João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Professor convidado da pós-graduação da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.
Desde o último dia 01/05/2023, as empresas passaram a conviver com uma nova sistemática de apuração do PIS/COFINS no regime não-cumulativo.
Isto porque, desde 01/05/2023 a Medida Provisória º 1.159/2023 a passa ter plena eficácia.
A MP 1.159/2023 tem um pote de “bondade” e um pacote pesado de maldade.
A “bondade” da MP 1.1159/2023 está nas alterações que promove no art. 1º das Leis nº 10.637/2002 (PIS) e 10.833/2003 (COFINS) de modo a excluir o ICMS da base de cálculo das contribuições.
A “bondade” deve vir entre aspas mesmo porque esta alteração legislativa nada mais é do que o reconhecimento daquilo que o STF decidiu no julgamento da Tese do Século, Tema nº 69 da Repercussão Geral.
O pacote de maldade está nas alterações ao art. 3º das Leis nº 10.637/2002 (PIS) e 10.833/2003 (COFINS).
A MP 1.159/2023 passa a vedar o aproveitamento do ICMS relativo ao preço pago pelas mercadorias ou insumos adquiridos no cálculo do crédito do PIS/COFINS não-cumulativos.
Segundo a Exposição de Motivos da MP 1.159/2023, a exclusão do ICMS no crédito do PIS/COFINS decorreria da observância do Tema nº 69 da Repercussão Geral. Para o governo, se o ICMS deve ser excluído da receita, também deve ser excluído na apuração do crédito.
O governo parte de premissa equivocada e não é essa a correta interpretação do Tema nº 69 da Repercussão Geral.
O fato de ser mandatória a exclusão do ICMS para efeito de determinação da receita tributável pelo PIS/COFINS não tem qualquer relação com o modo como deve ser calculado o crédito das contribuições na sistemática não-cumulativa. Há, inclusive, decisão judicial neste sentido[1].
É bem verdade que a não-cumulatividade do PIS/COFINS não é disciplinada pela Constituição, ao contrário do que acontece com o IPI e com o ICMS.
O art. 195, §12, da Constituição, reserva à lei a disciplina da não-cumulatividade do PIS/COFINS.
Mas o STF, na definição do Tema nº 756 da Repercussão Geral, fixou as balizas para a definição da não-cumulatividade do PIS/COFINS pelo legislador: “O legislador ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art. 195, § 12, da Constituição, respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional das contribuições ao PIS e COFINS e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança.”
Ora, vedar o aproveitamento do ICMS incidente sobre a mercadoria, serviço, energia ou insumo adquirido não é razoável.
Não faz o menor sentido extirpar parte do preço pago por um bem no cálculo do crédito do PIS/COFINS não cumulativos.
Consequentemente, é preciso ingressar em juízo para discutir mais esta violação à lei e à Constituição no cálculo do PIS/COFINS.
[1] 8. Não há qualquer vinculo jurídico entre a forma de apuração de débito de PIS/COFINS com a eventual pretensão de incluir na sua base de cálculo o ICMS computado no cálculo dos crédito dessas contribuições. A relação jurídica do crédito é segregada da relação jurídica do débito. A discussão travada na presente ação diz respeito à formação da base de cálculo com as operações de saída.
9. A decisão proferida no RE no 574.706/PR em nenhum momento trata da base de cálculo dos créditos do PIS/COFINS, muito menos em relação à inclusão do ICMS em tal base de cálculo. O julgamento pela Suprema Corte em nada alterou a forma de apuração dos crédito, permanecendo incólume a legislação que trata do tema. A tese definida no tema no 69 foi de que o conceito constitucional de receita não comporta a parcela atinente ao ICMS e, por isso, não incidem as contribuições ao PIS e COFINS sobre aquela parcela. A conclusão, evidentemente, não tem o condão de modificar a base de cálculo dos crédito das contribuições em questão, que decorre de interpretação do princípio da não-cumulatividade e do custo de aquisição, definidos em lei. A discussão no RE no 574.706/PR cingiu-se em torno do conceito de faturamento, como grandeza de natureza tributável pelo PIS/COFINS.
(…)
15.Apelação e remessa oficial providas em parte.
(ApelRemNec 5000412-65.2017.4.03.6130, Des. ANTONIO CARLOS CEDENHO, 3a Turma do TRF3, DJEN DATA: 23/06/2021).