ITBI e IPTU: o STJ e os impostos municipais que incidem sobre imóveis (parte 2)

Previstos no artigo 156 da Constituição Federal e nos artigos 32 a 42 do Código Tributário Nacional (CTN), o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) compõem parte importante da receita dos municípios brasileiros – entes federativos competentes para instituir e regulamentar esses tributos. 

Como impostos não possuem finalidade específica, os recursos arrecadados se destinam a financiar serviços públicos em geral, fornecidos pelos municípios, como construção de escolas e creches, pavimentação, saneamento básico e ampliação do atendimento de saúde.

Aumentar a arrecadação é um esforço constante dos municípios. Por outro lado, para quem é proprietário, suportar os encargos tributários decorrentes da aquisição e da manutenção do imóvel pode ser pesado, o que acaba levando muitos casos à apreciação do Poder Judiciário.

Os imóveis sujeitos à cobrança, quem deve pagar, os critérios para aumento do tributo e os prazos de prescrição são alguns dos muitos assuntos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem analisando nos últimos anos em relação ao IPTU, tema desta segunda reportagem sobre a jurisprudência da corte e os impostos municipais relacionados a imóveis.

Leia também – ITBI e IPTU: o STJ e os impostos municipais que incidem sobre imóveis (parte 1)

Quanto ao IPTU, o ministro Gurgel de Faria, em julgamento recente (REsp 1.937.821), explicou que ele tributa a propriedade, “lançando-se de ofício o imposto tendo por base de cálculo a Planta Genérica de Valores aprovada pelo Poder Legislativo local, que considera aspectos mais amplos e objetivos como, por exemplo, a localização e a metragem do imóvel”.

Atualização e notificação de lançamento

Na Súmula 160, a Primeira Seção do tribunal fixou a tese de que é proibido ao município atualizar o IPTU por decreto em percentual superior ao índice oficial de correção monetária. 

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma julgou, em 2019, o AgInt no AREsp 1.351.651, de relatoria da ministra Assusete Magalhães. O recurso discutia se seriam nulos os créditos de IPTU atualizados mediante decreto. 

Em seu voto, a relatora destacou que, nos termos da Súmula 160, o que se impede é “a majoração da base de cálculo do IPTU por meio de decreto, e não a mera atualização monetária”.

No julgamento, a turma aplicou também a Súmula 397. “A jurisprudência desta corte é firme no sentido de que a notificação do lançamento do IPTU e das taxas municipais ocorre com o envio da correspondente guia de recolhimento do tributo para o endereço do imóvel ou do contribuinte, com as informações que lhe permitam, caso não concorde com a cobrança, impugná-la administrativa ou judicialmente”, afirmou a relatora.

IPTU em área urbanizável e de expansão urbana 

No AgInt no REsp 1.930.613, sob a relatoria do ministro Francisco Falcão, a Segunda Turma reforçou que a incidência do IPTU sobre imóvel situado em área considerada pela lei local como urbanizável ou de expansão urbana não está condicionada à existência dos melhoramentos elencados no artigo 32, parágrafo 1º, do CTN, conforme enunciado da Súmula 626.

O recurso teve origem em ação anulatória de débito fiscal ajuizada por dois contribuintes, referente à cobrança retroativa de IPTU sobre imóvel antes situado em área rural, porém tornada urbana em virtude de alteração no plano diretor do município. 

Na sentença, o pedido foi julgado procedente – decisão mantida em segunda instância, sob o fundamento de não haver pelo menos dois dos requisitos indicados pelo CTN para a classificação da área como urbana.

Ao votar pela reforma do acórdão do tribunal de origem, o ministro Falcão citou como precedentes o REsp 1.903.076 e o AREsp 1.517.241

A responsabilidade pelo IPTU na alienação fiduciária

Ao julgar o AREsp 1.796.224, a Primeira Turma entendeu que o credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade em seu nome e da imissão na posse do imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do IPTU, uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no artigo 34 do CTN.

A relatoria foi do ministro Gurgel de Faria. Segundo ele, no REsp 1.111.202, submetido ao rito dos repetitivos (Tema 122), o STJ definiu que cabe ao legislador municipal eleger o sujeito passivo do IPTU, entre as opções previstas no CTN – tese que deu origem à Súmula 399.

“Em relação aos créditos de IPTU, o entendimento desta corte superior se consolidou no sentido de que se consideram contribuintes do referido imposto o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título”, afirmou o relator.

Entretanto, no caso do credor fiduciário, o ministro anotou que a propriedade a ele conferida é resolúvel e nunca será plena, não sendo ele detentor do domínio útil sobre o imóvel, de forma que passaria a responder pelas dívidas tributárias e não tributárias incidentes sobre o bem somente a partir da consolidação da propriedade em conjunto com a imissão na posse, em hipótese de sucessão (artigo 27, parágrafo 8°, da Lei 9.514/1997).

Leia também – STJ decidirá sobre responsabilidade solidária do credor fiduciário na execução de IPTU do imóvel alienado

“A propriedade conferida ao credor fiduciário é despida dos poderes de domínio e de propriedade (uso, gozo e disposição), sendo a posse indireta por ele exercida desprovida de ânimo de domínio, considerando-se a inexistência do elemento volitivo: a vontade de ter o bem como se seu fosse”, declarou Gurgel de Faria.

Proprietário e usufrutuário são contribuintes do IPTU 

No REsp 1.111.202 (Tema 122), ficou estabelecido pela Primeira Seção que “tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no registro de imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU”. 

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em 2022, decidiu que, no caso de imóvel gravado com usufruto, tanto o proprietário, que remanesce com o domínio indireto, quanto o usufrutuário, que exerce a posse direta e detém o domínio útil, são contribuintes do IPTU, podendo a lei municipal disciplinar a sujeição passiva de qualquer um deles ou, ainda, de ambos (AREsp 1.566.893). A relatoria foi do ministro Gurgel de Faria. 

Na origem, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) havia entendido pela ilegitimidade do nu-proprietário para constar no polo passivo da execução fiscal de IPTU, ao fundamento de que ele não seria contribuinte desse tributo sobre o imóvel objeto de usufruto, apenas recaindo a condição de contribuinte sobre o usufrutuário.

O relator destacou que a conclusão a que chegou o TJSP já teve o respaldo na jurisprudência do STJ no passado. Entretanto, ressaltou que, após o julgamento do Tema 122, a posição do tribunal foi atualizada, passando a se orientar em sentido diverso.

“A Primeira Seção, no julgamento dos REsps 1.111.202 e 1.110.551, submetidos à sistemática dos recursos repetitivos, ao decidir sobre a responsabilidade dos promitentes vendedor e comprador de imóvel, assentou que o artigo 34 do CTN elenca como contribuintes do IPTU tanto o proprietário quanto o possuidor da coisa, desde que tenha animus domini“, disse o ministro.

Imunidade tributária e de jurisdição

No RO 138, de relatoria do ministro Herman Benjamin, a Segunda Turma reafirmou a jurisprudência segundo a qual os Estados estrangeiros possuem imunidade tributária e de jurisdição, conforme os preceitos das Convenções de Viena de 1961 e de 1963, sendo descabida a execução fiscal para cobrança de IPTU. 

Na origem, o município do Rio de Janeiro ajuizou execução fiscal contra a República da Argentina para a cobrança de IPTU e de Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo – processo que foi extinto pelo juiz sem resolução do mérito, em razão da imunidade de jurisdição. O município alegou que, no Brasil, prevalece a teoria da imunidade relativa, segundo a qual o Estado estrangeiro deve ser submetido à jurisdição de outro quando atua como simples particular.

Em seu voto, o ministro Herman Benjamin citou precedentes tanto da Primeira quanto da Segunda Turma no sentido de que os Estados estrangeiros são dispensados do pagamento de tributos que recaiam sobre seu patrimônio ou lhes sejam exigidos pela prestação não individualizada de serviços. “Não se pode admitir o prosseguimento do processo em relação à cobrança de IPTU”, definiu Benjamin.

Locatário não pode discutir relação jurídico-tributária do IPTU

Ainda sobre o tema, a Primeira Turma, ao julgar o AREsp 1.065.190, entendeu que o IPTU deve incidir sobre imóvel alugado para representante de consulado. 

No recurso, interposto por representante de consulado da Turquia, pleiteou-se isenção de IPTU baseada na Convenção de Viena, além da devolução do imposto que foi recolhido durante a vigência do contrato. 

O relator, ministro Gurgel de Faria, ressaltou que a isenção tributária prevista na Convenção de Viena sobre Relações Consulares só pode ser concedida aos imóveis dos quais o Estado estrangeiro signatário seja proprietário.

De acordo com o magistrado, a Convenção de Viena sobre Relações Consulares não se aplica aos tributos incidentes sobre imóvel alugado a Estado estrangeiro para o exercício de sua missão consular, “visto que o ordenamento jurídico brasileiro não atribui essa responsabilidade tributária ao locatário, mas ao proprietário (locador)”. 

Quanto à devolução do imposto já pago, o relator reforçou a previsão da Súmula 614 no sentido de que o locatário não tem legitimidade ativa para discutir a relação jurídico-tributária de IPTU e de taxas referentes ao imóvel alugado, nem para pedir a restituição de tributo pago a mais nesses casos.

Definições sobre o prazo de prescrição

No julgamento dos Recursos Especiais 1.658.517 e 1.641.011 (Tema 980), ambos de relatoria do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a Primeira Seção fixou duas importantes teses sob o rito dos repetitivos. 

A primeira define que o prazo prescricional da cobrança judicial do IPTU começa no dia seguinte à data estipulada para o vencimento do imposto. Em seu voto, o relator destacou que, até o vencimento, o fisco “não dispõe de pretensão executória legítima para ajuizar execução fiscal objetivando a cobrança judicial, embora já constituído o crédito desde o momento no qual houve o envio do carnê para o endereço do contribuinte (Súmula 397)”.

Já a segunda estabelece que o parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. Sobre esse ponto, o ministro afirmou que, se o fisco resolve oferecer a opção de parcelamento para pagamento do IPTU por decisão unilateral, por mera liberalidade, não se pode chegar à conclusão de que houve moratória ou parcelamento do crédito tributário capaz de suspender o prazo prescricional para a cobrança do crédito.

“Necessária manifestação de vontade do contribuinte a fim de configurar moratória ou parcelamento apto a suspender a exigibilidade do crédito tributário”, concluiu o ministro. 

Imóvel qualificado como estação ecológica 

Em 2019, a Segunda Turma do STJ entendeu que a qualificação de imóvel como estação ecológica limita o direito de propriedade, o que afasta a incidência do IPTU (REsp 1.695.340).

Na ocasião, o colegiado analisou o recurso de um contribuinte contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que manteve a cobrança de IPTU exigida pelo município de Belo Horizonte sobre seu imóvel, o qual, a partir da edição de lei estadual, passou a ficar situado em unidade de conservação. 

O tribunal local ressaltou que a criação da estação ecológica não transfere, automaticamente, a titularidade do imóvel do contribuinte para o ente público, permanecendo o particular responsável pelo pagamento do tributo até a efetiva desapropriação. 

Embora a Lei 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, tenha definido que a estação ecológica é zona rural, o TJMG fundamentou que ela não tem o efeito de alterar a natureza jurídica do imóvel e mudar o fato gerador do tributo, em razão de não ser lei complementar. 

Em seu voto, o relator do recurso no STJ, ministro Mauro Campbell Marques, destacou que a limitação trazida por lei estadual e a consequente aplicação dos dispositivos da Lei 9.985/2000 acarretaram ao particular o esvaziamento completo dos atributos inerentes à propriedade (reivindicação, uso e gozo do bem), retirando-lhe o domínio útil do imóvel e afastando o aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU.

“O regime de unidade de conservação é incompatível com a caracterização do fato gerador do Imposto Predial e Territorial Urbano, pois, de acordo com o artigo 49 da Lei 9.985/2000, a área destinada a essa finalidade é considerada imóvel rural, o qual somente pode ser tributado pelo Imposto Territorial Rural, cuja competência tributária é específica da União, e não do município de Belo Horizonte”, concluiu o ministro.

Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1937821AREsp 1351651REsp 1930613REsp 1903076AREsp 1517241AREsp 1796224AREsp 1566893RO 138AREsp 1065190REsp 1695340

Fonte: Notícias do STJ

STJ mantém denúncia por crime-meio antes de crédito tributário definitivo

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acatou a argumentação do Ministério Público do Paraná para transformar em rés pessoas investigadas pela prática de crime tributário, apesar de esse delito ainda não poder ser tipificado.

O caso trata de esquema criado para reduzir tributação junto ao Fisco do Paraná, pela aquisição simulada de grãos de café com produtores de outros estados, em compras intermediadas por agências corretoras com sede em Londrina (PR) e Maringá (PR).

Esse crime tributário só pode ser tipificado quando o respectivo crédito tributário de ICMS for lançado de maneira definitiva, conforme prevê a Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal. O procedimento administrativo fiscal ainda não foi concluído.

No entanto, o MP paranaense denunciou os 70 investigados por todas as outras condutas usadas para, em tese, praticar esse crime tributário: organização criminosa, associação criminosa e falsidade ideológica.

Tratam-se de crimes autônomos, com tipificação independente e que, segundo a 6ª Turma do STJ, podem render persecução penal sem ofender a Súmula 24. Bastou ao MP excluir da denúncia a principal conduta apurada: suprimir ou reduzir tributo, crime previsto no artigo 1º da Lei 8.137/1990.

Relator de um recurso em Habeas Corpus ajuizado para obter o trancamento das investigações pelo crime tributário, o ministro Sebastião Reis Júnior foi informado pela defesa do oferecimento da denúncia e enxergou flagrante ilegalidade.

Para ele, em razão da sucessão de condutas tipificáveis, deve-se imputar aos suspeitos o crime-fim, considerando-se as demais absorvidas. Ou seja, se o contexto geral é do crime de reduzir tributos, a falsidade ideológica e a organização criminosa usadas nesse intuito seriam condutas-meio.

“Trata-se de tentativa de contornar o óbice da Súmula Vinculante 24/STF, visto que, a se permitir a persecução penal pelo delito-meio, corre-se o risco de permitir dupla imputação pelo mesmo fato, já que na manifestação ministerial há menção a posterior oferecimento da denúncia pelos crimes tributários ou persecução penal pelos crimes materiais da Lei 8.137/1990, sem que o resultado ainda tenha sido produzido”, afirmou.

Abriu a divergência vencedora o ministro Rogerio Schietti, para quem a estratégia do MP é legal. O crime de associação criminosa, por exemplo, é formal e se consuma com a formação da quadrilha no intuito de cometer a conduta tributária ilícita, o que não depende do término do procedimento administrativo fiscal.

O mesmo vale para falsidade ideológica, conduta que permitiu a prática do crime tributário, mas que também serviu para dar sustentação a empresas de fachada e para escamotear a origem e o destino de mercadorias transacionadas.

“Não havendo a imputação de crime previsto no artigo 1º da Lei 8.137/1990, não há, por conseguinte, malferimento à Súmula 24 do Supremo Tribunal Federal”, concordou o ministro Antonio Saldanha Palheiro, em voto-vista para aderir à divergência. Formaram a maioria a ministra Laurita Vaz e o desembargador convocado Olindo Menezes.

Clique aqui para ler o acórdão
RHC 151.007

Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 4 de novembro de 2022, 8h49

ARTIGO DA SEMANA – STJ e as Certidões Negativas

João Luís de Souza Pereira

Advogado. Mestre em Direito.

Professor convidado da Pós-graduação da FGV Direito Rio

Professor convidado do IAG/PUC-Rio

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Tema 1074 dos Recursos Repetitivo, que destacamos nesta semana, nos faz refletir sobre as certidões negativas e como o Tribunal tem se posicionado sobre o tema.

Como é de amplo conhecimento, o sujeito passivo da obrigação tributária tem o direito à obtenção de documento que comprove sua regularidade perante o fisco. 

A regularidade fiscal poderá ocorrer em situações em que não exista débito de responsabilidade do sujeito passivo. Neste caso, a regularidade fiscal corresponderá à uma prova de quitação. Desta hipótese, cuida o art. 205, do Código Tributário Nacional (CTN).

Todavia, há casos em que, mesmo havendo débito, o sujeito passivo estará em situação de regularidade fiscal. Para tanto, é preciso que o crédito tributário esteja com sua exigibilidade suspensa ou, já tendo sido objeto de cobrança judicial, esteja devidamente garantido o juízo da execução pela concretização da penhora. Esta é a hipótese disciplinada pelo artigo 206, do CTN, a chamada Certidão Positiva com Efeitos de Negativa.

A Certidão Negativa (art. 205, do CTN) e a Certidão Positiva com Efeitos de Negativa (art. 206, do CTN) são expedidas a requerimento do interessado e no prazo de 10 (dez) dias. Exatamente por isso, recomenda-se que o prazo de validade de certidões seja controlado porque não adianta ir a juízo para exigir que a autoridade competente expeça a prova de regularidade fiscal antes do prazo de 10 dias.  

Duas observações ainda precisam ser feitas sobre a Certidão do artigo 206, do CTN.

A primeira delas diz respeito ao momento em que se deve considerar concretizada a penhora. Decididamente, não se pode admitir que a concretização da penhora, para o efeito do artigo 206, esteja caracterizada após a anotação do gravame no órgão competente para o registro do bem ou direito (DETRAN, RGI, etc…). Penhora concretizada é aquela que produz o efeito de garantir o juízo da execução e, por consequência, a efetividade da realização do crédito tributário. Portanto, uma vez lavrado o auto ou termo de penhora, com a devida intimação do executado, ter-se-á por concretizada a penhora.

A segunda observação sobre a Certidão Positiva com Efeitos de Negativa refere-se ao posicionamento da jurisprudência do STJ acerca da possibilidade de garantia do crédito tributário cuja execução fiscal ainda não foi ajuizada para o fim de se obter prova de regularidade fiscal.

No julgamento do Recurso Especial nº 1.123.669, o STJ definiu o Tema 237 fixando a seguinte tese: “É possível ao contribuinte, após o vencimento da sua obrigação e antes da execução, garantir o juízo de forma antecipada, para o fim de obter certidão positiva com efeito de negativa”.

É bem verdade que, atualmente, o ingresso em juízo para realizar a caução da futura execução fiscal pode ser desnecessário, tendo em vista que a Portaria PGFN nº 33/2018[1] e a Resolução PGE nº 4.700/2021[2]disciplinam a garantia antecipada da execução. 

Da coletânea de Recursos Repetitivos, convém lembrar que o STJ, no julgamento do Recurso Especial 1.042.585, fixou entendimento no Tema 358 no sentido de que “O descumprimento da obrigação acessória de informar, mensalmente, ao INSS, dados relacionados aos fatos geradores da contribuição previdenciária, é condição impeditiva para expedição da prova de inexistência de débito”

Trata-se de precedente que acabou concluindo pela legalidade do art. 32, IV e §10, da Lei nº 8.212/91.

Na jurisprudência do STJ também há importante Súmula sobre as certidões negativas.

Considerando que nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação “A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco” (Súmula nº 436), o Tribunal da Cidadania acabou definindo, na Súmula STJ nº 446 que “Declarado e não pago o débito tributário pelo contribuinte, é legítima a recusa de expedição de certidão negativa ou positiva com efeito de negativa.”

Finalmente, destacamos importante precedente do STJ[3] de interesse das empresas em Recuperação Judicial  que, analisando o art. 57, da Lei nº 11.101/2005, que impõe a apresentação de prova de regularidade fiscal para o deferimento de recuperação judicial, concluiu que “a exigência legal não se mostra adequada para o fim por ela objetivado – garantir o adimplemento do crédito tributário -, tampouco se afigura necessária para o alcance dessa finalidade: (i) inadequada porque, ao impedir a concessão da recuperação judicial do devedor em situação fiscal irregular, acaba impondo uma dificuldade ainda maior ao Fisco, à vista da classificação do crédito tributário, na hipótese de falência, em terceiro lugar na ordem de preferências; (ii) desnecessária porque os meios de cobrança das dívidas de natureza fiscal não se suspendem com o deferimento do pedido de soerguimento.”


[1] Art. 8º. Notificado para pagamento do débito inscrito em dívida ativa, o devedor poderá antecipar a oferta de garantia em execução fiscal.

Parágrafo único. A oferta antecipada de garantia em execução fiscal, apresentada no prazo do art. 6º, II, suspende a prática dos atos descritos no art. 7º até o montante dos bens e direitos ofertados.

Art. 9º. O devedor poderá apresentar, para fins de oferta antecipada de garantia em execução fiscal:

I – depósito em dinheiro para fins de caução;

II – apólice de seguro-garantia ou carta de fiança bancária que estejam em conformidade com a regulamentação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional;

III – quaisquer outros bens ou direitos sujeitos a registro público, passíveis de arresto ou penhora, observada a ordem de preferência estipulada no art. 11 da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980.

§ 1º. A indicação poderá recair sobre bens ou direitos de terceiros, desde que expressamente autorizado por estes e aceitos pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, observado o disposto no art. 9º, § 1º, da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980. 

[2] Art. 1º – É facultado ao devedor, a partir da inscrição do débito em dívida ativa apresentar administrativamente garantia antecipada à execução fiscal, sejam os débitos de natureza tributária ou não tributá- ria. 

Art. 2º – A garantia antecipada, apresentada antes do ajuizamento da execução fiscal, suspende a prática de atos administrativos de cobrança do débito. 

Parágrafo Único – Não se enquadra na suspensão a que se refere o caput crimes contra a ordem tributária, cuja encaminhamento ao Ministério Público Estadual decorre de lei. 

Art. 3º – O devedor poderá́ apresentar, para fins de oferta antecipada de garantia em execução fiscal: 

I – apólice de seguro-garantia ou carta de fiança bancária que estejam em conformidade com a regulamentação da Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro;
II – quaisquer outros bens ou direitos sujeitos a registro publico, passíveis de arresto ou penhora, observada a ordem de preferência estipulada no art. 11 da Lei no 6.830, de 22 de setembro de 1980. 

§ 1º – A indicação poderá́ recair sobre bens ou direitos de terceiros, desde que expressamente autorizado por estes e aceitos pela Procuradoria da Dívida Ativa, observado o disposto no art. 9o, § 1o da Lei no 6.830, de 22 de setembro de 1980, observadas as exigências do Código Civil. 

§ 2º – A indicação também poderá́ recair sobre bem ou direito já penhorado, desde que avaliados em valor suficiente para garantia integral das dívidas. 

[3] REsp n. 1.864.625/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 23/6/2020, DJe de 26/6/2020

Deixar de recolher ICMS em meses aleatórios não é crime, diz STJ

A conduta de deixar de recolher ICMS aos cofres públicos em meses aleatórios não pode ser considerada crime. A tipificação da conduta depende da demonstração de persistência pelo réu e do dolo específico, representado pela vontade de se apropriar dos valores retidos.

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu a ordem de ofício em Habeas Corpus para absolver um administrador de uma fabricante de maquinaria, que foi condenado a 1 ano e  2 meses de reclusão por deixar de recolher ICMS.

O imposto incide sobre a movimentação de mercadorias em geral e deve ser pago ao Fisco estadual. O acusado deixou de cumprir a obrigação em Santa Catarina, nos meses de março, maio, julho, outubro e dezembro de 2012 e dezembro de 2013, o que representou desfalque de R$ 250 mil aos cofres públicos.

Relator no STJ, o ministro Sebastião Reis Júnior observou que a conduta do acusado não pode ser tipificada como crime tributário porque o Supremo Tribunal Federal, em 2019, entendeu que a criminalização do não pagamento do ICMS depende da existência de contumácia e dolo.

Contumácia é a insistência e a teimosia no desrespeito à lei. Já o dolo é a específica a vontade de se apropriar dos valores retidos por meio da omissão ou alteração da dívida. Ele não existe, portanto, se o réu declara tais valores junto aos órgãos de administração fiscal.

“No caso dos autos, o não pagamento do tributo por seis meses aleatórios não é circunstância suficiente para demonstrar a contumácia nem o dolo de apropriação. Ou seja, não se identifica, em tais condutas, haver sido a sonegação fiscal o recurso usado pelo empresário para financiar a continuidade da atividade em benefício próprio, em detrimento da arrecadação tributária”, concluiu o ministro Sebastião.

Clique aqui para ler o acórdão
HC 569.856

Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 2 de novembro de 2022, 8h47

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