Apropriação indébita previdenciária só é crime após lançamento tributário

O crime de apropriação indébita previdenciária previsto no artigo 168-A, parágrafo 1º, inciso I do Código Penal, possui natureza de delito material que só se consuma com a constituição definitiva, na via administrativa, do crédito tributário.

Essa foi a tese fixada pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento nesta terça-feira (17/10). O enunciado foi definido sob o rito dos recursos repetitivos e deve ser obrigatoriamente obedecido pelas instâncias ordinárias.

O crime de apropriação indébita previdenciária ocorre quando o empregador deixa de repassar à Previdência Social as contribuições descontadas dos salários de seus empregados. A definição da natureza da conduta tem impacto no prazo de prescrição.

No caso julgado, a tese mais favorável à defesa seria a consideração de crime formal, ou seja, aquele que não depende da produção de resultado para sua consumação. Assim, o ato de não repassar a contribuição no prazo legal configuraria a ocorrência do crime.

O Ministério Público Federal, por outro lado, defendeu ser um crime material: aquele que só se consuma com a produção do resultado. Essa tem sido a interpretação adotada pelas turmas criminais do STJ e que foi confirmada em voto da relatora, ministra Laurita Vaz.

Para Laurita, o crime de apropriação indébita tributária só se consuma com a constituição definitiva, na via administrativa, do credito tributário. Isso ocorre com o lançamento definitivo do tributo, conforme prevê a Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal.

Com isso, a consumação do crime é mais tardia do que o momento em que o repasse não foi feito, o que empurra também os prazos prescricionais. A votação foi unânime.

REsp 1.982.304

Revista Consultor Jurídico, 18 de outubro de 2023, 11h51

Mantida a sentença que impôs multa a empresa por não apresentar informação à autoridade aduaneira no prazo legal

A apresentação do registro de cargas transportadas perante a autoridade alfandegária após o prazo regular, mas antes da fiscalização, não afasta a imposição de multa. Assim decidiu a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) confirmando a sentença no mandado de segurança. 

No recurso, a impetrante argumentou que o cumprimento da obrigação de registro das cargas equivale à denúncia espontânea, prevista no art. 138 do Código Tributário Nacional (CTN). Tal circunstância impediria, no entender da empresa recorrente, a aplicação de qualquer penalidade em razão do princípio in dubio pro contribuinte (a dúvida beneficia o contribuinte), benefício previsto no art. 112 do mesmo Código. 

A relatora, desembargadora federal Maura Moraes Tayer, observou que, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não se aplica a denúncia espontânea em caso de descumprimento de obrigação acessória autônoma, ou seja, desvinculada da obrigação principal. 

Além disso, de acordo com a jurisprudência do TRF1, “a aplicação da multa independe da comprovação de prejuízo à fiscalização, pois a infração é objetiva e materializada pela mera conduta, além de que não tem a fiscalização discricionariedade na aplicação da sanção”, concluiu a magistrada ao votar pelo desprovimento da apelação. 

O Colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto da relatora. 

Processo: 1001853-51.2017.4.01.3400

TA/RS/CB

Assessoria de Comunicação Social

Tribunal Regional Federal da 1ª Região  

STJ julga dedução de PLR de diretor empregado do IRPJ

A 1a Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar ontem um tema considerado inédito. Os ministros analisam a possibilidade de dedução, do cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL, de valores de participação nos lucros e resultados (PLR) e gratificações de administradores e diretores que também são empregados — modalidade de contratação que não é muito comum.

Por enquanto, apenas a relatora do caso, a ministra Regina Helena Costa, proferiu voto, a favor do contribuinte. Para ela, esses valores distribuídos aos diretores e administradores devem ser considerados despesas e, portanto, podem ser deduzidos. Antes mesmo de seu voto, o ministro Gurgel de Faria pediu vista (REsp 1948478).

A tributação da PLR — tanto de celetistas como estatutários — é motivo de briga histórica entre Fisco e contribuintes. Em 2021, segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), havia mais de R$ 7 bilhões em discussão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e no Judiciário.

Em seu voto, a ministra Regina Helena Costa admitiu recurso do ING Bank, que vinha perdendo até então em todas as instâncias do Judiciário. O Tribunal Regional Federal da 3a Região (TRF-3), com sede em São Paulo, manteve sentença favorável aos autos de infração sofridos pela instituição financeira, entre os anos de 2006 e 2007.

No julgamento, um dos advogados que assessora o ING Bank, Alexandre Ponce de Almeida, do escritório Velloza Advogados, fez sustentação oral. Ele destacou que o parágrafo 1o do artigo 3o da Lei no 10.101, de 2000, que trata de PLR, afirma expressamente que, para efeito de apuração do lucro real, a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa operacional as participações atribuídas aos empregados nos lucros ou resultados, sem fazer qualquer distinção entre eles.

Almeida ainda citou um outro

julgamento, de relatoria da ministra Regina Helena Costa, que tratou de PLR de diretores estatutários. Nele, a ministra fez um paralelo em relação a casos de diretores empregados para abordar a possibilidade de dedução desses valores do cálculo do IRPJ e da CSLL (REsp 1897960).

A procuradora Marise Correa de Oliveira, representante da PGFN, também fez sustentação oral no julgamento. Alegou que o recurso não poderia ser admitido pelo STJ por envolver análise de provas. E que o TRF da 3ª Região, ao analisar o caso, concluiu que não seria possível a dedução dos valores, uma vez que os diretores exercem atividade de gestão, “que está muito mais próxima do empregador do que do empregado”.

Ela acrescentou que a função de diretor é diferente da de empregado, que tem assegurado pelo artigo 7o, inciso XI, da Constituição o pagamento de PLR, desvinculado da remuneração.

Por fim, Marise citou que o Regulamento do Imposto de Renda (RIR), de 1999, era vigente na época das autuações. De acordo com ela, a norma — Decreto no 3.000 — dizia expressamente, no artigo 303, que “não serão dedutíveis, como custos ou despesas operacionais, as gratificações ou participações no resultado, atribuídas aos dirigentes ou administradores da pessoa jurídica”. Ao contrário da situação de empregados, ressaltou, com previsão de dedução no artigo 359.

Logo em seguida, o ministro Gurgel de Faria já antecipou que pediria vista. A ministra Regina Helena Costa preferiu, então, citar trechos de seu voto. Destacou que fez um voto longo, em homenagem ao ineditismo do tema. “O tribunal de origem entendeu que, por serem diretores empregados, os valores não seriam dedutíveis e assim manteve autuações lavradas pela Receita de 2006 e 2007. É um caso bem peculiar, estamos falando de autuações”, disse a relatora.

A ministra passou por diversas leis, que desde 1946 tratam do assunto, até chegar na Lei no 10.101, de 2000, que não faz distinção entre os trabalhadores ao tratar da dedução, e no Regulamento do Imposto de Renda, de 1999, que impedia o abatimento de valores pagos a diretores.

Para a ministra Regina Helena Costa, contudo, não faria sentido existir uma lei prevendo essa dedução, uma vez que esses valores dispendidos pelas empresas para o pagamento de PLR devem ser considerados despesas, que têm possibilidade de abatimento prevista no IRPJ e na CSLL.

“A indedutibilidade de despesa é que precisaria de previsão legal”, disse. Ela acrescentou que o que está dentro dessa dedução não precisa ser dito, uma vez que todos os custos e despesas devem ser abatidos na sistemática do lucro real.

Em seu voto, ainda afirmou que o Carf não tem posição consolidada sobre o assunto, mas tem decisão recente, de 2020, da Câmara Superior, no mesmo sentido do seu voto. Por fim, esclareceu que a solução encontrada no processo não deve ser generalizada porque ela atende às particularidades desse caso. O julga- mento então foi suspenso com o pedido de vista.

Para o advogado Leandro Cabral, do Velloza Advogados, que também assessora o ING Bank, o voto da ministra Regina Helena “é irretocável”.

Segundo Cabral, ela entendeu que essa despesa com PLR e gratificação a empregados que ocupam cargo diretivo reduz o lucro da companhia e não há razão para se exigir fora da regra de dedução do IRPJ e da CSLL. “Haveria necessidade de lei caso se quisesse tratar como indedutível, mas não há. Ao contrário, esses pagamentos a empregados são dedutíveis”, diz. “Esse julgado é importante também para ajudar a uniformizar a jurisprudência do Carf, inclusive mediante súmula.”

Fonte: Valor Econômico, 18/10/2023

TRF-2 afasta prescrição e valida compensação tributária à Petrobras

Como já decidido pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos (REsp 1.164.452), a lei que regula a compensação tributária é aquela vigente à data do encontro de contas.

Sob essa fundamentação, a 3ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região afastou a prescrição de uma ação anulatória ajuizada pela Petrobras doze anos após a execução fiscal e anulou um despacho decisório da Receita Federal que havia rejeitado a compensação relativa a créditos de estimativa mensal de IRPJ recolhido indevidamente. A existência ou não de crédito a ser compensado ainda será verificada pela administração tributária.

O despacho em questão deu origem a um crédito tributário inscrito em dívida ativa da União, no valor original de R$ 91,8 milhões. A Petrobras acionou a Justiça para tentar anular a decisão administrativa.

A 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro constatou prescrição do pedido da estatal. O prazo é de cinco anos a partir da notificação do lançamento. A Petrobras foi notificada da não homologação da compensação em 2009, enquanto a ação foi ajuizada em 2022.

No TRF-2, o desembargador William Douglas Resinente dos Santos, relator do caso, lembrou que, conforme jurisprudência do STJ, os embargos à execução interrompem a prescrição.

No caso em questão, a execução fiscal foi ajuizada em 2010 e a Petrobras apresentou embargos à execução em 2013. Assim, o prazo prescricional foi interrompido até a conclusão dos embargos, que ocorreu somente em 2022.

O inciso IX do parágrafo 3º do artigo 74 da Lei 9.430/1996 diz que débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL não podem ser objeto de compensação. Essa regra foi incluída pela Lei 13.670/2018.

Com base no precedente da 1ª Seção do STJ, o desembargador concluiu que a nova regra se aplica apenas às compensações posteriores à publicação da lei de 2018.

A redação da lei de 1996 vigente à época do encontro de contas autorizava a compensação de créditos apurados pelo contribuinte com quaisquer tributos e contribuições administrados pela Receita.

Clique aqui para ler o voto do relator
Processo 5040817-80.2022.4.02.5101

Revista Consultor Jurídico, 15 de outubro de 2023, 16h29

Alíquota do IRRF sobre ganho de capital é a válida na assinatura do contrato, diz STJ

A alíquota do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) cobrado sobre a remessa ao exterior do ganho de capital decorrente da venda de participação societária é aquela válida no momento da assinatura do contrato e não do efetivo pagamento.

Essa foi a conclusão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em recurso ajuizado por uma petrolífera estrangeira que vendeu quotas a empresas com sede no Brasil com o objetivo de explorar o recurso natural no país.

O valor pago pelas compradoras dessas ações e remetido a pessoa jurídica residente no exterior se sujeita ao IRRF com alíquota de 15%, pela regra geral. Se o local de destino for um país de tributação favorecida, a alíquota sobe para 25%.

Países de tributação favorecida são aqueles que não tributam renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a 20% — também conhecidos como paraísos fiscais.

No caso concreto, o contrato de compra e venda da participação societária teve vigência prevista a partir de janeiro de 2008, mas só foi assinado em março do mesmo ano. Nesse período, a petrolífera estava sediada nas Bahamas, um país de tributação favorecida.

Já o efetivo pagamento, com a remessa de valores para o exterior, só ocorreu em novembro de 2008, quando a petrolífera já havia transferido sua sede para o estado de Delaware, nos Estados Unidos.

Assim, a definição do momento do fato gerador do IRRF é o que vai definir se a alíquota do IRRF deve ser de 15% ou 25%.

O Tribunal Regional Federa da 2ª Região entendeu que o contrato já vigorava e produzia efeitos desde janeiro de 2008, antes mesmo de sua assinatura, momento em que a sede estava nas Bahamas. Portanto, a alíquota de IRRF a incidir é a de 25%.

Ao STJ, a petrolífera defendeu que o fato gerador do IRRF só ocorreu com o efetivo pagamento, que se adiou até novembro de 2008 porque o contrato tinha cláusulas que dependiam da autorização da Agência Nacional do Petróleo.

Já a Fazenda Nacional defendeu que o fato gerador ocorreu na assinatura do contrato, em março de 2008, o que manteria a tributação com alíquota mais alta. Essa foi a conclusão adotada pelo relator, ministro Francisco Falcão.

Para isso, adotou o critério do artigo 43 do Código Tributário Nacional, segundo o qual o fato gerador do Imposto de Renda é o momento da aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda.

Assim, o fato gerador ocorreu na assinatura do contrato, momento em que a compradora passou a incorporar direitos ao patrimônio da petrolífera. Não faz diferença que a remessa do pagamento ao exterior tenha se dado apenas meses mais tarde.

“Considerando que o fato gerador ocorreu na celebração do negócio jurídico, época em que as empresas recorrentes estavam sediadas nas Bahamas, a alíquota de IRRF aplicável é a de 25% sobre o ganho de capital auferido com a alienação das quotas”, concluiu. A votação foi unânime.

Clique aqui para ler o acórdão
REsp 1.377.298

Revista Consultor Jurídico, 15 de outubro de 2023, 9h49

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