teses tributárias”. Na época, a Fazenda apontou cerca de 200 processos em tramitação sobre o tema — 150 na esfera administrativa e 50 na judicial —, que somavam ao redor de R$ 69 bilhões.

O STF começou a analisar a aplicação de tratados contra a incidência de IR e CSLL referente a lucro auferido no exterior no mês de maio. Mas um pedido de vista, após o voto do relator, ministro André Mendonça, favorável aos contribuintes, suspendeu o julgamento. O prazo para um processo voltar à pauta do Supremo depois de um pedido de vista é de 90 dias.

No mesmo mês de maio, no STJ, a ministra Regina Helena Costa, por meio de decisão monocrática, aceitou que tratados afastem a tributação no Brasil, enquanto a 1a Turma da Câmara Superior do Carf manteve a autuação fiscal em outro caso semelhante. Segundo advogados, a divergência acaba por incentivar a judicialização.

O processo que está sendo julgado pelo Supremo é um recurso da

Fazenda contra uma decisão do STJ, do ano de 2014 (RE 870214). Na ocasião, a 1a Turma havia decidido que não incide IR e CSLL sobre o lucro de controladas situadas em países com os quais o Brasil firmou tratados para evitar a bitributação sobre a renda. No caso, unidades, da companhia siderúrgica Vale, eram localizadas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo.

O STJ considerou, naquele caso, que deve prevalecer o artigo 7o dos tratados que seguem o modelo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O dispositivo estabelece que esses lucros só podem ser tributados no país de origem. Assim, essas empresas não se submeteriam a tributação no Brasil, como determinava o artigo 74 da Medida Provisória (MP) no 2.158, de 2001.

No voto, Regina Helena Costa afirmou que a Corte adota entendimento segundo o qual, no caso de empresa controlada, dotada de personalidade jurídica própria e distinta da controladora, nos termos dos Tratados Internacionais, os lucros auferidos são lucros próprios e assim tributados somente no país do seu domicílio (REsp 1325709).

“A sistemática adotada pela legislação fiscal nacional de adicioná-los ao lucro da empresa controladora brasileira fere os Pactos Internacionais Tributários e infringe o princípio da boa-fé na relações exteriores, a que o Direito Internacional não confere abono”, afirma no voto, citando o precedente da 1a Turma do STJ, do ano de 2014.

Já no Carf, a 1a Turma da Câmara Superior manteve autuação semelhante (16561.720158/2013-15) em julgamento realizado em 20 de maio. No caso, o auto de infração foi recebido pela Andrade Gutierrez Engenharia referente a lucros auferidos no exterior por controladas na Argélia, Peru, Espanha e Portugal.

No STF, o relator, ministro André Mendonça, afirma no voto que, uma vez que os tratados foram pactuados, não se admite o descumprimento de maneira unilateral pelo Brasil nem seu uso abusivo pelas empresas.

Ainda segundo o ministro, a decisão no caso concreto depende da aplicação específica de normas infraconstitucionais, mas, se admitida a discussão constitucional, se afastarem os efeitos do artigo 7o desses tratados, além do inadimplemento unilateral do pacto, será frustrada a confiança dos contribuintes que estruturaram suas operações tendo em vista a legislação e a interpretação no momento em que decidiram a estrutura de suas operações.

No voto, Mendonça afirma que o Brasil atrai investimentos ao pactuar acordos. Diz ainda que eventual redução na arrecadação da tributação sobre matrizes nacionais compensa-se com o influxo de multinacionais estrangeiras que se instalam no país. Faltam dez votos.

A advogada Priscila Faricelli, sócia do Demarest Advogados, destaca um julgado do STF, citado em decisões do Carf favoráveis ao Fisco, fazendo uma diferenciação entre ele e a discussão atual. Diz que a ADI no 2588 discute a tributação quando a empresa lá fora está em um paraíso fiscal. Mas aponta que a composição do STF mudou muito desde esse julgamento e que o processo da Vale, julgado pelo STJ, fala de países com os quais o Brasil tem tratado e não são paraísos fiscais.

Já o advogado Raphael Lavez, sócio do Lavez Coutinho Advogados, diz que o Carf é consistente em manter o entendimento favorável à Fazenda por meio do voto de qualidade (desempate). No caso analisado em maio, diz que o relator havia citado a jurisprudência do STJ, mas ficou vencido.

De acordo com Lavez, existem tratados que expressamente permitem a tributação nacional, mas o Carf tem esse entendimento, atualmente, para qualquer tratado. “Falta, na jurisprudência do Carf, reconhecer especificidades dos tratados em si”, afirmou o advogado.

Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma que o Carf segue as premissas do entendimento firmado pelo STF em precedentes como a ADI no 2588. Segundo o órgão, restou definido que os lucros obtidos por meio de controladas e coligadas no exterior estão disponíveis, jurídica e economicamente, para a empresa residente no Brasil. “A renda pertence à empresa residente no Brasil, e não às empresas sediadas no exterior”, diz.

Ainda segundo o órgão, existe vedação nos tratados para que um país tribute a renda de uma empresa situada no outro país signatário do tratado. Sobre os precedentes do STJ, a PGFN esclarece que apenas os julgados na forma de recursos repetitivos produzirão efeito vinculante para o Carf, o que ainda não aconteceu. A PGFN ainda atua perante o STJ para fazer prevalecer a tese de que a tributação recai sobre os lucros disponíveis para a empresa residente no Brasil.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/06/16/stf-definira-se-lucro-no-exterior-pode-ser-tributado-no-brasil.ghtml

Primeira Seção discute se seguro-garantia impede protesto do título e inscrição do débito tributário no Cadin

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou os Recursos Especiais 2.098.943 e 2.098.945, de relatoria do ministro Afrânio Vilela, para julgamento pelo rito dos repetitivos.

A controvérsia foi cadastrada na base de dados do STJ como Tema 1.263 e está assim descrita: “definir se a oferta de seguro-garantia tem o efeito de obstar o encaminhamento do título a protesto e a inscrição do débito tributário no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin)”.

O relator enfatizou que “a tese a ser adotada contribuirá para oferecer maior segurança e transparência na solução da questão pelas instâncias de origem e pelos órgãos fracionários desta corte”.

O ministro destacou que a Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas, ao concluir pela necessidade de submissão do assunto à sistemática dos repetitivos, apontou o relevante impacto nos processos em trâmite no país e nos procedimentos executivos adotados pelos estados e municípios para cobrança das dívidas tributárias.

A Primeira Seção determinou a suspensão de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria, nos quais tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial, na segunda instância ou no STJ.

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Leia o acórdão de afetação do REsp 2.098.943.

Fonte: Notícias do STJ

ARTIGO DA SEMANA –  A responsabilidade do sócio nas execuções fiscais

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

Questão bastante importante surge da interpretação do artigo 135, III, que dispõe sobre a possibilidade de sócios ou administradores responderem por débitos da pessoa jurídica. 

De acordo com este dispositivo, (a) apenas o sócio ou administrador que detenha a gestão da empresa é que poderá ser pessoalmente responsabilizado por débito da pessoa jurídica e (b) ainda assim, é preciso que fique provado que este sócio ou administrador praticou atos contrários à lei ou com excesso de poderes que lhe foram conferidos pelos atos constitutivos da sociedade.

Segundo a pacífica orientação da jurisprudência, o não pagamento do tributo, por si só, não caracteriza infração à lei de modo a permitir a responsabilização do sócio, como deixa claro a Súmula STJ nº 430[1]

Por outro lado, nos casos de dissolução irregular da sociedade – extinção de fato da empresa – presume-se a infração à lei e fica autorizado o redirecionamento ao sócio administrador (Súmula STJ nº 435[2]).

Na compreensão do Tema 981 dos Recursos Repetitivos, o STJ definiu que o redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da pessoa jurídica executada ou na presunção de sua ocorrência, pode ser autorizado contra o sócio ou o terceiro não sócio, com poderes de administração na data em que configurada ou presumida a dissolução irregular, ainda que não tenha exercido poderes de gerência quando ocorrido o fato gerador do tributo não adimplido, conforme art. 135, III, do CTN.

O Superior Tribunal de Justiça, tratando do artigo 135, III, do CTN, também esclarece sobre o ônus da prova do ato contrário à lei ou com excesso de poderes. Assim, a Corte entende que, no caso do sócio constar como codevedor no título executivo (Certidão da Dívida Ativa) a ele é que caberá o ônus de provar que não praticou ato ilegal ou com excesso de poderes contratuais, sob pena de macular-se a presunção de liquidez e certeza do título (REsp nº 947.063/RS entre outros). Mas havendo o redirecionamento da execução fiscal em relação ao sócio, o ônus da prova caberá ao fisco (exequente) – EREsp nº 702.232/RS.

Uma questão que ainda precisa ser definida pela jurisprudência diz respeito à fundamentação legal da responsabilização do sócio/administrador na Certidão de Dívida Ativa.

De acordo com o art. 202, III, do CTN, o título executivo deve indicar o enquadramento legal da exigência e, obviamente, da responsabilidade tributária.

No entanto, não raro, as CDAs que instruem as execuções fiscais não indicam qual a fundamentação legal da responsabilidade tributária do sócio executado.

Sem saber em que dispositivo legal está lastreada a sua responsabilização, o executado não tem como exercer na plenitude seu direito de defesa, à vista das diversas possibilidades de sujeição passiva indireta previstas no Código Tributário Nacional.

Por aí já se vê a clara nulidade das CDAs e das execuções fiscais que omitem a fundamentação legal da responsabilidade do sócio, valendo a pena lembrar importante decisão do TRF1:  

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SÓCIO CUJO NOME CONSTA DA CDA. NULIDADE DO TÍTULO QUE NÃO APRESENTA FUNDAMENTO LEGAL DA CORRESPONSABILIDADE. CABIMENTO DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. 

1. Embora a dívida ativa regularmente inscrita goze de presunção de certeza e liquidez ( CTN, art. 204) e seja admissível o ajuizamento da execução fiscal também contra eventuais corresponsáveis (Lei 6.830/1980, art. 2º, § 5º/I e art. 4º/V), há necessidade de que o título executivo tenha se constituído validamente em relação a eles, porque o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente (Súmula 430/STJ). 

2. “A responsabilidade tributária pressupõe duas normas autônomas: a regra matriz de incidência tributária e a regra matriz de responsabilidade tributária, cada uma com seu pressuposto de fato e seus sujeitos próprios. A referência ao responsável enquanto terceiro (dritter Persone, terzo ou tercero) evidencia que não participa da relação contributiva, mas de uma relação específica de responsabilidade tributária, inconfundível com aquela” ( RE 562.276-PR, repercussão geral, r. Ministra Ellen Gracie, Plenário/STF em 03.11.2010). 

3. Não obstante o nome dos sócios conste como corresponsável pelo débito da empresa, não está indicado o dispositivo legal em que se fundamenta a corresponsabilidade, como exige o art. 2º, § 5º/III, da Lei 6.830/1980, caracterizando nulidade do título em relação a eles

4. A falta de indicação do fundamento legal na CDA é questão de direito, não tendo o executado de provar nenhum fato, caso em que podia ser apreciada em exceção de pré-executividade CTN, art. 204, p. único. 

5. Aliás, como se trata de crédito previdenciário constituído na vigência da Lei 8.620/1993, é de se concluir, como o fez o juiz de primeiro grau, que o sócio tenha sido originariamente incluído na CDA/1998 por força do art. 13 dessa lei. Posteriormente, esse dispositivo foi declarado inconstitucional pelo STF ( RE 562.276-PR, repercussão geral, r. Ministra Ellen Gracie, Plenário/STF em 03.11.2010) e revogado pela MP n. 449/2008, convertida na Lei n. 11.941/2009. 

6. Como a responsabilidade tributária de terceiro não decorre da norma tributária impositiva (regra matriz de incidência tributária), mas de uma norma específica de responsabilidade tributária (regra matriz de responsabilidade tributária), a higidez do título para fundamentar execução contra o responsável depende de indicação do fundamento legal da própria responsabilidade. Do contrário, não será suficiente, por si só, para fundamentar o redirecionamento. (Paulsen, Leandro. Direito Processual Tributário. Livraria do Advogado, 8ª Ed. pág. 261). 

7. Agravo de instrumento da União/exequente desprovido.

(TRF-1 – AI: 00490287320174010000, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA, Data de Julgamento: 12/04/2021, OITAVA TURMA)

Interessante notar que nem mesmo o recente PL 2.488/2022, que propõe uma nova Lei de Execuções Fiscais, se preocupou com o assunto. É preciso que a lei deixe expresso que a indicação dos dispositivos legais que fundamentam a responsabilidade do devedor, se for o caso, é um dos requisitos da CDA, sob de não ser possível o pleno exercício do direito de defesa, cujo ônus a jurisprudência fez recair sobre o sócio/administrador.


[1] “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”.

[2] “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente”.

STJ nega possibilidade de importador pedir ao Fisco devolução de valores pagos a maior

1ª Turma impede devolução de PIS/Cofins-Importação em operação por conta e ordem

A 1a Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) impediu que o pedido de devolução de valores pagos a maior de PIS/Cofins-Importação seja feito pelo importador  por conta e ordem de terceiro.

Nessa modalidade, muito comum no comércio exterior, a empresa é contratada para importar mercadoria adquirida no exterior como mandatário. A decisão foi unânime. 

O entendimento é importante porque essa foi a primeira vez que a 1a Turma do STJ julgou o assunto. Como a 2a Turma já havia negado um outro pedido similar, na prática, a questão pode ser considerada pacificada na Corte.

Na importação direta, o importador assume total responsabilidade pela operação. Já na indireta, há participação de intermediário e ela pode ser feita em duas modalidades: por encomenda ou por conta e ordem de terceiro, como no caso concreto.

A Receita Federal considera que na modalidade de importação por conta e ordem, embora a atuação da empresa importadora possa abranger desde a execução do despacho de importação até a intermediação da negociação no exterior, o importador de fato é a adquirente, mandante da importação. A importadora por conta e ordem é considerada uma mandatária da adquirente.

Para o Fisco, mesmo que a importadora por conta e ordem efetue os pagamentos ao fornecedor estrangeiro, não se caracteriza uma operação por sua conta própria, mas, sim, entre o exportador estrangeiro e a adquirente, pois é dela que se originam os recursos financeiros.

“A legislação esclarece que é o adquirente quem tem direito ao crédito de PIS-Importação e Cofins-Importação nesses casos”, afirmou o relator no STJ, ministro Paulo Sérgio Domingues.

Os valores pleiteados na ação eram relativos à inclusão de ICMS e das próprias contribuições na base de cálculo do PIS/Cofins-Importação, nas operações em que atuou como importadora por ordem de terceiros. A Brasil Mundi Importação e Exportação tentava reaver valores que ampliaram a base de cálculo dos tributos.

Para o Tribunal Regional Federal da 4a Região (TRF-4), o direito à restituição (repetição de indébito) estaria restrito às operações de

importação por conta própria. Isso porque, nas operações por conta e ordem de terceiros, a empresa não teria legitimidade para pedir a devolução.

Inconformada, a empresa recorreu ao STJ. Alegou que a existência de solidariedade entre importador e adquirente não impede a restituição pelo importador do PIS/Cofins-Importação pagos indevidamente (REsp 1552605). O advogado da companhia, José Antônio Valduga, afirmou na sustentação oral que se o importador não puder pedir a repetição de indébito, não haverá nenhum legitimado a fazer esse pedido, o que resultaria em enriquecimento ilícito da União.

O relator, ministro Paulo Domingues, destacou que não há legitimidade para o importador por conta e ordem de terceiros usar créditos de PIS/Cofins-Importação porque não é ele quem arca com o custo financeiro da importação. O ministro considerou também que a 2a Turma tem precedente no mesmo sentido (Resp 1573681).

Ainda segundo Domingues, nesse modelo de importação, há uma espécie de mandato que acaba se extinguindo com a realização da operação. “Precisaria de outro [mandato] para fazer algum tipo de restituição ou algo que o valha na importação por conta e ordem de terceiros.”

A ministra Regina Helena Costa destacou que essa é a primeira decisão da 1a Turma sobre o assunto e também acompanhou o relator, como os demais integrantes do colegiado.

Em decisão unânime, em 2016, a 2a Turma do STJ havia definido que o artigo 18 da Lei no 10.865/04 estabelece que os créditos de PIS/Cofins- Importação serão aproveitados pelo encomendante. Para a turma, não seria possível ao importador por conta e ordem de terceiro repetir o indébito do tributo pago a maior, até porque os créditos já podem ter sido usados pelo encomendante. Assim, os valores pagos não poderiam ser restituídos ao importador sob pena de dupla repetição.

Após recurso, o precedente da 2a Turma chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Em decisão monocrática, o ministro Gilmar Mendes destacou que o caso trazia apenas argumentos infraconstitucionais e que eventual julgamento exigiria análise de fatos e provas, o que não é feito no Supremo. Assim, na prática, o pedido foi negado.

Segundo Maria Andréia dos Santos, sócia do Machado Associados, o tema é relevante para muitos agentes econômicos porque essas operações são extremamente comuns nas operações de comércio exterior. A advogada destaca que a importadora é considerada contribuinte para todos os fins de direito, e, inclusive, nas autuações ligadas à operação é a importadora que será autuada. Porém, quando se trata da repetição de indébito, diz ela, esse direito não lhe é assegurado por se entender que há uma ilegitimidade de parte.

“Para se evitar realmente o enriquecimento ilícito por parte do Estado, este direito deve ser assegurado às importadoras no caso das empresas adquirentes sujeitas ao lucro presumido”, afirmou. A advogada reforça que, como há precedentes das duas turmas, fica mais difícil haver uma análise do tema pela Seção, que poderia consolidar definitivamente o entendimento sobre o assunto em recurso repetitivo — que seria seguido pelas instâncias inferiores do Poder Judiciário.

Quanto à possibilidade de exame da questão pelo STF, a advogada considera as chances remotas por se tratar de matéria infraconstitucional.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/06/11/stj-nega-possibilidade-de-importador-pedir-devoluo-de-valores-pagos-a-maior.ghtml

Negado pedido da Petrobras para anular débito de quase R$ 1 bilhão por não recolher Cide-Combustíveis

Por unanimidade, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido da Petrobras para que fosse anulado o processo administrativo fiscal no qual a empresa foi autuada pelo não recolhimento de cerca de R$ 975 milhões a título de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de petróleo e seus derivados (Cide-Combustíveis).

A petrolífera havia deixado de recolher o tributo em razão de decisões liminares – posteriormente revogadas – concedidas em favor de distribuidoras e postos de combustíveis para que a compra dos derivados de petróleo fosse feita sem a incidência da Cide. No entanto, para a Segunda Turma, essas decisões provisórias não reconheceram aos varejistas a condição jurídica de contribuintes, tampouco de responsáveis tributários. 

Ainda de acordo com os ministros, as liminares não poderiam violar o artigo 2º da Lei 10.336/2001, trazendo nova hipótese de responsabilidade tributária sem previsão em lei específica e ignorando a qualificação das produtoras de combustíveis (a exemplo da Petrobras) como contribuintes. 

O caso teve origem em ação ajuizada pela Petrobras para anular o processo administrativo fiscal referente a valores da Cide-Combustíveis, bem como para pedir a suspensão da exigibilidade dos juros cobrados em outro processo administrativo fiscal, pendente de julgamento pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). 

Em recurso, Petrobras alegou que apenas teria respeitado ordens judiciais

Em primeiro grau, o pedido da petrolífera foi julgado parcialmente procedente, apenas para suspender a exigibilidade do crédito relativo aos juros de mora enquanto houvesse discussão na esfera administrativa. 

A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2). Para o tribunal, nos termos do artigo 2º da Lei 10.336/2001, são contribuintes da Cide-Combustíveis o produtor, o formulador e o importador, enquadrando-se a Petrobras entre esses contribuintes, especialmente por atuar como refinaria. Assim, segundo o TRF2, a empresa não estaria desobrigada do recolhimento da contribuição em razão de decisões liminares favoráveis às distribuidoras e aos postos de combustíveis, quando autorizada a aquisição de derivados de petróleo sem o repasse do tributo no preço. 

Em recurso especial, a Petrobras alegou que, como terceiro de boa-fé, apenas teria respeitado ordens judiciais de proibição de repasse do ônus tributário na cadeia negocial. 

Substituto tributário pode repassar ônus do tributo ao substituído

O ministro Francisco Falcão, relator, citou jurisprudência do STJ no sentido de que, em respeito ao princípio da capacidade contributiva, a responsabilidade pelo pagamento do tributo deve recair sobre o contribuinte, mesmo que seja o caso de tributo indireto. 

“Dessa forma, o substituto tributário, conquanto tenha o dever de apurar e recolher o tributo devido pelo substituído, pode repassar a este o ônus do tributo, mediante a inclusão do valor correspondente no preço da mercadoria”, completou.

Na hipótese de revogação de liminares obtidas pelos substituídos tributários (como as distribuidoras e os postos de combustível), o ministro Falcão apontou que só é possível o direcionamento da cobrança ao substituto nas hipóteses de culpa ou dolo, ou seja, a cobrança é condicionada ao descumprimento da legislação que determina a apuração e o recolhimento do tributo. 

Varejistas de combustíveis não são contribuintes ou responsáveis tributários

Entretanto, no caso da cobrança da Cide-Combustíveis, Falcão apontou que, nos termos do artigo 2º da Lei 10.336/2001, os varejistas de combustíveis não possuem a condição nem de contribuinte nem de responsável tributário, de modo que eles não possuem legitimidade para discutir o tributo, mas apenas os produtores, os formuladores e os importadores.  

Em seu voto, Falcão apontou que, segundo o TRF2, as decisões provisórias determinavam a compra, pelas varejistas, dos derivados de petróleo sem o acréscimo da Cide, o que não pode ser confundido com a dispensa da obrigação de recolher o tributo. 

“Ou seja, as liminares concedidas, conforme apreciado pelo tribunal de origem, não teriam o condão de afastar a obrigação do contribuinte de apurar e recolher a Cide-Combustíveis nos termos dos artigos 11, 12 e 13 da Instrução Normativa (IN) 422, de 2004, referindo-se apenas à aquisição dos combustíveis sem o acréscimo do mencionado tributo pelos varejistas”, concluiu o ministro.

Leia o acórdão no AREsp 1.483.879.

Fonte: Notícias do STJ

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