Primeira Seção fixa teses sobre prescrição intercorrente em processo administrativo de apuração de infração aduaneira

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos(Tema 1.293), fixou três teses sobre a ocorrência da prescrição intercorrente em processo administrativo de apuração de infrações aduaneiras de natureza não tributária.

Na primeira tese, o colegiado definiu que incide a prescrição intercorrente prevista no artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 9.873/1999 quando paralisado o processo administrativo de apuração de infrações aduaneiras, de natureza não tributária, por mais de três anos. 

A segunda tese estabelece que a natureza jurídica do crédito correspondente à sanção pela infração à legislação aduaneira é de direito administrativo (não tributário) se a norma infringida visa, primordialmente, ao controle do trânsito internacional de mercadorias ou à regularidade do serviço aduaneiro, ainda que, reflexamente, possa colaborar para a fiscalização do recolhimento dos tributos incidentes sobre a operação. 

Por fim, a terceira tese fixa que não incidirá o artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 9.873/1999 apenas se a obrigação descumprida, embora inserida em ambiente aduaneiro, destinava-se direta e imediatamente à arrecadação ou à fiscalização dos tributos incidentes sobre o negócio jurídico realizado.

Com o julgamento, podem voltar a tramitar os recursos especiais e agravos em recurso especial que estavam suspensos à espera do precedente qualificado. As teses devem ser observadas pelos tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes. 

Inércia poderá causar a extinção de processos aduaneiros 

O relator do tema repetitivo, ministro Paulo Sérgio Domingues, lembrou que a Lei 9.873/1999 estabeleceu o regime jurídico da prescrição apenas no âmbito da administração pública federal – seja ela direta ou indireta –, cabendo aos estados e municípios estabelecerem seus próprios regramentos.

Segundo o ministro, também há limitações materiais à aplicação da regra da prescriçãointercorrente prevista no artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 9.873/1999, tendo em vista que, conforme estipulado no artigo 5º da mesma lei, a prescrição não se aplica às infrações de natureza funcional e aos procedimentos de natureza tributária. 

Paulo Sérgio Domingues apontou que o critério a ser observado para definir se uma infração legal deve ou não seguir as regras da Lei 9.873/1999 é a natureza jurídica da norma violada, e não o procedimento que tenha sido escolhido pelo legislador para se promover a apuração ou a constituição definitiva do crédito correspondente à sanção pela infração praticada. 

“O procedimento, seja ele qual for, não tem aptidão para alterar a natureza das coisas, de modo que as infrações de normas de natureza administrativa não se convertem em infrações tributárias apenas pelo fato de o legislador ter estabelecido, por opção política, que aquelas serão apuradas segundo processo ou procedimento ordinariamente aplicado para estas”, afirmou.

Atividade aduaneira é complexa e sanções podem ter implicações tributárias e não tributárias

O ministro Domingues reforçou que, em razão da complexidade do procedimento de despacho aduaneiro, surgem dificuldades na definição da natureza jurídica da obrigação legal – por exemplo, identificar se a infração resulta em violação de norma administrativo-aduaneira ou a inobservância de uma obrigação tributária acessória. 

Por outro lado, citando o precedente da Primeira Turma no REsp 1.999.532, ele apontou que só se atribui natureza tributária às obrigações que repercutem, de maneira direta, na fiscalização e na arrecadação das exigências fiscais, não bastando o simples efeito indireto de imposições legais com finalidades diferentes. 

Como consequência, o ministro enfatizou que, na seara aduaneira, a natureza jurídica do crédito decorrente de sanção será de direito administrativo se a norma violada buscar, em especial, o controle do trânsito internacional de mercadorias ou a regularidade do serviço aduaneiro.  

“Não incidirá o artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 9.873/1999 apenas se a obrigação descumprida, conquanto inserida em ambiente aduaneiro, destinava-se direta e imediatamente à arrecadação ou à fiscalização dos tributos incidentes sobre o negócio jurídico realizado”, concluiu.

Leia o acórdão no REsp 2.147.578.

Fonte: Notícias do STJ

Reforma tributária: Braga propõe plano de trabalho para regulamentação final

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) poderá realizar quatro audiências públicas sobre o projeto de lei que dá continuidade à reforma tributária — o PLP 108/2024. É o que prevê o plano de trabalho apresentado nesta quarta-feira (2) pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM). Esse plano ainda precisa ser aprovado pela CCJ.

O PLP 108/2024 cria um comitê gestor para coordenar a arrecadação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a distribuição dos respectivos valores entre estados e municípios. O IBS irá unificar o ICMS, que é um imposto estadual, e o ISS, que é um imposto municipal.

O objetivo das audiências previstas no plano de trabalho — que contarão com a presença de especialistas e integrantes do governo, entre outros representantes da sociedade — é dar embasamento às discussões e deliberações a serem feitas pelos senadores.

Eduardo Braga, que sugeriu os debates, é o relator do PLP 108/2024. Esse projeto é o segundo a regulamentar a reforma tributária (em janeiro, foi sancionada a primeira parte, que criou o IBS). Ele ressaltou que o PLP 108/2024 é o “último estágio” da reforma tributária iniciada em 2023 com a Emenda Constitucional 132.

Veja a seguir o que o plano de trabalho prevê para cada uma das quatro audiências públicas.

1º audiência: comitê gestor

O primeiro debate abordará o funcionamento do comitê gestor do IBS, suas funções, sua gestão financeira e sua prestação de contas — que deverá ser realizada de forma compartilhada entre tribunais de contas dos estados, dos municípios e do Distrito Federal.

O projeto (PLP 108/2024) determina que o comitê será conduzido por um conselho superior (que terá representantes indicados por prefeitos e governadores, entre outros) e estabelece regras para a eleição dos membros desse conselho. Por exemplo: no caso dos municípios, as votações serão organizadas por associações municipais; no caso dos estados, os candidatos terão de ser secretários da Fazenda.

A representatividade dos entes federativos em órgãos como esse foi um dos pontos de discordância entre os parlamentares durante a análise da proposta que deu origem à Emenda Constitucional 132.

2º audiência: conflitos tributários

Nesse debate, serão abordadas as infrações, as penalidades e os encargos moratórios relativos ao IBS, assim como as regras sobre o processo administrativo tributário desse imposto. Também deve ser discutido o modelo de resolução de conflitos tributários entre a administração pública e os pagadores de tributos.

De acordo com o projeto, o processo no âmbito administrativo terá três etapas de julgamento: a primeira instância, a instância recursal e a Câmara Superior do IBS (que terá a decisão final). Para implementar isso, o texto determina a atuação conjunta de auditores fiscais de estados e municípios. No entanto, as regras previstas geram questionamentos entre auditores fiscais.

3º audiência: tributos estaduais

Eduardo Braga lembra que o PLP 108/2024 trata das regras de transição do ICMS para o IBS até 2033. E que, além disso, o projeto traz regras gerais sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), um tributo estadual. O ITCMD é devido quando há doações e heranças, e a porcentagem a ser paga varia de acordo com a legislação de cada estado. Os dois tributos serão tema do terceiro debate.

4º audiência: tributos municipais

A última audiência prevista vai abordar os dispositivos do projeto que alteram normas sobre o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip). 

Braga informou que na semana passada se reuniu com representantes da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP) para tratar desse assunto.

Fonte: Agência Senado

ARTIGO DA SEMANA –  Desproporcionalidade e efeito de confisco na multa do art. 62-B, da Lei nº 2.657/96-RJ

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

Em dezembro de 2012, a Lei Estadual nº 6.357 promoveu profundas alterações no Capítulo da Lei do ICMS/RJ que trata das penalidades.

Entre estas alterações, destaca-se o art. 62-B, II[1], que pune a informação ou dado incorreto, bem como a omissão de tais dados/informações em documento, formulário ou arquivo exigido pela legislação com multas de 0,25% a 1% do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período.

O art. 67, V[2], da Lei nº 2.657/96, ainda esclarece que “o valor total das operações de saídas e prestações de serviço praticadas a qualquer título e sob qualquer regime tributário, inclusive, as operações ou prestações isentas, imunes, não tributadas, sujeitas à substituição tributária, a regime de recolhimento antecipado de tributo, a diferimento, estimativa, regime especial ou qualquer outro benefício fiscal, exceto as saídas com suspensão do imposto, inclusive as relativas a operações temporárias para demonstração, conserto, comodato e locação.”

Da combinação destes dispositivos, conclui-se que o contribuinte que prestar uma informação inexata em sua Escrituração Fiscal Digital (EFD) estará sujeito à multa calculada em até 1% sobre o valor total de suas saídas, pouco importando o valor, a origem ou o peso da informação incorreta no total do ICMS devido ao final do período de apuração.

A simples informação inexata de uma entrada sem direito a crédito na apuração do ICMS pode dar ensejo à cobrança da multa de até 1% do valor total das saídas!

A informação incorreta de um crédito a maior em um estabelecimento e a menor em outro também é causa para a cobrança da multa de até 1% do valor total das saídas!

A omissão de um depósito judicial na EFD, que pode até ser devolvido ao contribuinte, também permite a cobrança da multa de até 1% do valor total das saídas!

Calcular a multa sobre o valor total das saídas quando o erro ou a omissão não têm qualquer relação com estas operações já denota clara desproporção entre a infração e a penalidade.

A mesma desproporcionalidade se verifica quando o valor da multa supera até mesmo o valor da infração ou, não raro, o valor do ICMS devido.

Embora a fiscalização da SEFAZ/RJ sequer faça o cotejo entre a penalidade aplicada e o ICMS devido, é bom lembrar que já é pacífica a orientação jurisprudencial, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que afasta a imposição de multa por descumprimento de obrigação acessória em valor superior à obrigação principal (AgRg no AgIn 851.038[3] e ARE 949.147[4]).

Também é preciso lembrar que, à luz da jurisprudência do STF, a exigência de multas por descumprimento de obrigação tributária está sujeita ao princípio da vedação ao confisco (artigo 150, IV, da Constituição) e há, inclusive, interessante acórdão em que se declarou a inconstitucionalidade de dispositivos da Constituição do Estado do Rio de Janeiro que previam multas de duas e cinco vezes do valor de impostos e taxas estaduais[5].

A simples existência da multa do art. 62-B, II, da Lei nº 2.657/96 e a diversidade de casos em que sua aplicação é exacerbada deixam evidente que já está na hora deste Capítulo da Lei Estadual do ICMS/RJ sofrer nova alteração.


[1] Art. 62-B. O descumprimento de obrigações acessórias relativas à entrega de informações e declarações ensejará a aplicação das seguintes penalidades:

II – indicar informação ou dado incorreto ou omiti-lo em documento, formulário ou arquivo exigido pela legislação:

a) REVOGADO

b) se a retificação for efetuada após a ciência de intimação:

1) MULTA: 0,25 % (vinte e cinco centésimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 1.500 (mil e quinhentas) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 10.000 (dez mil) UFIR-RJ, caso entregue dentro do prazo estabelecido na 1ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo;

2) MULTA: 0,5% (cinco décimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 2.000 (duas mil) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 15.000 (quinze mil) UFIR-RJ caso entregue dentro do prazo estabelecido na 2ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo, sem prejuízo da aplicação da penalidade prevista no inciso I do art. 65 pelo não-atendimento da 1ª intimação;

3) MULTA: 0,75% (setenta e cinco centésimos por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais a 2.500 (duas mil e quinhentas) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 20.000 (vinte mil) UFIR-RJ caso entregue dentro do prazo estabelecido na 3ª intimação que exigir a retificação do documento, formulário ou arquivo, sem prejuízo da aplicação da penalidade prevista nos incisos I e II do art. 65 pelo não-atendimento da 1ª e da 2ª intimações;

c) caso não entregue a retificação dentro do prazo estabelecido na 3ª intimação que a exigiu:

1) MULTA: 1% (um por cento) do valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, nunca inferior ao equivalente em reais 3.000 (três mil) UFIR-RJ, limitada ao equivalente em reais a 25.000 (vinte e cinco mil) UFIR-RJ, sem prejuízo da aplicação das penalidades previstas nos incisos I a III do art. 65 pelo não-atendimento das intimações e de outras medidas cabíveis;

[2] Art. 67. A aplicação das penalidades previstas neste Capítulo:

V – quando tenha por base o valor das operações de saídas e prestações efetuadas no período, considerar-se-á o valor total das operações de saídas e prestações de serviço praticadas a qualquer título e sob qualquer regime tributário, inclusive, as operações ou prestações isentas, imunes, não tributadas, sujeitas à substituição tributária, a regime de recolhimento antecipado de tributo, a diferimento, estimativa, regime especial ou qualquer outro benefício fiscal, exceto as saídas com suspensão do imposto, inclusive as relativas a operações temporárias para demonstração, conserto, comodato e locação;

[3] AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO. CARÁTER CONFISCATÓRIO DA MULTA FISCAL. Em se tratando de débito declarado pelo próprio contribuinte, não se faz necessária sua homologação formal, motivo por que o crédito tributário se torna imediatamente exigível, independentemente de qualquer procedimento administrativo ou de notificação do sujeito. O valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade se revela nas multas arbitradas acima do montante de 100%. Agravo regimental a que se nega provimento. (AI 838302 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 25-02-2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-063  DIVULG 28-03-2014  PUBLIC 31-03-2014)

[4] DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ICMS. SALDO CREDOR ACUMULADO. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ENTRE ESTABELECIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ATIVIDADE INDUSTRIAL. PROVA PERICIAL. RICMS. DECADÊNCIA. CARÁTER INFRACONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA. SÚMULAS 279 E 280/STF. PRECEDENTES. 1. Para dissentir da conclusão a que chegou o Tribunal de origem, fundada em prova pericial, no sentido de que inexiste comprovação da atividade industrial, seria necessário o reexame do conjunto fático e probatório, pretensão inviável em sede de recurso excepcional. 2. A resolução da controvérsia demanda a analise da legislação local e o reexame dos fatos e provas constantes dos autos, o que é vedado em recurso extraordinário. Incidência das Súmulas 279 e 280/STF. Precedentes. 3. A Corte tem entendimento no sentido de que o valor da obrigação principal deve funcionar como limitador da norma sancionatória, de modo que a abusividade se revela nas multas arbitradas acima do montante de 100%. Entendimento que não se aplica às multas moratórias, que devem ficar circunscritas ao valor de 20%. Precedentes. 4. Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, fica majorado em 25% o valor da verba honorária fixada anteriormente, observados os limites legais do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC/2015. 5. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, em caso de unanimidade da decisão. (ARE 949147 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 21-06-2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-171  DIVULG 15-08-2016  PUBLIC 16-08-2016)

[5] AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. §§ 2.º E 3.º DO ART. 57 DO ATO DAS DOSPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. FIXAÇÃO DE VALORES MÍNIMOS PARA MULTAS PELO NÃO-RECOLHIMENTO E SONEGAÇÃO DE TRIBUTOS ESTADUAIS. VIOLAÇÃO AO INCISO IV DO ART. 150 DA CARTA DA REPÚBLICA. A desproporção entre o desrespeito à norma tributária e sua consequência jurídica, a multa, evidencia o caráter confiscatório desta, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em contrariedade ao mencionado dispositivo do texto constitucional federal. Ação julgada procedente.

(ADI 551, Relator(a): ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 24-10-2002, DJ 14-02-2003 PP-00058  EMENT VOL-02098-01 PP-00039)

Pedido de restituição de bem é julgado improcedente em Uruguaiana

A 2ª Vara Federal de Uruguaiana (RS) julgou improcedente um pedido de anulação de ato de perdimento de bem, em processo contra a União. A sentença é do juiz Carlos Alberto Sousa e foi publicada no dia 7/3.

No final de 2019, um caminhão foi flagrado pela Polícia Rodoviária Federal, em Uruguaiana, transportando 860 garrafas de bebidas alcoólicas provenientes da Argentina, sem a documentação devida. Foi elaborado auto de infração e instruído processo administrativo, que culminou na aplicação da pena de perdimento do veículo.

A autora da ação alegou que o caminhão teria sido utilizado por terceiros, mediante contrato de locação com uma empresa, o que afastaria sua responsabilidade. Ocorre que o proprietário da empresa, que estava dirigindo o veículo no momento da apreensão, é cônjuge dela.

A mercadoria foi avaliada em mais de R$50 mil e o veículo, em R$10 mil, o que afastou a alegação de desproporcionalidade na aplicação da pena administrativa. Segundo o juiz, a sanção “mostra-se adequada e necessária para evitar a prática de novos ilícitos tributários, inclusive levando-se em conta a necessidade do transportador ser corresponsável pela fiscalização da mercadoria que transporta.”

Além disso, restou demonstrado nos autos que outros veículos, de propriedade da demandante e do seu filho, já haviam sido apreendidos em situações anteriores semelhantes, também configuradas como descaminho. Assim, entendeu-se que a prática seria reiterada, havendo conhecimento e participação da mulher nos ilícitos. 

“Não há locação de veículos a terceiros, mas um contrato de locação entre cônjuges à pessoa jurídica de um destes, o que afasta a condição de terceiro de boa-fé da autora em relação ao cometimento da infração aduaneira”, ressaltou o magistrado.

A ação foi julgada improcedente e a autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e de eventuais honorários periciais. Cabe recurso ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Fonte: Nucom/JFRS (secos@jfrs.jus.br)

Justiça Federal autoriza contribuinte a pagar dívida sem multa e juros

Empresa perdeu discussão no Carf por voto de qualidade e recorreu ao Judiciário após a Receita Federal negar benefício previsto em lei

Uma produtora de petróleo e gás conseguiu, na Justiça Federal, sentença para afastar multa e juros sobre dívida a ser paga após derrota no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) por voto de qualidade – o desempate do presidente da turma julgadora, que é representante da Fazenda. Apesar de a isenção das penalidades estar prevista na nova Lei do Carf (nº 14.689/2023), a União negou o pedido do contribuinte. Entendeu que o caso estaria entre as exceções, previstas em regulamentação da norma, e não poderia ser beneficiado.

A decisão, segundo tributaristas que defendem contribuintes, é uma das primeiras sobre o assunto. A produtora entrou com o pedido na Justiça no dia 25 de setembro e obteve no mesmo dia, cerca de três horas depois, liminar, agora confirmada por sentença do juiz Wilney Magno de Azevedo Silva, da 16ª Vara Federal do Rio de Janeiro.

O contribuinte recorreu ao Judiciário para afastar uma cobrança de R$ 84 milhões, prestes a ser inscrita na Dívida Ativa da União. O auto de infração que originou a discussão foi lavrado em dezembro de 2018 e é decorrente de valores de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) não pagos em três remessas enviadas ao exterior em março de 2013. Ele pediu para que fosse aplicado ao caso a Lei do Carf e afastados um parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) – SEI nº 943/2024 – e a Instrução Normativa nº 2.205/2024, da Receita Federal.

No tribunal administrativo, a produtora de petróleo e gás foi derrotada por voto de qualidade após discutir a chamada “decadência”, que é o prazo de cinco anos que a Receita Federal tem para cobrar tributos de forma retroativa.

Na visão do contribuinte, por conta de a discussão da decadência ter sido definida por desempate, multa e juros deveriam ser afastados. “Se fosse acolhida [a decadência], cancelaria a totalidade do auto de infração”, defende a companhia, que pediu ainda o uso de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL para o pagamento da dívida no prazo de até 90 dias – previsto na lei.

A empresa pleiteou o benefício, em julho, quando estava vigente a IN nº 2.167/23, “que não impõe qualquer impedimento ao exercício legítimo do direito da imperante”. Mas o pedido foi rejeitado pela Receita, que embasou a negativa no parecer da PGFN, que veda a aplicação da lei a processos resolvidos definitivamente, de maneira favorável à Fazenda, por voto de qualidade, em matéria de decadência.

O contribuinte defende, nos autos, que “não está obrigado a seguir o entendimento da representação judicial da União, porque não se trata de norma legal e tampouco possui efeito vinculante, em vista do princípio da legalidade”, previsto no artigo 5º da Constituição Federal. Cita que uma a IN nº 2.205/2024, que revogou a anterior, também elencou ilegalmente a decadência como um dos temas em que a Lei do Carf não poderia ser aplicada.

O juiz acatou essa argumentação e afirma, na decisão, que a norma da Receita Federal (IN nº 2.205/2024) “extrapolou ao querer inovar a ordem jurídica criando restrições não previstas em lei”. Silva fundamentou a sentença com uma decisão do desembargador Marcus Abraham, que negou um agravo da União no caso, interposto contra a liminar concedida em favor da empresa (processo nº 5075609- 89.2024.4.02.5101).

O magistrado considerou que, como o voto de qualidade foi usado para decidir acerca da alegação de decadência no Carf, poderia ser aplicada a lei nessa situação. “Nesse diapasão, ao contrário do que defende a Fazenda Nacional, não parece, em preliminar análise, que o parágrafo 9º-A do artigo 25 do Decreto nº 70.235/1972, só seria aplicável às hipóteses em que o lançamento fiscal tenha sido, no mérito, mantido pelo voto de qualidade”, diz.

Para o advogado Alessandro Mendes Cardoso, sócio do Rolim Goulart Cardoso Advogados, a decisão está correta. “O parecer claramente tem o objetivo de limitar o alcance da alteração da legislação”, afirma. “E um parecer não pode restringir aquilo que é o conteúdo da lei. É uma clara violação ao princípio da legalidade.”

Na visão do tributarista, a decadência é uma questão de mérito e não preliminar, como entende a Fazenda. “No artigo 156 do Código Tributário Nacional está expresso que a decadência é uma das formas de extinção do crédito tributário. O documento da PGFN faz uma ginástica interpretativa, para que não seja aplicada a previsão legal à decadência.”

Segundo a tributarista Maysa Pittondo Deligne, sócia do CPMG Advocacia e ex-conselheira do Carf, o tema decadencial é uma preliminar de mérito. Mas independentemente de ser mérito ou processual, a lei deveria ser aplicada, porque ela não faz distinção. “Mesmo sendo preliminar, pode [o tema] ser considerado para a não aplicação de multa e juros”, diz.

Pela lei, acrescenta, qualquer julgamento por voto de qualidade, sejaem câmara baixa ou superior, ensejaria a aplicação da norma e os benefícios aos contribuintes. “O dispositivo fala de julgamento resolvido por voto de qualidade e não julgamento final. É possível sustentar que mesmo não sendo um resultado final, seria aplicável.”

Já o parecer da PGFN e a IN dizem que o último julgamento no Carf que deve ser levado em consideração. Se um contribuinte perder por voto de qualidade na câmara baixa, por exemplo, e recorrer para a superior, perdendo por unanimidade ou por maioria, não haveria mais direito à aplicação da lei, para a exclusão da multa e juros. “É melhor utilizar o benefício e não arriscar de ir para a Câmara Superior”, afirma a tributarista.

Procurada pelo Valor, a PGFN informou que vai recorrer da decisão.

Fonte: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/11/19/justica-federal-autoriza-contribuinte-a-pagar-divida-sem-multa-e-juros.ghtml.

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