TJ anula cobrança de ICMS sobre vendas pela internet no Rio de Janeiro

É inconstitucional a incidência do ICMS sobre o licenciamento ou a cessão do direito de uso de programas de computador. Com base nesse precedentedo Supremo Tribunal Federal, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro anulou, na segunda-feira (8/8), dispositivos que incluíram donos de sites que vendem softwares, aplicativos e produtos físicos entre os que devem pagar ICMS.

A corte declarou a inconstitucionalidade das alterações introduzidas pela Lei 8.795/2020 no artigo 15, parágrafo 1º, incisos XIX e XX, e parágrafo 2º, quanto à menção aos incisos XIX e XX; e no artigo 18, inciso VIII, alíneas “a”, “b”, “c” e “d”, todos da Lei 2.657/1996.

A relatora dos casos, desembargadora Leila Albuquerque, apontou que os dispositivos violam o artigo 200, IV, que atribui aos municípios a instituição de tributos sobre os serviços não estabelecidos em lei complementar federal.

A magistrada citou que o STF decidiu que incide ISS, e não ICMS, nas operações de softwares (ADIs 1.945 e 5.659). Nessas ações, o ministro Dias Toffoli, autor do voto vencedor, destacou que “o simples fato de o serviço encontrar-se definido em lei complementar como tributável pelo ISS já atrairia, em tese, a incidência tão somente desse imposto sobre o valor total da operação e afastaria a do ICMS”.

A ações diretas de inconstitucionalidade foram movidas pela Federação Nacional das Empresas de Informática e pelo ex-deputado estadual Chicão Bulhões, tendo a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia como amicus curiae.

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Processos 005016806.2020.8.19.0000 e 004021433.2020.8.19.0000

Fonte: Conjur – 09/08/2022

A instrumentalização das transações tributárias no âmbito federal

I – Do limbo após promulgação do CTN passando pela instituição dos sucessivos “Refis”
Desde a promulgação do Código Tributário Nacional (CTN), o instituto da transação tributária é previsto como modalidade de extinção do crédito, nos termos dos artigos 156, III e 171, caput. Não obstante, muito já se discutiu a respeito do cabimento constitucional deste instituto, alegando-se a indisponibilidade do interesse público e a vedação de dispor do crédito tributário, teoria reforçada pelo artigo 841 do Código Civil, que restringe a transação aos direitos patrimoniais de caráter privado.

Somente após 34 anos de promulgação da Lei 5.172/1966 — e passados 47 anos do anteprojeto de autoria de Rubens Gomes de Souza — é que foi promulgada a Lei 9.964, de 10 de abril de 2000, conversão da Medida Provisória 2.004-6/2000, que instituiu o Programa de Recuperação Fiscal, popularmente conhecido pela sigla “Refis” e iniciou uma sucessiva série de programas especiais de parcelamentos de débitos tributários federais, que previam pagamentos parcelados com descontos de multa e juros, conforme condições de adesão impostas pelo poder público. Seriam estes os primeiros modelos de transação.

De lá para cá, muitas críticas foram feitas sob a ótica da eficiência destes parcelamentos como instrumentos de política pública, seja porque premiavam o contribuinte inadimplente, seja porque incentivaram o não compliance, alegando-se, inclusive, que os parcelamentos se tornavam uma nova forma de financiamento das atividades empresariais, tanto em razão do custo de oportunidade, quanto diante da certeza de que novos programas seriam editados.

Em paralelo, a necessidade de desenvolvimento de formas inovadoras e capazes de dirimir conflitos, sobretudo as que se mostrassem mais céleres, efetivas e menos onerosas, sem incentivar condutas de não compliance, apontava a premência de se regulamentar, de forma permanente, o instituto da transação tributária.

II – Da crescente e necessária mudança de postura do Fisco
O cenário fiscal brasileiro das últimas décadas ilustra o tamanho distanciamento entre fisco e contribuintes e a dificuldade das partes dialogarem: de um lado, contribuintes buscando otimizar as questões fiscais, encontram-se desorientados e muitas vezes sequer conseguem saber quais tributos e alíquotas incidem sobre determinada operação; de outro, o fisco pressionado a arrecadar cada vez mais, cumpre seu papel punitivo, lavrando elevados autos de infração à qualquer indício de erro ou economia fiscal, contribuindo para o aumento do caos e do passivo tributário das empresas.

A necessidade de que as práticas tributárias sejam responsivas às demandas sociais já foi amplamente identificada em estudos internacionais, sendo, inclusive, recomendada por organismos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

O estado de São Paulo foi vanguardista ao promulgar a Lei Complementar 1.320/2018, de 6/4/2018, que estabelece paradigma positivo e inovador no relacionamento entre fisco e contribuinte, orientado a facilitar, colaborar e promover o adimplemento espontâneo das obrigações tributárias instituindo o programa “Nos Conformes”, buscando tornar a administração tributária mais responsiva e sensível.

Embora as previsões da lei paulista não tenham sido inteiramente implementadas, o exemplo foi seguido pelos órgãos da administração tributária federal, a exemplo do Programa de Apoio à Conformidade Tributária (PAC/PJ) que contém orientações preventivas para que os contribuintes se adequem espontaneamente à legislação e com isso seja desnecessário instaurar procedimentos de fiscalização, bem como do “Confia” que tem como objetivo construir um novo modelo de relacionamento do fisco com os maiores contribuintes, com foco na cooperação, adesão voluntária e boa-fé.

Esses exemplos revelam uma crescente superação do legalismo exegético partindo para adoção da noção de que o direito deve ser responsivo às condutas que pretende regular mas esta realidade, contudo, ainda é incipiente em termos absolutos ao considerarmos todo território nacional.

Conforme revelam os recentes dados do Diagnóstico do Contencioso Judicial Tributário Brasileiro, estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) que por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), consultou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a Receita Federal, 35 procuradorias estaduais e municipais e 35 fiscos subnacionais, apenas 5,76% destes órgãos adotam alguma prática de incentivo à conformidade fiscal dos contribuintes.

III – Finalmente a Lei 13.988/2020 e o início do que se espera ser uma nova era
Responsividade, tradução livre do termo em inglês responsiveness significa sensibilidade para a textura complexa da vida social. Na medida em que o direito deve ser capaz de encontrar respostas regulatórias satisfatórias a novos atores, contextos, demandas e expectativas, parece adequada a escolha legislativa que permite a adequação da legislação tributária para um novo contexto das relações entre Estado e particular inaugurado pela Lei 13.988/2020 que finalmente instituiu a transação tributária no âmbito federal.

A Lei 13.988/2020 instituiu três modalidades de transação: (1) por proposta individual ou por adesão, na cobrança de créditos inscritos na dívida ativa da União, de suas autarquias e fundações públicas, ou na cobrança de créditos que seja competência da Procuradoria-Geral da União; (2) por adesão, nos demais casos de contencioso judicial ou administrativo tributário (teses); e (3) por adesão, no contencioso tributário de pequeno valor.

No caso da adesão, a proposta já está moldada pelo poder público, enquanto na individual caberá ao contribuinte apresentar os seus termos quando sua situação concreta não se ajustar à transação por adesão, podendo o contribuinte negociá-la. Por fim, a transação por adesão também abrange o contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica, assim entendida aquela que ultrapassa os interesses subjetivos da lide.

IV – O ETA 9/22 e a recém publicada Lei 14.375/2022 que ampliou as possibilidades de transação inicialmente previstas
Em 3/5/2022 foi publicado o Edital de Transação Por Adesão (ETA) 9/22, pelo procurador-geral da Fazenda Nacional e pelo Secretário da Receita Federal do Brasil, regulando a transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica referente aos débitos de pessoas naturais ou jurídicas oriundos do aproveitamento fiscal de despesas de amortização de ágio decorrente de aquisição de participações societárias, limitada às operações de incorporação, fusão e cisão ocorridas até 31/12/2017, nos termos do artigo 65 da Lei nº 12.973/14.

E mais recentemente, em 21/6/2022 foi publicada a Lei 14.375/2022 que alterou a Lei 13.988/2020, em diversas de suas disposições, incluindo na proposta individual de transação a possibilidade de transacionar os créditos ainda em discussão perante os órgãos do contencioso administrativo (Delegacias da Receita Federal de Julgamento – DRJ e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf), contribuindo para reduzir o volume atual do contencioso administrativo.

Dentre as demais inovações, vale destacar: (a) concessão de maiores descontos em multas, juros e encargos legais relativos a créditos a serem transacionados que sejam classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, conforme critérios estabelecidos pela autoridade competente; (b) utilização de créditos de prejuízo fiscal do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), até o limite de 70% do saldo remanescente; (c) possibilidade de uso de precatórios ou de direito creditório com sentença de valor transitada em julgado para amortização de dívida tributária principal, multa e juros; e (d) incremento do valor máximo dos descontos a serem concedidos para até 65% do valor total dos créditos objeto de transação.

Após muito se discutir no âmbito de programas de parcelamento anteriores, a nova lei dispõe expressamente que não devem ser tributados pelo IRPJ, CSLL, PIS e Cofins os descontos concedidos no âmbito da transação. Tal disposição, contudo, ficou restrita aos créditos constantes das disposições do Capítulo II da Lei 13.988/2020, o que não impede que se busca a aplicação para os demais créditos transacionados, seja em razão da observância do princípio da isonomia consagrado no seu artigo 1°, § 2º, seja em razão da própria natureza dos descontos e das bases de cálculo dos tributos em questão.

Este, aliás, é o mesmo entendimento aplicável ao artigo 11-A que se buscou introduzir na Lei 13.496/2017, que instituiu o Pert, mas acabou vetado pelo presidente da República, uma vez que as razões de veto não se sustentam pois, no que tange ao PIS e à Cofins não se trata de renúncia de receita, mas simplesmente de base de cálculo das contribuições, visto que o desconto em dívida tributária não tem natureza contraprestacional, como determina a legislação aplicável.

VI – O estado atual das transações e as perspectivas de futuro
Ainda que sejam tímidas ou insuficientes, as transações tributárias recentemente positivadas inauguram uma nova lógica de atuação da administração tributária, pautada no paradigma do apoio e da colaboração, que esperamos que gradativamente substitua o modelo atual excessivamente focado na lavratura de autos de infração, que gera grande insegurança jurídica e induz o contencioso administrativo e judicial.

No último dia 7/7/2022, a Comissão de Direito Tributário do Iasp promoveu evento on line para tratar do assunto e contou com a participação de três procuradores da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Este encontro registra a mudança da orientação institucional do órgão ocorrida nos últimos anos e seu interesse em atuar em conjunto com a advocacia privada, fomentando meios de solução de conflito para diminuição do contencioso, incentivo ao compliance fiscal e maior efetividade na recuperação de créditos para os cofres públicos [1].

Ainda, aguarda-se as diretrizes infralegais que irão regulamentar diversos institutos previstos da Lei 14.375/2022, a exemplo dos critérios que serão utilizados para aferição do grau de recuperabilidade das dívidas; os parâmetros para concessão de descontos, tais como o insucesso dos meios ordinários e convencionais de cobrança; bem como os parâmetros para aceitação da transação individual e como serão medidos e divulgados os critérios objetivos que incluem temporalidade, a capacidade contributiva do devedor e os custos da cobrança.

A par disso e das dúvidas comuns e inerentes aos novos institutos, finalmente a transação tributária foi instrumentalizada no âmbito federal e, esperamos, sirva de exemplo tanto para adoção de práticas semelhantes pelos demais órgãos da administração tributária em todas as esferas e no território nacional, quanto para o abandono das práticas de concessão reiteradas e indiscriminadas de parcelamentos especiais cujos efeitos nocivos ainda vigoram no ambiente jurídico nacional.

Fonte: Conjur 08/08/2022

Processos parados no Carf afetam empresas, escritórios e União

Os efeitos da pandemia e a da greve dos auditores fiscais da Receita Federal fizeram com que  Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) tivesse o maior volume de processos tributários parados desde 2011. O valor dessas demandas já supera a marca de R$ 1 trilhão conforme levantamento do jornal O Globo.

Em 2022 o número de processos parados segue aumentando. “No conselho nada foi julgado. Já havia um volume de demandas muito grande por conta dos efeitos da crise sanitária e isso se agravou esse ano”, explica Augusto Paludo, sócio da Covac Sociedade de Advogados. 

O escritório em que Paludo trabalha tem 95 processos — cujo valor se aproxima de R$ 1 bilhão — parados no Carf. Essa morosidade no julgamento de processos administrativos impacta todas as partes envolvidas nas demandas.

As empresas, por exemplo, têm cada vez mais que contingenciar valores para arcar com os processos parados em caso de derrota. Já os escritórios acabam vendo parte expressiva dos seus contratos comprometidos, já que em muitos casos boa parte da remuneração dos advogados consiste em um bônus pago ao final do processo em caso de êxito. 

O presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Processo Tributário (IDPT) Igor Mauler Santigo vai além e lembra que a própria capacidade de arrecadação da União fica comprometida. “Talvez o maior prejudicado seja a coletividade, que fica privada da receita correspondente à parcela dos lançamentos que deveria ser mantida pelo Carf. Esse infarto da arrecadação tributária, num momento de crise como o que vivemos, cobra um preço muito alto da população”, resume. 

A média histórica de processos parados no Carf sempre girou em torno de R$ 600 bilhões. Até julho do último ano, esse total era de R$ 882 bilhões. Maria Teresa Grassi, sócia do contencioso tributário do escritório Rayes e Fagundes Advogados Associados, lembra que a morosidade sempre foi um problema no Carf, mas, garante que o problema se agravou em 2022. “A pandemia contribuiu para aumentar o número de casos parados, mas historicamente um processo quando chega ao Carf demora de três a cinco anos para ser efetivamente julgado”, explica. 

Além da herança deixada pelos efeitos da crise sanitária, a greve dos auditores da Receita ajudou a agravar ainda mais o quadro. “Trabalhamos com dezenas de casos pendentes de julgamento. O que temos visto é que os processos têm sido pautados para julgamento, mas na véspera o Carf divulga um comunicado informando do cancelamento por falta de quórum”, explica.

Número astronômicos
Existem 160 processos em tramitação no tribunal com valor de R$1 bilhão ou mais. Somados, eles chegam a R$ 444,7 bilhões. Ou seja, 42% do estoque está concentrado em menos de 200 casos, segundo O Globo

Há ainda um estoque de 1.250 processos na faixa de valor entre R$ 100 milhões e R$ 1 bilhão, que chegam ao montante de R$ 337 bilhões. Outros R$ 165,1 bilhões são referentes a 4,5 mil processos entre R$ 15 milhões e R$ 100 milhões.

Já R$ 106,1 bilhões estão distribuídos em 52,3 mil processos na faixa de R$ 72,7 mil a R$ 15 milhões. Por fim, R$ 687,4 milhões dizem respeito a pouco mais de 34 mil processos, todos com valor abaixo de R$ 72 mil.

Judicialização não é o caminho
Uma unanimidade entre os advogados que estão lidando diretamente com os processos parados do Carf é que judicializar essas demandas não é o melhor caminho. 

Entre as razões estão o custo mais alto de levar esses processos ao Poder Judiciário e a capacidade dos quadros técnicos do Carf para analisar demandas tributárias. “Não é vantajoso porque, se o contribuinte perder um processo administrativo, ainda pode recorrer judicialmente. Já nos casos de vitória, o Fisco não pode recorrer”, explica André Guimarães, líder da área de contencioso tributário administrativo da LacLaw Consultoria. 

A carteira de clientes da consultoria em que Guimarães trabalha tem processos cujo valor gira em torno de R$ 100 milhões. 

Graziele Pereira, advogada da área Tributária, sócia do escritório Greco, Canedo e Costa Advogados, afirma que a banca tem em torno de 70 processos parados. “Atuo no caso de uma cooperativa que tramita no Carf desde 2008 e que após o julgamento continua parado por um erro deles. Era um caso apenso de PIS e Cofins, mas julgaram apenas o caso de PIS. E estamos há um ano tentando fazer com que eles julguem embargos de declaração por conta de um erro que eles mesmos cometeram”, lamenta. A especialista explica que é muito difícil para o cliente que segue com a pendência contábil enquanto os embargos não são julgados.

O relacionamento com os clientes também exige mais dos advogados com o atual acúmulo de processos no Carf. Paludo explica que é preciso jogo de cintura para explicar por que processos ficam sem movimentação por dois anos. “A insatisfação entre os clientes é muito grande. Ir para o Judiciário também não é algo vantajoso pela possibilidade de ter que congelar um bem ou reservar um montante em dinheiro para ter a Certidão Negativa de Débitos”, explica.

Apesar da morosidade, o consenso é de que, se a situação é ruim com o Carf, é pior sem ele.

Fonte: Conjur 08/08/2022

Os erros do Supremo Tribunal Federal no julgamento das taxas minerárias

O Supremo Tribunal Federal encerrou o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.785, 4.786 e 4.787 declarando por maioria que as leis dos estados de Minas Gerais, Pará e Amapá são constitucionais, e, portanto, são válidas as taxas de fiscalização e controle sobre a extração de minérios em seus territórios. Como a função da doutrina é doutrinar, analisando de forma crítica as decisões dos Tribunais, tecerei alguns comentários sobre esse julgamento, tomando como parâmetro básico o que foi noticiado no sitedo STF, pois o acórdão ainda não foi lavrado.Sobre a questão da proporcionalidade consta que “o colegiado considerou possível, nos três casos, que a taxa seja baseada na presunção do custo da fiscalização, porque o ônus tributário ao patrimônio do contribuinte está graduado de acordo com o faturamento do estabelecimento, com o grau de poluição potencial ou com a utilização de recursos naturais”.Há uma incorreção nessa afirmativa, pois, a considerar válido o texto acima, estão sendo colocados no mesmo balaio dois diferentes institutos, o da proporcionalidade e o do confisco. É inegável que as taxas não são confiscatórias, pois representam um valor muito baixo em comparação com o patrimônio da (maior parte) das empresas, porém isso nada tem a ver com a questão da proporcionalidade, uma vez que esta não tem correlação com o referido patrimônio. Proporcionalidade, na questão das taxas, está correlacionada à questão da equivalência, isto é, a arrecadação tem que ser suficiente para cobrir os custos fiscalizatórios, o que faz com que a correlação seja interna corporis ao Poder Público que a arrecada.No caso, está mais do que provado que essas taxas são arrecadatórias, pois geram para os cofres públicos um montante vastamente superior ao custo da fiscalização – na verdade, ao custo de várias das Secretarias estaduais envolvidas, segundo os orçamentos de cada uma delas. Logo, o argumento utilizado no julgamento não condiz com a proporcionalidade, pois foi usado um parâmetro externo àquele que deveria ser utilizado.Quanto à questão ambiental, consta que foram proferidos votos argumentando que “a taxa tem natureza extrafiscal, porque desincentiva atividades degradantes e permite ao estado que se planeje para evitar desastres ambientais”, usando como referência aos desastres ambientais de Mariana e Brumadinho em Minas Gerais, o que gera “urgência das ações de prevenção”.Penso existir outra incorreção, pois uma coisa é a fiscalização ambiental sobre um “bem de uso comum do povo” (artigo 225 da Constituição) e outra é a fiscalização minerária sobre bens da União (artigo 20, IX, da Constituição), a qual é da própria União, através da Agência Nacional de Mineração (ANM), cuja lei estabelece, de forma expressa, que a ela incumbe “a regulação e a fiscalização das atividades para o aproveitamento dos recursos minerais no país” (artigo 2º da Lei 13.575/17). Logo, a decisão misturou a frequência, atribuindo à matéria minerária regulamentação ambiental. Ademais, várias empresas estavam pagando a taxa mineral em Minas Gerais, mesmo durante a tramitação da ADI, e isso não impediu os lastimáveis desastres ambientais.Sobre o impacto social e ambiental, foi dito que “pode-se concluir que, quanto mais minério extraído, maior pode ser o impacto social e ambiental do empreendimento. Maior, portanto, deve ser o grau de fiscalização e controle do poder público”.Aqui a imprecisão no julgamento é ainda maior, pois são apontados argumentos que não dizem respeito ao ponto central em debate, qual seja, o artigo 145, parágrafo 2º, da Constituição: “As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos.“ E a quantidade de minério extraído serve como base de cálculo do ICMS, o que aponta para a violação da Constituição, sem que o STF tenha enfrentado o tema de forma direta.Sobre o exercício do poder de polícia, foi alegado que “as taxas possibilitam que os estados exerçam o poder de polícia sobre atividades em que há competência constitucional comum com a União”, e que “em razão da maior complexidade da fiscalização das mineradoras, o valor das taxas não viola o princípio da proporcionalidade, especialmente levando-se em conta os expressivos lucros dessas empresas”, afastando a alegação de confisco.Aqui a mistura de argumentos é total, o que obriga a desdobrá-los para melhor análise.O efetivo exercício do poder de polícia dá ensejo à cobrança de taxas – isso é inegável. Todavia, esse fato não tem correlação direta com “competência constitucional comum com a União” (artigo 23, XI, da Constituição), pois são coisas distintas. Nem toda fiscalização acarreta poder de polícia. Um exemplo esclarece: a Receita Federal fiscaliza os contribuintes de tributos federais, mas não exerce poder de polícia. Imagine só, caro leitor ou leitora, você passar a pagar uma taxa de fiscalização para ser fiscalizado pela Receita Federal…Logo, uma coisa é a “competência concorrente”, outra coisa é o “efetivo exercício do poder de polícia”. Poder de Polícia, na feliz expressão de Regis de Oliveira, é “o poder de dizer não”, ou seja, de autorizar ou vedar determinada atividade. Qual poder de polícia os estados possuem sobre a atividade mineral? Nenhum. Só quem o tem é a União, através da ANM. Os Estados possuem poder de polícia sobre a atividade ambiental e não sobre a mineral – mais uma confusão.Ainda sobre o mesmo tópico, alega-se que a fiscalização sobre as atividades mineradoras é “mais complexa”. Qual a complexidade em identificar as toneladas de minério extraído? Nenhuma. Servem como base de cálculo para um imposto, o ICMS, além de servirem para a cobrança da CFEM. Além disso, não é verídico que, quanto mais toneladas forem extraídas, maior deverá ser a fiscalização – a mesma quantidade de pessoas fiscaliza uma balança em que constam dez ou 100 toneladas. Logo, o argumento também não se sustenta.O último argumento neste tópico é sobre proporcionalidade e confisco, que já foi comentado acima, com a piora de que está sendo usado o lucro como parâmetro – isso implica em dizer que, havendo prejuízo, haverá proporcionalidade? A lógica jurídica não é consistente.Os argumentos dos ministros cujos votos restaram vencidos são muito mais convincentes, pois, segundo a mesma fonte, Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes e André Mendonça, reconheceram a competência dos estados para a instituição dessas taxas, porém as entenderam desproporcionais, o que geraria sua inconstitucionalidade. O ministro André Mendonça ainda acresceu, corretamente, haver bitributação, pois já há a cobrança de taxas de fiscalização ambiental sobre a atividade mineradora. O ministro Marco Aurélio já havia votado pela inconstitucionalidade da cobrança da taxa na ADI 4.785.Volto a relatar um fato: “Em um evento sobre tributação do setor mineral realizado anos atrás, ao passar por um estande montado pela secretaria estadual que cuidava da fiscalização do setor de mineração, fizeram questão de me apresentar a última novidade que estava sendo implementada — haviam comprado vários drones para efetuar a fiscalização da quantidade de minérios extraídos, reduzindo, assim, o número de servidores alocados para revisar a documentação das empresas. Perguntei: com isso, a atividade fiscalizatória ficará mais barata? Resposta: sim, claro. Nova pergunta: portanto, o valor da taxa minerária cobrada das empresas será reduzido? Ouvi gargalhadas como resposta” (leia aqui).É concreta a possibilidade de haver a proliferação na instituição de taxas minerárias por todos os estados, e, pior ainda, por todos os mais de 5.500 municípios. Os bens minerais estão no meio de nós, seja no computador ou celular no qual você está lendo este texto, seja no tijolo, cimento, areia e vidro que fazem as paredes e janelas no ambiente em que você se encontra. O impacto econômico dessa decisão, e sua possível ampliação federativa, seguramente será repassado ao consumidor.Enfim, há cerca de um ano e meio analisei a jurisprudência do STF sobre a matéria, comparando o que havia sido votado acerca das taxas hídricas e das taxas sobre petróleo e gás, com o que então estava por ser votado acerca das taxas minerárias. De forma comparativa, constata-se que a nossa mais alta Corte não cumpriu o artigo 926 do CPC: “Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”. Em matéria de taxas de fiscalização, a jurisprudência do STF não é nem estável, nem íntegra e muito menos coerente.É inegável que as decisões dos tribunais devem ser obedecidas, porém não são imunes a críticas doutrinárias, como as ora apontadas.

Fonte: Conjur – 08/08/2022

STJ afirma a impossibilidade de aplicação concomitante de mais de uma multa fiscal punitiva

04 de agosto de 2022 | AgInt nos EDcl no REsp 1.825.186/RS | 2ª Turma do STJ
A Turma, por unanimidade, entendeu ser indevida a aplicação concomitante da multa qualificada de 150% pela prática de fraude na importação consistente em subfaturar os preços efetivamente praticados, assim como da multa de 100% por consumo das mercadorias de procedência estrangeira no processo produtivo do contribuinte. Segundo os Ministros, no caso concreto, a infração oriunda do consumo das mercadorias importadas de maneira fraudulenta nada mais é do que a consumação ou exaurimento da infração que lhe foi precedente, ou seja, a importação com subfaturamento. Assim, os Ministros destacaram que a multa de 150% sobre a diferença do tributo devido em razão da fraude perpetrada já é a punição suficiente por ambas as condutas.
Fonte: Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados.

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