ARTIGO DA SEMANA –  CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO NO IBS (Pedido de retificação) Parte 6

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

O artigo 98[1], do PLP 108/2024 disciplina o recurso denominado pedido de retificação.

Bem compreendido o recurso, o que se percebe é que se trata dos embargos de declaração, recurso bem conhecido e disciplinado, desde há muito, no Código de Processo Civil.

No âmbito do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são cabíveis para o esclarecimento de obscuridade, eliminação de contradição, supressão de omissão e correção de erro material.

De acordo com o artigo 98, do PLP 108/2024, o pedido de retificação será cabível para “corrigir erro de fato, eliminar contradição ou obscuridade ou suprir omissão em relação à questão que deveria ter sido objeto de decisão”.

O ponto importante e louvável do pedido de retificação é que sua interposição pode ocorrer face à decisão de qualquer instância administrativa.

Esta previsão é digna de nota porque, no âmbito federal, os embargos de declaração – recurso idêntico ao pedido de retificação – só é cabível face às decisões de Turmas e/ou Câmara Superior  do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), vedado o manejo do recurso para correções ou integração de decisão de primeira instância.

O pedido de retificação é igualmente bem-vindo porque as legislações estaduais não costumam admitir a correção de decisões pela via dos aclaratórios.

Deste modo, o novo processo administrativo fiscal do IBS traz boa notícia aos litigantes, que passarão a contar com recurso para extirpar indesejáveis contradições, obscuridades, omissões e erros materiais, proporcionando maior celeridade na tramitação dos processos.

Considerando que o pedido de retificação será apreciado pelo próprio órgão que proferiu a decisão, evita-se o reconhecimento de nulidade pela instância superior que, via de regra, determina o retorno ao órgão de origem para proceder a novo julgamento. 

O PLP 108/2024 também acerta em definir que os legitimados à interposição do recurso são representante da fazenda e o sujeito passivo, acabando com a esdrúxula previsão do Regimento Interno do CRF de oposição de embargos de declaração por membro do Colegiado, autoridades julgadoras de primeira instância e titulares de repartições fiscais encarregadas da execução do julgado.

A correta previsão do pedido de retificação é um dos pontos altos do PLP 108/2024 que deve ser mantido pelo Senado Federal na apreciação do Projeto.


[1] Art. 98. Da decisão de qualquer instância administrativa, caberá pedido de retificação para a própria Câmara que a proferiu e, se for o caso, as suas Turmas de Julgamento, no prazo de 5 (cinco) dias, contado da intimação da decisão, exclusivamente para corrigir erro de fato, eliminar contradição ou obscuridade ou suprir omissão em relação à questão que deveria ter sido objeto de decisão, podendo, ainda, a referida matéria ser tratada como preliminar das razões de recurso próprio.

§ 1º Poderão firmar o pedido de retificação:

I – a representação fazendária; ou

II – o sujeito passivo.

§ 2º A interposição tempestiva do pedido de retificação interrompe o prazo para apresentação de recursos.

§ 3º A decisão relativa ao pedido de retificação versará apenas sobre o objeto do pedido.

§ 4º O pedido de retificação será decidido pelo mesmo órgão que proferiu a decisão contestada.

§ 5º A decisão que não conhecer ou rejeitar  pedido de retificação é irrecorrível.

Regulamentação da reforma tributária sobre consumo é aprovada no Senado

Os senadores concluíram em Plenário, nesta quinta-feira (12), a regulamentação da reforma tributária sobre o consumo. O texto volta à Câmara dos Deputados com novas hipóteses de redução dos futuros tributos (CBS e IBS), como na conta de água e com mais itens na cesta básica, como a inclusão da  erva-mate muito mais consumida do que café em terminados estados, como os da Região Sul e no Mato Grosso do Sul. O projeto de lei complementar (PLP) 68/2024 foi aprovado com 49 votos favoráveis e 19 contrários, basicamente de senadores do PL e do Novo.

No Plenário, o relator Eduardo Braga (MDB-AM) emitiu sua última avaliação sobre as solicitações dos parlamentares. Entre elas, Braga atendeu emenda da senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB) incluindo os serviços funerários no regime de tributação diferenciada e outra do senador Omar Aziz (PSD-AM) para aperfeiçoar as compras governamentais. Ele informou que acatou várias emendas que deram maior segurança jurídica ao projeto e outras pontuais como para o setor artístico e combustíveis para fins de transporte, como solicitado pelo senador Laércio Oliveira (PP-SE). 

Comprometeu-se em estudar um tratamento tributário adequado para as franquias, que ficaram fora do projeto de lei complementar. Essa questão, levantada pelo senador Irajá (PSD-TO), foi considerada importante pelo relator, que informou a necessidade de ter que apresentar uma proposta de emenda constitucional. Também informou seu compromisso com o senador Laércio para estudar e negociar uma legislação específica sobre a desoneração da folha para o setor de serviços já em 2025.

Só no Plenário, foram apresentadas 64 novas emendas, das quais 16 foram acatadas. Não foi aprovado nenhum dos três destaques [quando a inclusão ou retirada de um trecho do relatório é decidida por votação dos senadores]. Isso acabou mantendo, na rodada final, uma das decisões que despertaram maior polêmica na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ): a retirada de armas e munições do Imposto Seletivo (IS). Uma outra decisão aprovada na CCJ excluiu as bebidas açucaradas da sobretaxa.

Segundo Braga, em seu pronunciamento na Tribuna, o texto moderniza o sistema tributário, o que refletirá em um “novo ambiente de negócios” para o país, proporcionando crescimento econômico. Lembrou que a justiça social foi o grande norteador para suas escolhas na relatoria.

— Esses aspectos sociais do tributo talvez tenham sido o balizador, a coluna vertebral de todo o trabalho de nosso relatório. Como qualquer obra humana, não é perfeita. No entanto, posso assegurar que é o melhor texto que conseguimos construir… Nós teremos revisões quinquenais sobre este texto, exatamente para que possamos ir aperfeiçoando — sustentou.

A aprovação do projeto era uma das prioridades do Senado para este ano. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, disse ao final da sessão que recaiu sobre as costas de um só senador, Eduardo Braga, uma “das matérias mais complexas e difíceis da história do Parlamento”. Elogiou o preparo do senador para atender os outros parlamentares e ouvir os mais variados setores da economia e da sociedade brasileira.  O texto chegou no Senado em julho, mas sofreu atrasos na CCJ. Em “esforço concentrado”, Braga concluiu seu primeiro relatório na segunda-feira (10) e apresentou ao colegiado na terça-feira (11), que aprovou o substitutivo na quarta-feira (12) com modificações após oito horas de reunião. Braga fez questão de reconhecer e agradecer a sua equipe, aos consultores do Senado e à área técnica do Ministério da Fazenda, que nos últimos 20 dias, segundo ele, trabalharam incansavelmente, às vezes 20 horas por dia. O relator fez um agradecimento especial ao Ministro Fernando Haddad, por ter apoiado a manutenção da competitividade e da sobrevivência, como qualificou, da Zona Franca de Manaus, “que é o maior programa de conservação ambiental do Brasil”.

Alíquotas

Nos debates em Plenário, os senadores de oposição voltaram a criticar o projeto de regulamentação e a reforma tributária aprovada, insistiram que haverá aumento da carga tributária atual. O senador Rogerio Marinho (PL-RN) afirmou que o texto aprovado aumentará a alíquota-padrão e que o país terá o maior IVA [Imposto sobre Valor Agregado] do mundo. Considerou que a reavaliação das alíquotas em 2030 para garantir o máximo de 26,5% [trava aprovada na Câmara para a alíquota-padrão] está num período muito distante, levando em conta as alíquotas já estimadas.

— Nós estamos aqui próximo de 30%. E eu estou sendo, diria, cauteloso. Nós vamos aguardar o “crime” acontecer [para tomar providências]?

Marinho tentou incluir mecanismos para assegurar a alíquota-padrão em 25% nos primeiros meses após a sanção do projeto. Mas o destaque foi rejeitado por 33 senadores.

Para Braga, a modernização e as tecnologias a serem utilizadas vão reduzir a sonegação, as fraudes e o contencioso fiscal; tirará pessoas da informalidade e movimentará a economia do país, aumentando a arrecadação e viabilizando uma alíquota inferior à trava aprovada no texto da Câmara.

 — Eu estou convencido de que as alíquotas provarão que nós teremos uma alíquota-padrão menor do que nós estamos imaginando.

O aumento da alíquota-padrão em razão de novas exceções ocorre para compensar a arrecadação governamental. A alíquota dos novos tributos (CBS e IBS) só será definida em futura lei. Sua arrecadação deve ser a mesma obtida com os tributos atuais [Pis, Cofins, IPI, ICMS e ISS] que serão extintos. A complexidade do sistema atual, conforme os especialistas, dificulta a comparação entre a alíquota dos novos tributos e a dos tributos vigentes.

Imposto reduzido

Diversos outros bens e serviços foram incluídos na redução de 60%. É o caso de:

  • água mineral;
  • fraldas;
  • biscoitos e bolachas, desde que não tenham recheio ou cobertura e que não tenham manteiga ou cacau;
  • castanhas brasileiras, como a do Pará e de caju;
  • saneamento;
  • serviços de gravações de vídeo ao vivo;
  • serviços de artistas como fotografias, escultura e gravuras;
  • atividades de condicionamento físico, entre outros.

Outras vantagens aprovadas são a redução de 8,5% para 5% do tributo específico para Sociedades Anônimas de Futebol e a retirada de gestoras de fundo patrimonial dos contribuintes dos tributos, com relação aos seus investimentos.

Cashback

A devolução dos tributos por meio do mecanismo de cashback incluirá gastos com internet e telefonia. Todo o valor pago em CBS e 20% em IBS serão devolvidos para famílias com renda de até meio salário mínimo por membro — o que corresponde a R$ 706 atualmente. Antes, a devolução seria definida futuramente, com piso mínimo de 20%.

Remédios

A lista de remédios isentos dos tributos será definida em futura lei complementar. A Câmara dos Deputados listou mais de 300 remédios com isenção, com a possibilidade de chegar a quase 600, no Senado.

Os medicamentos devem ser para tratamentos de câncer, Aids, doenças “negligenciadas”, vacinas e soros. Além disso, devem ter o preço máximo estipulado de acordo com a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), que é uma tabela de referência nas compras do setor público, segundo Braga.

Os medicamentos fora da lista terão alíquota reduzida em 60%. Mas para compras do programa farmácia popular, pela administração pública e por algumas entidades beneficentes, a isenção é para todos os remédios.

Cesta básica

A Cesta Básica Nacional de Alimentos (CBNA), com desoneração total, chegou ao Senado com 22 itens, dos quais apenas o óleo de soja foi retirado (agora com 60% de redução dos tributos). Mantém-se carne, queijo e o óleo de babaçu, agora o único óleo na CBNA.

Na lista, entram farinhas e massas utilizadas por pessoas com algumas doenças identificadas no “teste do pezinho” (aminoacidopatias, por exemplo), além do mate e de fórmulas infantis utilizadas para pessoas com erros inatos de metabolismo.

Armas

Os senadores confirmaram o resultado da votação na CCJ na quarta-feira: armas e munições ficam de fora do Imposto Seletivo (IS). Desta forma, as armas terão uma carga tributária inferior à atual, na avaliação de Braga. O imposto seletivo será cobrado uma única vez em produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Em votação acirrada no Plenário, 33 senadores pediam a volta da incidência, contra 32 senadores. No entanto, era preciso apoio da maioria absoluta, 41 senadores. 

O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), que foi voto vencido, disse que criminosos irão se beneficiar da medida.

— A disseminação do uso de armas só aumenta a criminalidade, e essas armas, vêm cair nas mãos do crime organizado, penalizando ainda mais a população.

Já o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que defendeu a emenda, disse que o crime organizado terá acesso às armas de qualquer forma por meios ilegais.

— O marginal compra arma em loja? Sabe quanto o Estado do Rio de Janeiro arrecadou de ICMS com [apreensão de fuzis]? Zero.

Um outro destaque rejeitado buscava assegurar isenção em passagens aéreas internacionais.

“Imposto do pecado”

Na versão aprovada pelo Senado, o IS ocorrerá na extração de minérios, ao invés da exportação, como veio da Câmara dos Deputados. 

A alíquota máxima será de 0,25% na extração, mas será zerada se for a operação envolver gás natural para que seja usado em processo industrial. Durante a sessão, os senadores incluíram na excepcionalidade os “combustíveis para fins de transporte”. Também foi incluída a revisão anual da alíquota específica (quando não é cobrado em porcentagem) pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado para medir a inflação.

Cigarros, bebidas alcóolicas, refrigerantes e água mineral poderão ser atingidos pelo modelo da substituição tributária, que cobra os tributos no início ou no meio do processo produtivo. O modelo possui facilidades para a administração pública, como a facilidade na fiscalização, mas pode ser prejudicial ao setor. A substituição tributária havia sido extinta pela reforma tributária. 

Os demais itens escolhidos pelos deputados para o IS permanecem, como as loterias, as bebidas alcoólicas e os cigarros. Quanto às bebidas alcoólicas, uma futura lei poderá aliviar a alíquota, ainda a ser definida, para pequenos produtores de bebidas, por exemplo, de cervejas artesanais.

Região Norte

De quarta para quinta-feira, três novos benefícios foram aprovados para empresas incentivadas da Zona Franca de Manaus (ZFM) ou das Áreas de Livre Comércio (ALC). Trata-se da previsão de créditos presumidos — mecanismo que permite “desconto” nos débitos fiscais — para operações em que não há cobrança de tributos. No entanto, só será possível para negócios com o poder público ou para importação de materiais revendidos na região.

OUtro benefício foi alongar a existência das ALCs até o ano de 2073, ao invés de até 2050, equiparando à ZFM. As ALCs promovem o comércio em cidades dos estados de Amazonas, Amapá, Acre, Rondônia e Roraima.

Para Braga, o tratamento mantém a competitividade assegurada pela Constituição, “nem um milímetro a mais, em alguns casos até menos”. Já o senador Marcos Rogério (PL-RO) afirmou que a vantagem da região não será mantida porque, com a reforma, os estados não poderão criar novos benefícios fiscais.

— Os estados não terão poder, o estado perde a autonomia. Vai ficar dependente de um modelo [único].

Imóveis

Como aluguel e compra de imóveis não pagam ICMS atualmente, representantes do setor de imóveis ouvidos na CCJ temiam os resultados da cobrança da CBS e do IBS. Para minimizar o impacto, os senadores aumentaram para R$ 600 o “desconto” no valor do aluguel a ser tributado. Na versão dos deputados o redutor social era R$ 400. 

Além disso, o tributo será 70% menor que a alíquota-padrão, no lugar de 60%. Dessa forma, por exemplo, um aluguel de R$ 1.500 terá R$ 75,60 de tributos, considerando a estimativa de alíquota-padrão de 28% do governo federal. Na versão dos deputados, a tributação seria de R$ 123,20.

Outra novidade é que a obrigação de arcar com o IBS e a CBS será apenas no momento do pagamento do aluguel, enquanto o texto original previa também no momento de vencimento do boleto. Assim, o tributo não será devido caso o inquilino atrase o aluguel.

Comitê Gestor

Braga apontou que a implementação do PLP será testada em 2026. Mas as empresas não terão que pagar o Fisco durante o período, mas apenas emitir o valor do tributo destacado na nota fiscal. Daí para frente, a administração pública verificará a viabilidade do novo sistema, que será totalmente implementado em 2033.

Para isso, Braga incluiu no texto parte do PLP 108/2024, que está parado no Senado, para instituir um Comitê Gestor temporário e independente, que durará até o fim de 2025. O Comitê também criará o regulamento único do IBS na sua vigência.

Tempo de análise

O projeto recebeu o total de 2235 emendas, possui mais de 530 artigos e 23 anexos. Foram realizadas 13 audiências públicas na CCJ, além de 21 debates na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) durante o segundo semestre.

Este é o primeiro dos projetos que regulamenta a reforma tributária e refere-se a tributação sobre o consumo instituída pela Emenda Constitucional 132, de 2023. No âmbito da reforma tributária, ainda é esperada a reforma sobre a renda e o patrimônio, ainda sem propostas apresentadas.

Fonte: Agência Senado

Fonte: Agência Senado

Reforma tributária: CCJ deve votar regulamentação nesta quarta-feira

Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) deve votar nesta quarta-feira (11) o primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária: o PLP 68/2024. O projeto é o único item da reunião deliberativa do colegiado, que será realizada após sabatina de autoridades — que, por sua vez, está prevista para começar às 9h30.

Proposto pelo governo, o PLP 68/2024 cria as regras que vão viabilizar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, com a substituição de cinco tributos (ICMS, IPI, ISS, PIS e Cofins) por três: Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de nível federal; Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de nível estadual e municipal; e o Imposto Seletivo, de nível federal.

O relator do PLP 68/2024 no âmbito da CCJ é Eduardo Braga (MDB-AM). Ele acatou parte das 1.998 emendas apresentadas pelos senadores ao projeto.

A CCJ promoveu 13 audiências públicas sobre a matéria. Ao longo dos debates, representantes de vários setores da economia — como imobiliário, de turismo e alimentos, entre outros —, pediram para serem beneficiados com cobranças menores de tributos (regime diferenciado). 

Outros setores produtivos pediram revisão das regras sobre o sistema de créditos com a administração pública, o que permitiria às empresas de determinadas cadeias produtivas retomarem valores de tributos pagos sobre o consumo — o mecanismo busca tributar apenas o consumidor final.

Também houve convidados nessas audiências que discutiram instrumentos sociais previstos na reforma tributária. É o caso do cashback, que permitirá a devolução de imposto para famílias com renda de até meio salário mínimo por membro — o que corresponde a R$ 706 por integrante, nos valores de hoje —, beneficiando a clientela do Bolsa Família e outros programas sociais do governo. 

Fonte: Agência Senado

ARTIGO DA SEMANA –  CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO NO IBS (Recurso voluntário) Parte 5

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

De acordo com o art. 93, são cabíveis os seguintes recursos: (i) recurso de ofício, (ii) recurso voluntário, (iii) recurso de uniformização e (iv) pedido de retificação.

O PLP 108/2024 foi econômico na disciplina do recurso voluntário, reduzida ao artigo 96[1].

Recursos administrativos fiscais são espécie dos recursos administrativos e recebem esta adjetivação em função do direito material submetido a uma solução por meio do processo. 

Nunca é demais lembrar que, qualquer que seja o recurso interposto, a vontade do recorrente é a de impedir a definitividade da decisão recorrida, de modo que somente se cristalize após o exame de suas razões de recurso. Se assim não fosse, de nada adiantaria recorrer.

Característica importante dos recursos no processo administrativo fiscal é que, desde que interpostos nos termos da lei que os regula, suspendem a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, III, do CTN) e, consequentemente, permitem que o recorrente faça prova de sua regularidade fiscal (art. 206, do CTN).

Nos termos do PLP 108/2024, um dos requisitos a ser observado no recurso voluntário é o prazo de 20 (vinte) dias para sua interposição (art. 93, §1º). 

A propósito, é preciso lembrar que o art. 74, do PLP 108/2024, dispõe que “Na contagem dos prazos processuais previstos neste Título, serão considerados somente os dias úteis, excluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento, exceto se houver expressa disposição em contrário nesta Lei Complementar ou na lei complementar que institui o IBS e a CBS”.

Mas além da intempestividade, o PLP 108/2024 prevê outros dois requisitos para a inadmissibilidade do recurso voluntário: (a) a ilegitimidade e (b) a inépcia, conforme prevê o art. 86[2].   

O chamado vício de ilegitimidade de parte ocorrerá  quando os recursos forem  “postulados ou assinados por pessoa sem capacidade ou competência legal para fazê-lo, inclusive em caso de ausência de legítimo interesse ou de ilegalidade da representação” (art. 86, §1º, II).

Constatado o vício de ilegitimidade, o contribuinte será intimado para saneamento no prazo de 05 (cinco) dias, “sob pena de preclusão e nulidade dos atos praticados e dos que lhes forem consequentes” (art. 86, §2º).

A inépcia, nos termos do art. 86, §1º, III, ocorrerá quando os recursos: a) não contiverem pedido ou seus fundamentos; b) contiverem pedido relativo a matéria estranha à legislação tributária aplicável ao lançamento do tributo contestado; ou c) não contiverem elementos essenciais à identificação do sujeito passivo, inclusive sua assinatura ou a assinatura de seu representante legal ou procurador legalmente constituído.

Sobre a inépcia, vale a pena destacar que as hipóteses elencadas no PLP 108/2024 não exatamente as mesmas daquelas relacionadas no art. 330, §1º, do Código de Processo Civil.

Além disso, é preciso ter cautela quanto à identificação de “matéria estranha à legislação tributária aplicável ao lançamento do tributo contestado” já que isto envolve exame do mérito e não é causa juridicamente aceitável para o indeferimento de plano do recurso. 


[1] Art. 96. Das decisões de primeira instância contrárias ao sujeito passivo, caberá recurso voluntário ao colegiado de segunda instância.

§ 1º O recurso voluntário admitido devolve o conhecimento de toda a matéria nele versada.

§ 2º O recurso interposto pelo sujeito passivo de parte da decisão implica reconhecimento da parte não recorrida.

[2] Art. 86. Exceto na hipótese do art. 85 desta Lei Complementar, a impugnação e os recursos serão indeferidos pela autoridade competente se intempestivos, postulados ou assinados por pessoa sem legitimidade ou ineptos, vedada a recusa de seu recebimento ou protocolização.

ARTIGO DA SEMANA –  CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO NO IBS (Recurso de ofício) Parte 4

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

Os artigos 93 a 99 do PLP 108/2024 (Seção V, do Capítulo III, Título II) cuidam das espécies recursais no processo administrativo fiscal do IBS.

O recurso de ofício no processo administrativo do IBS está disciplinado no art. 95, do PLP 108/2024.

Recursos de ofício não são propriamente recursos, já que não há qualquer manifestação de vontade da parte em rever a decisão administrativa que lhe foi desfavorável. Na verdade, como bem ensinam LUIZ GUILHERME MARINONI e DANIEL MITIDIERO[1] (2008, p. 451), analisando o instituto análogo do Direito Processual Civil, “o reexame necessário não constitui figura recursal, porque lhe falta a voluntariedade inerente aos recursos. Trata-se de condição para eficácia da sentença”.

Ou seja, nem toda decisão administrativa se tornará definitiva no momento em que o sujeito passivo da relação tributária for intimado de sua existência e conteúdo. Há casos em que é necessária a revisão da decisão administrativa por outro órgão da administração tributária com função judicante, independentemente da vontade da parte.

Inegavelmente, o que dá fundamentação ao recurso de ofício é o exercício da autotuela, do controle da legalidade dos atos da administração tributária.

Nunca se pode perder de vista que a atuação da Administração deve observar seu poder de autotutela, vale dizer, de correção dos atos eivados de ilegalidade ou em cujo mérito haja flagrante desrespeito ao interesse público. Exatamente por esta razão é que DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO[2] (2003, p. 104) afirma que a autotutela é um princípio de direito administrativo que “exprime o duplo dever da Administração Pública de controlar seus próprios atos quanto à juridicidade e à adequação ao interesse público”.

Acontece, porém, que o exercício da autotutela independe de provocação do interessado. O dever da Administração corrigir seus próprios atos deve ser realizado de ofício porque só assim, aliás, estará atendido o interesse público. JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO[3] (2002, p. 131) ensina que “se for necessário rever determinado ato ou conduta, a Administração poderá fazê-lo ex officio, usando sua auto-executoriedade, sem que dependa necessariamente de que alguém o solicite”. Isto é o que está contemplado no artigo 63, § 2°, da Lei n° 9.784/99, como também já ficou pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nas súmulas n° 346 e 473.

Como se vê, o recurso de ofício no processo administrativo fiscal foi um momento contemplado pelo legislador para que os órgãos administrativos de função judicante reexaminem a decisão que, por sua relevância econômica, tem grande repercussão no erário e pode contrariar o interesse público.

Questão importante envolvendo o recurso de ofício diz respeito à extensão do poder de revisão conferido à autoridade ad quem. Como já observou JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO[4] (2001, p. 233):

“a autoridade incumbida da reapreciação tem ampla margem de avaliação do ato administrativo decisório sujeito a seu crivo. Em outras palavras, é de se considerar que a ela compete verificar os aspectos de legalidade e de mérito do ato sob sua reapreciação, fato que rende ensejo a que o ato da autoridade seja idôneo para exercer controle natural.”

A lição de CARVALHO FILHO corresponde àquilo que ficou pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça quanto à Remessa Necessária no processo judicial: 

“A remessa oficial devolve ao Tribunal o reexame de todas as parcelas da condenação suportadas pela Fazenda Pública, inclusive dos honorários de advogado”.

(Súmula n.  325, Corte Especial, julgado em 3/5/2006, DJ de 16/5/2006, p. 214.)

Como decorrência do amplo poder de revisão da autoridade competente para apreciação dos recursos administrativos, corolário lógico do efeito devolutivo, surge a questão de saber se é possível que este poder seja exercido de forma a agravar a situação do interessado (sujeito passivo).

De fato, o recurso de ofício tem evidente efeito devolutivo. No exercício de seu poder de revisão, a autoridade administrativa poderá não apenas avançar sobre questões que não foram objeto de impugnação, como também agravar a situação do recorrente.

A possibilidade da reformatio in pejus no processo administrativo se justifica e encontra seu fundamento no princípio da legalidade. Todos os atos da administração devem ser praticados no estrito cumprimento da lei, não sendo lícito ao administrador fazer aquilo que não encontre previsão legal, tampouco deixar de fazer o que a lei expressamente determina – artigo 37, da Constituição. 

Tratando-se de ato praticado pela administração tributária, a observância da legalidade torna-se ainda mais importante porque tributos somente podem exigidos mediante prévia lei (art. 150, I, da Constituição).

Logo, a decisão administrativa que dispensa tributo ou penalidade que esteja previsto em lei deve ser revista e reformada. Daí ser possível a reforma para pior de decisão contrária à lei.

Mas é evidente que a decisão que dá provimento a recurso de ofício deverá ser submetida ao conhecimento do sujeito passivo para o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Desse modo, ainda que o acolhimento do recurso de ofício importe em agravamento ou restabelecimento da exigência fiscal, caberá ao interessado interpor o competente recurso voluntário, provocando o órgão administrativo a rever a decisão que lhe foi desfavorável.

Como se vê, o julgamento do recurso de ofício não é a última decisão do processo administrativo fiscal, já que ao sujeito passivo estará assegurado, em típico recurso, o direito de expor os motivos pelos quais entende que a exigência fiscal deve ser afastada.     

Nos termos do art. 95, do PLP 108/2024, o órgão julgador de primeira instância recorrerá de ofício à segunda instância sempre que a decisão for, no todo ou em parte, contrária à Fazenda Pública.

O art. 95, §3º, do PLP 108/2024 elenca as hipóteses de dispensa da interposição do recurso de ofício quando: (i) a decisão contrária à Fazenda Pública consignar, na data da realização do julgamento, valor inferior ao limite específico para esse fim fixado pelo CG- IBS; (ii) houver, nos autos, provas de recolhimento integral do tributo exigido no lançamento original; (iii) o cancelamento do ato de lançamento de ofício tiver por fundamento disposição legal que importe remissão do crédito tributário; ou (iv) a decisão aplicar penalidade mais benéfica à conduta infracional indicada no ato de lançamento de ofício, decorrente exclusivamente de alteração superveniente na legislação.

Tratando-se de hipótese de cancelamento por remissão, o art. 95, §4º, impõe a necessidade de manifestação da Representação da Fazenda.

A art. 95, §5º, em indevida delegação de competência, autoriza que o Comitê Gestor do IBS estabeleça outras hipóteses de dispensa da interposição do recurso de ofício em razão da matéria controvertida e da natureza da infração.

Finalmente, o art. 95, §6º, prevê que o valor mínimo de dispensa do crédito tributário para efeito de interposição do recurso de ofício será único e estabelecido em caráter nacional. 


[1] MARINONI, Luiz Guilherme e MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil – Comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

[2] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003.

[3] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2002. 

[4] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Processo Administrativo Federal – Comentários à Lei n° 9.784, de 29/1/1999. Rio de Janeiro: Editora Lumen Iuris, 2001.

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