Reforma tributária: associação de supermercados propõe que sejam desonerados na cesta básica foie gras, bacalhau e trufas

Um dos principais pontos da reforma tributária é justamente os itens da cesta básica. A discussão sobre quais produtos serão contemplados com quais benefícios ainda não foi feita. Ela ocorrerá neste ano, quando há expectativa de ser feita a regulamentação da reforma.

A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) divulgou nesta terça-feira (8) uma proposta para a cesta básica, que será regulamentada no âmbito da reforma tributária sobre o consumo. 

Entre os produtos desonerados, ou seja, com isenção de tributos sobre o consumo, a entidade propôs que sejam incluídos foie gras (fígado gordo de pato ou ganso), bacalhau, trufas (fungos subterrâneos, ingrediente caro usado em pratos e doces requintados), e lagostas (veja uma lista maior abaixo nessa reportagem). 

A proposta foi entregue para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Ao mesmo tempo, a entidade também propõe um desconto de 60% na tributação para alguns produtos, como cervejas, chopes, caviar, chocolates, champagne, vinhos e panetones.

“Esses são os produtos elegíveis, conforme o texto constitucional. O Congresso aprovou um texto que determina que o produto seja nutritivo e saudável. A escolha dos produtos que cada cidadão vai comprar deve ser uma opção democrática, desde que sejam saudáveis e nutritivos. Se um cidadão de classe média baixa, ou baixa, quiser comer um bacalhau ou picanha, por que não? Porque deveríamos negar essa opção?”, afirmou o presidente da Abras, João Galassi, ao g1.

Segundo Galassi, o Congresso Nacional será responsável por decidir quais produtos terão isenção, quais terão alíquota menor e quais serão taxados normalmente.

Reforma tributária e a cesta básica

Promulgada no fim do ano passado, a reforma tributária sobre o consumo prevê a substituição de cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) por dois impostos sobre valor agregado, um federal e outro dos estados e municípios. 

Além disso, também haverá o imposto seletivo e um IPI para manter a competividade da Zona Franca. As alíquotas ainda não foram definidas. 

  • Um dos principais pontos da reforma tributária é justamente os itens da cesta básica. Há previsão de que alguns produtos terão isenção, enquanto outros terão alíquota reduzida (40% do valor total).
  • discussão sobre quais produtos serão contemplados com quais benefícios ainda não foi feita. Ela ocorrerá neste ano, quando há expectativa de que será feita a regulamentação da reforma tributária.
  • governo tem citado a possibilidade do uso do chamado “cashback” na cesta básica, ou seja, cobrar imposto de todos e devolver o valor pago apenas para a população carente.

A equipe do Ministério da Fazenda, os estados e os municípios estão fechando uma proposta, que será enviada ao Congresso Nacional. 

Entidades de classe, como a Abras, começaram a enviar sugestões para o debate que acontecerá no Legislativo. 

Entenda

Atualmente, a cesta básica nacional está desonerada (em a cobrança de impostos federais, como PIS/Pasep, Cofins e IPI) contempla produtos como: carnes bovina, suína, ovina, caprina e de aves e peixes; café, açúcar, óleo de soja, manteiga, margarina, sabões, produtos para higiene dentária, e papel higiênico, além de leite, feijão, arroz, farinha de trigo ou massa, batata, legumes, pão e frutas. 

De acordo com relatório do Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMAP), formado por vários ministérios, feito em 2021, as regras atuais contempla a desoneração de 745 alimentos diferentes abrangidos pelas leis de desoneração de tributos federais. 

Ao desonerar a cesta básica, o governo abre mão de arrecadação. Isso agrava o rombo das contas públicas – que somou R$ 230 bilhões no ano passado. O governo busca zerar o déficit neste ano.

Segundo estimativa da Receita Federal, a desoneração da cesta básica custará R$ 39 bilhões aos cofres públicos em 2024.

Além da renúncia de fiscal, ou seja, do valor que o governo deixa de arrecadar, outra discussão é o impacto da cesta básica no tamanho do imposto que será cobrado sobre o consumo de outros produtos — a chamada alíquota geral.

Estimada, por enquanto, em cerca de 27,5% – entre as maiores do mundo -, a alíquota geral dos futuros IVAs (impostos sobre o consumo) pode ser ainda mais pressionada para cima se a lista dos produtos incluídos na cesta básica com alíquota zero for muito extensa, segundo o alerta de especialistas. 

Cashback

Alguns estudos apontam que o uso do “cashback” (devolução dos impostos pagos na cesta básica) seria uma alternativa menos custosa e mais eficaz para beneficiar a camada mais pobre da população, favorecendo a redistribuição de renda. 

  • Estudo do Banco Mundial, divulgado no fim de 2023, diz que uma isenção ampla dos itens da cesta básica pode beneficiar os mais ricos em termos absolutos, ao mesmo tempo em que o uso de um “cashback” direcionado pode ser mais eficaz para aliviar a carga tributária sobre os mais pobres e redistribuir a renda.
  • O Centro de Liderança Pública (CLP), uma organização suprapartidária que busca um Estado mais eficiente, avaliou, por meio de nota em 2023, que o “cashback” reduziria a regressividade dos impostos sobre o consumo no Brasil, que ocorre quando a incidência dos tributos afeta proporcionalmente os mais pobres.

Proposta da Abras

A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) informou que sua proposta para a cesta básica, com tributação zerada, contempla uma “Cesta SANA” — Saudável Alimentação, Nutricionalmente Adequada” — por nela se incluir, “sem exceções discriminatórias, todos os alimentos elegíveis, inclusive os de consumo regional ou decorrentes de distintos padrões culturais no país”.

“Esta Cesta SANA é um passo transformador da CF88 [Constituição Federal de 1988] na direção de viabilizar o acesso de TODOS os consumidores, sem exclusões, a uma alimentação saudável, balanceada e diversificada, além de 100% livre de tributação”, informou a Abras, no estudo.

Entre os alimentos desonerados, pela proposta, estão:

  • Fígados gordos (foies gras) de patos e gansos, frescos ou refrigerados;
  • Carnes e miudezas comestíveis, frescas, refrigeradas ou congeladas de coelhos ou lebres;
  • Carnes e miudezas comestíveis, frescas, refrigeradas ou congeladas de camelo;
  • Carnes da espécie cavalar;
  • Trutas;
  • Salmões do pacífico e do atlântico;
  • Arenques;
  • Cavalinhas;
  • Bacalhaus;
  • Carpas, 
  • Enguias;
  • Lagostas vivas e congeladas;
  • Camarões congelados;
  • Ostras;
  • Queijos de pasta mofada (azul);
  • Baunilha;
  • Canela;
  • Amendoins;
  • Azeite de oliva;
  • Cogumelos e trufas:
  • Azeitonas;
  • Nozes;
  • Tâmaras e figos;

Entre os alimentos com redução de 60% nos impostos, pela proposta, estão:

  • Iogurte;
  • Soro de leite;
  • Sucos e extratos vegetais;
  • Margarina;
  • Preparações e conservas de peixes; 
  • Caviar;
  • Chocolate;
  • Achocolatados;
  • Waffles e wafers;
  • Panetones;
  • Ketchup e outros molhos de tomate;
  • Concentrados de proteínas e substâncias proteicas texturizadas;
  • Cerveja sem álcool;
  • Cervejas e chopes;
  • Champagne;
  • Vinhos;

João Galassi, presidente da Abras, explicou que a inclusão de bebidas alcoólicas na lista com imposto reduzido visou privilegiar a indústria vinícola nacional, tendo por base uma regra da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que estabelece um teto de 20% de teor alcoólico.

” Queremos proteger a vinicultura nacional. Partimos de uma lógica, se poderia entrar vinho, porque não cerveja. Mas é uma decisão do Congresso”, declarou. 

Ao contrário da proposta da Abras, a reforma tributária estabelece que os produtos nocivos à saúde, como bebidas alcoólicas e cigarros, serão sobretaxados por meio do imposto seletivo, ou seja, terão uma tributação maior do que a alíquota normal.

Fonte: G1, 02/04/2024

ARTIGO DA SEMANA –  As imunidades após a Reforma Tributária – parte 1

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

A promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023 não se restringiu a aprovar a Reforma Tributária dos Tributos Sobre o Consumo.

Entre outras previsões, a EC 132/2023 também modificou dispositivos da Constituição que cuidam das imunidades tributárias.

Como se sabe, as imunidades são limitações constitucionais ao poder de tributar. Sobre a pessoa ou situação imune, os entes da federação não podem exercer a competência tributária e por isso que se diz que as imunidades são hipóteses de incompetência tributária.

Entre as alterações promovidas na Constituição pela EC 132/2023 destaca-se a nova redação dada ao artigo 150, VI, “b”, segundo o qual a União, os Estados, DF e Municípios ficam vedados a instituir impostos sobre o patrimônio, renda e serviços de “entidades religiosas e templos de qualquer culto, inclusive suas organizações assistenciais e beneficentes.”

Então aquilo que era a imunidade dos templos, passa a ser também das entidades religiosas e das organizações assistenciais e beneficentes vinculadas e/ou mantidas pelos templos e/ou entidades religiosas.

Esta nova redação da conhecida imunidade dos templos nada mais fez do que trazer para a Constituição aquilo que já tinha sido interpretado pelos Tribunais.  

O Supremo Tribunal Federal já conferiu interpretação expansiva à imunidade dos templos.

No julgamento do Recurso Extraordinário 578.562[1], por exemplo, o STF assegurou a imunidade dos templos aos cemitérios que consubstanciam extensões das entidades de culto religioso.

O STF, no julgamento do RE 630.790, que deu origem ao Tema 336 da Repercussão Geral, afirmou que “As entidades religiosas podem se caracterizar como instituições de assistência social a fim de se beneficiarem da imunidade tributária prevista no art. 150, VI, c, da Constituição, que abrangerá não só os impostos sobre o seu patrimônio, renda e serviços, mas também os impostos sobre a importação de bens a serem utilizados na consecução de seus objetivos estatutários”

Consequentemente, as organizações assistenciais e beneficentes vinculadas e/ou mantidas pelos templos, à luz da jurisprudência, também gozam de imunidade tributária.

Outra “novidade” trazida pela EC 132/2023 está na redação dada ao art. 150, §2º, segundo o qual a conhecida imunidade recíproca é extensiva, além das autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo poder público, também à empresa pública prestadora de serviço postal, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes. 

Neste caso, a EC 132/2023, ao adaptar a Constituição àquilo que já era entendimento do STF, deixou de fora a INFRAERO, EMBRAPA e a Casa da Moeda, que igualmente já haviam sido contempladas pela imunidade segundo a jurisprudência do Tribunal, tal como já apontamos (veja aqui).

Como se vê, o legislador insiste em trazer ao Direito Positivo aquilo que já era entendimento pacífico na jurisprudência, mas mesmo assim comete deslizes que podem acabar atrapalhando a interpretação da Constituição.


[1] EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. IPTU. ARTIGO 150, VI, “B”, CB/88. CEMITÉRIO. EXTENSÃO DE ENTIDADE DE CUNHO RELIGIOSO. 1. Os cemitérios que consubstanciam extensões de entidades de cunho religioso estão abrangidos pela garantia contemplada no artigo 150 da Constituição do Brasil. Impossibilidade da incidência de IPTU em relação a eles. 2. A imunidade aos tributos de que gozam os templos de qualquer culto é projetada a partir da interpretação da totalidade que o texto da Constituição é, sobretudo do disposto nos artigos 5º, VI, 19, I e 150, VI, “b”. 3. As áreas da incidência e da imunidade tributária são antípodas. Recurso extraordinário provido.

(RE 578562, Relator(a): EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 21-05-2008, DJe-172  DIVULG 11-09-2008  PUBLIC 12-09-2008 EMENT VOL-02332-05  PP-01070 RTJ VOL-00206-02 PP-00906 LEXSTF v. 30, n. 358, 2008, p. 334-340)

ARTIGO DA SEMANA –  CBS das entidades beneficentes: inconstitucionalidade da Reforma Tributária

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

A Emenda Constitucional nº 132/2023, que aprovou a Reforma Tributária com foco na tributação sobre o consumo, contém flagrante inconstitucionalidade no artigo 149-B[1], parágrafo único, introduzido à Constituição.

Este dispositivo teve o nítido propósito de, através de seus quatro incisos, uniformizar as normas do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS), dispondo que a ambos serão aplicadas as mesmas regras em relação a fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência, sujeitos passivos, imunidades, regimes especiais de tributação, não cumulatividade e creditamento.

Consequentemente, a definição dos fatos geradores do IBS serão os mesmos da CBS, assim como bases de cálculo, contribuintes, responsáveis e etc…

Mas o que chama atenção, do ponto de vista da constitucionalidade, é o parágrafo único do art. 149-B, segundo o qual “Os tributos de que trata o caput observarão as imunidades previstas no art. 150, VI, não se aplicando a ambos os tributos o disposto no art. 195, § 7º”.

Significa dizer que ao IBS e à CBS são aplicáveis as imunidades recíproca, dos templos, dos partidos políticos, suas fundações, entidades sindicais dos trabalhadores, entidades assistenciais e educacionais sem fins lucrativos, a chamada imunidade dos livros e aquela que protege os fonogramas e videogramas musicais.

Mas não o IBS e a CBS não observarão a imunidade do artigo 195, §7º[2], da Constituição, vale dizer, aquela que protege as entidades beneficentes de assistência social.   

Ao afirmar que a CBS não observará a imunidade das entidades beneficentes de assistência social, a EC nº 132/2023 incorre em grave inconstitucionalidade.

As imunidades, inclusive aquela do art. 195, §7º, conforme o Supremo Tribunal Federal já afirmou diversas vezes, são direitos e garantias dos contribuintes[3].

E as emendas constitucionais não podem suprimir direitos e garantias do contribuinte, sob pena de serem inconstitucionais por violação ao artigo 60, § 4°, IV, da CF, como já decidiu o Plenário do STF[4].

Consequentemente, é inconstitucional o art. 149-B, parágrafo único, introduzido pela EC 132/2023, naquilo que afasta a imunidade das entidades beneficentes de assistencial social em relação à CBS.


[1] Art. 149-B. Os tributos previstos nos arts. 156-A e 195, V, observarão as mesmas regras em relação a:     

I – fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência e sujeitos passivos

II – imunidades;

III – regimes específicos, diferenciados ou favorecidos de tributação;

IV – regras de não cumulatividade e de creditamento.      

Parágrafo único. Os tributos de que trata ocaputobservarão as imunidades previstas no art. 150, VI, não se aplicando a ambos os tributos o disposto no art. 195, § 7º.

[2] Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;

b) a receita ou o faturamento; 

c) o lucro; 

II – do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, podendo ser adotadas alíquotas progressivas de acordo com o valor do salário de contribuição, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo Regime Geral de Previdência Social; 

III – sobre a receita de concursos de prognósticos.

IV – do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.         

V – sobre bens e serviços, nos termos de lei complementar.

……………………………………………………………..

§ 7º São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

…………………………………………………………….

[3] MANDADO DE SEGURANÇA – CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – QUOTA PATRONAL – ENTIDADE DE FINS ASSISTENCIAIS, FILANTRÓPICOS E EDUCACIONAIS – IMUNIDADE ( CF, ART. 195, § 7º)- RECURSO CONHECIDO E PROVIDO . – A Associação Paulista da Igreja Adventista do Sétimo Dia, por qualificar-se como entidade beneficente de assistência social – e por também atender, de modo integral, as exigências estabelecidas em lei – tem direito irrecusável ao benefício extraordinário da imunidade subjetiva relativa às contribuições pertinentes à seguridade social . – A cláusula inscrita no art. 195, § 7º, da Carta Política – não obstante referir-se impropriamente à isenção de contribuição para a seguridade social – , contemplou as entidades beneficentes de assistência social, com o favor constitucional da imunidade tributária, desde que por elas preenchidos os requisitos fixados em lei. A jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal já identificou, na cláusula inscrita no art. 195, § 7º, da Constituição da República, a existência de uma típica garantia de imunidade (e não de simples isenção) estabelecida em favor das entidades beneficentes de assistência social. Precedente: RTJ 137/965 . – Tratando-se de imunidade – que decorre, em função de sua natureza mesma, do próprio texto constitucional -, revela-se evidente a absoluta impossibilidade jurídica de a autoridade executiva, mediante deliberação de índole administrativa, restringir a eficácia do preceito inscrito no art. 195, § 7º, da Carta Política, para, em função de exegese que claramente distorce a teleologia da prerrogativa fundamental em Referência, negar, à entidade beneficente de assistência social que satisfaz os requisitos da lei, o benefício que lhe é assegurado no mais elevado plano normativo.

(STF – RMS: 22192 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 28/11/1995, Primeira Turma, Data de Publicação: DJ 19-12-1996 PP-51802 EMENT VOL-01855-01 PP-00154)

[4] Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e de Lei Complementar. I.P.M.F. Imposto Provisório sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira – I.P.M.F. Artigos 5., par. 2., 60, par. 4., incisos I e IV, 150, incisos III, “b”, e VI, “a”, “b”, “c” e “d”, da Constituição Federal. 1. Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação a Constituição originaria, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua e de guarda da Constituição (art. 102, I, “a”, da C.F.). 2. A Emenda Constitucional n. 3, de 17.03.1993, que, no art. 2º., autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo 2º desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica “o art. 150, III, “b” e VI”, da Constituição, porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutáveis (somente eles, não outros): 1. – o princípio da anterioridade, que é garantia individual do contribuinte (art. 5., par. 2., art. 60, par. 4., inciso IV e art. 150, III, “b” da Constituição); 2. – o princípio da imunidade tributária recíproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que é garantia da Federação (art. 60, par. 4., inciso I, e art. 150, VI, “a”, da C.F.); 3. – a norma que, estabelecendo outras imunidades impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: “b”): templos de qualquer culto; “c”): patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e “d”): livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão; 3. Em consequência, é inconstitucional, também, a Lei Complementar n. 77, de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidência do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150, VI, “a”, “b”, “c” e “d” da C.F. (arts. 3., 4. e 8. do mesmo diploma, L.C. n. 77/93). 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993.

(ADI 939, Relator(a): SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 15-12-1993, DJ 18-03-1994 PP-05165  EMENT VOL-01737-02 PP-00160 RTJ  VOL-00151-03 PP-00755)

Pacheco: regulamentação da reforma tributária será prioridade no 1º semestre

Na abertura da ordem do dia desta terça-feira (6), a primeira do ano, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, reiterou temas prioritários para votação no primeiro semestre e também ao longo de 2024. Entre eles, está a regulamentação da reforma tributária (Emenda Constitucional 132), promulgada no final do ano passado pelo Congresso Nacional.

— Agora nos cabe promover as leis complementares, as leis infraconstitucionais, para podermos tornar efetiva a reforma tributária no Brasil — declarou.

Pacheco ressaltou que, em consequência de um novo sistema tributário, será uma “preocupação muito grande” do Congresso Nacional este ano a “qualidade do gasto público”, com atenção especial para responsabilidade fiscal, combate a desperdícios, combate a privilégios e o tamanho do Estado brasileiro.

— Eu quero crer que, assim como foi nos últimos tempos uma tônica prioritária a reforma tributária, deve ser por parte do Congresso Nacional agora uma discussão muito profunda sobre qualidade de gasto público, que envolva as nossas comissões permanentes, que envolva a participação da sociedade civil, a colaboração muito importante e muito bem-vinda do Tribunal de Contas da União, da Controladoria-Geral da União, para que tenhamos de fato definições legislativas sobre as finanças públicas, sobre o Orçamento público e o gasto público no Brasil — disse.

Questionado pelo senador Izalci Lucas (PSDB-DF) sobre a desoneração da folha de pagamento (MP 1.202/2023), o presidente do Senado ressaltou que buscou dialogar com o governo federal sobre o assunto durante o mês de janeiro. Ele disse esperar que o Executivo revogue o trecho da medida provisória que trata da reoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. Assim, a desoneração seguirá valendo.

— Eu particularmente espero que seja esse o encaminhamento por parte do Poder Executivo, dando a Vossa Excelência e aos demais que apoiaram a desoneração da folha, sobretudo ao autor do projeto, senador Efraim Filho [União-PB], segurança de que a nossa decisão com relação à desoneração da folha de pagamento será mantida. Ou seja, a desoneração será uma realidade tanto nos 17 setores quanto dos municípios.

A MP foi publicada no fim de dezembro, algumas semanas após o Congresso decidir prorrogar a desoneração da folha de pagamento. A intenção do governo com a medida provisória é diminuir o impacto da renúncia fiscal nas contas públicas.

Propostas prioritárias 

Pacheco afirmou que deve ser votado até abril o projeto que trata a inteligência artificial (PL 2.338/2023), relatado pelo senador Eduardo Gomes (PL-TO), bem como os projetos relacionados a transição energética e pauta ambiental.

Na educação, Pacheco sugeriu que os parlamentares discutam o novo Plano Nacional de Educação numa sessão de debates no Plenário.

— Que possamos nos ocupar, inclusive, numa sessão de debates do Senado Federal, a respeito da questão da educação no Brasil, uma educação que possa ter o básico de saber ler, escrever e contar, mas que também seja uma educação relevante em termos de formação de cidadãos e cidadãs. Nós temos essa prioridade, também, aqui anunciada pela Presidência, em relação à educação. E desde já gostaria de fazer essa proposta em relação ao Plano Nacional de Educação, para que seja antecipadamente debatido no âmbito do Senado Federal.

O presidente da Casa também anunciou que nos próximos dias haverá a conclusão do trabalho da comissão de juristas instituída pelo Senado para elaborar uma proposta de atualização do Código Civil (Lei 10.406, de 2002). A comissão de juristas é presidida pelo ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

— Inovações, suprimento de lacunas através deste trabalho com os melhores juristas do Brasil na área do direito civil, que nos entregarão o trabalho nos próximos dias para que possamos submeter como um projeto para o Senado se debruçar, estando ali diversos institutos de direito civil, importantes de ter uma disciplina legal atualizada — reforçou. 

O senador disse ainda que serão prioridade, nas votações e debates, projetos ligados à educação e à segurança pública, conforme tinha anunciado na abertura dos trabalhos legislativos.

Chile

Pacheco transmitiu, em nome do Senado, uma mensagem de solidariedade à população do Chile em razão dos incêndios florestais que atingem várias regiões do país. Autoridades locais já confirmaram mais de 120 mortes.

— Diante de uma tragédia dessa magnitude num país irmão da América do Sul, o Senado Federal gostaria de manifestar nossa solidariedade, nossos profundos sentimentos. Que o governo chileno consiga, o mais breve possível, controlar a propagação desse incêndio.

Os incêndios começaram no último dia 1º, na região de Valparaíso. A cidade é a segunda maior cidade do Chile e abriga o principal porto do país. Outra cidade importante afetada é Viña del Mar, tradicional destino turístico. Os incêndios chegaram a regiões vizinhas. O governo chileno decretou dois dias de luto oficial em razão do desastre.

Pacheco também manifestou voto de pesar pelo ex-presidente chileno Sebastián Piñera, que morreu nesta terça-feira em um acidente de helicóptero. Piñera presidiu o Chile de 2018 a 2022.

Fonte: Agência Senado

ARTIGO DA SEMANA – Créditos acumulados do ICMS e do IBS

João Luís de Souza Pereira. Advogado. Mestre em Direito. Membro da Comissão de Direito Financeiro e Tributário do IAB. Professor convidado das pós-graduações da FGV/Direito Rio e do IAG/PUC-Rio.

O ICMS não foi imediatamente extinto pela Reforma Tributária.

Somente a partir de 2033 o velho imposto dará adeus ao Sistema Tributário Nacional.

Até lá, todos conviveremos com o grave problema dos créditos acumulados do ICMS.

O novo IBS já nasce como o mesmo defeito.

O art. 156-A, §1º, III e §5º, III, cuida de uma das hipóteses de créditos acumulados e não aponta uma solução expressa para o problema.

Créditos acumulados de ICMS ou IBS podem ocorrer em diversas situações. O melhor exemplo é crédito acumulado na exportação ou do exportador.

O exportador, porque vende mercadoria ou serviço sem a incidência de tributos, acumulas os créditos decorrente de aquisições tributadas nas etapas anteriores.

O artigo 155, §2º, X, “a”, da Constituição, na redação dada pela EC nº 42/2003, estabelece que o ICMS não incidirá sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores.

Ainda em relação ao ICMS, a Lei Complementar nº 87/96 prevê que os saldos credores acumulados pelo exportador poderão ser a qualquer estabelecimento da empresa no mesmo Estado e, havendo saldo remanescente, transferidos a outros contribuintes do mesmo Estado, mediante a emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito.

Ao condicionar as transferências para terceiros dos créditos acumulados à emissão pela autoridade competente de documento que reconheça o crédito, a Lei Kandir abriu caminho para os Estados, salvo raras exceções, fecharem as portas para as transferências.

Também é óbvio que a disciplina da matéria pela Lei Kandir não tratou assunto de acordo com o estabelecido na Constituição, visto que assegurou o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores, mas apenas na etapa anterior à exportação.

Quanto ao IBS, o artigo 156-A, §1º, III , dispõe que o imposto não incidirá sobre as exportações, assegurados ao exportador a manutenção e o aproveitamento dos créditos relativos às operações nas quais seja adquirente de bem material ou imaterial, inclusive direitos, ou serviço, observado o disposto no § 5º, III;

O art. 156-A, §5º, III, por sua vez, prevê que a lei complementar disporá sobre a forma e o prazo para ressarcimento de créditos acumulados pelo contribuinte.

Considerando a experiência adquirida pela Lei Kandir e o eterno estado de penúria dos entes da federação, é bem fácil prever que a regulamentação da matéria ocorrerá de forma altamente restritiva à utilização e transferência dos créditos acumulados.

A ampla utilização e transferência do saldo credor acumulado é um direito do contribuinte, já que não é lícito, sequer razoável, impor ao exportador o ônus de manutenção deste custo.

Uma solução viável para o problema é a autorização, mediante lei, da compensação dos créditos acumulados com créditos tributários constituídos, inscritos ou não em dívida ativa.

Admitida a compensação, todos ganham.

O detentor do crédito porque conseguirá transformar o crédito em dinheiro ou diminuirá seus próprios débitos.

O adquirente do crédito porque terá mais uma solução à sua disposição para buscar a regularidade fiscal.

O fisco porque poderá aliviar a pressão exercida pelos detentores, sanear as finanças, reduzir o estoque da dívida ativa e impulsionar a economia, em última análise.

A solução para o problema não pode demorar. Muito menos aguardar até 2033.    

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