STF confirma invalidade de aumento da contribuição previdenciária de transportadores autônomos

O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou sua jurisprudência sobre a inconstitucionalidade de normas que alteraram a base de cálculo da contribuição previdenciária devida sobre a remuneração de trabalhadores autônomos em fretes, carretos e transporte de passageiros. A decisão, unânime, foi no Recurso Extraordinário (RE) 1381261, com repercussão geral (Tema 1.223).

Legalidade tributária

O recurso foi interposto por uma empresa do ramo de transporte e logística contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, contrariando a jurisprudência do Supremo, havia reconhecido a legalidade do Decreto 3.048/1999 e da Portaria 1.135/2001 do então Ministério da Previdência e Assistência Social.

O argumento era de que o Supremo, no julgamento do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) 25476, já havia analisado a matéria e reconhecido a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária e a ilegalidade da portaria, mas o STJ deixou de aplicar esse entendimento por não ter força vinculante.

Jurisprudência

Em seu voto, o relator do RE, ministro Dias Toffoli, observou que de acordo com a redação da Lei 8.212/1991 (Lei Orgânica da Seguridade Social), vigente na época da edição do decreto e da portaria, a contribuição social a cargo da empresa seria de 20% sobre a remuneração paga ou creditada aos transportadores autônomos.

As normas, no entanto, alteraram a base de cálculo ao estipular que, no lugar da remuneração efetivamente paga, fosse considerado o resultado de um percentual (de 11,71% ou de 20%) incidente sobre o valor bruto do frete, carreto ou transporte de passageiros. No julgamento do RMS 25476, o Plenário considerou, então, que a portaria alterara a base de cálculo do tributo prevista em lei, em violação ao princípio da legalidade.

O Plenário acompanhou o voto do relator para cassar a decisão do STJ e restabelecer a do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que reconhecia a inconstitucionalidade das normas e restabelecia a disciplina da Lei 8.212/1991.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “São inconstitucionais o Decreto nº 3.048/99 e a Portaria MPAS nº 1.135/01 no que alteraram a base de cálculo da contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração paga ou creditada a transportadores autônomos, devendo o reconhecimento da inconstitucionalidade observar os princípios da congruência e da devolutividade”.

FONTE: Notícias do STF

A REFORMA TRIBUTÁRIA QUE NÃO VEM

O início do período de campanha eleitoral para a Presidência da República reacende a discussão sobre a Reforma Tributária. O tema é tratado em todos os programas de governo, defendido por todos os candidatos e aprovado por todas as equipes envolvidas na campanha.

Mas é evidente que nenhuma Reforma Tributária, com R e T maiúsculos, será aprovada nos próximos quatro anos, como não foi nos últimos 34 anos.

De 05/10/1988 para cá, a Constituição sofreu alterações pontuais. Criou-se um imposto provisório aqui, uma contribuição provisória acolá, ambos sobre a movimentação financeira, claro… A substituição tributária foi constitucionalizada, espancando qualquer dúvida sobre a possibilidade de tributação sobre operações ainda não realizadas. A competência tributária da União em matéria de contribuições foi ampliada, de modo que hoje até sobre as importações há contribuição específica, para além do II, IPI, ICMS e ISS que já incidiam sobre a entrada de produtos e serviços importados. Os Estados também foram beneficiados por Emendas Constitucionais, ou alguém se esqueceu da ampliação do ICMS nas importações e da constitucionalização dos Fundos de Combate à Pobreza? Municípios e o Distrito Federal não ficaram de fora do elastecimento da competência tributária, bastando lembrar das contribuições de iluminação pública criadas por Emenda Constitucional.

A Reforma Tributária que realmente importa para o desenvolvimento econômico e para a racionalização do que é totalmente irracional ainda não foi promulgada nos últimos 34 anos!

Emendas vão, emendas vêm, mas ainda convivemos com a múltipla incidência de tributos sobre o faturamento das empresas. A cada ano que passa, perde-se a oportunidade de acabar com a tributação sobre a folha de pagamentos. Entra ano e sai ano, e a Constituição continua prevendo várias incidências tributárias sobre as importações, como se vivêssemos num país autossuficiente e num mundo sem globalização.

Se não há Reforma no âmbito constitucional, a esperança está naquilo que pode ser reformado através de leis ordinárias e/ou complementares.

Diante disso, tomara que o novo Congresso demonstre preocupação com o caótico conceito de insumos na apuração do PIS/COFINS, finalmente estabeleça o imediato creditamento do ICMS sobre a aquisição de bens de uso e consumo, determine uma base de cálculo justa no imposto de renda devido pelas pessoas físicas, autorize a ampla utilização/transferência de todo saldo credor do ICMS, acabe com as restrições à compensação tributária, enfim, faça a sua parte, deputado e senador!

Fica o desabafo… 

EXCLUSÃO DO PIS/COFINS DE SUAS PRÓPRIAS BASES DE CÁLCULO

Com o julgamento da Tese do Século (exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, RE 574.706, Tema 69 de Repercussão Geral), abriu-se a possibilidade de novo questionamento envolvendo as bases de cálculo do PIS/COFINS.

Trata-se da possibilidade das contribuições para o PIS e a COFINS serem excluídas das próprias bases de cálculo.

Esta discussão envolve a indevida e inconstitucional definição da base de cálculo das contribuições para o PIS e da COFINS a partir da redação dada pela Lei nº 12.973/2014 às Leis nº 10.637/2002, 10.833/2003 e ao Decreto-Lei nº 1.598/77.

O art. 12, §5º, do Decreto-Lei nº 1.598/77,  alterado pela Lei nº 12.973/2014, passou a dispor que “Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes…”.

Como o PIS/COFINS incide sobre a receita bruta, as contribuições passam a integrar as próprias bases de cálculo.

O problema é que, através da Lei nº 12.973/2014, o legislador ordinário está elastecendo, de forma não autorizada pela Constituição, o conceito de receita definido pelo legislador constituinte.

Se a Constituição fixou a competência da União para instituir contribuições de seguridade social sobre a receita ou faturamento das empresas (art. 195, I, “b”), os tributos exigidos com fundamento nesta competência não podem incidir sobre os ingressos ou entradas no caixa que não são destinados ao contribuinte, mas repassados à União, aos Estados e/ou aos Municípios.

Isto, aliás, foi o que ficou decidido pelo STF no julgamento da Tese do Século.

Embora a tese da exclusão do PIS/COFINS de suas próprias bases de cálculo já esteja em discussão no STF (RE 1.233.096, Tema 1.067 da Repercussão Geral), nunca é demais lembrar: no julgamento da Tese do Século, só puderam obter o aproveitamento integral do que foi pago indevidamente os contribuintes que, à época do julgamento, já mantinham discussão idêntica em juízo.

Por isso é que as empresas não podem perder tempo e devem ingressar em juízo para discutir a exclusão do PIS/COFINS de suas próprias bases de cálculo.

Fica o alerta…

STJ decidirá sobre responsabilidade solidária do credor fiduciário na execução de IPTU do imóvel alienado

A Primeira Seção do Superior de Justiça (STJ) decidiu afetar os Recursos Especiais 1.949.182, 1.959.212 e 1.982.001, de relatoria da ministra Assusete Magalhães, para julgamento sob o rito dos repetitivos.

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.158 na base de dados do STJ, está assim ementada: “Definir se há responsabilidade tributária solidária e legitimidade passiva do credor fiduciário na execução fiscal em que se cobra IPTU de imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária”. 

O colegiado determinou a suspensão – em segunda instância e no STJ – dos recursos especiais e dos agravos em recurso especial fundados na mesma questão de direito, conforme o artigo 256-L do Regimento Interno do STJ (RISTJ).

Carência na exposição dos preceitos legais para decidir sobre o tema 

No REsp 1.949.182, indicado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) como representativo da controvérsia, o município de São Paulo sustentou que o credor fiduciário é responsável pelo pagamento dos tributos incidentes sobre o imóvel objeto de alienação fiduciária, possuindo, dessa forma, legitimidade para figurar no polo passivo da execução fiscal para a cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) que onera o bem. 

O TJSP entendeu pela ilegitimidade passiva do credor fiduciário, o qual, para a corte, tem apenas a propriedade resolúvel e a posse indireta do bem tributado. 

Ao propor a afetação do tema, Assusete Magalhães ressaltou que, nos casos que envolvem essa controvérsia, os acórdãos recorridos se fundamentam em jurisprudência do tribunal de origem, “por vezes com a transcrição de ementas de julgados desfavoráveis à tese do recorrente, sem, contudo, indicar, expressamente, o preceito legal”.

Controvérsia infraconstitucional e multiplicidade de recursos 

A relatora considerou ainda que o Supremo Tribunal Federal – como apontou o município de São Paulo –, ao julgar o RE 1.320.059, correspondente ao Tema 1.139/STF, proclamou que “é infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à legitimidade passiva do credor fiduciário para figurar em execução fiscal de IPTU incidente sobre imóvel objeto de alienação fiduciária”.

Além disso, destacou que, ao tratar do caráter multitudinário da demanda, o presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, informou que foram identificados em pesquisa à jurisprudência da corte dez acórdãos e 720 decisões monocráticas proferidas por ministros da Primeira e da Segunda Turma contendo controvérsia semelhante à dos autos. 

Recursos repetitivos geram economia de tempo e segurança jurídica

O Código de Processo Civil de 2015 regula, no artigo 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros. 

A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica. No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.

Leia o acórdão de afetação do REsp 1.949.182.

Fonte: Notícias do STJ

Setor de turismo se qualifica ao Perse mesmo sem inscrição no Cadastur

Criado pela Lei 14.148/2021, o Programa Especial de Recuperação do Setor de Eventos (Perse) visa a mitigar as drásticas perdas experimentadas por esse segmento em razão da Covid-19. Em sua redação original, a lei trazia os seguintes benefícios: renegociação de dívidas fiscais e não fiscais (artigo 3º), indenização sobre a folha de salários para empresas que tiveram mais de 50% de redução no faturamento entre 2019 e 2020 (artigo 6º) e programas voltados às operações de crédito de empresas privadas dos setores críticos (artigo 8º).

São elegíveis ao Perse as pessoas jurídicas, inclusive sem fins lucrativos, que exercem direta ou indiretamente as atividades de: (1) realização ou comercialização de congressos, feiras, eventos esportivos, sociais, promocionais ou culturais, feiras de negócios, shows, festas, festivais, simpósios ou espetáculos em geral, casas de eventos, buffets sociais e infantis, casas noturnas e casas de espetáculos; (2) hotelaria em geral; e (3) administração de salas de exibição cinematográfica; e (4) prestação de serviços turísticos, conforme o artigo 21 da Lei 11.771/2008 (artigo 2º, parágrafo 1º).

Essa última lei, por sua vez (artigo 21), enquadra como serviços turísticos as atividades de: (4.1) meios de hospedagem; (4.2) agências de turismo; (4.3)transportadoras turísticas; (4.4) organizadoras de eventos; (4.5) parques temáticos; e (4.6) acampamentos turísticos, acrescentando que, “atendidas as condições próprias”, podem ainda cadastrar-se no Ministério do Turismo as sociedades empresárias que exerçam as atividades de: (4.7) restaurantes, cafeterias, bares e similares; (4.8) centros ou locais destinados a convenções e/ou a feiras e a exposições e similares; (4.9) parques temáticos aquáticos e empreendimentos dotados de equipamentos de entretenimento e lazer; (4.10)marinas e empreendimentos de apoio ao turismo náutico ou à pesca desportiva; (4.11) casas de espetáculos e equipamentos de animação turística; (4.12) organizadores, promotores e prestadores de serviços de infraestrutura, locação de equipamentos e montadoras de feiras de negócios, exposições e eventos; (4.13) locadoras de veículos para turistas; e (4.14) prestadores de serviços especializados na realização e promoção das diversas modalidades dos segmentos turísticos, inclusive atrações turísticas e empresas de planejamento, bem como a prática de suas atividades.

Voltando à Lei do Perse, tem-se que o seu artigo 2º, parágrafo 2º, prevê que ato do Ministério da Economia publicará os códigos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) que se enquadram na definição de setor de eventos. Em atenção ao comando foi editada a Portaria ME 7.163/2021, que enumera os CNAEs elegíveis nos Anexos I (eventos) e II (turismo) e exige, quanto a este último, que a empresa candidata aos benefícios estivesse inscrita no Cadastur na data da publicação da lei (artigo 1º, parágrafo 2º).

Pois bem: em 18/3/2022, após a derrubada do veto aposto pelo presidente da República, foi publicado o artigo 4º da lei, trazendo mais uma vantagem para as empresas enquadráveis no Perse: redução a zero, por 60 meses, das alíquotas de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Desde então, tem-se discutido sobre a aplicabilidade a esse novo benefício, para as empresas do setor de turismo e sobretudo para aquelas listadas nos itens 4.7 e seguintes da enumeração acima, da exigência de prévia inscrição no Cadastur.

Como visto, a inclusão de todas elas no programa passa-se exclusivamente no nível legal, decorrendo da combinação dos artigos 4º, caput, e 2º, parágrafo 1º, da Lei do Perse e do artigo 21 da Lei 11.771/2001 (caput para as listadas nos itens 4.1 a 4.6 e parágrafo único para as seguintes). É certo que o parágrafo único submete a inscrição facultativa no Cadastur das empresas ali referidas ao atendimento das “condições próprias”. Impõe-se, assim, uma análise da normativa infralegal para identificar que condições são essas. 

A matéria é tratada diretamente na Portaria MTur 38/2021, em vigor quando da promulgação das partes vetadas, a qual apenas exige inscrição no CNPJ que indique como atividade principal ou secundária uma das referidas em qualquer dos subitens do item iv da lista acima, autorizando o Ministério do Turismo a solicitar outros documentos “para averiguar a compatibilidade das atividades desenvolvidas com a constante do CNPJ” (artigo 3º, caput e parágrafo 1º). Isto é: condições inteiramente genéricas, que qualquer empresa do ramo atenderá sem dificuldade. A conclusão não se altera diante das anteriores Portarias MTur 105/2018, vigente quando da votação da lei do Perse, e 130/2011, que primeiro instituiu o Cadastur.

Nenhum acréscimo fazem os dispositivos invocados como substrato normativo da Portaria MTur 38/2021, a saber: o próprio artigo 22 da Lei 11.771/2008 (que atribui ao Executivo a competência para definir as “condições especiais”), o artigo 19 do Decreto 7.381/2010 e os artigos 10 e 11 do Decreto 946/93. A irrelevância do segundo decreto para o tema aqui discutido é nítida, por disciplinar a profissão de guia de turismo. O primeiro, que regulamenta a Lei 11.771/2008, reitera a competência do Ministério do Turismo para definir os documentos necessários à inscrição no Cadastur, exigindo apenas respeito à matriz de cadastro de cada atividade e ao CNAE (artigo 19, caput e parágrafo único) — novamente o minimum minimorum, incapaz de excluir qualquer agente que atue de maneira regular no mercado.

Em resumo: nem as leis do Perse e do turismo, nem o decreto que regulamenta esta última, nem a portaria que disciplina o Cadastur exigem a inscrição das empresas que exercem as atividades listadas nos itens 4.7 e seguintes acima, ou a condicionam à satisfação de requisitos aptos a diferenciar uma categoria especial de prestadores. Quem faz tal imposição, de forma completamente autônoma e desarrazoada _ impondo condição que não é aplicável sequer ao setor de origem do cadastro —, é apenas a Portaria ME 7.163/2021.

E assim age, claro está, para exigir tributos onde a lei os dispensa, isto é, para afastar — quanto aos contribuintes que não cumpram essa condição — a alíquota zero de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins instituída pelo legislador sem qualquer referência à inscrição no Cadastur. A ofensa ao princípio da legalidade é manifesta (Constituição, artigo 150, inciso I; CTN, artigo 97, inciso II). Ora, mesmo os decretos, editados pela autoridade máxima do Poder Executivo, devem fiel obediência às leis (Constituição, artigo 84, inciso IV; CTN, artigo 99). Muito menos poderiam inovar na ordem jurídica as chamadas normas complementares do artigo 100 do CTN, que se situam abaixo daqueles e dentre as quais estão os atos administrativos expedidos pelas autoridades administrativas (inciso I) — caso da citada portaria. 

E tem mais: ainda que a exigência de cadastramento fosse válida, tem-se que pegou os referidos contribuintes inteiramente de surpresa. Com efeito, para eles a medida sempre foi facultativa, como demonstrado, e apenas em 18/3/2022 — data da publicação dos trechos vetados da lei do Perse — teria passado a ser obrigatória para o gozo das alíquotas zero. Contudo, nos termos da Portaria ME 7.163/2021, o contribuinte deve comprovar o cumprimento da condição “na data da publicação da Lei 14.148/2021”, ou seja, desde 3/5/2021. 

A ofensa à irretroatividade (Constituição, artigo 150, inciso III, alínea “a”; CTN, artigo 105) é chapada. Trata-se, à toda evidência, de condição impossível, que deve ser tida por não escrita, por aplicação analógica dos artigos 123, inciso I, e 124 do Código Civil [1]. Essa a solução dada pelo STF em situação análoga, também relativa ao descasamento temporal entre a instituição da condição e a data em que a conduta do particular seria exigível (1ª Turma, RE 409.730/PR, relator ministro Marco Aurélio, DJ 29/4/2005).

Por fim, ainda que superadas as duas claras invalidades, um terceiro aspecto bastaria para afastar a exigência de cadastramento em 3/5/2021 para o gozo das alíquotas zero. Trata-se do nítido abalo que o requisito traz à livre concorrência, princípio geral da ordem econômica previsto no artigo 170, inciso IV, da Constituição e recentemente importado de forma expressa para o sistema tributário pelo artigo 146-A [2].

De fato, como poderiam uma empresa nova, instituída após aquela data, ou uma empresa antiga que não tenha exercido a faculdade (ou mesmo o dever, para aquelas referidas nos itens 4.1 a 4.6 da lista acima) de se inscrever no Cadastur — e que, assim, ficariam sujeitas à incidência normal de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins — concorrer com outra que, inscrita no prazo assinado pela portaria, estivesse livre dessas exações? A impossibilidade é total é basta para acarretar a inconstitucionalidade do requisito, em boa hora rechaçado pelas decisões judiciais já proferidas na matéria.


[1] “Art. 123. Invalidam os negócios jurídicos que lhes são subordinados:

I – as condições física ou juridicamente impossíveis, quando suspensivas;

(…)

Art. 124. Têm-se por inexistentes as condições impossíveis, quando resolutivas, e as de não fazer coisa impossível.”

[2] “Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo.”

Igor Mauler Santiago é sócio-fundador do escritório Mauler Advogados, mestre e doutor em Direito Tributário pela Universidade Federal de Minas Gerais, membro da Comissão de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB e presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Processo Tributário (IDPT).

Valdecir de Souza é advogado e contador, especialista em Direito Tributário pela FGV e sócio de Mauler Advogados.

Fonte: Conjur – 10/08/2022

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