Publicada Portaria da RFB que regulamenta a transação de créditos tributários em contencioso administrativo

22 de novembro de 2022 | Portaria nº 247/2022 | Receita Federal do Brasil

A Receita Federal do Brasil (RFB) publicou Portaria que regulamenta a transação de créditos tributários sob sua administração. A Portaria estabelece as seguintes modalidades de transação dos créditos tributários em contencioso administrativo fiscal: (i) transação por adesão à proposta da RFB; (ii) transação individual proposta pela RFB; e (iii) transação individual proposta pelo contribuinte. Ademais, as transações poderão prever: (i) o pagamento de entrada mínima como condição à adesão e a manutenção dos arrolamentos e demais garantias associadas aos débitos transacionados; (ii) descontos em relação a débitos considerados irrecuperáveis ou de difícil recuperação, vedada a transação que implique redução superior a 65% do valor total dos créditos a serem transacionados; (iii) pagamento dos débitos de forma parcelada; (iv) possibilidade de diferimento ou moratória; (v) flexibilização das regras para aceitação, avaliação, substituição e liberação de arrolamentos e demais garantias; (vi) possibilidade de utilização de créditos líquidos e certos do contribuinte em desfavor da União, reconhecidos em decisão transitada em julgado, ou de precatórios federais próprios ou de terceiros, para fins de amortização ou liquidação de saldo devedor transacionado; e (vii) possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, na apuração do IRPJ e da própria CSLL, até o limite de 70% do saldo remanescente após a incidência dos descontos, se houver. Demais disso, a Portaria dispõe que na celebração de transação será observada, dentre outras condições, a situação econômica e a capacidade de pagamento do sujeito passivo, conforme aferidos pela PGFN, ajustados para considerar em seus cálculos os créditos tributários sob gestão da RFB. Por fim, a Portaria dispões que a RFB observará, no que couber, os critérios de aferição da capacidade de pagamento estimada do contribuinte, definidos nos termos do Capítulo II da Portaria PGFN nº 6.757/2022, competindo à Procuradoria-Geral Adjunta de Gestão da Dívida Ativa da União e do FGTS o fornecimento dos dados necessários para esse fim.

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Suspenso julgamento no STF em que se discute a constitucionalidade de multa isolada aplicada por descumprimento de obrigação acessória e calculada em função do valor da operação, quando há obrigação principal subjacente

O Ministro Roberto Barroso – Relator – propôs a fixação da seguinte tese de repercussão geral: “A multa isolada, em razão do descumprimento de obrigação acessória, não pode ser superior a 20% (vinte por cento) do valor do tributo devido, quando há obrigação principal subjacente, sob pena de confisco”. O Ministro ressaltou que, no julgamento do RE 606.010/PR (RG) – Tema 872, a Corte analisou questão similar e definiu que a multa por descumprimento de uma obrigação acessória não pode exceder o limite de 20% do valor do tributo respectivo. Dessa forma, o Ministro entende ser inconstitucional o art. 78, III, “i”, da Lei nº 688/1996, do Estado de Rondônia, que previa multa de 40% sobre o valor da operação, quando ocorresse, dentre outras hipóteses, o transporte de mercadoria desacompanhada de documento fiscal. Pediu vista dos autos o Ministro Dias Toffoli.

Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores & Advogados

PGR questiona cobrança de taxas de prevenção a incêndios em estados e município

O procurador-geral da República, Augusto Aras, ajuizou três ações no Supremo Tribunal Federal para questionar normas que regulamentam a cobrança de taxas de prevenção e extinção de incêndios.

Duas das ADPFs se referem a leis estaduais, de Pernambuco e do Rio de Janeiro, e estão sob relatoria do ministro Edson Fachin. A outra ação foi proposta contra normas do município de Itaqui (RS) e foi distribuída ao ministro Luís Roberto Barroso, que já pediu informações às autoridades envolvidas.

Aras alega que as normas violam a previsão constitucional de que a criação de taxa deve estar vinculada ao exercício do poder de polícia ou à utilização (efetiva ou potencial) de serviços públicos específicos e divisíveis prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.

Em todas as ações, o PGR argumenta que as taxas incidem sobre serviços típicos de segurança pública, prestados de forma geral e indistinta. As atividades de prevenção e de extinção de incêndios e outros riscos deveriam, portanto, ser financiadas por meio de impostos.

Em 2020, o Plenário do STF declarou inconstitucional a taxa de segurança pública pela utilização potencial do serviço de extinção de incêndios em Minas Gerais.

Nos casos do Rio e da cidade gaúcha, também é questionada a cobrança de taxa para emissão de certidões e atestados. De acordo com Aras, isso ofende a regra constitucional de gratuidade de certidões como garantia fundamental dos cidadãos. Com informações da assessoria de imprensa do STF.

ADPF 1030
ADPF 1028
ADPF 1029

Revista Consultor Jurídico, 28 de novembro de 2022, 13h56

ARTIGO DA SEMANA- Exceções à legalidade tributária

João Luís de Souza Pereira

Advogado. Mestre em Direito.

Professor convidado da Pós-graduação da FGV Direito Rio

Professor convidado do IAG/PUC-Rio

A Constituição Brasileira é extremamente detalhista no tratamento da matéria tributária.

Nossa Constituição define quem pode instituir tributos, que espécies de tributo podem existir, como se devem instituir tributos e, em algum casos, dispõe até sobre normas gerais sobreo tributo. No art. 155 da Constituição, por exemplo, há quase um verdadeiro tratado sobre o ICMS.

Esta riqueza de detalhes na disciplina da matéria tributária, a exemplo da jabuticaba e do pentacampeonato mundial de futebol, são produtos tipicamente nacionais.

Na parte reservada ao como se devem instituir tributos, surge o famoso princípio da legalidade tributária, previsto no art. 150, I, da Constituição.

O princípio da legalidade estabelece que nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que lei o estabeleça. 

Isto quer dizer que a instituição e o aumento de tributos estão sujeitos à reserva legal. Somente através de lei que tenha tramitado pelo Poder Legislativo é que se pode instituir ou aumentar tributos. Os atos normativos do Poder Executivo (decretos, portarias, instruções normativas…) não se prestam para aumentar ou instituir tributos. 

O princípio da legalidade está ligado à idéia de consentimento. Desde o reinado de João Sem Terra, na Inglaterra, os financiadores do Estado impuseram limites ao pagamento de tributos, subordinando as exações à prévia deliberação dos “contribuintes”. 

Se os tributos são devidos por toda a sociedade para o financiamento do Estado – que nada mais faz do que utilizar estes recursos em benefício de todos – nada mais justo do que deixar que a própria sociedade delibere sobre o quanto será necessário para o financiamento do Estado. 

Como nas democracias o poder do povo é exercido através de seus representantes regularmente eleitos, cabe ao Poder Legislativo a tarefa de elaborar as leis tributárias. Por isso é que se diz que there is no taxation without representation.

Daí a importância na eleição de legisladores (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores).

O princípio da legalidade possui exceções previstas no próprio Texto Constitucional. 

O artigo 153, § 1º, da Constituição dispõe que “É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.”

Ou seja, a Constituição admite que as alíquotas – tão somente as alíquotas – do Imposto de Importação, do Imposto de Exportação, do IPI e do IOF sejam alteradas por norma infralegal, dentro dos limites e condições previstos em lei. Isto quer dizer que em relação a estes impostos o princípio da legalidade fica flexibilizado, admitindo-se a instituição e a majoração das alíquotas por ato do Poder Executivo.

Também constitui uma exceção ao princípio da legalidade a contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool. Isto porque o artigo 177, § 4º, I, “b”, da Constituição – na redação dada pela Emenda Constitucional nº 33/2001 – dispõe que alíquota deste tributo “poderá ser reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo…”

No Direito Brasileiro, além da Constituição consagrar o princípio da legalidade, o artigo 97, do Código Tributário Nacional explicita as matérias reservadas à lei.

Em decorrência do princípio da legalidade, há autores que sustentam que a exigência de tributos deve estar veiculada por lei que descreva minuciosamente todos os elementos necessários ao pagamento do tributo. É o que se chama de tipicidade fechada.

O Supremo Tribunal Federal, contudo, não vem acolhendo a tese da tipicidade fechada. 

Em março de 2003, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Recurso Extraordinário nº 343.446/SC, apreciou a constitucionalidade da Contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho (SAT). De acordo com a lei, as alíquotas do SAT variam em razão do grau de risco da atividade preponderante do contribuinte. No entanto, a definição de atividade preponderante e grau de risco leve, médio ou grave, coube a um Decreto, portanto ato do Poder Executivo. 

Naquela ocasião, o STF decidiu que “As Leis 7.787/89, art. 3º, II, e 8.212/91, art. 22, II, definem, satisfatoriamente, todos os elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida. O fato de a lei deixar para o regulamento a complementação dos conceitos de “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave”, não implica ofensa ao princípio da legalidade genérica, C.F., art. 5º, II, e da legalidade tributária, C.F., art. 150, I.”.

Na verdade outras decisões do STF já afirmavam ser desnecessária a utilização de lei para ajustar bases de cálculo, alíquota e prestações de parcelamento de tributo (IPTU) – desde que nos limites da variação de índice nacional de medição da inflação. Esta, aliás, é a posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidada na Súmula nº 160“É defeso, ao município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.”

O STF também já afastou a necessidade de lei para a fixação de prazo de vencimento do ICMS (RE 253.395/SP): “Não se compreendendo no campo reservado à lei a definição de vencimento das obrigações tributárias, legítimo o Decreto nº 33.386/92, que modificou a data de vencimento do ICMS. Improcedência da alegação de infringência ao princípio da vedação de delegação legislativa”.

Decisão importante sobre a mitigação da legalidade tributária ocorreu no julgamento da norma que permitiu ao Poder Executivo manejar alíquotas do PIS/COFINS sobre receitas financeiras. No julgamento do RE 1.043.313 (DJE de 25/03/2021), o STF concluiu que “É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”, fixando tese para o Tema 939 da Repercussão Geral.

Ainda sobre o PIS e a COFINS, o STF também reconheceu a constitucionalidade do art. 5º, §§ 8º a 11, da Lei nº 9.718/98, na redação dada pela Lei nº 11.727/2008, admitindo que o Poder Executivo reduza e restabeleça alíquotas dos tributos nas operações com álcool carburante, desde que a lei estabeleça os limites para esta flexibilização (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.277)[1].

Também houve flexibilização da legalidade na norma que, tratando da taxa para emissão da Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) pelos CREAs, estabeleceu um piso e um teto para o tributo. Analisando o caso, o STF concluiu que “Não viola a legalidade tributária a lei que, prescrevendo o teto, possibilita ao ato normativo infralegal fixar o valor de taxa em proporção razoável com os custos da atuação estatal, valor esse que não pode ser atualizado por ato do próprio conselho de fiscalização em percentual superior aos índices de correção monetária legalmente previstos” e fixou tese para o Tema 829.

Como se vê, o princípio da legalidade não foge à regra e também tem exceções…


[1] A observância do princípio da legalidade tributária é verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz de cada caso concreto, sendo certo que não existe ampla e irrestrita liberdade para o legislador realizar diálogo com o regulamento no tocante aos aspectos da regra matriz de incidência tributária. Para que a lei autorize o Poder Executivo a reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, é imprescindível que o valor máximo dessas exações e as condições a serem observadas sejam prescritos em lei em sentido estrito, bem como exista em tais tributos função extrafiscal a ser desenvolvida pelo regulamento autorizado. (Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10-12-2020, P, DJE de 25-3-2021).

A carga tributária brasileira é alta? O IR é elevado para quem?

O início de um novo governo traz uma série de mudanças e, com elas, voltam à pauta assuntos como a reforma tributária e a justiça do sistema brasileiro. Ouve-se de tudo, tanto no que tange a apontar problemas, como especialmente no que respeita a propor soluções.

Não é o propósito deste artigo debater amplamente o assunto, o que demandaria extensão incompatível com esta coluna. Objetiva-se comentar apenas um dos defeitos usualmente imputados ao sistema brasileiro, que é sua elevada carga. E, dos vários tributos que poderiam ser colhidos para aferir sua onerosidade, escolhe-se o Imposto de Renda (IR). É ele, no Brasil, muito elevado?

A pergunta, na verdade, precisa ser replicada com outra, antes de que se possa responder de maneira mais precisa: elevado para quem?

Relativamente às pessoas físicas, existem quatro alíquotas progressivas, de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%. Mas saber se esses percentuais são altos, ou baixos, envolve uma comparação. Algo, ou alguém, pode ser alto, ou baixo, dependendo de com quem, ou o que, se compara. Um homem de 1,78m pode ser alto, para os padrões dos jóqueis brasileiros, mas baixo, para os atletas de elite do basquete americano. Um edifício de 20 andares é alto, se comparado a um de 10, mas baixíssimo, se o contraste se der com um de 120.

Comparemos, então, o sistema tributário brasileiro com o de outro país. Veja-se a Áustria. Lá, a alíquota máxima do imposto de renda das pessoas físicas é de 55%. Pode-se dizer, então, que é mais alta que a brasileira, de 27,5%. Exatamente o dobro.

Não esqueçamos, porém, da segunda pergunta. Alta para quem? A leitora pode estar se perguntando: – 55% não é maior que 27,5% de forma objetiva? Até a matemática se estaria, aqui, a tentar relativizar?

27,5 é menor que 50, por certo, mas tais percentuais incidem sobre bases, as chamadas “bases de cálculo”. Por isso, não é possível aferir se uma carga tributária é alta, ou baixa, comparando apenas alíquotas. Recorramos às bases.

No Brasil, a alíquota máxima, de 27,5%, incide sobre rendimentos superiores a R$ 4.664,68 ao mês, o que corresponde a pouco mais de R$ 55 mil ao ano. Já na Áustria, a alíquota de 55% alcança apenas rendimentos superiores a 1 milhão de euros, algo próximo a R$ 5,5 milhões, por ano.

Mas e os limites de isenção? No Brasil, o limite correspondente ao chamado “mínimo existencial” é de R$ 1.903.98 mensais, valor acima do qual os rendimentos se submetem já à primeira alíquota, de 7,5%. Na Áustria, por sua vez, o limite de isenção é de 11 mil euros anuais (916,66 euros/mês), o que significa dizer que, ao câmbio hoje vigente, mesmo os rendimentos que no Brasil já se submetem à alíquota máxima, naquele outro país seriam ainda isentos.

Voltemos então à pergunta. A carga brasileira é alta para quem? Comparada à austríaca, para contribuintes que ganham rendimentos mais elevados ela é baixa. O beneficiário de rendimentos mensais de R$ 1 milhão, por exemplo, na Áustria pagaria 55%, e, aqui, apenas 27,5%. Mas o beneficiário de rendimentos mensais no valor de R$ 5.000,00, no Brasil, seria onerado em 27,5%, enquanto naquele outro país seria isento.

Escolheu-se a Áustria, mas a comparação com outros países da Europa, geralmente apontados como dotados de uma alta carga quando contrastados com o nosso, levaria a resultados semelhantes. Não se pode comparar alíquota, portanto, sem cotejar também as bases sobre as quais incidem. A resposta para a pergunta (alta ou baixa?) pode mesmo ser oposta.

O mesmo problema se replica, em alguma medida, na generalidade dos Estados-membros, no que tange ao imposto sobre heranças, e no âmbito dos Municípios, relativamente ao IPTU, cuja progressividade, levada a efeito por meio de faixas muito baixas e muito próximas, praticamente equivale a um imposto “flat”, a alcançar de maneira igual, ou muito próxima, ricos e pobres.

Tais aspectos devem ser lembrados, em um cenário em que se discute a reforma da tributação incidente sobre o consumo e se projeta um grande imposto sobre bens e serviços cuja alíquota poderá ser bastante elevada. A regressividade de um imposto com tais características, que acentua a injustiça do sistema, poderia ser minimizada com uma tributação progressiva do patrimônio, da herança e da renda, o que precisa ser lembrado pelos que levam a reforma a efeito.

Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito, professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFCE), ex-coordenador do programa de pós-graduação (mestrado/doutorado) da UFCE, professor do Centro Universitário Christus (graduação/mestrado), membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (Icet) e da World Complexity Science Academy (WCSA), advogado e visiting scholar da Wirtschaftsuniversität, em Viena (Áustria).

Revista Consultor Jurídico, 23 de novembro de 2022, 14h58

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